Análise: Torn Away (Switch) é uma descida gélida ao desespero sob os olhos de uma criança na Segunda Guerra Mundial

Mesmo com tropeços na tradução, é obrigatório para entusiastas deste período sombrio.



Um dos momentos mais icônicos da clássica série de televisão M*A*S*H é quando o cirurgião Hawkeye afirma que a guerra é pior que a danação eterna do Inferno, explicando exatamente como:
Não há espectadores inocentes no Inferno. A guerra está repleta deles – crianças, aleijados, idosos. Na verdade, com exceção de algumas pessoas, quase todos os envolvidos são espectadores inocentes.
Torn Away é uma visão crua e desconfortável sobre esse mesmo pensamento, jogando o jogador no tormento sem fim de uma menininha entre 1943 e 1945. Coloque uma luva porque esta análise será fria.

Coração das Trevas

Era 1943, quarto ano da Segunda Guerra Mundial. Asya, uma garota de 10 anos vivendo em Stalingrado, estava em sua casa brincando com seus brinquedos e preparando as coisas para celebrar o aniversário de sua mãe. O pai de Asya era um aviador e estava combatendo as forças do Eixo, mandando algumas cartas e dizendo que tinha saudades. No meio do dia, Asya encontra uma luva de seu pai e a costura, colocando dois botões e dando voz para a peça de roupa, chamando-o de Camarada Mitten.

Em um único momento, no entanto, a vida da garota muda para sempre quando uma bomba cai na cidade, destruindo sua casa e, pouco tempo depois, ela e sua mãe são levadas para um campo de prisioneiros alemão. O objetivo principal de Torn Away é bem simples: viver. Trabalhar no campo de concentração, tentar achar comida, fugir de soldados ou lobos, fazer o almoço… O jogo é exclusivamente focado na visão de uma criança tentando respirar no meio de um dos momentos mais sombrios da humanidade, e a execução é sensacional.

Está nevando...

Torn Away é uma mistura de point and click com furtividade. Asya deve explorar os mais variados ambientes e resolver quebra-cabeças simples para progredir com a narrativa. Muitos deles são minigames, como costurar Mitten, fritar linguiças para o almoço ou fazer um barquinho de papel, tudo muito simples, mas intuitivo. Nem tudo é simples, porém. O mundo é um lugar cruel e selvagem, com soldados, lobos e trincheiras perigosas que devem ser evitados e fugir, com uma forte tensão sempre presente para aumentar a imersividade.

E falando nela, a imersividade é um dos pontos mais altos da história. Todos os personagens são muito simples, mas carismáticos e fáceis de gostar, principalmente a relação de Asya com sua mãe ou Mitten, que é uma tradução dos pensamentos otimistas da garota em meio ao mar de chamas e neve que virou sua vida. Existem momentos do jogo que ficam em primeira pessoa e estas são algumas das partes mais aterrorizadoras, mergulhando dentro da mente da pobre criança diante do horror.

A direção artística é o outro ponto mais forte. Com um belíssimo estilo de desenho para ilustrar os momentos mais belos e tristes, pareados com uma trilha sonora magistral, formam uma experiência inesquecível para quem gosta de peças artísticas com temática de guerra e drama (particularmente, minhas músicas favoritas foram do campo de concentração e na trincheira). As diversas passagens no diário da garota retratam suas experiências e descobertas de uma forma tão realista que evocam sentimentos de dor e perda profundos.

Um tiro no meio da floresta

O jogo tem muitas opções de tradução, mas apenas duas de áudio, uma em inglês e outra em russo, sendo a segunda opção a recomendada por conta dos contextos geográficos e a dramaticidade impecável das vozes. Existe também a opção para legendas em português, mas que está, infelizmente, mal traduzida, com diversos erros ortográficos e gramaticais. Não é algo que arruína a experiência, já que a história ainda pode ser entendida, mas ainda é um pouco insultante que uma história tão bela tenha recebido uma adaptação para nosso idioma com tão pouco carinho.

Um outro pequeno detalhe que não me agradou também foi o final. Sem entrar em spoilers, é um final que faz sentido para o contexto de tudo, mas também é insatisfatório e abrupto, como se fosse deixar abertura para mais história. Mas, dado o contexto e situações que levaram ao final, não existe tal possibilidade, então… por que toda aquela odisseia para chegar aonde terminou? O jogo é bem curto, no máximo 3 horas, então pode deixar um gosto meio amargo na boca ver como acaba.

Inocência e pureza

Mesmo com defeitos pequenos, Torn Away é belíssimo e cru. Existem diversas mídias que mostram a guerra não como gloriosa, mas o pior destino para a humanidade. O Resgate do Soldado Ryan, Fuga do Inferno, Valiant Hearts, Coração das Trevas… Torn Away se junta a esse panteão com uma história trágica, simpática, destruidora e esperançosa.

A guerra é pior que o Inferno. Ninguém merece morrer pelos interesses cruéis de outros. Especialmente as vidas inocentes presas nos olhares opressores de mentes pequenas. O jogo é uma dedicatória a todas as almas ceifadas por conflitos mesquinhos… e este texto segue a mesma linha. Coloque uma luva, está muito frio lá fora…

Prós:

  • Narrativa curta que prende a atenção, como um filme de época;
  • Belíssimos gráficos que evocam os horrores da guerra e inocência juvenil;
  • Personagens simples, mas carismáticos;
  • Trilha sonora impecável;
  • A realidade apresentada de forma nua e crua.

Contras:

  • Tradução para o português está cheia de erros gramaticais e ortográficos;
  • Final insatisfatório.
Torn Away — PC/PS4/PS5/XBOXSX/Switch — Nota: 9.0
Versão utilizada para análise: Switch
Revisão: Cristiane Amarante
Análise produzida com cópia digital cedida por perelesoq
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Formado em Publicidade e Propaganda na USC e especializado em Marketing Digital, sou Editor de Vídeos também, meu TCC foi sobre a Guerra dos Consoles e evolução da publicidade nos games. Jogo um pouco de tudo e também escrevo. Me descrevo como um artista.
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