Afinal, de todos os fenômenos culturais que já vimos até hoje na indústria dos games — de Pokémon a Fortnite, passando por Grand Theft Auto e Minecraft — pode-se argumentar que poucos talvez seriam capazes de se manter relevantes por tanto tempo quanto a obra criada pelo engenheiro russo Alexey Pajitnov há quarenta anos, em 1984.
Logo, esta compilação da Digital Eclipse, embora infelizmente marcada por alguns pequenos deslizes, merece ser conferida por todos aqueles que se interessem pela história dos games e, logicamente, pelo processo criativo por trás do “jogo mais popular do mundo”.
Respeito aos clássicos
Tetris Forever é a mais nova obra da série Gold Master da Digital Eclipse (a primeira foi The Making of Karateka). O objetivo dessa série da empresa estadunidense, segundo a própria, é celebrar “designers, estúdios e jogos que mudaram o mundo”, em uma abordagem chamada de “documentário interativo”.
De fato, o que vemos em Tetris Forever reflete com precisão essa descrição: além dos dezoito jogos incluídos — que vão desde a versão de 1984 para o computador soviético Electronika 60 até Tetris Time Warp, título criado especialmente para esta coletânea — há diversos vídeos, fotos e relatos que ajudam a entender a engenharia por trás do fenômeno que conquistou o mundo.
Assim, no menu inicial, é possível tanto ir direto para os jogos incluídos (e escolher um para se divertir imediatamente) quanto explorar a história de Tetris em uma linha do tempo própria, cuidadosamente dividida em cinco capítulos que pontuam fases específicas da franquia, desde a sua criação até os dias atuais.
Pelo que conferi, praticamente nenhum acontecimento marcante deixou de ser citado: do exclusivo de Switch Tetris 99 aos poliominós descritos pelo matemático Solomon Golomb em 1953 (e que serviram de referência para Pajitnov), a riqueza de detalhes e a bela apresentação certamente impressionam e tornam muito divertida a navegação pela linha do tempo montada pela Digital Eclipse.
Explorar Tetris Forever traz, portanto, a sensação de adentrar um museu virtual e tocar em verdadeiras pedras angulares da indústria, permitindo entender os fatos que levaram Tetris a ser a obra atemporal que é hoje. O único ponto negativo — e que precisa ser citado — é que não há (ainda) suporte ao português brasileiro nem nos menus, nem nas legendas dos vídeos, dificultando a compreensão caso o jogador não domine os outros idiomas suportados, como o inglês. Quem sabe em uma atualização futura?
Dezoito, o número da sorte — ou não?
Se o museu interativo por si só já valeria o ingresso, é inegável que a quantidade de jogos incluídos enriquece a proposta de Tetris Forever. Ao todo, estão presentes no pacote dezoito títulos de diferentes plataformas e eras, listados a seguir:
- Tetris, Electronika 60 (1984)
- Tetris, MS-DOS (1986)
- Igo: Kyu Roban Taikyoku, Famicom (1987)
- Tetris (Spectrum Holobyte), MS-DOS (1988)
- Tetris, Apple II (1988)
- Tetris, Famicom (1988)
- Hatris, Famicom (1990)
- Hatris, Game Boy (1991)
- Tetris 2 + Bombliss, Famicom (1991)
- Hatris, NES (1992)
- Super Tetris 2 + Bombliss, Super Famicom (1992)
- Tetris Battle Gaiden, Super Famicom (1993)
- Super Tetris 2 + Bombliss Genteiban, Super Famicom (1994)
- Super Tetris 3, Super Famicom (1994)
- Super Bombliss, Game Boy (1995)
- Super Bombliss, Super Famicom (1995)
- Super Bombliss DX, Game Boy Color (1999)
- Tetris Time Warp (2024)
Como a lista acima revela, alguns dos maiores clássicos da franquia — como as populares versões de Game Boy e NES — infelizmente não estão incluídos nesta coletânea. O mesmo vale para títulos mais recentes, como os excelentes Tetris DS e Tetris Effect, e para os numerosos e ambiciosos crossovers, como Tetris & Dr. Mario e Puyo Puyo VS. Tetris.
Sobre isso, a verdade é que os desafios de licenciamento e a grande quantidade de empresas envolvidas com a franquia ao longo dos anos certamente dificultaram a meta da Digital Eclipse de fazer uma compilação definitiva, de modo que a seleção final infelizmente pode não agradar tanto assim quem não aprecia jogos mais antigos ou, por outro lado, só estava interessado em reviver o clássico do Game Boy.
Porém, é inegável o fato que títulos como Super Bombliss DX e Super Tetris 3 continuam divertidos até hoje, especialmente com a facilidade do multiplayer local que é oferecida pelo Switch e seus Joy-Con nos títulos compatíveis com mais de um jogador.
Felizmente, a qualidade da emulação também é de alto nível: testando os vários títulos incluídos em Tetris Forever para esta análise, não encontrei engasgos ou travamentos em nenhum deles tanto no modo portátil quanto no modo TV do Switch. Além dos tradicionais save states e da possibilidade de retroceder a gameplay para consertar um erro, também vale mencionar que as versões orientais incluídas foram todas adaptadas em inglês para este lançamento.
Tetris: o túnel do tempo
Se a ausência de jogos importantes decepciona um pouco, Tetris Time Warp ameniza parte da tristeza com um título totalmente novo, criado especialmente para Tetris Forever. Com suporte para até quatro jogadores locais, o destaque em Time Warp é a presença de Tetriminós especiais, que possibilitam ao público “viajar ao passado” por tempo limitado, conquistando pontos em cenários bônus que remetem aos Tetris antigos.
Além de divertido — especialmente com mais de um jogador — Time Warp remete à longa e rica história de Tetris, provando a capacidade da Digital Eclipse de realmente criar um “documentário interativo” de altíssimo nível com sua série Gold Master.
A única infelicidade, nesse caso, fica pela ausência de um modo online, especialmente considerando que o jogo, assim como outros presentes na coletânea, é bem mais divertido com outros jogadores. Fica aqui registrada a esperança que essa opção esteja sendo ao menos considerada pelos desenvolvedores para alguns títulos específicos de Tetris Forever, pois ela muito agregaria a um pacote robusto como este.
Uma compilação digna que merece ser experimentada
Tetris Forever sucede em sua missão de entregar uma compilação digna do legado de uma das franquias mais influentes da indústria dos games. Mesmo os pequenos deslizes, como a ausência de suporte ao português brasileiro ou de certos jogos e modos online, não são capazes de ofuscar o brilho deste museu virtual cujos curadores foram evidentemente cuidadosos e atenciosos. No fim, se ainda havia alguma dúvida, agora ela não existe mais: graças à Digital Eclipse, Tetris é, definitivamente, para sempre.
Prós
- Por meio de vídeos, fotos e menus interativos, entrega um verdadeiro museu virtual dedicado ao imenso legado de Tetris, abordando desde a origem do jogo na década de 1980 até os seus lançamentos mais recentes;
- Reúne dezoito títulos que ajudam a entender o fenômeno por trás da saga e a sua evolução constante, com destaque para a histórica versão de Electronika 60;
- A apresentação e a emulação tecnicamente perfeitas no Switch tornam esta uma versão altamente recomendável, especialmente considerando o caráter híbrido da plataforma da Nintendo e a sua flexibilidade no que tange às opções multiplayer;
- A inclusão de um título totalmente novo — Tetris Time Warp — engrandece a proposta e supera as expectativas.
Contras
- A ausência completa de suporte ao português brasileiro é notável e prejudica os jogadores que não possuem familiaridade com outros idiomas;
- Alguns dos títulos mais conhecidos da franquia, como a versão de Game Boy, não estão presentes, assim como qualquer jogo lançado após os anos 2000;
- Tetris Time Warp poderia contar com modo online e crossplay.
Tetris Forever — PC/Switch/PS4/PS5/XBO/XSX — Nota: 8.5
Versão utilizada para análise: Switch
Revisão: Beatriz Castro
Análise produzida com cópia digital cedida pela Digital Eclipse