Análise: Arzette: The Jewel of Faramore (Switch) é o suco mais refinado da comédia e absurdismo

Abraçando a insanidade dos jogos medíocres que lhe inspiram, é uma das maiores surpresas do mercado indie.

Nos tempos modernos, o humor tem virado uma cópia distorcida e bastarda do movimento artístico dadaísta, no qual o absurdo e nonsense reinam na cabeça dos artistas. Existe um velho ditado que diz que “ninguém sabe o que se passa na cabeça do palhaço”, em que as pessoas zombam e apreciam (ironicamente ou não) da mediocridade midiática. Seja pelo filme fracassado Morbius ou a tentativa patética de um jogo no personagem Gollum, o público aplaude o horror.


Vamos supor que algum fã lunático do infame filme Plan 9 from Outer Space quisesse fazer algo inspirado na obra, mantendo um visual cafona, com vestuário simples, ambientes obviamente falsos e de baixo orçamento mas com um roteiro conciso, efeitos interessantes e boa atuação. Arzette: The Jewel of Faramore segue a mesma linha de pensamento. Mas será que vale a pena? Entre no hospício, as coisas vão ficar estranhas.

Hotel? Mario

Com a criação da internet, o YouTube foi criado. E com a criação do YouTube, surgiu o YouTube Poop, vídeos em que o besteirol e insanidade reinavam, sendo que os ridículos jogos das franquias Mario e Zelda para o falido console Philips CD-i eram alguns dos mais famosos protagonistas na biblioteca. Arzette é uma homenagem a essas atrocidades culturais, aceitando o absurdismo dos jogos que presta tributo.

Na terra de Faramore, o terrível demônio Daimur tinha sido preso em um livro mágico graças aos esforços de Arzette (e nem tanto esforço do inútil “herói” Dail) dez anos atrás. No presente, o traidor Duke Nodelki livra o demônio e, ao lado de quatro apóstolos, roubam pedaços da joia mágica que uma vez aprisionou o lorde sombrio e cabe a Arzette enfrentar Daimur mais uma vez.

As Caras Malvadas

Desde que foi anunciado, Arzette prometia duas coisas: ter o mesmo estilo das abominações dos Zelda de CD-i e ser divertido. Uma ideia que poderia dar muito errado e virar mais um embaraço para a biblioteca dos jogos. Entretanto, o resultado final foi muito além do esperado. O jogo não é muito difícil, mesmo na dificuldade média e com vidas infinitas, mas a diversão é imensa com a facilidade de gameplay e pegar no ritmo das coisas. Cada nível é curto, mas o fator replay é imenso por conta das diversas sessões bloqueadas até Arzette conseguir os itens certos e encontrar todos os coletáveis.

Uma das partes mais impressionantes é conseguir misturar a feiúra dos jogos de CD-i, mas que ao mesmo tempo deixa os personagens carismáticos e divertidos. Inclusive tem partes do ambiente genuinamente bonitas e cutscenes com esforço para manter a história intrigante, mesmo que simples e levando na zueira.

Por falar nos personagens, Arzette é uma protagonista muito divertida, uma mistura da insanidade do mundo mas também a personagem mais pé no chão deste País das Maravilhas, reagindo com expressões hilárias de desconforto com os malucos mais bizarros. Cada um dos personagens coadjuvantes são icônicos, apresentando uma galeria colorida de esquisitos e abominações para rir e apreciar, cada um com sprites e personalidades únicas.

A Vara de Gamelon

É bastante visível o esforço da produção do estúdio Seedy Eye (pronúncia sendo, obviamente, CD-i; tem que tirar o chapéu para o comprometimento da equipe) não somente com a parte visual, mas também com o áudio. A dublagem dos personagens, trazendo atuações cheias de vida e exageradas, misturando perfeitamente com as abominações Lovecraftianas que os malucos viram em certas expressões. Inclusive, os dubladores originais de Link e Zelda estão de volta, fazendo pequenas pontas, evidenciando o carinho na criação do projeto. Inclusive o efeito sonoro de teletransporte é tirado diretamente de Hotel Mario e a pronúncia da moeda, Rubis, é como Rupees eram chamados nos Zeldas de CD-i.

A trilha sonora é fenomenal, com uma ambientação digna da década de 1990 e enaltecendo os mais variados ambientes. Seja uma planície pacífica ou um cemitério assustador, sejam cavernas profundas ou a cidade, cada nível tem sua própria música, fazendo cada ambiente se destacar por sua singularidade.

A tradução contém minúsculos erros de gramática e ortografia, bem como algumas sessões de plataforma podem ser frustrantes no começo, mas não são nada que atrapalhem a jogatina. Inclusive, estes erros podem até trazer um sentimento de genuinidade, em referência às adaptações porcas nos primórdios da legenda ou a dificuldade de jogos antigos (além que é fácil de pegar no jeito e aprender com os erros). E para quem acha que o jogo está muito fácil, a dificuldade difícil é desbloqueada ao final do game, além de um Boss Rush.

A Aventura de Arzette

Arzette: The Jewel of Faramore é o total oposto dos jogos que lhe inspiram. É divertido, contém esforço e, mesmo com as homenagens, consegue ser seu próprio produto. Uma ideia tão criativa, tão imaginativa e tão insana que deu certo, com promessa para mais conteúdo no futuro.

Se alguém ousasse fazer um filme de Plan 9 from Outer Space (e podem, já que o filme está em domínio público) com esse mesmo nível de esforço, apresentando algo brega mas genuinamente com esforço, então a lenda do cinema Ed Wood poderá descansar em paz. Até lá, Arzette detém o título de “Melhor Inspiração do Pior”.

Prós:

  • Níveis curtos e com alto fator replay;
  • Estilo artístico único e insano, lembrando perfeitamente o estilo horroso do CD-i mas com capricho;
  • Produção sonora de ponta, com dubladores associados ao material original e interpretações convincentes;
  • Humor de qualidade, fundindo zoação com ambientação;
  • Personagens únicos e protagonista carismática;
  • Tradução em português com qualidade;
  • Um tributo feito com carinho aos piores jogos da história;

Contras:

  • Pouquíssimos erros de português;
  • Algumas sessões de plataforma podem ser frustrantes.
Arzette: The Jewel of Faramore — PC/PS4/PS5/XBOXSX/Switch — Nota: 10
Versão utilizada para análise: Switch
Revisão: Vitor Tibério
Análise produzida com cópia digital cedida por Limited Run Games
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Formado em Publicidade e Propaganda na USC e especializado em Marketing Digital, sou Editor de Vídeos também, meu TCC foi sobre a Guerra dos Consoles e evolução da publicidade nos games. Jogo um pouco de tudo e também escrevo. Me descrevo como um artista.
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