Análise: Bō: Path of the Teal Lotus é um bom metroidvania que sofre com problemas no Switch

O título do Squid Shock Studios impressiona em alguns aspectos e desaponta em outros cruciais.

em 30/07/2024
Desde a primeira vez que vi Bō: Path of the Teal Lotus em ação, fiquei instigado. Afinal, um metroidvania que une belíssimos cenários no estilo Ukiyo-e com a jogabilidade inspirada em clássicos modernos como Hollow Knight parecia uma fácil recomendação aos apreciadores do estilo e, talvez, uma daquelas bem-vindas surpresas que todo ano proporciona quando o assunto é jogos independentes. 


Pois bem: apesar de impressionar de fato em vários aspectos, infelizmente esta aventura do Squid Shock Studios peca em alguns aspectos cruciais do gênero e, para piorar, sofre de problemas consideráveis de performance no Switch, o que prejudicará a experiência dos jogadores que optarem por esta versão. Confira a análise.

O caminho suave

Em Bō: Path of the Teal Lotus, somos apresentados a Bō, uma raposinha que na verdade é uma tentaihana (天体花), expressão que pode ser traduzida do japonês como “flor celestial”. Criada pelos produtores especialmente para este jogo, tentaihana pode ser definida como uma espécie de Yokai, seres sobrenaturais, misteriosos e fascinantes, geralmente associados ao folclore oriental.

Após uma tragédia ocorrida na Crimson Bamboo Forest, Bō nasce para impedir que o mal se espalhe pela terra, seguindo uma antiga profecia local. É nesse contexto que assumimos o controle do protagonista em sua jornada, encontrando diversas criaturas curiosas, tarefas e adversários pelo caminho.

Já nos primeiros momentos, é difícil não se impressionar com a qualidade artística e o bom uso das inspirações orientais no game: dos cenários desenhados à mão ao melhor estilo Ukiyo-e — também conhecido como estampa japonesa — aos seres fantásticos como Asahi (outra tentaihana), o kodama Shimeji e o pássaro de duas cabeças Tori, uma das grandes forças deste metroidvania é a sua temática “fora da curva”, capaz de continuamente surpreender o jogador com seus elementos de fantasia.

Se você aprecia jogos como Ōkami e animações detalhadas como A Viagem de Chihiro (2001) e Princesa Mononoke (1997), saiba que essas obras foram inclusive citadas como influências pelos produtores de Bō na época de seu Kickstarter. Só é uma pena, portanto, que a jogabilidade não esteja à altura da qualidade artística do título e, por vezes, inclusive atrapalhe a experiência.

Um pulo de cada vez, ou não

Apresentado em um universo 2.5D, Path of the Teal Lotus incorpora uma série de mecânicas para tornar tanto o combate quanto as seções de plataforma mais dinâmicas para o jogador. O principal recurso, neste caso, é o Equinox Staff, um bastão mágico que Bō tem à sua disposição e, conforme a aventura progride, vai se provando cada vez mais versátil, podendo ser utilizado tanto para atacar os inimigos quanto para se manter no ar e alcançar lugares altos durante a aventura.

Como muito bem-explicado pelo meu colega de redação João Pedro em sua análise para o GameBlast, Bō faz uso do recurso conhecido como “pogo”, derivado do brinquedo pogobol, cujo grande chamariz era fazer as crianças (ou adultos, apesar de isso não ser recomendado) pularem e manterem o equilíbrio enquanto continuavam pulando. Após sucesso no Brasil no final da década de 1980, o brinquedo até hoje pode ser encontrado em lojas especializadas, graças a um relançamento da Estrela durante a Comic Con Experience de 2018.

Já nos games, a mecânica se popularizou com o clássico DuckTales, em que o Tio Patinhas usa sua fiel bengala como pula-pula para se locomover pelos cenários, derrotar inimigos, quebrar baús e mais, instaurando um estilo de jogabilidade que ressoou em diversos jogos 2D das décadas seguintes. Mais recentemente, outra aplicação muito elogiada foi a de Shovel Knight, visto que o nobre cavaleiro usa sua pá multifuncional para quicar, atacar e até se defender.

Pois bem: aqui, o pogo usando o bastão é crucial tanto para o combate quanto para movimentação, sendo que acertar um inimigo ou elemento no ar (como uma luminária flutuante) instantaneamente lhe garante um pulo extra, seja para desviar de um projétil ou alcançar outra parte do cenário. O problema é que a mecânica não é exatamente precisa para algo tão vital e, na prática, torna-se comum ter que repetir uma mesma sequência de plataforma várias vezes, até que o jogo reconheça os comandos como devidamente executados.

Esse deslize na jogabilidade acaba tornando algumas seções de Path of the Teal Lotus mais difíceis que o devido, especialmente no caso dos confrontos contra chefes. Adicione a isso problemas de performance no Switch, sobre os quais falarei a seguir, e temos claramente uma fórmula bonita na teoria, mas um tanto quanto disfuncional na prática. Triste.

Imperfeito no Switch

Bō: Path of the Teal Lotus mira os 60 quadros por segundo (o ideal para um jogo de plataforma 2D baseado em precisão), mas nem sempre atinge essa marca no console da Nintendo. Quando há muitos efeitos na tela ou quando a câmera se afasta para mostrar a riqueza de detalhes dos cenários, o que era pra ser uma experiência cinematográfica se transforma em um lembrete de que não houve uma otimização eficaz para o Switch. 

O nível das quedas de performance varia a cada seção do jogo, sendo que algumas são piores que as outras em proporcionar aquela lentidão incômoda que quebra a imersão. Sei que o Switch não é exatamente um titã em termos de hardware — especialmente se aproximando de seu nono ano no mercado —, mas, ports miraculosos à parte, acredito que pelo menos a opção de travar em 30 quadros por segundo poderia ter sido incluída nas configurações.

A boa notícia é que os desenvolvedores confirmaram que um patch com melhorias, inclusive de performance, está a caminho, embora sem data definida. Particularmente, torço para que a atualização corrija esses deslizes e também aprimore, dentro do possível, a detecção de hitboxes e a leitura dos comandos dos jogadores. Isso porque, quando se considera o conjunto da obra, Bō passa, na minha opinião, bem perto de ser uma experiência memorável.

Além dos cenários e universo cativantes, as batalhas contra chefes tendem ao espetáculo ao ocupar toda a tela, exigindo reflexos rápidos e uma boa dose de memorização de seus padrões para avançar. A trilha sonora e a sonoplastia (que contam com a contribuição da compositora Manami Kiyota, conhecida por seu trabalho na série Xenoblade Chronicles) também são ambas dignas de elogios, acertando ao usar tanto as escalas pentatônicas quanto instrumentos não-convencionais para proporcionar uma ambientação impecável.

Nos momentos em que a jogabilidade funciona, também é difícil não se empolgar com a flexibilidade e capacidade acrobática de Bō de se manter no ar. Não é preciso muito tempo de jogo para desbloquear funções como o impulso aéreo e a capacidade de rebater determinados projéteis, por exemplo, então os entusiastas podem se animar sabendo que sensações essenciais a todo metroidvania — como a melhoria constante das habilidades do protagonista e o senso de descoberta ao explorar novas áreas, seja durante as missões principais, seja nas secundárias, obtidas com os personagens espalhados pelo mundo — estão preservadas aqui. 

Há até um aceno aos jogadores que não curtem tanto desafio e preferem uma aventura mais tranquila nesse sentido, com a inclusão de um modo “invencível”, desbloqueável após morrer 20 vezes, e a opção de desacelerar a velocidade do jogo pela metade, facilitando a leitura de padrões de combate de chefes, por exemplo.

Só fica o aviso: é necessário saber inglês para achar essas opções com facilidade, já que, infelizmente, o jogo não suporta o português brasileiro nem mesmo em seus menus, ofuscando os diálogos e algumas quebras de quarta parede interessantes para quem não é familiar com outro idioma. Quem sabe na futura atualização?

Uma aventura interessante, mas carente de atenção no Switch

Bō: Path of the Teal Lotus impressiona com cenários ricos em detalhes e um universo instigante, capaz de surpreender o jogador continuamente ao longo de sua aventura. Porém, uma vez despido de sua ambientação fantástica, nota-se uma falta de polidez complicada e difícil de ignorar em mecânicas cruciais e também na adaptação para o console da Nintendo.

Logo, a jornada de Bō ainda merece, sim, ser vivenciada, mas com ressalvas. Fica registrada a esperança de que as próximas atualizações prometidas pelos desenvolvedores aprimorem o jogo no Switch. Afinal, como dito, o que há aqui passa perto de ser memorável — uma pena que não seja com tanta frequência assim.

Prós

  • Os cenários desenhados à mão e inspirados no estilo Ukiyo-e promovem um espetáculo visual que destaca a obra na multidão de metroidvanias lançados nos últimos tempos;
  • Personagens carismáticos, como o pássaro de duas cabeças Tori, fornecem momentos interessantes, inclusive de quebra da quarta parede;
  • Quando a jogabilidade funciona como previsto, é difícil não se empolgar com as manobras acrobáticas do protagonista;
  • A trilha sonora e a sonoplastia também são dignas de elogio, favorecendo a ambientação oriental.

Contras

  • Os problemas de performance, como a taxa de quadros inconstante, prejudicam a experiência no Switch;
  • A incoerência nos hitboxes e falta de precisão nos comandos levam à repetição e, em seguida, à frustração, além de denotar falta de polidez em aspectos cruciais;
  • Ausência de suporte ao português brasileiro.
Bō: Path of the Teal Lotus — PC/Switch/PS5/Xbox Series — Nota: 7.5
Versão utilizada para análise: Switch
Revisão: Davi Sousa
Análise produzida com cópia digital cedida pela Humble Games
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