Análise: Stray para Nintendo Switch é um port respeitável de um jogo mediano

A versão do jogo para o console híbrido é um bom relançamento, mas não muda o que tornava o título original maçante.

em 18/11/2024
Imagem de Stray, com um gatinho em uma cidade repleta de letreiros neon coloridos.

Você já reparou na quantidade de jogos com gatos que estão sendo lançados ultimamente? Seja protagonizando uma aventura ou trazendo fofura e caos como animais não jogáveis, os felinos ganharam apreço dos desenvolvedores, especialmente dos indies. Assista aos Indie World mais recentes e aposto que encontrará pelo menos um bichano.


Acredito que esta tendência começou lá em 2022, quando Stray foi originalmente lançado para PlayStation 4, PlayStation 5 e PC pela publisher Annapurna Interactive e pela desenvolvedora BlueTwelve Studio.

A proposta de jogar como um gatinho fotorrealista em um mundo cibernético em decadência chamou a atenção e conquistou a graça de grande parte do público e da crítica, levando o título ao patamar de candidato a Jogo do Ano no The Game Awards.

Dois anos depois, e após ser lançado para todas as outras plataformas, o game chega ao Nintendo Switch. Embora tenha aparecido no console híbrido tarde demais para aproveitar o hype da época de estreia, o jogo recebeu um port digno, com mais pontos positivos do que negativos. Infelizmente, a aventura em si continua a mesma de sempre: uma história interessante com um gameplay truncado.

Mais profundo do que parece

Se você acha que Stray é só um conto sobre um gatinho, se enganou. O jogo usa seu protagonista para apresentar uma mensagem sobre a condição humana.

No game, o felino laranja se perde de seu bando e acaba parando em um mundo tecnológico, mas deteriorado, repleto de robôs. O título não expõe logo de início o que é esse universo, quem são esses androides e o que está acontecendo com eles.

Somente ao encontrar um drone senciente, mas sem memórias, chamado B-12, o animal passa aos poucos a compreender o drama de toda uma sociedade que existia, literalmente, abaixo de suas patas. O objetivo final do game é encontrar um caminho de volta para o bando, enquanto ajuda B-12 a recuperar suas lembranças, que estão intrinsecamente ligadas ao destino dos robôs.

Imagem de Stray em que o gato olha para o drone B-12.


A graça do título é solucionar esse mistério narrativo. Explorar e visitar lugares que fazem o drone recordar de algo adiciona uma peça dentro do quebra-cabeça desse universo. É interessante ver, nesse processo, como o título confronta a natureza muitas vezes inocente do gato com uma realidade dura, na qual nós, na vida real, já vivemos ou estamos possivelmente prestes a presenciar.

O enredo aborda questões como destruição de recursos naturais, desigualdade social e vigilância policial. A discussão é bem posta, fazendo pensar, mas não distraindo do jogo em si. A proposta do jogo não é militar, mas mostrar como esses tópicos afetam seus personagens, refletindo sobre o mundo em que vivemos. Para quem está jogando o game novamente, a maneira como esses pontos são debatidos pode não afetar tanto quanto na primeira jogatina. No entanto, a história permanece como destaque da experiência.

Por outro lado, algo que continua sempre impactante é a ambientação da jornada. O contraste da fofura do animal com a iminente melancolia e medo dos robôs, que são representados em mapas que vão do contemplativo ao assustador, permanece algo que salta aos olhos, não importa quantas vezes você já jogou o game.



Gameplay prejudicado

Porém, é na jogabilidade e no game design que as coisas se arrastam. Oficialmente, Stray se classifica como um jogo de ação, aventura e plataforma. Sim, ele realmente é tudo isso, mas de modo bem minimalista.

Aqui você não vai encontrar desafios que exigem pulos certeiros, ataques poderosos ou caminhos diversos. Na maior parte do tempo, avançar pelo jogo significa ir de um ponto A a um ponto B, talvez pegando um item ou outro pelo caminho. Isso não é um problema. Muitos títulos tachados como walking simulators fazem o mesmo e alguns deles conseguem ser ótimos jogos.

Mas o pecado da produção da BlueTwelve é colocar o jogador para fazer ações repetitivas e desinteressantes. Andar e pular por caminhos lineares é praticamente tudo o que o jogador faz, além de resolver puzzles bem simples. A movimentação do felino não ajuda, pois ele só é capaz de saltar em pontos específicos, o que cria barreiras para uma exploração mais livre e esguia, digna de um gato.
Imagem de Stray em que o gato está na frente de um robô desativado. Há um ícone para o botão de pulo próximo à cabeça do robô.
Somente elementos com ícones de botões de pulo podem ser usados como plataforma.



















E não é como se a narrativa transcorresse durante esses momentos para manter o engajamento do jogador. Em quase todas as situações, a história para e exige que o gatinho vá para um outro ponto ou faça algum tipo de fetch quest para que ela possa prosseguir.

O jogo até tenta variar um pouco a sua jogabilidade com seções de perseguição, stealth e de combate contra bactérias carnívoras chamadas Zurks, mas elas são curtas e não se esforçam em adicionar ideias novas às mecânicas introduzidas nessas instâncias. O frescor das novas atividades dura pouco tempo.

Assim, a duração da aventura é estendida artificialmente, prejudicando o ritmo da experiência. Muitas vezes, a vontade é de querer passar o mais rápido possível pela gameplay para continuar com a trama, algo não muito bom para uma obra lançada em uma mídia interativa como os videogames.

Uma boa adaptação

Se você já jogou Stray e conhece todos os detalhes citados acima, provavelmente está lendo esta análise para saber como está o port do game para o Nintendo Switch. Afinal, estamos falando de um título reconhecido por gráficos realistas lançado em um hardware com mais de sete anos no mercado.

Felizmente, a versão para o console híbrido não deixa a desejar. Claro, se a compararmos com as edições do jogo para plataformas mais parrudas, como o PS5 ou o Xbox Series X, ajustes tiveram que ser feitos para atender o chip mobile do Switch.

Parte da qualidade visual do título teve de ser sacrificada pelos desenvolvedores. Uma resolução mais baixa, qualidade menor das texturas e modelos com polígonos mais simples fazem com que a experiência tenha imagens mais embaçadas e serrilhadas no console da Big N.

Imagem de Stray em que um gato está olhando para uma cachoeira.


Além disso, certos problemas de pop-in são notáveis. Às vezes, é possível ver um elemento do cenário aparecer do nada, um mapa descarregando pela fresta de uma janela ou texturas desaparecendo das superfícies dependendo do ângulo da câmera. Tais momentos tiram um pouco da imersão dos ambientes.

No entanto, a direção de arte do título é capaz de se provar superior aos gráficos em si, pois, mesmo com essas questões, o game permanece com sua identidade visual intacta. As cidades cheias de neon, os esgotos contaminados e o resto de natureza desse mundo continuam passando a sensação de beleza, medo e intranquilidade, assim como nos hardwares mais potentes. Assim, jogadores de Switch não ficam com uma experiência menor.

O framerate quase sempre constante a 30 quadros por segundo também ajuda nesse quesito. Há momentos de lentidão bem pontuais que, curiosamente, não são em momentos de muita ação, o que favorece as cenas em que há muitos Zurks na tela. Por serem curtos, esses slowdowns atrapalham bem pouco a jogabilidade.

Acessibilidade e qualidade de vida

Em termos de acessibilidade, todos os recursos do game original retornam. Há a possibilidade de remapear botões – o que não funcionou completamente bem na minha jogatina – e configurar como certas ações serão ativadas.

Essa segunda opção foi uma dádiva para mim, pois permitiu que eu não precisasse pressionar o mesmo botão várias vezes para me livrar dos ataques dos Zurks. Uma apertada no A já bastava. O meu punho agradece.
Imagem de Stray em que Zurks estão atacando o gato em uma sequência de perseguição.
Zurks atacando o gato em uma sequência de perseguição.


















Vale lembrar também que o jogo está totalmente localizado em português brasileiro. Tirando alguns erros de concordância, e puzzles que necessitam a compreensão de uma palavra simples escrita em inglês, a adaptação para nosso idioma é bem feita, sem grandes expressões de brasilidade, mas sem traduções robóticas.

Um ponto de qualidade de vida que poderia ter sido melhorado, no entanto, é o sistema de autosave. O game salva automaticamente a aventura em checkpoints específicos pelos cenários ou ao obter itens importantes. A falta de uma opção de salvamento manual faz com que seja possível perder progresso se esses pontos não forem atingidos pelo jogador.

Um game OK

A versão de Nintendo Switch de Stray faz tanto um serviço quanto um desserviço à versão original do game.

Por um lado, jogadores da plataforma da Nintendo podem aproveitar um port com poucos comprometimentos gráficos e de performance. Tirando pontuais quedas de framerate e alguns problemas de textura, essa é a experiência completa, com a mesma ambientação tecnologicamente decadente que torna a história surpreendentemente profunda, com suas mensagens sociais e ambientais.

Porém, como nenhum aprimoramento de design foi realizado nesta versão, a jogabilidade permanece cansativa como em 2022. Embora o game até tente diversificar as ações que o gatinho pode fazer, a base da progressão consiste em correr e pular por caminhos pré-determinados que, em vez de fazer a narrativa fluir, acabam ficando no caminho dela.

Se o Switch é sua única plataforma, felizmente você não vai estar em detrimento em relação a jogadores de outros consoles. Mas entre no título com as expectativas no lugar, pois, pessoalmente, ele nunca esteve no calibre de candidato a Jogo do Ano.

Prós

  • História instigante, com mensagens importantes sobre sustentabilidade e desigualdade social;
  • Ambientação que contrasta a inocência do gato protagonista com a dureza do universo que ele explora, mexendo com sentimentos como apreensão e medo;
  • Port bem produzido, com direção de arte intacta, taxa relativamente estável de quadros por segundo e redução em resolução que não incomoda;
  • Opções de acessibilidade e localização em PT-BR razoáveis.

Contras

  • Gameplay repetitiva, com controles e movimentação truncados;
  • Mecânicas de jogabilidade que tentam diversificar a experiência, mas falham em introduzir ideias novas que as mantêm engajantes;
  • Expansão artificial da duração do jogo;
  • Falta de opção de salvamento manual.
Stray – Switch/PS5/PS4/XBX/XBO/PC – Nota: 7.5
Versão utilizada para análise: Switch

Revisão: Beatriz Castro
Análise produzida com cópia digital cedida pela Annapurna Interactive



Jornalista, analista de mídias, PcD e entusiasta de games desde que jogou Pokémon Azul no Game Boy Color nos anos 90. De lá para cá, tenta aproveitar ao máximo todos os consoles no pouco tempo que a vida adulta permite. Se não está escrevendo para o Blast ou demorando anos para zerar um jogo, está no Twitter (@DanielMorbi) e no Instagram (@danielmorbi_)
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