Lançado em 1995 para o Super Nintendo, Lufia II: Rise of the Sinistrals é uma prequela de Lufia & The Fortress of Doom, ocupando o primeiro lugar na cronologia da série. Com inovações notáveis na jogabilidade e uma narrativa habilmente elaborada, este título não apenas supera seu antecessor, mas se estabelece como o ápice da franquia e um dos melhores RPGs que o nostálgico SNES tem a oferecer. No entanto, lamentavelmente, ele nunca alcançou a mesma popularidade dos clássicos desse console.
Nos primeiros minutos de Lufia & The Fortress of Doom, testemunhamos quatro destemidos guerreiros — Maxim, Guy, Selan e Artea — enfrentando e vencendo os Sinistrals, entidades poderosas e quase divinas que ameaçam a existência da humanidade.
Após essa introdução, o jogo dá um salto de cerca de 100 anos no futuro, colocando-nos no controle de um descendente de Maxim. Ao lado de uma garota chamada Lufia e outros dois aliados, esse jovem embarca em uma aventura que culmina em um novo confronto contra os Sinistrals, misteriosamente ressuscitados.
Compreender esse contexto é crucial, pois Lufia II: Rise of the Sinistrals coloca-nos precisamente no papel de Maxim, revelando tudo o que ocorreu antes do início de Fortress of Doom. Essa abordagem é intrigante e ousada, considerando que, teoricamente, o desfecho do segundo título é a introdução do primeiro.
Felizmente, os desenvolvedores conseguiram criar uma história envolvente, capaz de manter nossa imersão durante todo o tempo. Mesmo para aqueles que desbravaram o início do primeiro Lufia e, de certa forma, têm conhecimento do final de Lufia II, a exploração minuciosa da jornada que os heróis trilharam até esse ponto revela-se uma experiência incrivelmente satisfatória.
A trama não é revolucionária ou incrível; pelo contrário: está repleta de clichês que vão de unilateralidade de pensamento e comportamento da maioria dos Sinistrals (um deles é especial, fique de olho!) à existência de uma espada lendária que permitirá que o herói escolhido vença os poderosos antagonistas.
Contudo, os personagens que compõem o elenco jogável são muito interessantes, e a singularidade de cada indivíduo contribui para que os momentos de interação entre eles sejam especiais. Além dos quatro protagonistas que enfrentam os vilões no desfecho, outros integram o grupo de forma rotativa, e, por serem igualmente cativantes, suas ausências são notáveis e deixam saudades.
Apesar de possuir pontos previsíveis, a trama não deixa de demonstrar maturidade em alguns momentos, especialmente considerando a época de seu lançamento. Exemplos notáveis incluem aliados se casando e formando uma família; cidades sendo completamente destruídas, resultando na morte de diversas pessoas; e heróis enfrentando sentimentos de incerteza, medo e ciúmes, o que os ajuda a amadurecer. Assim, mesmo seguindo uma premissa batida, o roteiro consegue introduzir elementos complexos que adicionam uma camada de profundidade ao enredo.
Um RPG recheado de puzzles
Além de aprimorar os sistemas de seu antecessor, como a eliminação da irritante e datada mecânica que fazia o personagem errar um ataque caso seu alvo morresse antes do golpe ser desferido, Rise of the Sinistrals introduz várias inovações que enriquecem a experiência de jogo, tornando-o extremamente divertido.
Assim como na maioria dos RPGs mais antigos, aventuramo-nos em um gigante mapa que nos permite visitar diversas áreas internas como cidades, castelos, cavernas, torres e fortalezas. Nessa área externa, os encontros com inimigos acontecem aleatoriamente; contudo, dentro das masmorras, conseguimos visualizar os monstros vagando pelo cenário.
Essa característica não apenas reduz consideravelmente o número de encontros indesejados, já que passamos muito mais tempo dentro do que fora dos calabouços, mas permite que o jogador utilize os inimigos a seu favor para resolver alguns quebra-cabeças. A presença e qualidade dos enigmas, aliás, é, sem dúvida, o aspecto que melhor define Lufia II.
Rise of the Sinistrals apresenta um número altíssimo de masmorras, e, em cada uma delas, diversos puzzles a serem resolvidos. Nesse sentido, há uma certa similaridade com os jogos 2D da franquia The Legend of Zelda, pois as dungeons são divididas por áreas interligadas e a maioria delas possui um desafio a ser superado. Além disso, cada uma delas contém uma sala final com um chefe, trancada por uma chave específica.
Mover estruturas e plataformas, apertar botões em sequências corretas, combinar objetos coloridos e caminhar por trajetos específicos são apenas alguns exemplos mais básicos dos enigmas que o game oferece. Nesse sentido, posso afirmar que a esmagadora maioria desses desafios é incrivelmente bem planejada e oferece uma grande satisfação ao ser resolvida.
Outro aspecto presente que se assemelha às aventuras de Link é a aquisição e uso de ferramentas como bomba, flecha e gancho, que, dentre outras funções, servem principalmente para interagir com certos mecanismos e desbloquear pontos específicos da zona.
Como mencionei mais acima, podemos utilizar a capacidade de visualizar os monstros vagando pelo cenário em nosso favor. Isso ocorre porque a movimentação das criaturas é semelhante à dos títulos de Mystery Dungeon, ou seja, a cada passo ou ação que nosso personagem realiza, os adversários também se movimentam uma vez.
Dessa forma, em quebra-cabeças que precisamos manter botões continuamente pressionados e não dispomos de objetos na área para esse fim, conseguimos atrair um inimigo até o local e paralisá-lo por um tempo com o uso da flecha ou gancho.
Essa característica de cada ação se assemelhar a um turno também se aplica aos objetos e até mesmo às explosões de nossas bombas, o que é considerado por muitos enigmas, exigindo que o jogador pense bem os seus passos para superar as barreiras.
Ainda sobre as masmorras, um dos pontos que critiquei sobre Fortress of Doom é o fato de a maioria delas serem praticamente cavernas iguais. Nesse sentido, é verdade que Lufia II possui uma diversidade visual muito maior; contudo, por existirem muitas dungeons, algumas delas inevitavelmente acabam sendo semelhantes.
Apesar disso, o jogo nunca passa a sensação de repetição, pois, ainda que estéticamente parecidas, cada área é completamente única devido aos quebra-cabeças que elas ostentam, fazendo com que a exploração possua um excelente frescor durante toda a campanha.
Um sistema de combate cheio de opções
As batalhas em Lufia II compreendem as características fundamentais de muitos RPGs da época, inclusive do seu antecessor. Assim, os confrontos seguem o formato por turnos e a ordem de ataque é determinada pela velocidade dos personagens.
O interessante é que os heróis também diferem bastante entre si durante as lutas, com alguns tendo mais propensão às habilidades mágicas enquanto outros sequer possuem MP. Nesse sentido, devido ao grupo ser rotativo durante a jornada, há situações em que a estratégia formulada pelo jogador deverá ser mudada, já que um ou outro indivíduo deixará ou ingressará na equipe.
Outro aspecto fascinante com respeito aos embates diz respeito à mecânica de IP. Esse sistema apresenta uma barra que é preenchida conforme o personagem sofre dano, permitindo que ataques poderosos sejam desferidos quando a quantidade necessária fica disponível.
Ocorre que esses golpes são inerentes às armas, armaduras e acessórios, ou seja, grande parte dos equipamentos possui uma habilidade de IP diferente. Essa abordagem faz com que nem sempre um equipamento com valor superior seja melhor em determinada batalha, pois um item de força inferior pode conter uma skill que se encaixa melhor naquele momento.
Para exemplificar, pode ser benéfico utilizar uma espada com IP de um poderoso ataque de fogo para enfrentar um chefe que possua fraqueza contra esse elemento, mesmo que seu valor base seja consideravelmente inferior em comparação a outras disponíveis naquele ponto do jogo.
Os sete monstrinhos
Além de todas essas possibilidades estratégicas, ainda há mais uma mecânica relacionada ao combate que precisa ser mencionada: o capsule monster. Em Lufia II, podemos contar com a ajuda de um quinto parceiro no grupo, sendo este um monstrinho controlado completamente por IA. Existem sete dessas criaturas e cada uma delas é diferente da outra, tanto em aparência quanto em habilidades.
É relevante ressaltar que cada um desses bichos possui quatro estágios evolutivos. Para atingir os três primeiros, devemos alimentar nossos companheiros com equipamentos, sendo que cada nova forma requer itens progressivamente mais raros. Já para atingir o último nível, o monstrengo precisa comer um item específico, que geralmente é mais difícil de ser adquirido e exigirá um esforço muito maior do jogador.
Se as individualidades de cada personagem e a variedade de habilidades somadas às skills de IP já tornam o combate de Lufia II bastante rico, o capsule monster aumenta ainda mais as possibilidades estratégicas, já que cada monstro representa um elemento diferente, o que, naturalmente, o faz ter vantagem e desvantagem contra determinados tipos de inimigo.
Curiosamente, essas criaturas estão escondidas pelo mundo do jogo, tornando completamente possível que um jogador, ao não explorar além do necessário, conclua a campanha sem sequer ter conhecimento da existência dessa mecânica.
Uma joia do Super Nintendo
Com uma narrativa simples, mas bem-executada e uma jogabilidade incrivelmente rica e divertida, que incorpora elementos de diferentes gêneros, Lufia II: Rise of the Sinistrals se destaca como uma verdadeira joia que merece ser lembrada e admirada. Embora não tenha alcançado a mesma popularidade dos RPGs mais consagrados do Super Nintendo, este título, certamente, não fica atrás.
Revisão: Juliana Paiva Zapparoli