Resenha

The Legend of Zelda: Twilight Princess em mangá: o final mais épico que os portadores da Triforce já tiveram (Vol. 10 e 11)

A conclusão digna de uma saga que dá voz e aprofunda os personagens para além do que já foi feito antes.


Chegamos ao final do mangá de The Legend of Zelda: Twilight Princess. Levou seis anos para a dupla de autoras Akira Himekawa chegar a esse ponto e tenho plena certeza de que a obra compensou o trabalho.

De agora em diante, a história corre solta na ação contínua em um grande clímax que traz todos os atores para o palco. Antes de passarmos a isso, vou apenas lembrar de que já escrevi antes sobre o tema principal deste clímax: o conflito eterno entre os três portadores da Triforce. Os links de todos os outros textos sobre mangás de Zelda estão no final.



Volume 10

O poder antigo 

Antes de morrer, Zant havia se vangloriado de que seu deus, Ganondorf, havia reassumido uma forma física e já estava no mundo da luz. Após salvar a cidade-que-guarda-a-fronteira-do-deserto, Link, Midna, Darpa, Rioma e Zeu partem para a luta final no castelo de Hyrule e avistam o enorme enxame de monstros convocados pelo rei-demônio para a batalha que esmagará o reino.
Himekawa aproveita a preparação da batalha para uma breve e última aparição de personagens que não participarão dela, como as crianças Luda, Colin e Talo, e também o príncipe zora, Ralis.
A princesa do Crepúsculo diz que sua magia de teleporte está pronta e os leva bem para o meio da luta nas ruas da capital, onde os cavaleiros de Hyrule estavam dando o sangue em um confronto fadado à derrota, liderados pela estóica Ashei, que segue ao lado do determinado Rusl. Ilia, Telma e Shad estão barricados no bar, protegendo crianças e cidadãos vulneráveis.



Vendo a colossal desvantagem numérica, Midna toma uma decisão drástica e invoca o poder do Cristal da Sombra, transformando-se em um gigantesco monstro elástico de sete tentáculos. Ela usa esse poder para invocar os seus súditos twilis que ainda estavam amaldiçoados no mundo da luz, virando a maré da guerra, e também para quebrar a barreira que envolvia o castelo de Hyrule, onde estão Zelda e Ganondorf.

Os cavaleiros invadem a fortaleza e mandam Link avançar para salvar a princesa hylian enquanto eles seguram as forças inimigas no pátio principal, mas é nesse momento que Midna perde o controle do poder antigo do Cristal da Sombra e agarra o herói, preparando-se para matá-lo. Ela o chama de rei-demônio, então fica implícito que sua consciência descontrolada confundiu o herói com o vilão porque ambos carregam a essência da Triforce.




Midna consegue se forçar a sair do Cristal e cai exaurida no chão, acolhida por Link. Auru, em sua obsessão de se opor ao Crepúsculo, comanda que os cavaleiros a matem, mas Link ergue sua espada contra eles, jurando proteger a companheira. O trio Darpa, Rioma e Zeu intervêm, testemunhando que o povo do Crepúsculo é um aliado que tomou conta da cidade quando foi transportada para a escuridão. Ashei repreende Auru e os cavaleiros, dizendo que eles só se levantam contra Midna agora porque querem esconder sua própria fraqueza ao enfrentar uma pessoa fragilizada.

Os cavaleiros decidem continuar a enfrentar os exércitos de Ganondorf, e Link deixa Midna aos cuidados de Rioma, se despedindo com um beijo no rosto antes de adentrar os muros sozinho. Ela quer seguir com ele, sabendo que o herói planeja dar a vida em sacrifício por todos, mas ainda está fraca para relutar.
Exceto pelas companheiras de Link (algumas inúteis, outras irritantes. Midna é a melhor), os jogos da série são aventuras solitárias em que o herói salva o reino e a princesa. Como já disse antes, um mangá não é restrito por essas convenções. Com a liberdade narrativa, Himekawa transformou o ápice da história em um grande conflito em que todos lutam pelo destino de Hyrule, não apenas os protagonistas, embora estes ainda carreguem o fardo maior.


O fim de Bulblin

Quando a situação aperta novamente e os soldados se veem encurralados pelos bokoblins, eis que ressurge Bulblin, que devasta os monstros, salvando os confusos guerreiros de Hyrule. Ele explica que encontrou Link, momentos antes, e declarou obediência ao herói, seu novo mestre, aquele que mesmo havendo morrido por seu machado, havia retornado e se provado o mais poderoso. “Eu sigo o mais forte. Fim da história”.

Sem pensar duas vezes, Link ordenou que Bulblin ajudasse seus amigos no portão do castelo, ao que ele obedeceu até a morte. Mais tarde, quando tudo terminar, veremos o corpo de Bulblin, cravejado de espadas e lanças, caído diante de algumas crianças e de Ilia, sua adorada, a quem morreu protegendo.

A Triforce face a face

Link finalmente chega ao salão do trono e encontra Ganondorf pela primeira vez, além de Zelda adormecida em sua prisão mágica. Finalmente, toda a Triforce está reunida, mas, quando Link ataca, é a princesa que se opõe a ele com sua espada. Com essa mudança no equilíbrio do triângulo, Ganondorf pretende obter a vitória final. Mesmo sabendo que aquilo é feitiçaria do maligno ladrão, Link não consegue contra-atacar a princesa, mas Zelda força o controle sobre seu corpo e aproxima a espada da própria garganta.




Subitamente, Midna surge no salão e usa o Cristal da Sombra mais uma vez, envolvendo a amiga em seus tentáculos para livrá-la da influência maldita. Pouco antes, três twilis haviam cedido à sua rainha suas forças vitais, sacrificando-se pela soberana, que agora podia voltar à luta.

Furioso, Ganondorf se transforma em uma fera que é a própria encarnação do ódio mais profundo, amplificado pela Triforce do Poder. Link responde à altura, usando sua raiva para assumir a forma de lobo e entrar em uma ferrenha luta de fera contra fera. Midna usa seu cabelo para segurar a cabeça do monstro, dando a chance de Link rasgar o peito da criatura com suas presas até arrancar-lhe o coração.



Volume 11

Enquanto alguns dos jogos tiveram direito a ter suas histórias contadas em um único volume, uma porção equivalente foi separada apenas para o duelo final contra Ganondorf, desde o castelo até o campo. Ou seja: zero pressa, o fim tem todo o espaço necessário para crescer até o clímax épico que condensa toda a alma da série The Legend of Zelda.

O duelo final

Link retorna à forma humana com o rosto coberto de sangue, Zelda recobra a consciência e abraça Midna, mas a alegria dura pouco, pois do corpo da fera brota a forma crepuscular de Ganondorf, uma esfera de fogo.

Midna dá um olhar para Link que ele entende ser de melancólica despedida, mas, antes que ele possa fazer qualquer coisa, a amiga se reveste do Cristal da Sombra mais uma vez para enfrentar o inimigo sozinha e transporta magicamente a dupla de hylians para um campo fora do castelo.



Enquanto se recuperam, um raio atinge as proximidades e dele surge Ganondorf sobre um corcel sombrio, brandindo o elmo de Midna alto para que seus inimigos o vejam e entendam o significado. Enfurecido, Link avança a pé contra ele, enquanto a atônita Zelda invoca os espíritos da luz, que concedem a ela um arco com quatro flechas.

Link para ao ouvir um relinchar e vê Epona correndo em sua direção (foi Ilia quem a soltou do estábulo algumas páginas antes, com a sensação de que Link precisava da égua). Ele monta junto com Zelda, e as duas montarias investem uma contra a outra. Ganondorf rebate três das flechas certeiras da princesa, mas a quarta acerta em cheio, abrindo a defesa do inimigo para um golpe da Master Sword que o derruba do cavalo.



Solenemente, Link desmonta de Epona e caminha até seu nêmesis, mandando-o levantar. Ambos querem uma vitória completa sobre o rival e segue-se um poderoso embate de espadas. Vendo que o herói começa a demonstrar cansaço, o gerudo esbraveja ameaças de que nunca será derrotado, pois o rei-demônio sempre retornará, e lutar contra isso é algo tão fútil quanto a Master Sword.

Em mais um pesado encontro de espadas, para a surpresa de todos, quem bloqueia Ganondorf é o Herói do Tempo em sua forma de esqueleto guerreiro. Ele diz que tudo o que vilão falou não passa de bravatas, uma vez que as flechas de luz minaram a magia do demônio e resta agora apenas o homem. Ambos golpeiam juntos e o Herói do Tempo diz que Link é como um filho que herdou suas técnicas. O jovem de verde tem em si a força necessária para continuar a luta.



Ganondorf se ergue mais uma vez e continua o duelo sangrento, enquanto Zelda aproxima-se do Herói do Tempo. As memórias da antiga Zelda habitam na nova como se fossem dela mesma, e a princesa se emociona com o reencontro, abraçando o guerreiro enquanto ele deixa aquele mundo, havendo finalmente cumprido seu dever.

O embate continua sob o pôr do sol com golpes que despedaçam o chão, enquanto as sombras caem ao redor. Link luta como se toda a sua existência servisse para enfrentar aquele inimigo que conhecia há tão pouco tempo e, ao mesmo tempo, há várias vidas.




Ganondorf ainda grita sobre a certeza da vitória, embevecido por seu poder. Link está em seu limite, quase cego e surdo de esforço, mas, de repente, ele percebe que seu último golpe feriu gravemente o tronco do adversário e reúne forças para um ataque final, que, enfim,  derruba o rival. Antes que o inimigo de Hyrule possa se reerguer, o herói crava a Master Sword em seu peito para selar o mal.

Link e Zelda assistem, perplexos, Ganondorf ficar de pé mais uma vez para amaldiçoá-los, profetizando que as trevas retornarão enquanto houver humanos infestando o mundo com sua cobiça por poder. Ele diz que aquela luta foi apenas o começo e se despede dizendo a Zelda que aguardará ansioso o momento em que se encontrarão novamente. Enfim, morre ainda de pé.



Himekawa se permitiu representar graficamente a ferocidade desse confronto mitológico de forças, um sentimento impresso nas feições e nas palavras do próprio Link, que não deixa de ser um herói por transbordar sua ira contra o inimigo de séculos.

Em particular, acho notável o trabalho com Zelda, que aparece tão pouco nessa história, mas sempre de forma marcante e com emoções profundas na beira da superfície, como se constantemente contivesse uma enorme onda prestes a romper.

Vejo isso na tristeza de seu olhar ao lamentar o destino do reino; na firmeza com a qual decide se sacrificar por Midna; na determinação direta da conversa com Ganondorf, sem jogos nem subterfúgios; na bravura de lutar contra ele com as flechas de luz, sem hesitar um instante; e, por fim, nas lágrimas de afeto de reencontrar o Herói do Tempo que só conheceu em outra vida.

Obrigado a Akira Himekawa por ter dado vozes, cores e nuances a personagens com os quais convivo desde criança. 

A despedida

Os espíritos da luz surgem no horizonte e trazem Midna com eles em sua verdadeira forma de rainha do Crepúsculo. Ela profere a mesma fala do jogo: “Bem, diga algo. Ou minha beleza o deixou sem palavras?” e, em vez de cortar a cena, o mangá mostra o que aconteceria depois: Link corre para ela e a abraça com força, lágrimas nos olhos de ambos.



Por toda Hyrule, as pessoas param de lutar, pois o exército da escuridão se dissipou. Eles sabem o que aconteceu: Link venceu.

Os hylians portadores da Triforce levam a convidada até o Território dos Juízes, onde o Espelho da Sombra a levará de volta a sua terra. Aquele espelho, eles concluem, não foi criado pelas deusas para punir criminosos mandando-os ao inferno, mas para aproximar os dois mundos que coexistem como faces da mesma moeda.

Midna concorda, mas lembra que luz e sombra não podem se misturar. Hyrule e o Crepúsculo deverão lembrar um do outro à distância para evitar que a história se repita mais uma vez.




Link corre até ela, na beira do espelho, e insiste que quer acompanhá-la. Ela primeiro dá um tapa no rosto dele pela insolência, lembrando da dinâmica dominadora de quando ela o encontrou transformado em lobo. Em seguida, ela o beija na boca, dizendo que aquele é um presente de seu verdadeiro ser. Surpreso, Link aceita o gesto e entende sua melancolia; aquele é o adeus que ela também não queria, mas fará por crer ser o melhor para os dois reinos.

A surpresa aumenta quanto Link e Zelda veem a outra pegar uma lágrima de seu rosto e fazê-la flutuar até o espelho, trincando toda a sua superfície, Enquanto Midna é sugada pelo espelho, o guerreiro põe um joelho no chão, em devota reverência à sua bela princesa do Crepúsculo. O espelho enfim se estilhaça, destruindo a ponte que levava de um reino a outro.

Eu não acho que toda história com casal de protagonistas tem que terminar em romance e até acho essa convenção hollywoodiana incômoda, de tão superficial. No entanto, neste caso eu achei muito adequada como expressão da intimidade que Midna e Link desenvolveram e da importância de um para o outro. É uma despedida que reflete os sentimentos pessoais, apesar da decisão final ser guiada.

Não há tensão sexual nem declarações amorosas porque elas não são necessárias para a devoção sincera que compartilham abertamente, ainda que haja uma aparente diferença de maturidade entre o jovem Link e a soberana do Crepúsculo, uma relação desigual que ela faz questão de deixar clara no final ao lembrar dos deveres de cada um para com seus reinos, tomar as decisões sozinha e também as iniciativas para os gestos de despedida.
O povo de Hyrule tenta se reconstruir e Zelda terá muito a fazer. Os feridos Darpa, Rioma e Zeu realizam seu sonho quando Ashei os convoca para as fileiras dos cavaleiros de Hyrule. Colin e Talo têm aulas de espada com Rusl, inspirados em seu herói e amigo. Ilia ainda espera na ponte de Ordon pelo retorno de seu amado, mas quem surge no lugar dele é Shad, que viajou até lá com a desculpa de estudar as estátuas antigas do bosque.



E Link? Ele leva a Master Sword de volta a seu pedestal para aguardar o dia em que Hyrule precisará que um novo herói a empunhe. Montado em Epona, ele avista o lobo dourado e o segue. Aonde vai, jamais saberemos; imagine como achar melhor.

O fim da lenda?

Espero que tenham gostado desta longa série. Com isto, já apresentei e comentei 20 volumes de mangás de Zelda criados por Akira Himekawa (e um por Shotaro Ishinomori), restando apenas escrever sobre dois contos das autoras e o volume de Majora’s Masks. Ficarão para a próxima vez.

Revisão: Cristiane Amarante

Admiro videogame como uma mídia de vasto potencial criativo, artístico e humano. Jogo com os filhos pequenos e a esposa; também adoro metroidvanias, souls e jogos que me surpreendam e cativem, uma satisfação que costumo encontrar nos indies.
Este texto não representa a opinião do Nintendo Blast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Escrevemos sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0 - você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.


Disqus
Facebook
Google