Como Xenoblade Chronicles X ajudou a moldar o mundo de Zelda: Breath of the Wild

Experiência no mundo aberto do planeta Mira influenciou a construção da Hyrule dos novos jogos.

em 20/03/2025
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Liberdade, aventura, paisagens belíssimas e criaturas fantásticas a serem enfrentadas, tudo em um mundo aberto sem precedentes até então nos jogos da Nintendo. Se você pensou em The Legend of Zelda: Breath of the Wild (BotW), não está totalmente errado. Mas há um outro jogo que pode ser descrito nessas mesmas palavras. Xenoblade Chronicles X foi um dos principais lançamentos do Wii U em 2016. Ao lado de Super Mario Maker e de Splatoon, jogos que viriam a se tornar suas próprias franquias no futuro, o RPG deixou sua marca na história da Big N. 


Desde os primeiros trailers, o maior chamariz do jogo foi seu mundo aberto colossal e sua possibilidade de exploração sem limites. Mas você sabia que o mundo criado pela desenvolvedora Monolith Soft foi tão impressionante que eles auxiliaram a moldar a Hyrule de BotW? Vamos descobrir juntos essa história.

O impacto de Breath of the Wild

As influências de BotW podem ser sentidas por toda a indústria de games

The Legend of Zelda: Breath of the Wild se tornou o maior jogo de 2017 e do lançamento do Switch não apenas pelo seu sucesso comercial, mas pela revolução que causou nos jogos de mundo-aberto. Sua influência pode ser sentida por todo lugar, desde grandes MMORPGs (como Genshin Impact), passando por desenvolvedoras consagradas da indústria japonesa (Elden Ring), até jogos indie e de menor escopo (como o singelo, porém cativante, A Short Hike).

Pode-se dizer que os jogos de mundo aberto mudaram completamente com BotW. O jogo colocou Link em uma aventura pelo mapa mais expansivo até então de toda a franquia. O jogador nunca teve tanta liberdade para explorá-lo. BotW cativa, desde seus primeiros minutos, pela sensação de liberdade que oferece. É uma experiência quase universal de todos os jogadores o momento em que se avista um ponto interessante no horizonte, seja o cume de uma montanha, uma ruína ou um brilho misterioso, e se é inundado pela curiosidade de descobrir o que há lá.

Em muitos jogos, incluindo os Zelda anteriores, essa experiência se restringia à curiosidade. Mas em BotW o jogador é livre para explorar e descobrir todo tipo de ponto interessante. A montanha pode esconder um santuário natural; a ruína pode abrigar um Korok escondido; e o brilho misterioso pode ser um dragão aguardando para ser salvo. Não havia limites para a descoberta, exceto pelo céu (mas isso fica para discussão de outro jogo).

A essência de um mundo aberto


A franquia Zelda já havia tido grandes mapas antes. O primeiro jogo da franquia, de 1986, deixava Link solto para explorar o reino de Hyrule. Com o avanço da tecnologia, os mundos foram se tornando maiores e mais complexos. A Link to the Past (1991) subdivide o reino em diversas regiões. Ocarina of Time (1998) fez uma transição primorosa para o 3D, mas precisou dividir o mapa em áreas interconectadas. E por muito tempo esse foi o padrão da franquia: um mundo semi-aberto, conectado por corredores e telas de carregamento.

Os produtores da franquia sempre quiseram retornar para aquela liberdade que Zelda experimentou nos seus primórdios. Talvez a maior tentativa disso tenha sido o Great Sea, o “Grande Mar”, de The Wind Waker (2002). Não há sensação de liberdade tão emblemática quanto navegar nos mares a bordo do King of the Red Lions, ao som da trilha sonora de Koji Kondo. Contudo, mesmo que impressionante para a época, é perceptível como o mundo aberto de The Wind Waker não é exatamente o que os desenvolvedores almejavam.

São conhecidas as histórias dos muitos conteúdos cortados da versão final do jogo. Muitos concordam que um de seus pontos fracos é que, após diversas horas de navegação, percebe-se que esse mundo não tem tanta coisa assim a oferecer fora de suas principais ilhas. Sim, há ilhas menores e baús do tesouro, mas a maior parte da experiência não passa de vagar pelo mar coletando quinquilharias. Não entenda mal, esse continua sendo uma verdadeira obra-prima, mas limitada pela tecnologia de seu tempo.

É certo que uma das preocupações durante o desenvolvimento de BotW era não repetir esse mesmo erro. Dar aos jogadores não apenas um mundo que inspire liberdade, mas que entregue essa liberdade. A Nintendo então foi buscar ajuda em quem já era especializado no assunto: a Monolith Soft.

Monolith Soft: a parceria inesperada

Logo da empresa é baseado no monolito do filme "2001: Uma Odisseia no Espaço".

Comparado a outras grandes empresas de games, a Nintendo não costuma comprar muitos estúdios. E os estúdios que são adquiridos costumam ser incumbidos de trabalhar com propriedades da própria empresa. Eles são escolhidos por possuírem o “DNA Nintendo”. Mas com a Monolith Soft é diferente.

Fundada em 1999 por Tetsuya Takahashi e Hirohide Sugiura, a Monolith Soft foi uma desenvolvedora da Namco até ser comprada pela Nintendo em 2008 (quando a Big N se tornou a acionista majoritária da desenvolvedora). Entretanto, olhando para o portfólio da empresa à primeira vista, ela não demonstra esse tal “DNA nintendista”. Especializada em JRPGs densos em ficção científica, e conhecida pela franquia Xenosaga, ela se diferenciava bastante dos jogos mais familiares da empresa — que vivia nesse período o sucesso comercial do Wii com jogadores casuais. Então, onde estava essa essência nintendista?

Uma das razões que levou a Monolith à venda foi a perda de liberdade criativa que estavam enfrentando na Namco. Após uma mudança de gerência, a então Namco Bandai não se mostrava disposta a assumir riscos criativos. Porém, uma conversa com executivos da Nintendo mostrou que a Big N tinha a mesma sede por criatividade que eles.

Xenoblade Chronicles X e seu mundo colossal


Durante o período de transição da venda, a Monolith Soft trabalhava em uma ideia ousada para um novo jogo. Takahashi criou o conceito de duas civilizações rivais que moravam nos corpos congelados de dois deuses, colossos travados num combate eterno. Tratava-se de Xenoblade Chronicles. O primeiro Xenoblade enfrentou muitos desafios para ser lançado fora do Japão, mas conquistou aclamação mundial no final das contas. Dentre os destaques, estava a construção de mundo primorosa da desenvolvedora, que conseguiu criar um mundo vivo e interessante erguido sobre as estruturas de dois gigantes. Mas o maior passo da empresa veio com seu próximo jogo.

Xenoblade Chronicles X chegou ao Wii U como uma espécie de continuação antológica do primeiro jogo. Foi o primeiro mundo aberto da Monolith, e seu maior mapa já construído. A ideia no início era fazer vários planetas para o jogador explorar, mas o estúdio acabou optando por criar um único mundo o mais variado possível. E eles conseguiram. Xenoblade X entrega um mundo verdadeiramente alienígena para ser explorado. Muitos biomas compõem o planeta Mira, cada um com visuais únicos. Florestas bioluminescentes, planícies sem fim e regiões vulcânicas que parecem saídas de um filme de Star Wars, são apenas algumas das áreas que o jogo oferece.

Além dos visuais, cada região conta com uma flora e uma fauna única, o que incentiva o jogador a descobrir mais sobre esse ecossistema alienígena. Quando finalmente se conquista o Mecha voador — chamado aqui de Skells, uma das melhores experiências do título — não é para simplesmente poder ir mais rápido de um lugar ao outro, mas para explorar mais, descobrir mais. A Monolith Soft havia criado um dos mundos abertos mais convidativos da geração.

Moldando Hyrule


A desenvolvedora da franquia Xenoblade já tinha auxiliado a Nintendo em alguns jogos desde a compra. Seu trabalho era principalmente artístico. The Legend of Zelda: Skyward Sword (2011), por exemplo, contou com auxílio da Monolith para a criação de designs e artes. Quando o desenvolvimento de BotW começou, a desenvolvedora foi requisitada mais uma vez, mas, dessa vez, e pela primeira vez, a razão era sua habilidade técnica.

De acordo com uma entrevista com Eiji Aonuma (produtor da franquia Zelda) o trabalho da Monolith em BotW foi cuidar da topografia de Hyrule. Uma tarefa que pode parecer simples, mas é essencial para a imersão proporcionada pelo jogo. Já percebeu como essa versão do reino de Hyrule se parece muitas vezes com um mar de morros e colinas? Ou como as regiões mais distantes são também as mais altas? Nada disso é apenas acidental. Mesmo a posição do Hyrule Castle no centro do mapa, com Calamity Ganon sempre o rodeando, é proposital. Trata-se de um constante lembrete ao jogador da presença maligna que ele está destinado a extirpar, sempre visível no horizonte.

São qualidades como essas que tornaram Breath of the Wild um divisor de águas para a franquia Zelda e para a indústria de videogames. O trabalho da Monolith Soft, nascido de sua experiência em Xenoblade Chronicles X, foi essencial para atingir o nível de imersão e liberdade que a equipe de Aonuma desejava. O resultado foi tão frutífero que ambas as equipes voltaram a trabalhar juntas para o desenvolvimento de The Legend of Zelda: Tears of the Kingdom (2023). As lições aprendidas em Xenoblade X moldaram não apenas o novo mundo de Zelda, mas também o futuro dos jogos de mundo aberto.

Revisão: Beatriz Castro
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Bruno Zilli
Turismólogo e mestrando na UFPR, ama Mario e Zelda de coração desde criança. É músico e escritor nas horas vagas. Além de NIntendo, gosta de animês (tentando aprender japonês) e de todo tipo de livro (tentando escrever o seu próprio).
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