Metroid: Other M — revisitando o jogo mais polêmico da franquia

Gameplay diferente e inovadora, visuais incríveis e ideias à frente de seu tempo não salvaram Metroid: Other M das controvérsias.

em 29/07/2024

Metroid: Other M é um título que dividiu a opinião dos fãs desde seu lançamento. Como um jogo que buscou inovar dentro de uma franquia consagrada, ele introduziu uma abordagem radicalmente diferente em termos de narrativa e jogabilidade. Ao integrar elementos cinematográficos e apostar em uma jogabilidade híbrida entre a ação em terceira pessoa e a perspectiva em primeira pessoa, Other M tentou oferecer o melhor de dois mundos.

Entretanto, essa ousadia trouxe consigo desafios e críticas, principalmente relacionadas à linearidade e à caracterização de Samus Aran.

O melhor de dois mundos


Um dos grandes acertos de Other M é o design de sua jogabilidade híbrida e como ela se traduz em Samus. A personagem é jogável em terceira pessoa na maior parte do tempo, permitindo que vejamos e sintamos a movimentação ágil e veloz consagrada em Super Metroid e Metroid Fusion. 

Além disso, podemos apreciar o visual incrível da Power Suit da protagonista, algo que não se destacava tanto na série Prime. Other M também incorpora características únicas, especialmente quando o jogador utiliza seus mísseis, momento em que o jogo assume uma perspectiva em primeira pessoa.

A escolha da ambientação e jogabilidade funcionam bem, apesar de os controles parecerem pouco intuitivos no início. Sua jogabilidade única e veloz destaca a perícia e letalidade de Samus em combate, principalmente nos movimentos de execução. O jogo transmite muito bem a eficácia e a sensação de poder da personagem.


A ambientação de combate em espaço 3D foi muito bem realizada, graças à experiência da Team Ninja com aspectos de ação, herdada da franquia Ninja Gaiden, que souberam traduzir para o universo de Samus.

Esse modelo também permitiu criar pequenos momentos de tensão no jogo, semelhantes à experiência de terror vista em alguns Resident Evil.

A linearidade foi mesmo um problema?


Metroid sempre foi um grande jogo de ação exploratória, expandindo esse conceito principalmente em Super Metroid e sendo bem traduzido para o 3D em Metroid Prime e Prime 2: Echoes. No entanto, o aspecto de exploração e backtracking foi fortemente diminuído em jogos como Metroid Fusion e Prime 3: Corruption, mas nada comparado ao Other M.

Other M adota um modelo linear de jogos de ação, sendo o mais linear da franquia Metroid. Isso foi um dos grandes choques para os fãs que esperavam a manutenção dos elementos consagrados dos jogos anteriores. A postura de Other M é mais direta, sacrificando a necessidade de grandes explorações e guiando o jogador pelos ambientes e pela história.

Em si, a linearidade não é um problema em Other M, considerando que Metroid tende a realizar mudanças em suas características para criar novas experiências na série. No entanto, aqui o sacrifício de elementos tradicionais da série não foi para testar novas mecânicas de gameplay, mas para transformar Metroid em uma experiência jogo-cinemática única.

Sakamoto e o sonho de um Metroid cinemático


Diferente do que se vê nas principais franquias da Nintendo, como Zelda, onde enredo e construção do universo trabalham em função do gameplay, Other M coloca a construção narrativa e cinemática em primeiro lugar. Essa escolha trouxe resultados visuais incríveis e momentos memoráveis, sendo uma quase perfeita fusão entre cinemáticas e gameplay. Os aspectos técnicos e o posicionamento de câmera em diversos momentos são notáveis, mas isso não veio sem prejuízos.

Colocar a narrativa em primeiro lugar tornou o jogo essencialmente linear e cansativo, principalmente na primeira vez, já que as cutscenes não podem ser puladas. As cutscenes e os monólogos de Samus são longos, e o que deveria imergir o jogador na história e na psique de Samus acaba tendo o efeito contrário. Curtos diálogos internos de Samus em Fusion ajudavam a construir a narrativa e a personagem, mas em Other M, a tentativa de representar isso de forma mais cinemática não funcionou tão bem.


Aliás, Other M não foi o primeiro momento em que Sakamoto visualizou aproximar Metroid de uma experiência cinemática. Essa ideia já estava presente desde Super Metroid. Vale lembrar que Sakamoto tentou criar jogos com grandes experiências narrativas em outras ocasiões, como na franquia Famicon Detective Club.

As limitações técnicas dos Metroids 2D exigiam o uso da narrativa ambiental para contar a história. O Wii ofereceu potência e qualidade suficientes para que a visão de Sakamoto de um Metroid cinemático fosse realizada. Esforços não foram poupados para a criação do revolucionário Project M, que envolveu a Team Ninja, a R&D1 da Nintendo e diversos estúdios de animação. O resultado estético e técnico foi impressionante, mas a narrativa não agradou aos fãs e a muitos críticos, encobrindo a qualidade técnica e os aspectos positivos da história.

Uma tentativa de humanizar Samus


Uma das maiores críticas a Other M foi a representação de Samus, vista por muitos como uma contradição ou descaracterização da personagem. Sakamoto comentou sobre isso em entrevistas passadas:

“Existem muitas perspectivas diferentes de Samus Aran entre a série de jogos clássicos de Metroid e os títulos de Metroid Prime. No entanto, eu não acho que sejam personas completamente diferentes. Samus, nos títulos Prime, mostra principalmente seu lado frio e profissional como caçadora de recompensas e representa o que Samus Aran é para muitos de vocês. Em Metroid: Other M, tentamos introduzir outro lado dela e obter mais insight sobre seu conflito interno. Espero que muitos de vocês entendam e empatizem com ela enquanto jogam e descobrem mais sobre seu personagem.” Yoshio Sakamoto

Como apontado por Sakamoto, os diversos jogos da franquia têm abordagens e perspectivas diferentes tanto para o jogo quanto para a personagem Samus. A tentativa de mostrar uma Samus mais humana e sentimental é evidente durante vários momentos da série, mas foi abordada de forma mais detalhada e expositiva em Other M, que não funcionou para o público.


Em entrevista, Nate Bihldorf, que trabalhava na localização de jogos da Nintendo, refletiu sobre as críticas de que Samus foi representada como fraca e dependente no jogo:

“O monólogo desapegado de Samus reflete a reticência de uma personagem ferida. Uma pessoa marcada pelos trágicos eventos de sua infância. Pessoas que criticam essa cena como qualquer coisa menos empoderadora estão, na minha opinião, meio que perdendo o ponto —– afinal, ela acaba destruindo Ridley. Não existe coragem sem medo, na minha opinião, e saber que Samus supera esse terror reprimido a torna ainda mais heroica do que alguém que avança sem um traço de humanidade.” Nate Bihldorff

A fala de Nate destaca a dificuldade de humanizar e caracterizar um personagem que quase nunca é visto sem sua Power Suit. Afinal, Samus está trajada com ela em um ritmo de ação frenética na maior parte do tempo, com muito pouco espaço para desenvolvimento.

Como diferenciar Samus de outros personagens que são admirados apenas por parecerem incríveis apenas por quebrarem tudo sem se importar e por fazerem poses de durões, mas que são, na realidade, completamente vazios? Não é uma tarefa fácil. Other M fez uma tentativa corajosa, apesar dos resultados.

O legado de Other M


Apesar de ser considerado uma ovelha negra dos jogos da Nintendo, Other M tem diversos elementos retomados, especialmente em Metroid Dread. Os principais são as action-cutscenes, onde Samus eliminava adversários enfraquecidos em Other M, mas retornam com força, principalmente, no combate contra chefes em Dread. A exposição narrativa também retorna, mas de forma mais cautelosa e menos intrusiva.

E então, Other M?

Finalmente, Metroid: Other M é um bom jogo de ação com muitas escolhas de game design interessantes e com diversos aspectos técnicos que o colocavam à frente de seu tempo, mas o excesso de experimentalismo e o foco na ação afastaram-no bastante do que entendemos por Metroid em suas encarnações 2D ou 3D. Quanto à parte cinemática e narrativa, seus visuais são dos mais belos do Wii. As cutscenes, a ação nelas e na movimentação de Samus in-game evidenciam a alta qualidade desses aspectos. 

No entanto, esses aspectos positivos se diluem no fracasso em traduzir a protagonista, criar personagens secundários expressivos e suas relações nesse universo, falhando em conectar a personagem com os fãs de longa data. Other M tentou ser revolucionário, mas talvez a ambição tenha sido a causa de seus maiores problemas.

Revisão: Cristiane Amarante
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Fernando Paixão Rosa, normalmente referenciado por Lorde, está escrevendo pela internet afora há mais de dez anos e com alguns livros publicados. Escutando música 24h/dia, fã de cultura pop em suas muitas manifestações e mais fã ainda das IP's da Nintendo. Registrando as aventuras nos games no Instagram (@lordeverse) e Twitch (@lordeverso).
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