Análise: Astrea: Six-Sided Oracles traz dados e diversão em proporções astrais ao Switch

Este título brasileiro impressiona e é uma fácil recomendação para os fãs de deckbuilders que possuem o console da Nintendo.

em 09/10/2024
Acredite ou não, apesar de apreciar TCGs e tudo que eles envolvem desde a infância, foi somente neste ano que joguei o meu primeiro deck-building game ou deckbuilder — denominação dada aos jogos, virtuais ou físicos, que possuem como elemento principal ou fundamental de sua jogabilidade a construção de baralhos. 


Para isso, Slay the Spire, considerado um dos títulos mais importantes e um clássico moderno do gênero, foi a minha primeira experiência, instantaneamente se tornando a porta de entrada para um universo inteiro de bons títulos similares, como Monster Train e o mais recente Dicefolk

Logo, quando Astrea: Six-Sided Oracles — roguelike deckbuilder que usa dados em vez de cartas em um ambiente estelar — foi anunciado para o Switch após elogiada recepção no PC, corri para me candidatar a analisá-lo. Felizmente, após um bom tempo com o jogo, hoje posso afirmar com tranquilidade que o título do estúdio brasileiro Little Leo Games impressiona em diversas frentes e é uma fácil recomendação aos donos de um Switch que tenham experiência com o gênero.

Uma peregrinação verdadeiramente celestial

Astrea: Six-Sided Oracles apresenta aos jogadores a história da estrela mística conhecida como Astrea e dos seis planetas que a orbitam. Há tempos, Astrea, em sua infinita bondade, presenteou uma criança de cada um desses seis mundos com um Astrário, uma relíquia que detém o segredo das estrelas.

O tempo passou e as crianças ficaram conhecidas como os Oráculos das Seis Faces, valendo-se de sua intimidade com Astrea para guiar seus respectivos povos e construir civilizações prósperas, especializadas em astromancia. Era o início da Era Resplandecente, na qual luz e bênçãos não faltaram para nenhuma criatura.

Porém, como tudo passa, sem qualquer aviso prévio, Astrea caiu em silêncio e começou a desvanecer. Preocupados, os Oráculos começaram uma investigação, que resultou na descoberta de uma estranha anomalia na Estrela Mãe. Para combater a enfermidade, os seis representantes se uniram na criação apressada de um monumento em Aquarius, o qual seria capaz de removê-la, se tudo corresse bem.

No entanto, antes que o monumento fosse completado, o coração de Astrea caiu em Aquarius e lançou um cataclismo abrasador, envolvendo todo o sistema estelar e corrompendo as almas das criaturas suscetíveis em um evento conhecido como Aurora Carmesim.

Agora, com ecos do cataclismo começando a emergir novamente, caberá aos novos Oráculos das Seis Faces, que herdaram os Astrários dos Oráculos originais, partirem em uma jornada rumo a Aquarius, defendendo o universo e tudo que um dia conheceram. Pronto para ajudá-los nessa missão, caro leitor?

Dados na mesa

Na prática, Astrea Six-Sided Oracles é um legítimo deckbuilder roguelike, com a diferença de que, em vez de cartas, estaremos a cada novo turno usando dados para triunfar em situações de combate. Se, em tese, a missão parece fácil e até mesmo batida, não é preciso muito tempo de jogo para notar uma interessante camada extra de complexidade, proporcionada pelo sistema exclusivo de Purificação x Corrupção pensado pelos desenvolvedores.

Explicando: fazendo jus ao cataclismo da Aurora Carmesim, diversas criaturas estão corrompidas no mundo de Astrea. Para curá-las, é preciso causar dano, que se divide em dois tipos nas faces dos dados: a purificação (face azul) ataca inimigos e cura o protagonista; já a corrupção (face vermelha) cura os oponentes e fere o jogador simultaneamente.

Como as faces de corrupção precisam obrigatoriamente ser jogadas quando sacadas, a cada turno se renova uma dinâmica envolvente de risco e recompensa, pois sofrer dano pode desencadear ações poderosas, mas, quando em excesso, levará à perda dos corações que representam a vida do jogador (e perder todos eles invariavelmente levará à derrota). Para evitar isso (que é mais comum do que parece), há uma série de habilidades especiais, as quais permitem rolar novamente ou converter os dados em nossa mão, para citar alguns exemplos.

No decorrer da aventura — cujos combates, chefes e eventos são gerados aleatoriamente a cada rodada, como em todo roguelike —, ainda é possível adquirir novos dados ou personalizar os que já temos em áreas dedicadas, sendo que a presença de três variantes (Seguro, Equilibrado e Arriscado), cada qual com um certo número de faces vermelhas e azuis, amplia o leque de opções à disposição.

O resultado é um constante fluxo de novidades, que regularmente se prova suficiente para manter o jogador engajado durante uma partida e com vontade de retornar caso fracasse (algo, na minha opinião, crucial para um deckbuilder).

Uma aposta que funciona, mas não sem deslizes

É preciso mencionar que a mudança de cartas por dados adiciona uma porção um pouco maior que a esperada de sorte aos confrontos, mas a boa notícia é que, como citado, há ferramentas suficientes para reverter cenários desfavoráveis, bastando um pouco de prática. Jogar de qualquer forma ou com displicência, por outro lado, dificilmente resultará em um desfecho positivo, graças à complexidade natural do título do Little Leo Games.

Aliás, se há uma crítica a ser feita a Astrea é justamente esta: quando comparado a outras opções do gênero, fica claro que este título possui uma curva de aprendizado maior que a de jogos similares, muito por conta de suas mecânicas e da variedade de opções uma vez que se esteja em combate. Para piorar, a interface é bonita, esteticamente falando, mas um pouco confusa — confesso que mais de uma vez fiquei perdido na hora de selecionar as habilidades, tendo que caçar a opção desejada na tela para prosseguir. 

Com seis personagens jogáveis desbloqueáveis ao se cumprir determinadas condições e vários inimigos com mecânicas únicas, também não faltam opções para tornar as partidas diferentes umas das outras. O problema é que, por vezes, esse ponto forte joga contra, tornando mais difícil de entender o que está acontecendo de fato no desenrolar de um confronto (e planejar as medidas apropriadas). 

Assim, aqui está um título que eu recomendaria primeiramente para os entusiastas e para os jogadores que já têm certa experiência com o estilo. Quando todas as suas peças se encaixam, Astrea realmente promove uma aventura sem igual (até por conta de seus sistemas únicos), e vencer uma batalha apertada ou reunir uma boa seleção de dados sempre traz aquela bem-vinda injeção de satisfação pós-adrenalina.

Mas, com pouca margem de erro entre as partidas e chefes um tanto quanto complicados para serem batidos de início, torna-se necessária uma certa dose de paciência para ver tudo que o jogo oferece, mesmo com as várias opções de dificuldade (que, inclusive, serão um prato cheio para os veteranos, ao possibilitar ampliar o desafio encontrado).

Perfeitamente adaptado para o console da Nintendo

Em minhas análises aqui no Nintendo Blast, tenho sempre dedicado uma seção aos aspectos técnicos dos títulos, pois, no final da vida útil do Switch, não são poucos os jogos que sofrem com problemas de performance ou qualidade de imagem pífia, evitando assim uma recomendação mais ampla.

Felizmente, não é o caso de Astrea: Six Sided Oracles. Assim como outros deckbuilders, esta obra celestial se encaixa perfeitamente no console da Nintendo, inclusive se beneficiando de seu caráter híbrido ao oferecer partidas que podem ser completadas em torno de duas horas e meia ou até menos tempo, dependendo, nesse caso, da familiaridade do jogador com os sistemas do título.

Um elogio especial deve ser feito à direção de arte e as ilustrações do jogo, que flertam com os tons de azul e vermelho da pureza e corrupção para prover um verdadeiro espetáculo visual, condizente com a temática astral do game e renderizado de forma nativa tanto no modo portátil quanto no modo TV do dispositivo. 

Por se tratar de um título brasileiro, também não há problemas quanto à adaptação para o nosso idioma, ajudando no entendimento das regras mais básicas e dos efeitos de cada dado e recurso. Aliás, a verdade é que dá orgulho de ver algo com tanta qualidade produzido em nosso solo — Astrea prova definitivamente que a indústria nacional tem, sim, muito a oferecer para o mundo quando o assunto são bons games, devendo para isso ser valorizada e incentivada nesse processo.

Uma aventura de proporções astrais, agora no Switch

Astrea: Six-Sided Oracles ousa dentro de seu gênero ao trocar as tradicionais cartas por dados, mas valida essa decisão criativa ao entregar uma aventura divertida e envolvente perfeitamente adaptada ao Switch. 

Embora sua complexidade natural torne esta obra mais indicada para quem já tem experiência com o estilo, aqui está um título recomendável a todos aqueles que não têm medo de desafios e, pelo contrário, apreciam o uso da estratégia para reverter condições desfavoráveis com as ferramentas à disposição. Então, joguemos fora as “cartas na manga” — é finalmente a hora de substituí-las pelos dados (e isso é tão bom quanto promete).

Prós

  • Inova dentro do seu gênero, adicionando uma bem-vinda camada extra de complexidade graças às faces dos dados;
  • O sistema de Purificação x Corrupção é interessante e oferece uma dinâmica envolvente de risco e recompensa durante as partidas;
  • O grande número de heróis, dados e habilidades oferece possibilidades suficientes para entreter durante as partidas e também promover o importante fator replay;
  • Estética agradável e ilustrações pomposas chamam a atenção e aumentam o valor da experiência;
  • Sem problemas de performance no Switch, tanto no modo TV quanto no modo portátil.

Contras

  • A complexidade, embora apreciada por alguns jogadores, pode desanimar e afastar quem não tem intimidade ou contato prévio com o gênero;
  • A interface, embora esteticamente agradável, é desnecessariamente confusa em mais de uma situação, por vezes prejudicando a experiência.
Astrea: Six-Sided Oracles — PC/Switch/PS4/PS5/XBO/XSX — Nota: 8.5
Versão utilizada para análise: Switch
Revisão: Juliana Paiva Zapparoli
Análise produzida com cópia digital cedida pela Akupara Games

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