No dia 30 de julho, já com as Olimpíadas de Paris acontecendo a todo vapor, uma notícia assolou o mundo dos videogames: o Comitê Olímpico Internacional (COI) decidiu não renovar o contrato com Nintendo e Sega, acarretando o cancelamento da série Mario & Sonic at the Olympic Games. O motivo por trás da decisão, segundo Lee Cocker, produtor que esteve em praticamente todos os títulos da série, é o desejo do COI de explorar novas possibilidades de parcerias — no caso, eSports e NFT.
Enquanto a ideia de apoiar as competições online seja interessante, abrindo um leque de possibilidades para o futuro dos eSports, os NFTs (sigla para non-fungible tokens, ou tokens não fungíveis) são um assunto controverso por diversos motivos. O principal deles tem a ver com fraude e plágio, com muitas artes tendo sido roubadas para serem comercializadas como NFTs, mas também não podemos desconsiderar questões como impacto ambiental, especulação e bolha financeira, legalidade e regulação
Para isso, o Nintendo Blast procurou Igor Lucena, economista e doutor em Relações Internacionais, para uma entrevista exclusiva sobre o assunto sob a ótica da área da Economia — afinal, por mais que os NFTs, no caso da decisão do COI, estejam atrelados ao cancelamento da série Mario & Sonic, o resultado sempre gira em torno do dinheiro. Confira-a a seguir.
Observação: as respostas foram editadas por motivos de clareza.
Nintendo Blast: O que são NFTs e como eles funcionam no contexto do mercado digital? Qual a relação entre NFTs e a economia digital emergente?
Igor Lucena: Os NFTs são artes ou elementos digitais que são únicos, que podem ser transferidos pelo sistema de blockchain e compõem um sistema de economia emergente. Agora, há um grande ceticismo envolvendo a decisão do COI de cancelar a parceria com a Sega e a Nintendo para investir em NFT, mas o motivo por trás disso é muito simples. Muitas das receitas inflacionárias durante o período chamado de “pandemia dos NFTs” foram muito baseadas, a meu ver, numa bolha especulativa.
NB: Como o Comitê Olímpico Internacional (COI) pretende usar NFTs para gerar receita? Qual o impacto econômico esperado da integração de NFTs nas Olimpíadas de Paris 2024?
IL: Então, sobre o impacto de NFTs na Olimpíada de Paris, principalmente agora que a Olimpíada está tendo diversos reveses, como rio poluído e locais malfeitos para os atletas, eu não tenho certeza se o NFT como um sistema de receita vai ser muito positivo. Sou muito cético nisso, porque o NFT entra como uma espécie de arte digital e, como qualquer obra de arte, o que entra, o que gera valor é a sua própria escassez. Mas, ao longo do tempo, essa valorização de NFT, até as que foram compradas por celebridades, não se refletiu em realidade.
NB: De que maneira a venda de NFTs pode influenciar a receita geral de eventos esportivos ou culturais? O que pode motivar outras organizações a seguir o exemplo do COI e investir em NFTs?
IL: Muitas delas, basicamente, ficaram com valores muito negativos. Obviamente, se a gente tiver NFTs com licenças com empresas tradicionais, como Sega e Nintendo, pode ser, sim, positivo, porque você tem um mundo digital de pessoas e uma fanbase que já tem interesse em comprar esses produtos, impulsionando a venda e uma geração de receita extra para as Olimpíadas e para o Comitê Olímpico Internacional. Agora, é importante dizer que essa monetização dos NFTs ainda não é muito bem-feita.
NB: Como a transição para NFTs pode afetar o valor das licenças e parcerias tradicionais, como a que existia com Nintendo e Sega? Quais os desafios econômicos associados à implementação de NFTs em grandes eventos como as Olimpíadas?
IL: Provavelmente, a experiência de colocar marcas tradicionais, como Mario, Sonic e outros personagens, talvez Pokémon, Star Wars, possa, sim, impactar uma base de fãs que têm recursos financeiros para manter isso. Outro ponto fundamental do NFT é que a sua manutenção depende de redes, depende do blockchain e a gente viu, nos últimos meses, ataques cibernéticos que foram muito negativos. Então, é importante dizer que isso ainda é um risco e que um NFT, como arte digital, pode não ser impactante, pode não ter as mesmas características de segurança de uma arte real.
NB: A franquia de jogos Mario & Sonic at the Olympic Games vendeu mais de 30 milhões de cópias, gerando uma receita de aproximadamente US$ 1,5 bilhões desde 2008. Existe a possibilidade de a iniciativa do COI com NFTs superar esse valor só com as Olimpíadas de Paris? Por quê?
IL: Obviamente que franquias como Mario & Sonic at the Olympic Games foram muito boas, mas isso não é um NFT, é um jogo. O mercado de games se tornou o maior mercado do mundo, passando ainda do mercado tradicional de cinema e de quadrinhos. Então, é importante a gente dizer que é uma possibilidade grande de crescimento, mas não acredito, hoje, que o NFT tem uma capacidade ainda de passar, economicamente falando, de grandes mercados. Acho que ele é um apêndice que está se desenvolvendo e ainda precisa entender como massificar o seu próprio nicho de mercado.
Qual a sua opinião sobre o cancelamento da série Mario & Sonic at the Olympic Games? Você concorda com a decisão do COI de priorizar NFTs? Conte para a gente nos comentários!
Revisão: Cristiane Amarante
Capa: Juliana Paiva Zapparoli
Agradecimentos à Comunica PR, assessoria de imprensa responsável por Igor Lucena