Super Metroid (SNES): estamos ficando dependentes de guias?

Entenda como alguns jogos modernos têm tirado a autonomia da nossa gameplay.

em 14/03/2024
A título de apresentação, Super Metroid é a sequência de 16-bits de uma saga que se iniciou com o lançamento de Metroid para NES. Quem já teve algum contato com essa franquia sabe que são inúmeros os momentos em que ficamos perdidos. Isso porque grande parte do conceito do jogo é baseado no desbloqueio de upgrades que permitem o acesso a novos locais que antes eram inacessíveis.

Em se tratando de Metroid, além da exploração ser um dos fatores centrais, temos um pouco de aleatoriedade: há momentos em que precisamos atirar para todos os lados na tentativa de descobrir um bloco quebrável. Essa aleatoriedade não é tão rara quanto acredito que deveria ser, mas isso é apenas uma perspectiva pessoal. Para ser justo, os vários Metroids são jogos que sabem recompensar o nosso lado explorador.

Ego ferido

O que me levou a escrever esse texto foi justamente um momento que vivi com o jogo. Como eu disse antes, ficar travado/perdido não é uma coisa rara nessa franquia; na verdade, é precisamente o contrário. São inúmeros os momentos em que você não sabe para onde ir ou mesmo o que fazer.

No entanto, a forma como isso me aconteceu foi para arrebatar a dignidade de qualquer pessoa. Para ser preciso, fez com que eu me sentisse o sujeito menos provido de inteligência da Terra. 

Tudo caminhava “tranquilo” e sem grandes dificuldades, afinal, eu já havia tido contato com a franquia, embora só tenha finalizado a campanha do Metroid Dread e do remaster do Prime. Não havia passado muito tempo de gameplay e, ainda no começo da jogatina, o jogo me exigiu algo muito simples: correr.

Quando o conhecimento se torna um problema

Porém, talvez por conta da familiaridade que eu adquiri com os outros Metroids, eu tentei absolutamente de tudo, menos o que me foi requerido. O que me surpreendeu nisso tudo é que um dos comportamentos mais comuns de quem é familiarizado com o mundo dos games é testar todos os botões; quem sabe, até dar uma olhada nas configurações do jogo.
 

Apesar de já ter uma longa relação com jogos de modo geral, por algum motivo, eu não fiz nenhum dos dois. Logo comecei a me questionar sobre as razões pelas quais eu não tomei uma atitude tão fácil e comum. Tentando advogar a favor de mim mesmo, uma resposta que me exime de certa culpa é que Samus já é rápida suficiente na sua movimentação.

Então, até aquele ponto do jogo, não houve necessidade alguma da corrida. Mas algo me leva a crer que o motivo real por trás é bem mais profundo: acredito que os títulos atuais estão deixando os jogadores mal acostumados (eu incluso).

Mal acostumado, você me deixou mal acostumado...

Atualmente, virou certo consenso de que as primeiras batalhas que você enfrenta em um jogo moderno são apenas parte de um grande tutorial. Às vezes, surgem tutoriais até para usar o spray de cura... A todo momento somos bombardeados com vídeos ou ilustrações que nos mostram qual botão apertar para fazer ação X ou Y.

Se, por um lado, eu acredito que isso facilite as coisas para quem não é familiarizado com certos gêneros de jogos; por outro, eu penso que estamos ficando cada vez mais dependentes desses tutoriais. Na minha compreensão, essa é uma das grandes barreiras que dificultam o contato da geração atual com jogos retrô, que normalmente não nos entregam soluções de bandeja.

Guias não são sacrilégios

Buscar um guia, um detonado ou qualquer coisa que solucione um momento de maior dificuldade é extremamente comum. Afinal, ninguém é obrigado a ser um “pro player” em todos os jogos e saber masterizar todas mecânicas da maneira mais eficiente. Isso não é um problema em si mesmo. 

Sabemos ainda que nem todo mundo tem tempo e, muito menos, disposição para esmiuçar todas as possibilidades para solucionar um quebra-cabeça. Além disso, voltando a falar sobre os jogos retrôs, alguns deles tinham a característica de se fazerem propositalmente difíceis, para não falar impossíveis, para impulsionar a venda de revistas com detonados.

Muito ajuda quem não atrapalha

No entanto, vejo com certa infelicidade que alguns jogos atuais estejam sendo moldados de acordo com essa nova necessidade. Além dos diversos tutoriais com vídeos inseridos nos jogos, uma prática que vem se tornando cada vez mais comum é o auxílio do próprio jogo na resolução de enigmas.

Quem já teve contato com o God of War de 2018, ou mesmo o GOW Ragnarok, sabe que, nos puzzles, o Atreus simplesmente não deixa que nós tiremos nossas próprias conclusões. Nos jogos atuais da franquia Tomb Raider, isso acontece exatamente da mesma forma e esses não são exemplos isolados.

Talvez por um conservadorismo eu não consiga pensar que essa facilidade é positiva: de alguma forma, sinto como se o jogo estivesse atacando a nossa inteligência. Correndo o risco de ser romântico demais, no meu ponto de vista, a resolução de puzzles envolve mais etapas que apenas chegar à solução.

A jornada é um verdadeiro momento de aprendizado

O caminho que se percorre na tentativa de descobrir algo pode, muitas vezes, ser mais recompensador do que aquilo que você realmente ganha ao achar a solução. Basta pensar que foi por ter ficado empacado no Super Metroid que nasceu esse texto — quem me dera se todos os momentos em que travo nos jogos me fizessem escrever um texto!

Por fim, lembrar de Zelda Breath of the Wild nunca é demais. Esse título definitivamente é um dos melhores exemplos para falar sobre jogos que não te carregam pelo braço para mostrar uma solução.

A sensação de recompensa que temos ao encontrar algo novo quando não há um item hiper-realçado ou um ícone no minimapa é bem diferente. Nem importa se é apenas mais uma Korok Seed.

Outer Wilds e Tunic também são exemplos que merecem menção. Vale lembrar que parte da genialidade desses jogos vem justamente da liberdade que eles nos oferecem na exploração e na resolução de puzzles.

Todavia, isso tudo não passa de uma visão pessoal, para que seja um espaço de troca, preciso de saber o que outras pessoas têm a dizer. Sendo assim, o que vocês acham: estamos realmente ficando mais dependentes de guias?


Revisão: Juliana Paiva Zapparoli

Conhecido como Bebeto entre os amigos, sou recém-formado em Letras e amo literatura brasileira contemporânea. Além disso, tenho uma grande paixão por jogos retro, minha coletânea preferida é a de SNES. Oscilando constantemente entre o antigo e o moderno, vou adquirindo um pouquinho de conhecimento na tentativa de ser menos ignorante.
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