Concebida por Yoshihiro Togashi, Yu Yu Hakusho é uma série de mangá que acompanha a jornada de Yusuke Urameshi, um estudante que, de maneira inusitada, encontra a morte logo no primeiro capítulo. Entretanto, é oferecida a ele a chance de retornar à vida, sob a condição de assumir o papel de detetive espiritual, resolvendo questões causadas por demônios no mundo dos humanos.
Além do aclamado mangá e da icônica adaptação em anime, especialmente reverenciada no Brasil pela excelência de sua dublagem, que vai além de uma “simples” tradução, a obra de Togashi se aventurou no vasto universo dos videogames. Dentre os numerosos títulos, Yu Yu Hakusho: Tournament Tactics, lançado para o Game Boy Advance há quase duas décadas, destaca-se como um dos mais curiosos. Como o próprio nome sugere, trata-se de um RPG tático que se embasa no cativante arco do torneio das trevas.
Tô na área, se derrubar é pênalti!
Yu Yu Hakusho apresenta uma gama envolvente de características. Dentre suas virtudes, destacam-se a presença de antagonistas como Sensui e Toguro, cujas motivações transcendem a simples maldade inata; excelentes personagens de suporte, como Koenma, Botan e Keiko; o perspicaz senso de bom humor, acentuado pela maravilhosa dublagem brasileira; e o grupo de protagonistas formado por quatro indivíduos carismáticos, cujas diferenças se entrelaçam de maneira única.
Infelizmente, esses atributos não são explorados em Yu Yu Hakusho: Tournament Tactics, que se limita a nos oferecer apenas um breve resumo de que Yusuke é um detetive espiritual forçado a participar do torneio das trevas. Este campeonato é conduzido por pessoas gananciosas e envolve equipes de cinco membros, na sua maioria yokais, em disputas eliminatórias.
Embora seja baseado no arco do mangá, o jogo apresenta algumas pequenas alterações narrativas, mas nada que se destaque positivamente. Conforme discutiremos mais adiante, a escolha desse segmento específico é intrigante, considerando o grande número de indivíduos interessantes disponíveis para utilização; no entanto, a execução deixa a desejar.
Sejam bem-vindos, mas venham na maciota. Tá certo?
Yu Yu Hakusho: Tournament Tactics oferece os elementos mais básicos de um RPG tático. Em cada fase, somos apresentados a uma área composta por diversos quadradinhos nos quais podemos posicionar nossos personagens e utilizar suas habilidades.
Aqueles que conhecem a obra original estão cientes de que a equipe principal é formada por Yusuke, Kuwabara, Hiei, Kurama e uma misteriosa mulher mascarada (não está enganando ninguém, Genkai). No entanto, no decorrer do jogo, temos a possibilidade de recrutar outros aliados. Nesse sentido, nos é concedida certa liberdade para escolher quais membros utilizaremos em cada batalha.
O interessante é que as características individuais dos heróis foram, de certa forma, respeitadas, assim como suas técnicas distintas. Desta maneira, Hiei, por ser extremamente ágil, quase sempre terá vantagem em termos de turnos. Já Kurama, por sua vez, é capaz de realizar ataques a distância invocando plantas.
Como mencionado, outros personagens além dos cinco iniciais podem ingressar na equipe, com os destaques ficando por conta da irmã de Hiei, Yukina, e de Chu, o carismático beberrão que luta contra Yusuke. Enquanto Yukina brilha como uma ótima curandeira, Chu desempenha um papel incrivelmente eficaz como tank.
Também é importante ressaltar que cada indivíduo possui um considerável leque de habilidades, adquiridas gradativamente à medida que aumentam de nível. Nesse sentido, a cada novo level, ganhamos pontos que podem ser distribuídos entre os atributos dos heróis.
Além dos comandos básicos de ataques e movimentação, há pouquíssimas outras opções de ações, sendo a mais crucial aquela destinada à regeneração da energia espiritual, necessária para desferir golpes especiais. Essa falta de diversidade acaba tornando a maioria dos confrontos bastante acessíveis e até mesmo fáceis, uma vez que os adversários também não dispõem de muitas alternativas.
Controlar Yusuke e sua turma e utilizar as mesmas técnicas que eles usaram no anime é realmente uma experiência curiosa que consegue despertar agradáveis sentimentos de nostalgia. Infelizmente, esse potencial é subaproveitado com um preenchimento de conteúdo tristemente genérico.
Rapadura é doce, mas não é mole, não!
Apesar de o torneio das trevas abranger aproximadamente 40 episódios no anime e 60 capítulos no mangá, o grupo liderado por Yusuke enfrenta cinco equipes, o que, convenhamos, é um número de batalhas muito pequeno para preencher todo um RPG.
Para evitar que o jogo se tornasse excessivamente curto, os desenvolvedores optaram por dividir a campanha em áreas, cada uma contendo fases nas quais enfrentamos inimigos comuns e um estágio final no qual confrontamos o time adversário canônico.
Essa abordagem poderia ter sido mais aceitável se houvesse um esforço maior em sua execução. Contudo, infelizmente, todas as regiões oferecem desafios praticamente idênticos, com uma repetição absurda de monstros genéricos que nada remetem ao universo criado por Togashi.
Dessa forma, antes de chegarem às batalhas principais conhecidas do anime, os jogadores precisam enfrentar uma série de lutas monótonas. Além de ser extremamente chata e cansativa a obrigatoriedade de passar por esses confrontos, eles não fazem muito sentido narrativo, já que estamos em um torneio com chaveamento e grupos já definidos.
Em suma, Yu Yu Hakusho: Tournament Tactics é mais um exemplo de um jogo medíocre que dificilmente seria notado se não estivesse vinculado a um nome tão conhecido. Apesar de conseguir evocar alguma nostalgia por meio da caracterização dos personagens canônicos durante as batalhas, o restante da campanha é marcada por confrontos monótonos que não conseguem capturar a diversidade e profundidade do mundo criado por Togashi.
Ah, eu tô maluco!
Apesar de ser uma obra extremamente influente, Yu Yu Hakusho não teve tanta sorte nos videogames. Além de Yu Yu Hakusho: Tournament Tactics, diversos outros títulos foram lançados para diferentes plataformas, sendo a maioria deles jogos de luta e restritos ao Japão.
Embora alguns sejam até legais, como Yu Yu Hakusho: Sunset Fighters (Mega Drive), Yu Yu Hakusho: Tokubetsu Hen (SNES) e Yu Yu Hakusho: Forever (PS2), não creio que a série dispõe de algum representante que incontestavelmente faça jus ao seu nome, ao contrário de obras como Dragon Ball ou Naruto, que possuem não apenas um, mas alguns ótimos games.
Com a recente (e no mínimo questionável) série live-action trazendo certa atenção à criação de Togashi, além de diversos animes estarem recebendo jogos interessantes ultimamente, quem sabe não esteja chegando o momento de finalmente ganharmos um título à altura da jornada de Yusuke, Kuwabara, Hiei e Kurama.
Revisão: Juliana Paiva Zapparoli