Análise: SCHiM (Switch) oferece um ensaio interessante sobre a vida, mas pouco além disso

Navegue pelas sombras e reúna-se com o seu ser humano neste carismático título.

em 19/07/2024
Desenvolvido pelos holandeses Ewoud van der Werf e Nils Slijkerman, SCHiM apresenta ao público uma proposta tão única quanto instigante: transitar pelas sombras que existem pelo mundo e interagir com vastos e relaxantes ambientes cuidadosamente coloridos e animados — tudo isto, enquanto se reflete sobre a vida e seus acontecimentos diários.


No entanto, apesar do inegável valor artístico e do claro esmero de seus idealizadores, esta é uma obra que, infelizmente, passa longe de seu verdadeiro potencial enquanto jogo eletrônico. Confira a análise.

Conhecendo seu Schim

Schim é um termo em holandês que pode ser traduzido como sombra ou fantasma. No universo deste jogo, especificamente, o vocábulo é entendido como a alma ou espírito de um objeto ou ser vivo, materializado no carismático sapinho que vemos no material promocional e nas capturas de tela. Ademais, tudo no mundo possui um Schim próprio, porém a separação entre dono e “alma” jamais deveria ocorrer.

Infelizmente, essa ruptura é justamente o que ocorre com o protagonista. Alguns minutos após o início do jogo, o pequeno Schim que controlamos é separado de seu ser humano, graças a um incidente e à desilusão profunda deste último com a vida adulta e suas particularidades.

O que se segue, então, é uma jornada por ambientes minimalistas, mas belamente animados, enquanto tentamos reunir Schim e humano antes que seja tarde demais. Pronto para a missão, caro leitor?

Cavaleiro das sombras

Na prática, SCHiM une elementos de puzzle e plataforma em estágios curtos, apresentados sequencialmente ao jogador. Na imensa maioria das vezes, o seu objetivo será ir de um ponto A ao B nas fases, e para isso é preciso navegar pelas sombras disponíveis, visto que o Schim não pode ficar exposto à luz.

A navegação pelas regiões escuras, criadas pela obstrução da claridade, é, sem dúvidas, um dos pontos altos do jogo. Ao menos nas horas iniciais, é divertido pular entre sombras com o sapinho e buscar atalhos até o destino, como as projeções de uma bicicleta ou de um veículo, por exemplo. Além do recurso de salto (essencial para todo jogo de plataforma), também há um botão de interação com os objetos espalhados pelo mundo, que funciona tanto como easter egg — à la Untitled Goose Game — quanto como recurso para solucionar os ocasionais puzzles.

Não é preciso muito tempo com o título para perceber que SCHiM busca oferecer uma experiência relaxante ao público, quase terapêutica, inclusive. Não há mecanismos como vidas ou telas de game over, e caso você não consiga alcançar uma nova sombra, o máximo que acontecerá será um retorno automático ao último checkpoint de cada fase, que normalmente são bem próximos uns dos outros.

Até mesmo os enigmas encontrados pelo caminho são extremamente simples, resumindo-se a interações como ativar um semáforo para os pedestres passarem ou derrubar uma pilha de caixas para criar uma nova sombra como plataforma. O grande problema é que a linha entre a tranquilidade e o tédio é tênue, e SCHiM tende mais para a segunda opção, especialmente quando a aventura carece de variação e se prolonga mais do que o devido.

A vida é bela, mas…

Em seu decorrer, SCHiM propõe sobretudo uma reflexão sobre a vida: acompanhamos o protagonista em sua infância, no primeiro interesse romântico, na graduação e assim por diante. Esse ensaio é muito interessante e acerta em cheio ao mostrar que as coisas nem sempre saem do jeito que planejamos — quem é que nunca se decepcionou com alguma característica da vida adulta, por exemplo?

Além de criar identificação, a forma como essa reflexão é apresentada ao jogador também é digna de elogios. Já mencionei nesta análise o caráter minimalista dos cenários, mas aproveito para enfatizar a beleza das animações e o bom uso da paleta de cores secundárias e terciárias, que variam de acordo com o estágio e ajudam a estabelecer o estado de espírito de cada seção da narrativa. O mesmo pode se dizer da trilha sonora, que não soaria estranha em uma playlist da Lofi Girl.

Dito isto, confesso que por vezes me peguei questionando se SCHiM não funcionaria melhor como um curta-metragem do que como um jogo eletrônico. Digo isto porque suas pretensões artísticas e reflexivas são óbvias, mas infelizmente elas não são traduzidas muito bem para o formato jogável: além da já citada simplicidade das mecânicas, que não tardam a se tornar repetitivas e tediosas, há alguns problemas com a câmera e, para piorar, flutuações de performance no Switch.

Falando primeiramente da câmera: é possível girá-la em até quatro posições, mas nem sempre estas fornecem um bom ângulo para entender o que está acontecendo na tela ou qual o caminho que deve ser seguido. Na prática, isso resulta em “pulos cegos” e, às vezes, em um processo incômodo de tentativa e erro para achar o melhor rumo da fase.

Parece que, cientes desse problema, os desenvolvedores adicionaram um recurso que permite ver o objetivo final de cada estágio ao apertar ZR. Embora necessária, essa mecânica traz consigo um efeito colateral venenoso, que é a retirada à força do senso de descoberta presente em todo bom jogo do gênero. 

Junte a isso as variações na taxa de quadros no Switch, proporcionando engasgos na gameplay, e o fato de que algumas fases são muito parecidas com as outras (trazendo novamente o problema da repetição e mesmice), e temos aqui uma obra difícil de recomendar para quem não é exatamente entusiasta do gênero ou da proposta. Embora tenha boas ideias, uma excelente apresentação artística, e sobretudo traga uma reflexão oportuna, SCHiM possui falhas consideráveis em sua execução. 

Há até algumas surpresas para quem se aventura a ir até o final, como colecionáveis espalhados pelos níveis e um modo alternativo, mais difícil. Mas, para a maioria do público que esteja procurando um novo jogo de plataforma, é preciso lembrar que há alternativas mais coesas no mercado, principalmente na imensa biblioteca do console híbrido da Nintendo. Uma pena.

Ensaio sobre a vida

Apesar de suas boas intenções e da bem-vinda reflexão que promove, SCHiM acaba não se destacando como jogo devido a deslizes fundamentais, como os problemas com a câmera e as suas mecânicas simples, que infelizmente se provam repetitivas em pouco tempo. 

Ainda assim, se você busca uma jornada aconchegante com uma veia artística destacada, convém lembrar que uma das maravilhas da arte enquanto expressão humana é que ela é, sobretudo, subjetiva. Ciente disso, este ensaio sobre a vida não merece ser completamente relegado às sombras — aliás, a verdade é que se há algo que aprendi com esta análise, é que elas são mais acolhedoras do que aparentam.

Prós

  • Traz consigo uma reflexão oportuna sobre a vida e os acontecimentos do cotidiano;
  • Os cenários cuidadosamente desenhados e animados, juntamente com a trilha sonora que flerta com o lo-fi, promovem um deleite sensorial e conferem autenticidade ao título;
  • Ausência de mecânicas como vidas e checkpoints frequentes proporcionam uma aventura aconchegante, livre de estresse e pressão.

Contras

  • Na linha tênue entre a tranquilidade e o tédio, por vezes tende para a segunda opção;
  • Pouca variedade entre as fases traz a incômoda sensação de repetição cedo demais;
  • Problemas com a câmera e flutuações na performance no Switch tornam a experiência desagradável em determinados estágios.
SCHiM — PC/Switch/PS4/PS5/XBO/XSX — Nota: 6.5
Versão utilizada para análise: Switch
Revisão: Cristiane Amarante
Análise produzida com cópia digital cedida pela Extra Nice
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