Análise: Keylocker nos leva a Saturno para lutar contra o sistema

Novo jogo da Moonana é um competente desafio que mistura RPG e ritmo.

em 20/09/2024
Keylocker
é um novo jogo da Moonana, desenvolvedora brasileira que também foi responsável por Virgo Versus the Zodiac. Trata-se de um RPG com combate em turnos e elementos de ritmo cuja ambientação futurista é profundamente cativante.

Um mundo de pessoas e opressão

Keylocker conta a história de Bobo, uma ciborgue Doppelganger que mora em um setor periférico de Saturno. Nesse lixão a céu aberto que existe apenas para gerar mão de obra e energia para manter o planeta, nossa personagem ousa ser a líder de uma banda underground.

Música é um elemento proibido da sociedade, servindo para a geração de eletricidade, recurso precioso e artificialmente escasso graças ao controle truculento do governo. Por conta disso, durante um de seus shows, a protagonista é presa e é assim que nossa história começa.

Sem entrar em grandes detalhes para evitar spoilers, Bobo irá conhecer aliados e ter a oportunidade de enfrentar os poderosos Satellites que comandam Saturno. A narrativa gira em torno então desse esforço para ir contra o sistema e tentar dar voz a essas figuras marginalizadas.

Francamente falando, a trama de Keylocker é incrivelmente bem escrita, com personagens excêntricos e carismáticos. Não apenas temos elementos sociais e políticos bem trabalhados e discussões existenciais fáceis de empatizar, como também piadas infames e uma sensação de profunda humanidade em seu cerne. Uma tradução para o português ainda não está disponível, mas a desenvolvedora já chegou a comentar nas redes sociais que haverá uma atualização pós-lançamento.

As “profissões” do futuro

Uma das primeiras etapas do jogo envolve escolher entre quatro classes: Juggernaut, Samurai, Hacker e Sequencer. Elas definem as suas tendências de armas, habilidades desbloqueáveis e alguns elementos de história. Posteriormente também são liberadas combinações entre elas, aumentando o leque estratégico.

Para melhorar nossos personagens, podemos alterar o seu “hardware” mudando o que usa para defender sua cabeça e os golpes que terá disponível no menu. A ideia é que cada arma pode ser equipada em posições diferentes, alterando assim a sua atribuição ofensiva ou defensiva.

Por exemplo, uma guitarra talvez possa ser tanto um instrumento para causar dano ao EP (ponto de eletricidade) do oponente quanto para recuperar os próprios. Cabe ao jogador assim montar suas ações de acordo com suas preferências.

Além disso, podemos atualizar nossas habilidades na “Skeyll Tree” usando chaves que obtemos no fim das batalhas ou na exploração dos ambientes. Com elas, é possível melhorar o dano que causamos com certas armas e desbloquear passivas, algumas das quais podem ser adicionadas aos golpes para trazer efeitos especiais. De forma geral, o sistema é bem rico em opções para montar Bobo e seus aliados de acordo com as suas preferências.

No ritmo dos turnos

O combate de Keylocker é baseado em turnos utilizando um sistema de grids hexagonais para definir as posições dos personagens e as adjacências. As arenas são pequenas e voltadas a maximizar a capacidade do jogador de entender tudo que está em jogo tendo esses elementos todos à vista.

Cabe ao jogador então avaliar o posicionamento de aliados e inimigos de acordo com o alcance de seus golpes. Alguns ataques são focados em todas as adjacências, enquanto outros podem atingir dois hexágonos em uma linha reta, por exemplo. Entender essas condições será fundamental para tirar o máximo de proveito das batalhas.

Outro elemento fundamental a ter em mente é que há tanto ações ofensivas quanto defensivas e que elas podem ter propriedades específicas. Temos tanto ataques que causam dano ao LP (pontos de vida) do oponente quanto alguns que causam dano ao EP (pontos de eletricidade) para deixá-los incapazes de usar golpes mais fortes antes de se preocupar em eliminá-los. Também podemos regenerar nosso próprio EP ou criar uma barreira para proteger nossa vida e ativar o contra-ataque.

Cada ação envolve ainda algum elemento de timing. Tanto para atacar quanto para defender é fundamental ficar de olho nos botões e apertá-los na hora certa para maximizar o dano e reduzir o do oponente. A quantidade de dano causado e obtido pode ser alterada no menu a qualquer momento com os modos de dificuldade Soft Punk, Cyber Punk, Hardcore Punk. No New Game+, também é liberado o Horror Punk, ainda mais punitivo.

Em alguns casos, a ideia é esperar o personagem piscar em branco para apertar o botão. Já em outros, temos que apertar várias vezes o direcional ou seguir uma barra para apertar o momento exato em que o cursor chega na marca certa como em QTEs de pescaria em alguns RPGs.

De toda forma, é um sistema que, mesmo na dificuldade mais branda, exige do jogador atenção total para sobreviver. Em caso de morte, porém, basta tentar novamente e, se perder duas vezes consecutivas, terá a vida de seus personagens restaurada ao valor máximo. Isso é uma mão na roda caso o jogador esteja passando por dificuldade justamente por não estar com o HP cheio, embora também haja a opção de usar itens incluindo o Milkshake restaurativo durante a batalha.

Indo além

Além de tudo o que comentei, é interessante notar a qualidade visual e sonora do jogo. Keylocker é um título exuberante, cheio de carisma tanto em sua pixel art colorida quanto na trilha com vocais excêntricos cuja performance de Psamathes evoca todo um senso de força e estranheza. A composição e escolha de instrumentos de Elektrobear também ajuda a compor um panorama de futuro distópico fundamental para a imersão.

Os ambientes futuristas são bem interessantes, com múltiplas camadas que os fazem um pouco labirínticos. Temos a possibilidade de pular entre alguns pontos, mesmo alguns bem distantes, valendo a pena ficar de olho no ambiente, mas há certas armadilhas, como cactos e paredes que dão choque.

Curiosamente, a exploração conta com um sistema de indicador de perigo. Essa barra é preenchida com nossas ações ilegais como coletar e vender itens sem autorização e leva à chegada de drones que vasculham a área em busca de criminosos. Se passarmos pelo seu campo de visão, iniciaremos uma batalha.

Vale destacar que o jogo faz um tutorial básico no início e é possível ler “regras” para violarmos enquanto estamos na prisão. Há ainda itens que parecem pendrives e carregam informações adicionais explicando as mecânicas, e uma técnica interessante de combate, mas que pode resultar em menos clareza para alguns jogadores que acabem deixando esses itens para trás. Isso é especialmente grave porque o jogo é realmente bem complexo em elementos específicos e termos técnicos que não são nem mesmo usuais no gênero.

Em certos momentos da trama, também temos performances musicais em que devemos apertar os botões R, L, ZR e ZL no ritmo da música conforme as notas aparecem. Infelizmente, não é possível modificar esses botões no menu de configurações, o que me deixou em uma posição bem desfavorável por meus Joy-Con estarem danificados nos gatilhos. Há ainda um minigame no qual controlamos um robô e devemos coletar notas e usar uma lâmina para eliminar inimigos e fazer com que certos ataques ricocheteiem.

Uma experiência implacável

Keylocker é um RPG indie de alto nível e uma excelente adição à biblioteca do Switch. Com uma narrativa envolvente sobre enfrentar um mundo opressivo e uma gameplay de turnos desafiadora e cheia de elementos estratégicos, este pode não ser um jogo indicado para absolutamente todas as pessoas, mas definitivamente merece a chance de ressoar com os jogadores dispostos a encará-lo.

Prós

  • Narrativa envolvente em um universo futurista bastante curioso e com personagens carismáticos;
  • Classes, habilidades e equipamentos fornecem um sistema rico em estratégias para explorarmos em combate;
  • Acertar o timing para atacar e defender é um desafio que mantém o combate bastante dinâmico, exigindo a atenção do jogador;
  • Atmosfera futurista e excêntrica construída através de uma ótima direção audiovisual;
  • Possibilidade de reiniciar a batalha para testar outra estratégia em vez de receber um game over.

Contras

  • Os vários sistemas e especificidades do jogo mereciam explicações mais claras para os jogadores;
  • Mesmo na dificuldade mais baixa, oferece um desafio bem puxado que pode ser mais do que o desejado por alguns jogadores;
  • Impossibilidade de remapear botões para as performances musicais.

Keylocker — Switch/PC/PS5/XSX — Nota: 8.5
Versão utilizada para análise: Switch

Revisão: Juliana Paiva Zapparoli
Análise produzida com cópia digital cedida pela Serenity Forge

Siga o Blast nas Redes Sociais

é formado em Comunicação Social pela UFMG e costumava trabalhar numa equipe de desenvolvimento de jogos. Obcecado por jogos japoneses, é raro que ele não tenha em mãos um videogame portátil, sua principal paixão desde a infância.
Este texto não representa a opinião do Nintendo Blast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Você pode compartilhar este conteúdo creditando o autor e veículo original (BY-SA 3.0).