Guardiões da galáxia
Em Star Overdrive, assumimos o controle do protagonista BIOS, um jovem explorador galáctico que está relaxando com games e música em sua nave espacial (soa familiar?), quando, inesperadamente, recebe um estranho pedido de socorro, diretamente do planeta Cebete.
Não é preciso muito tempo para descobrir que o sinal de ajuda partiu de ninguém menos que NOUS, jovem exploradora que compartilha um laço especial com o protagonista e que, infelizmente, está há bastante tempo desaparecida após uma expedição.
Logo, dada a urgência da mensagem, BIOS parte imediatamente para Cebete para salvar NOUS e, talvez, descobrir o que está por trás de seu misterioso desaparecimento. Munido de sua Keytar — um versátil equipamento que lembra tanto uma guitarra quanto um sintetizador — e uma prancha voadora, o que não faltará é estilo para combater os vários desafios que o aguardam no mundo desenvolvido pela Caracal Games.
Um sopro da natureza espacial
Logo nos primeiros momentos de jogo, é possível ver que Star Overdrive é altamente inspirado em duas obras-primas bem conhecidas para os donos de um Nintendo Switch: The Legend of Zelda: Breath of the Wild e a sua sequência direta, Tears of the Kingdom. A inspiração é tamanha que engloba desde o ícone do jogo no menu do console (repare abaixo na paleta de cores e no protagonista olhando para o horizonte da mesma forma que Link fita o Hyrule Castle) até elementos da gameplay, como a mecânica de conseguir poderes especiais após resolver puzzles em áreas dedicadas.
Até aí tudo bem — independentemente do ramo, o que seria de um artista ou uma obra sem referências, por exemplo? —, mas o problema é que essa idealização acaba evidenciando logo cedo que falta à Star Overdrive o mesmo refino que Zelda tem. Uma das primeiras missões do jogo, por exemplo, requer que o protagonista energize uma das torres de mapeamento de Cebete. Para isso, é necessário viajar a três pontos de energia distintos e ligá-los.
Na prática, a tarefa é uma chance de ouro de se acostumar com os controles do jogo e adquirir os primeiros poderes da Keytar, assim como quando Link é orientado pelo espírito do Rei Rhoam, no início de BoTW. Porém, é precisamente nesse momento que percebemos que Star Overdrive infelizmente peca em aspectos cruciais para qualquer jogo, desde a movimentação do personagem até o sistema de combate.
Andou na prancha, ah ah…
Começando pelos pontos positivos do título, Cebete é um planeta lindo e vibrante e que realmente se destaca visualmente no Switch, tanto no modo portátil quanto com o console conectado à TV. Passear em alta velocidade usando a prancha voadora de BIOS também tem seus momentos divertidos, e a taxa de quadros (uma das minhas grandes preocupações para este lançamento) se mantém estável, mesmo durante as sequências mais ágeis.
Porém, para cada acerto da obra, há praticamente um deslize: impressionantemente, quando se está sobre a prancha, o analógico direito é usado para fazer manobras e ganhar velocidade, enquanto a câmera é ajustada automaticamente pelo jogo. Essa decisão de design até parece interessante na teoria, mas, na prática, acaba acarretando um incômodo descontrole sobre a direção em que o personagem se move, especialmente em alta velocidade (ou seja, na maior parte do tempo).
Não foram poucas as vezes, por exemplo, em que me percebi usando a prancha e mexendo no analógico direito para ver o que estava ao meu redor até cair na real e perceber que esse comando não surtiria o efeito desejado. Para piorar, com essa falta de controle sobre os rumos da prancha voadora, vêm as inevitáveis colisões com montanhas e afins, nas quais o protagonista cai e demora para se levantar de uma forma que deixaria o Neymar da Copa do Mundo de 2018 orgulhoso.
Aliás, por tocar no assunto, é impossível não reparar o contraste bizarro entre a velocidade da prancha e a lentidão do andar de BIOS, que praticamente torna qualquer segmento do jogo realizado a pé uma verdadeira tortura. Contrariando todos os avanços em jogos 3D ao longo das últimas décadas, nosso jovem explorador não consegue correr e mesmo as tarefas triviais como andar de lado são um grande desafio para sua morosidade.
Mas o pior de tudo talvez seja o sistema de combate, no qual o protagonista orgulhosamente empunha sua Keytar como se fosse uma espada — há até um golpe carregado ao segurar o “Y”, igual em… ah, você já sabe a essa altura do texto. Ocorre que, além da simplicidade perigosamente infantil das mecânicas, há a ausência completa de um sistema de lock-on (travamento de mira), o que torna enfrentar mais de um inimigo ao mesmo tempo um verdadeiro e desnecessário pesadelo.
Para ser justo, é bem verdade que desbloquear novas ferramentas para a Keytar nas Minas do jogo (os lugares equivalentes às shrines de Zelda) consegue tornar o combate um pouco menos tedioso, graças à possibilidade de atirar nos inimigos ou arremessá-los. Mas, mesmo com esses upgrades, é difícil não jogar Star Overdrive e notar um potencial que não foi realizado. Um sistema de travamento de mira e uma mecânica de combos que não envolvesse somente martelar o botão Y, por exemplo, já ajudariam a tornar os segmentos de combate mais interessantes. Uma pena.
Eu gravei uma fita para você
Outro ponto que me incomodou bastante foi a parte sonora do título. Para um jogo que apresenta uma temática musical (vide a Keytar e os logs sonoros em forma de fita cassete espalhados por Cebete, que ajudam a construir a narrativa), a trilha sonora e, principalmente, a mixagem de Star Overdrive estão em um nível muito abaixo do aceitável.
Mesmo jogando em um Switch OLED (que, de acordo com a Nintendo, possui alto-falantes melhores que os dos modelos V1, V2 ou Lite), quase não consegui escutar os sons e efeitos do jogo. Usar fones de ouvido com qualidade de estúdio também não resolveu a situação, que suspeito estar atrelada a uma severa compressão do áudio, então me sinto obrigado a relatar isso nesta análise, pois talvez seja algo que possa ser resolvido em um update.
É honestamente complicado para mim escrever tudo isso, pois eu adoraria ter gostado mais de Star Overdrive. Seu universo é interessante e, de fato, impressionante para um estúdio indie com pouco mais de dez pessoas na equipe. As referências à série Zelda, apesar de um pouco excessivas, também podem agradar quem já fez de tudo e mais um pouco em BoTW e ToTK e busca um jogo um pouco parecido para explorar.
Também há suporte a PT-BR e o valor atual na eShop brasileira é relativamente justo para a quantidade de conteúdo oferecido, então, se você gosta de jogos de mundo aberto, vale experimentar a demo disponível e, para além desta análise, formar suas próprias conclusões. Há alternativas melhores, mas, temperando as expectativas e moldando a paciência, ainda é possível se divertir em Cebete e, finalmente, descobrir o que de fato aconteceu com NOUS.
Mirando as estrelas
Star Overdrive ousa em sua proposta, porém peca ao entregar uma experiência cuja ausência de polidez em quesitos cruciais como a movimentação e o combate impede uma recomendação mais ampla. Com uma boa dose de paciência, é, sim, possível se divertir com a história de BIOS e NOUS, mas é difícil não olhar para este criativo universo e notar um potencial que não foi completamente realizado. Logo, por mais atrativa que pareça, a viagem para Cebete infelizmente não é um destino imperdível — quem sabe na próxima?
Prós
- Apresenta um intrigante universo sci-fi, cuja narrativa incentiva a continuar jogando para descobrir o que aconteceu com NOUS;
- Visuais vibrantes e boa performance, mesmo nas sequências com alta velocidade;
- Apesar de alternativas melhores, é uma escolha relativamente segura para quem busca um novo jogo de mundo aberto no console da Nintendo;
- Suporte a PT-BR.
Contras
- Tenta emular a criatividade e os desafios dos títulos open-world da série The Legend of Zelda, mas falha consideravelmente no processo;
- O contraste entre a alta velocidade da movimentação com a prancha e a lentidão do andar do protagonista é simplesmente irritante;
- As mecânicas de combate são rasas e acabam frustrando sem um sistema de travamento de mira;
- Para um jogo que ostenta uma temática musical, a trilha sonora e a mixagem estão muito aquém do que poderiam (e deveriam) ser;
- Faltam motivos para explorar o mundo, além da narrativa.
Star Overdrive — Switch — Nota: 6.5
Revisão: Alessandra Abreu
Análise produzida com cópia digital cedida pela Dear Villagers