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Análise: Times & Galaxy (Switch): uma aventura intergaláctica que explora os conceitos básicos do jornalismo

Na pele de um robozinho, vivenciamos alguns perrengues do dia a dia da profissão.


Como jornalista, posso dizer que todo o conceito de Times & Galaxy me intrigou desde o seu anúncio. Depois da oportunidade que eu e meu amigo Ivanir tivemos de entrevistar Ben Gelinas, o diretor criativo da Copychaser Games, desenvolvedora do jogo, foi aí que a vontade de jogar este curioso título atingiu seu patamar — e o motivo você descobrirá na análise a seguir.

Um estágio de outros mundos

Em Times & Galaxy, assumimos o controle do primeiro robô-jornalista do holo-jornal que dá nome ao jogo. Apesar de nosso contrato ser de estágio, logo recebemos uma missão importante: cobrir um acidente no planeta fictício Aug.

Sem tempo a perder, esta primeira reportagem serve como um breve tutorial do funcionamento do jogo, que nada mais é que uma aventura textual baseada em fundamentos jornalísticos. A cada ciclo, devemos cobrir eventos e, a partir da nossa apuração dos acontecimentos, montar as notícias da forma que decidirmos.


Nosso robozinho é amplamente customizável e podemos escolher um modelo físico, os pronomes pelos quais ele será chamado pelos demais personagens, nome e cores. Além disso, todos os indivíduos possuem suas próprias características, trazendo uma rica variedade (e diversidade) ao elenco de humanos, alienígenas e outros robôs.

Os diálogos e até mesmo as histórias que servem como pautas jornalísticas são bem escritos e humorados, sendo muito interessante — e altamente recomendável — interagir com todos os personagens sempre que possível. Infelizmente, por se tratar de uma aventura narrativa, os principais pontos contra são a ausência de algumas funções de qualidade de vida, como um histórico de mensagens (log) e, sobretudo, a falta de localização para outros idiomas, incluindo o português — aqui, mais pelos termos e jargões jornalísticos do que pela trama em si.

Um Profissão Repórter intergalático

Na hora de colocar a mão na massa, precisamos interagir com objetos dos cenários, entrevistar fontes para colher depoimentos e tentar entender o desenrolar da história. Assim como na vida real, nem todos os personagens compartilharão do mesmo ponto de vista — nem mesmo nossos colegas do Times & Galaxy —, então é muito importante que tenhamos tato na hora de escolher algumas opções de diálogo.

No entanto, como não temos a presença de Caco Barcellos para nos auxiliar, precisamos seguir nossa intuição. Infelizmente, nem sempre as decisões levam a um desfecho positivo; às vezes, perdemos a oportunidade de entrevistar uma fonte porque nossa abordagem não foi de seu agrado.


Na minha opinião, essa decisão é uma faca de dois gumes. Do ponto de vista jornalístico, sim, podemos perder potenciais depoimentos porque não conduzimos muito bem a entrevista ou erramos no jeito de abordar uma fonte; já no âmbito da jogabilidade, não ter uma ferramenta para conferir os possíveis desfechos, como um fluxograma, faz falta como um todo, ainda mais quando Times & Galaxy nos entrega um grande fator de rejogabilidade.

Agora a parte que, para mim, é a mais divertida do jogo: montar as notícias. Embora não tenhamos que escrever de verdade, precisamos escolher os principais elementos que a compõem: manchete, lide, parágrafo-chave, citação principal e detalhes, seguindo o modelo da Pirâmide Invertida — isto é, das informações mais importantes às mais gerais.


Ainda nesse quesito, nossas escolhas podem seguir certas tendências, isto é, ser informativas, de interesse alienígena ou sensacionalista, o que afeta nossa reputação e a base de leitores — essas tendências também afetam como certos personagens se comportam conosco. Felizmente, Times & Galaxy é bem didático e conta com explicações que nos ajudam a entender um pouco melhor esses aspectos jornalísticos presentes no jogo; a única barreira aqui é a linguística, como já apontado.

Também existem alguns upgrades opcionais que nos são oferecidos gratuitamente ao longo da campanha e desbloqueados com o passar dos ciclos (geralmente, essas melhorias demoram de três a quatro para ficarem prontos). O primeiro deles, que recebemos logo no início da campanha, são botas que nos permitem andar mais rápido, mas, com o passar dos ciclos, podemos desbloquear o Charisma Cap, que nos ajuda a obter informações mais facilmente durante as entrevistas, e os Advanced Optics, óculos especiais que facilitam na hora de investigar certos cenários atrás de elementos que nos ajudarão a compor as notícias.

Contudo, aqui entra outro aspecto negativo da jogabilidade: assim como não existe um fluxograma que nos mostre como avançar em determinados diálogos, não há pistas que nos indiquem o que falta investigar ou quem falta entrevistar nos cenários. Como resultado, nem sempre teremos todas as informações-chave para compor nossas notícias, com algumas opções ficando permanentemente inacessíveis até decidirmos rejogar o ciclo atual ou iniciar uma nova campanha. 

Não estamos sozinhos no universo

Reiterando o que eu comentei antes, o universo deste jogo é colorido, vibrante e carismático, com um rol de personagens interessantíssimos e cheios de personalidade própria. Porém, depois que conversamos com eles uma vez dentro de um ciclo, eles passam a não oferecer mais diálogos, tornando-se meros elementos do cenário; sendo assim, é uma pena que não eles não tenham tido nenhum tipo de relevância para além de algumas linhas de fala em determinadas situações.

Ver a convivência de robôs, alienígenas e seres humanos também é outro aspecto muito positivo de Times & Galaxy, na minha opinião. Além de enriquecer a trama e o elenco como um todo, nos ajuda a refletir como seria interessante se realmente tivéssemos contato com outros seres intergalácticos na vida real — e isso nos leva ao questionamento de existir ou não vida fora da Terra; é uma pena, dado este contexto, que não tenhamos um catálogo de personagens, pelo menos os nossos colegas do holo-jornal, para conferir ao longo da jornada.


Por exemplo, Arwin gosta de notícias mais factuais e informativas (pelo que consegui deduzir), enquanto Ursula prefere aquelas que atraiam uma base de leitores mais sólida. Dessa forma, mais uma vez um medidor relacionado às nossas escolhas faz falta, pois assim poderíamos ter noção de como anda nossa reputação com nossos colegas de profissão.

De todo modo, temos aqui um jogo que é positivamente satisfatório tanto no campo audiovisual quanto no textual. Mesmo que às vezes eu tenha sentido que fiquei no escuro por não saber como certas escolhas impactaram meu progresso na campanha, consegui sentir que o título da Copychaser Games transmite com fidelidade o dia a dia do jornalismo dentro de uma redação.

Uma recomendação sólida

Por mais que peque em alguns aspectos que podem minar a experiência como um todo, Times & Galaxy é um jogo pensado para traduzir, mesmo que de maneira simplificada, o dia a dia em uma redação e certas nuances jornalísticas para um contexto sci-fi e acessível a diversos públicos. Com ótimas sacadas e um carismático e colorido universo que possui vida própria, é muito difícil não se perder na jornada do nosso robô-jornalista em busca da melhor cobertura dos fatos.

Prós

  • Universo colorido e carismático, com personagens e diálogos bem-construídos e interessantes, que nos passam a sensação de urgência do dia a dia de uma redação de jornal;
  • Montar as notícias seguindo o modelo da Pirâmide Invertida, mesmo que de maneira mais simplificada, faz com que outras pessoas entendam alguns dos princípios e conceitos jornalísticos;
  • Os eventos que precisamos noticiar são bem-escritos e instigantes;
  • O modo como checamos e abordamos os fatos impactam no ponto de vista dos demais colegas de profissão, bem como nossa reputação com os outros personagens;
  • Presença de tutoriais que explicam as mecânicas básicas do jogo e podem ser acessados a qualquer momento;
  • Os equipamentos opcionais desbloqueáveis facilitam na hora da checagem dos fatos, permitindo que possamos ampliar a cobertura das notícias.

Contras

  • Não existe um indicativo de como nossas escolhas impactam o progresso na campanha, como um fluxograma e um portfólio de personagens, tanto no progresso quanto no relacionamento com outros indivíduos;
  • A falta de ferramentas de qualidade de vida, sobretudo um histórico de mensagens, prejudica a experiência enquanto aventura narrativa;
  • Dependendo do ciclo, certos personagens são reduzidos a “objetos” nos cenários;
  • A falta de localização para o português brasileiro e outros idiomas pode se tornar uma barreira linguística que prejudica o aproveitamento do jogo como um todo, já que muitos diálogos possuem jargões e gírias próprias do jornalismo.
Times & Galaxy — PC/PS5/XSX/XBO — Nota: 8.0
Versão utilizada para análise: Switch
Revisão: Davi Sousa
Capa: Juliana Paiva Zapparoli
Análise produzida com cópia digital cedida por Fellow Traveller

Também conhecida como Lilac, é fã de jogos de plataforma no geral, especialmente os da era 16-bits, com gosto adquirido por RPGs e visual novels ao longo dos anos. Fora os games, não dispensa livros e quadrinhos. Prefere ser chamada por Ju e não consegue viver sem música. Sempre de olho nas redes sociais, mas raramente postando nelas. Icon por 0range0ceans
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