Análise: Great God Grove — O poder das palavras

Resolva os problemas de deuses para que eles possam salvar o mundo.

Tendo me formado em Publicidade e Propaganda (e especializado em Marketing Digital), sei muito bem como a comunicação é um dos alicerces da existência. Ainda mais quando ela é usada de forma imbecil e propositalmente ruim, magoando as pessoas ou colocando-as umas contra as outras.


É a premissa de poder usar a força das palavras que Great God Grove possui que me intrigou, além de seu artstyle único e maluco. Mas será que vale a pena salvar o mundo ou deixar a ruína consumir tudo? Venha comigo.

Testando, testando… 1, 2, 3…

Em um belo dia, um evento cataclísmico está ameaçando o mundo. Normalmente, os deuses se juntam e revertem a situação em um piscar de olhos. No entanto, as coisas têm desandado bastante nos últimos tempos, com o Deus da Comunicação, King, tendo mandado diversas cartas cruéis e rudes entre seus conterrâneos por motivos desconhecidos, além de sumir do nada.

Assim, o jogador (denominado Godpoke) chega de barco à sociedade, com um megafone mágico, e cabe a esse herói por acidente reverter a situação e descobrir os mistérios de King antes que o mundo acabe.



Um Hermes de megafone

Great God Grove é um point-and-click fora do padrão, com Godpoke sendo livre para caminhar por todo o ambiente e interagir com os diversos e malucos personagens que habitam a Grove. À sua disposição está o artefato Megapon, um megafone mágico e a arma icônica do braço direito de King, além de conseguir aval para falar com os deuses sem muitos problemas. O Megapon funciona mais como um aspirador de pó do que como um megafone, podendo aspirar e expelir o que vier pela frente, como secar uma pobre coitada molhada pela chuva ou remover objetos da sua frente.

Mas sua principal utilidade está em tirar as palavras da boca de alguém… literalmente. Ao conversar com alguém, é possível notar certos balões de diálogo com um tracejado singular. Usando o Megapon, é possível aspirar essa frase (sendo possível guardar até cinco delas no inventário) e dispará-la em qualquer personagem, conseguindo uma reação diferente com cada interação. 

Por exemplo: um rapaz tímido quer confessar seus sentimentos para uma bela mulher, mas ele tem bastante medo e ansiedade para falar pessoalmente. Como um bom carteiro, Godpoke pode pegar a frase e disparar contra a moça, formando o casal.

No diálogo é que tudo se resolve

O jogo é bem curto, podendo ser completado por volta de cinco horas, mas isso não é algo ruim quando a execução é muito bem feita.E Great God Grove executa muito bem sua proposta. Um dos seus pontos mais altos é a sua apresentação, com músicas divertidas e gráficos maravilhosamente feitos, misturando modelos desenhados à mão e gráficos 3D. Desde o primeiro trailer, não pude parar de pensar no clássico de plataforma Psychonauts (2005), pela esquisitice e majestade dos visuais, e o produto final não deixa a desejar.

O ápice dessa mistura se encontra diante da presença dos diferentes deuses, cujos tamanhos colossais preenchem a tela (exceto pelo primeiro deus, o maluco Inspekta, Deus da Liderança), com seus ambientes contando mais de suas personalidades, de forma sutil e eficaz, ao serem analisados. 

Além disso, cada personagem tem sua esquisitice singular que os deixam bastante charmosos, alinhados ainda com suas expressões limitadas, como se fossem recortes de jornal, e suas falas algaravias semelhantes ao dialeto de Animal Crossing, deixando-os ainda mais engraçados e carismáticos.

Porém, não posso dizer que é um jogo perfeito. Existe apenas um único uso do giroscópio do Switch: quando o jogo assume o formato em primeira pessoa para falar com os deuses é possível responder positiva ou negativamente apenas balançando o Switch vertical ou horizontalmente. 

É uma proposta interessante (que também pode ser trocada usando simplesmente o analógico), mas limitada, me fazendo questionar por que ela não poderia ser usada em outras sessões do jogo ou até optar pelo recurso touch (como disparar os diálogos). 

Com tantos personagens malucos, seria legal se tivesse algum menu para ver mais sobre eles, como um guia de personagens, um recurso usado normalmente em jogos point-and-click ou em narrativas com bastante personagens. Por fim, o erro mais agressivo se deve a falta de localização em português. Para um jogo cuja mensagem principal é comunicação, é um paradoxo imenso que a única opção de linguagem disponível seja o inglês.

Isso também não seria um problema para o jogador comum com o mínimo de conhecimento da língua estrangeira… se os personagens não falassem tão insanamente e com as mais variadas gírias, usando pronúncias nada convencionais para falar simples palavras, podendo confundir o jogador em sua tarefa de fazer as pazes entre os deuses.

A pena é mais poderosa que a espada

Vivemos na era mais importante da comunicação. Palavras nunca tiveram tanta força como antes. É possível destruir a vida de alguém com poucas frases incriminatórias, sejam proferidas pela própria pessoa ou por conterrâneos desta. Great God Grove me passou esse zeitgeist em que vivemos, alinhado com uma história bastante charmosa e apresentação impecável.

É um jogo necessário e maluco para dias tão insanos quanto os que estamos presenciando. Certas vezes, um drama divino precisa da intervenção de um zé-ninguém para solucionar a bagunça, o oposto de um deus ex machina. Mesmo com a barreira linguística, é uma narrativa única e divertida de se presenciar e experimentar.

Prós

  • Excelente apresentação, com gráficos que misturam 2D e 3D (e até momentos com marionetes!);
  • Músicas divertidas e em par com o universo;
  • História criativa, repleta de deuses paranóicos e humanos desajeitados, todos engraçados e charmosos,
  • Jogabilidade simples, mas eficaz.

Contras

  • Limitado uso do giroscópio e perda de oportunidade para usar o recurso touch;
  • Falta de menu para identificar todos os personagens,
  • Falta de localização em português causa um paradoxo com a mensagem do jogo.
Great God Grove — Switch/PC/XSX — Nota: 8.5
Revisão: Cristiane Amarante
Análise feita com cópia digital cedida pela Fellow Traveller

Formado em Publicidade e Propaganda na USC e especializado em Marketing Digital, sou Editor de Vídeos também, meu TCC foi sobre a Guerra dos Consoles e evolução da publicidade nos games. Jogo um pouco de tudo e também escrevo. Me descrevo como um artista.
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