Análise: SteamWorld Heist II (Switch) prova que a segunda vez é ainda melhor

A sequência do aclamado jogo independente impressiona em todos os aspectos no Switch e é uma fácil recomendação aos entusiastas do gênero.

em 01/08/2024
A série SteamWorld possui uma longa relação com as plataformas da Nintendo, ao ponto de ter nascido em uma delas: foi SteamWorld Tower Defense, lançado em 2010 para a hoje extinta DSiWare, que nos apresentou ao carismático universo de steambots da desenvolvedora sueca Image & Form (hoje integrada ao grupo Thunderful).



O sucesso global da franquia, porém, viria somente anos depois, com o ótimo metroidvania SteamWorld Dig (cuja versão de Wii U, inclusive, celebra o seu décimo aniversário em 2024). À época, a mudança drástica — de tower defense para metroidvania — já antecipava que a série jamais ficaria presa a um único estilo de jogo, inclusive saindo da sua teórica zona de conforto para entregar ótimas experiências em diversos gêneros nos anos seguintes.

Dessas experiências (que envolveram até simuladores e deckbuilders), talvez a mais empolgante tenha sido SteamWorld Heist. Com versões para Wii U, 3DS e Switch, o título inovou ao colocar o jogador no comando de um esquadrão de robôs piratas cujas missões e combate por turnos surpreenderam positivamente com sua qualidade e bom mix de estratégia e desafio. Pois bem, nove anos após sua estreia, finalmente podemos jogar sua sequência SteamWorld Heist II, e posso felizmente afirmar que a espera valeu a pena. Confira os motivos!

Vidas secas robóticas

SteamWorld Heist II se passa no Grande Mar, planeta que orbita o núcleo da Terra outrora estilhaçada. Porém, apesar de seu intenso e pacífico brilho quando visto à distância, um olhar mais atento e aproximado revela que uma severa crise afeta os seus muitos habitantes robóticos: a crise da água.

Sim, esse recurso tão importante para a vida (mesmo a mecanizada) está contaminado, corroendo com igual facilidade membros de metal e corações mecânicos. Logo, com a escassez de água pura, o que se instaurou foi um grande conflito, em que a marinha real começou um controle rigoroso e ditatorial sobre o recurso, colocando a paz alcançada na Era dos Heróis em perigo.

É neste complicado cenário, em que as adversidades se espalham pelas marés e a tensão entre a marinha e os steambots comuns se aproxima do ponto de ebulição, que o capitão Quincy Leeway, filho da lendária Krakenbane, percebe uma chance de redenção em meio a todo esse caos.

Afinal, a localização de seu submarino — que havia sido confiscado pela marinha — foi descoberta. Quem sabe, se Leeway e sua conturbada tripulação conseguirem recuperá-lo, ainda existam chances de uma oposição real aos ditadores marítimos, que inclusive garanta para os piratas um lugar entre as lendas de SteamWorld. A resposta está nas suas mãos, então… pronto para a missão, caro leitor?

Esquadrão suicida, ou nem tanto assim

Como esperado de uma sequência direta, Heist II segue a fórmula consagrada do primeiro título, com algumas novidades. Na prática, isso significa que você comandará Quincy Leeway e sua trupe em diversas missões espalhadas pelo mundo do jogo, cujos objetivos podem variar entre derrotar todos os inimigos de um cenário (ou só o chefe deles), saquear espólios específicos, salvar steambots reféns da marinha e muito mais.

O elogiado sistema de combate do primeiro Heist, que uniu com maestria estratégia em turnos e tiros precisos, retorna com tudo e se prova tão divertido quanto da primeira vez: embora exista uma certa curva de aprendizado (especialmente se este for o seu primeiro contato com esta subsérie), com um pouco de prática torna-se muito divertido acertar os inimigos, graças à influência dos ângulos e trajetórias na jogabilidade uma vez que os gatilhos são disparados e os projéteis iniciam o seu percurso natural.

Claro, como no ditado “vento que venta lá, venta cá”, tão importante quanto atacar é se resguardar das movimentações e balas inimigas — aquela parede que você pensou em usar como cobertura pode proporcionar um ricocheteio letal sob a mira de um sniper inimigo habilidoso, por exemplo. Da mesma forma, uma escotilha aparentemente inócua pode ser a brecha pela qual reforços inimigos avançam ferozmente quando um alarme soa.

Essa dinâmica que prioriza a tática e o planejamento ao invés da sorte é muito interessante e bem-vinda, especialmente quando ela praticamente obriga o jogador a prestar atenção em tantos elementos quanto possível em cada cenário. Nas dificuldades mais altas (para esta análise, joguei no modo “experiente”, mas há cinco opções disponíveis e até a possibilidade de personalizar parâmetros individuais, como o dano e a precisão dos inimigos), é imperativo estudar e planejar bem cada turno para sair com a vitória, o que me agradou bastante e acredito que também agradará a outros fãs de estratégia. Ponto muito positivo para os desenvolvedores, portanto.

Um barquinho a deslizar no macio azul do mar

Como mencionado, há uma certa curva de aprendizado para entender as mecânicas de SteamWorld Heist II, como o número limitado de ações por turno e as opções de movimentação, mas o título conta com um bom tutorial (e suporte ao português brasileiro) para que os novatos possam entendê-las. Apesar de um ou outro Easter egg (há referências inclusive a outros games indie, como um chapéu de FEZ e outros clássicos), também é plenamente possível aproveitar esta sequência sem ter jogado o primeiro Heist ou mesmo outro jogo da série SteamWorld, já que a sua narrativa é independente e bem-amarrada nesse sentido. 

Quem já jogou o primeiro título, porém, pode esperar uma série de novidades: a primeira e mais impactante é que agora é possível explorar livremente o mundo do jogo, graças ao submarino de Leeway. Essa mecânica (que curiosamente me lembrou muito da navegação com o bote de Funky Kong no clássico Donkey Kong Country 3) promove um respiro entre os segmentos de combate e acaba conduzindo a gameplay de certo modo.

Isso porque para alcançar novas localidades no Grande Mar é necessário primeiro realizar melhorias na embarcação, como a instalação de torpedos, para se defender das embarcações mais imponentes da marinha, ou de propulsores, para conseguir avançar sobre correntes d’água.

Tais melhorias podem ser adquiridas nos já tradicionais bares virtuais em que os heróis descansam após as batalhas — basta trocar por água pura ou pontos de recompensa, ambos concedidos ao completar diferentes missões pelo mundo. A água também é o recurso usado para recrutar novos membros para a tripulação e comprar armas e equipamentos melhores, reforçando aquela importante sensação de progressão entre um estágio e outro.

Aliás, por falar nos equipamentos, aqui está outra novidade: ao contrário do primeiro jogo, agora a classe de cada personagem de sua tripulação não é fixa, dependendo somente da arma equipada. Na prática, isto quer dizer que é possível usar um mesmo bot como sniper em uma missão e como combatente em outra, bastando apenas trocar a sua ferramenta de combate após o merecido (e obrigatório) descanso in-game.

Como cada classe possui sua respectiva árvore de talentos, é possível até mesclar habilidades de diferentes classes e, em tese, produzir um steambot imparável com o investimento correto. Particularmente, não me dediquei tanto assim a explorar essa possibilidade, até porque ela está atrelada a um certo nível de grind (preferi manter meus comandados em suas classes originais, a não ser nos momentos em que foi obrigatório alterá-las para prosseguir). Não obstante, acredito que sua inclusão abre um leque de alternativas importante tanto para quem deseja finalizar a campanha em suas dificuldades mais altas quanto para quem está apegado demais a um steambot para deixá-lo de fora dos selecionados para cada aventura.

Lembrando que como cada missão possui um objetivo principal e outros extras (como chegar a um determinado ponto em um número limitado de turnos ou resgatar todos os espólios disponíveis), há classes que funcionam melhor que outras em determinadas situações. Encontrar o time ideal para conseguir todas as estrelas (e, portanto, a nota máxima) em todas as mais de 50 fases é certamente um desafio e tanto, resultando em horas e mais horas de diversão para quem aprecia deixar o mapa 100% concluído.

Uma excelente sequência que brilha no Switch

Com o Switch se aproximando de seu nono ano no mercado, a performance em alguns títulos (até mesmo first-party) tem deixado a desejar. Por isso, faço questão de tecer elogios aos responsáveis por esta adaptação: SteamWorld Heist II funciona extremamente bem no console híbrido da Nintendo, entregando excelente qualidade de imagem e performance impecável tanto no modo TV quanto no modo portátil.

A direção de arte da série também continua digna de nota, desta vez com as cores quentes e vivas que evidenciam o lado tropical do Grande Mar fornecendo um espetáculo à parte no Switch OLED ou em uma boa televisão. A ausência de bugs e crashes também me impressionou para um título tecnicamente ainda distante de seu lançamento (previsto para o dia 8 de agosto); além de resultar em uma experiência agradável e polida, reforçou o visível carinho com que esta sequência foi desenvolvida ao longo dos anos. 

Até a banda Steam Powered Giraffe, destaque da trilha sonora do primeiro jogo, está de volta com seus hits folk que tocam principalmente nos bares espalhados pelo título. Das 15 faixas criadas especialmente para esta sequência, destaco aqui A Life of Un-Delightment, que certamente estará em algumas das minhas playlists a partir de agora.

Navegar é preciso

SteamWorld Heist II passa perto de ser uma sequência perfeita, na minha humilde opinião. Com tantas qualidades visíveis, talvez o seu único defeito (se é que posso chamar assim) seja uma breve sensação de repetição quando se completa muitas missões sucessivas, mas a navegação com o submarino e até mesmo a variedade de inimigos e objetivos dentro de cada estágio ajudam a disfarçar esse ponto fraco.

Como o mapa navegável do mundo tem um tamanho considerável, também senti falta de um minimapa na tela ou de indicadores mais claros da localização das missões principais só para não ter que ficar recorrendo ao menu com tanta frequência. A obrigatoriedade de ter que descansar os seus bots em um bar antes de poder utilizá-los novamente em outra missão também beira perigosamente o incômodo, mas a verdade é que esses pequenos deslizes não prejudicam ou condenam a experiência, de forma alguma.

Assim, seja você fã da série SteamWorld ou mesmo um entusiasta de jogos de estratégia que priorizam a habilidade ao invés da sorte, faça um favor a si mesmo e jogue SteamWorld Heist II. Fazia um certo tempo que eu não me divertia tanto assim, então posso afirmar: navegar é realmente preciso, caso você goste do que lê e vê aqui.

Prós

  • Preserva corretamente o que deu muito certo no primeiro jogo, sem deixar de expandir a jogabilidade com a possibilidade de navegar pelo mundo e também alterar livremente as classes dos steambots comandados;
  • Mantém o charme já característico da série SteamWorld, bem como seus personagens carismáticos e direção de arte elogiável, com destaque para o retorno da banda Steam Powered Giraffes para a trilha sonora;
  • Os diversos níveis de dificuldade e possibilidade de personalização individual de parâmetros, como a pontaria e o dano dos inimigos, garantem uma experiência moldável a todos os níveis de habilidade;
  • A grande quantidade de missões garante dezenas de horas de jogo para quem deseja cumprir todos os objetivos;
  • Apresenta performance impecável tanto no modo TV quanto no modo portátil do Switch.

Contras

  • Não está imune à sensação de repetição, embora use diversos artifícios para disfarçar e minimizar essa impressão no jogador;
  • A ausência de minimapa ou indicadores mais salientes na navegação com o submarino é um tanto incômoda quando se leva em conta o tamanho do mapa;
  • A obrigatoriedade de descansar o time em bares espalhados pelo mapa antes de uma nova missão não se justifica enquanto mecânica.
SteamWorld Heist II — PC/PS4/PS5/XBO/XSX/Switch — Nota: 9.0
Versão utilizada para análise: Switch
Revisão: Juliana Paiva Zapparoli
Análise produzida com cópia digital cedida pela Thunderful
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