Misturando os típicos elementos dos RPGs da consagrada desenvolvedora japonesa (responsável pela franquia Final Fantasy, entre várias outras) com a movimentação, ambientação e o bom humor do herói do Reino do Cogumelo, Super Mario RPG vem encantando gerações de jogadores desde o seu lançamento até os dias de hoje. Demorou 27 anos, mas finalmente é possível apreciar este importante título da história dos videogames em sua melhor forma (e em alta fidelidade) no Nintendo Switch.
Poucos jogos possuem um título que consegue ser tão autoexplicativo quanto Super Mario RPG. Todas as expectativas que você poderia ter sobre o conteúdo e a forma são respondidas automaticamente pelo próprio nome da obra. Hoje em dia, após uma boa variedade de títulos das séries Paper Mario e Mario & Luigi, já não é tão estranho associar o bigodudo às batalhas de turno dos RPGs; porém, isso só acontece por causa do grande precursor que preparou o caminho. Existem vários RPGs do Mario, mas só existe um Super Mario RPG.
A principal característica que cimentou a identidade dos RPGs do encanador é sem sombra de dúvidas a ambientação. Esse é um jogo leve, colorido, agradável e que raramente se leva a sério. É fácil de dizer que ele é um exemplar do gênero perfeito para crianças, quase como um “Meu Primeiro RPG”. Isso não quer dizer que o título é infantil no sentido de ser bobo ou simplório, muito pelo contrário. A questão está mais relacionada ao espírito da aventura. A sensação é de algo que pertence facilmente ao imaginário infantil, o que acaba tornando o jogo mais acessível do que a maioria dos RPGs.
O aspecto de visão isométrica no estilo maquete, similar ao mundo de Captain Toad: Treasure Tracker, abriga com perfeição os personagens pequenos e cabeçudos que poderiam facilmente ser — ou literalmente são — bonecos. Há um momento da história em que um pequeno Toad brinca de forma empolgada com bonequinhos de Mario, Bowser, Peach e Geno (um personagem original famoso por ser incrivelmente descolado) e acredito que esse momento emula a experiência do próprio jogador de Super Mario RPG. Esse pequeno mundo meticulosamente decorado busca inspirações no fascínio dos contos de fadas e na criatividade e ingenuidade da infância.
Brincar com esses personagens é nostálgico e divertido do começo ao fim. A nostalgia me afeta diretamente, é claro, como alguém que jogou o título original. No entanto, tenho uma forte impressão de que essa sensação consegue ser produzida em qualquer um que coloque suas mãos nesse remake. No mínimo, a altíssima fidelidade dessa nova versão em relação a sua matéria-prima traz um momento especialmente nostálgico da história dos videogames para os tempos modernos. É impossível escapar do conforto que esse mundo desenvolve ao seu redor e é bem difícil desejar sair dessa nova realidade.
Infelizmente, o remake não entrou na nova limitada lista de títulos da Nintendo que estão sendo localizados para o nosso português brasileiro. Eu joguei — e fiquei totalmente encantado — por Super Mario RPG quando era criança nos anos 1990; no entanto, outro aspecto-chave da identidade do game se perdeu um pouco para mim e tantos outros jovens brasileiros que não falam inglês: a comunicação.
Preciosas interações
Super Mario RPG é divertido, começando pelo próprio protagonista, o bastante familiar Mario. Mesmo assumindo o tradicional papel de herói silencioso da maioria dos RPGs, essa versão do encanador esbanja personalidade: além de bastante expressivo em geral, Mario tem o maravilhoso hábito de relatar os eventos da trama para os NPCs enquanto interpreta o que aconteceu como se fosse uma mímica. É incrível como um personagem sem falas consegue se destacar tanto durante a história.Outro ponto interessante é que o mundo ao redor sempre age de forma apropriada na presença do famoso campeão do Reino do Cogumelo. Mario é naturalmente uma figura famosa e reconhecida pela população aonde quer que vá. Uma piada constante que costuma acompanhar as reações dos NPCs ao conhecer o herói está relacionada à sua renomada habilidade de saltar muito alto. Ver os habitantes desse mundo pedindo para que Mario pule alto para provar sua identidade nunca perde a graça.
Um personagem que rouba quase todas as cenas em que está presente é o próprio rei dos Koopas, Bowser. O arqui-inimigo do bigodudo encontra razões na narrativa para se unir ao grupo principal, no entanto considera todos eles seus lacaios — inclusive Mario.
Corrijam-me se eu estiver errado, mas o Bowser de Jack Black não existiria se Super Mario RPG não tivesse desenvolvido a fundação do comportamento do personagem. É muito satisfatório e hilário acompanhar o brutamontes e sua personalidade gigante ao longo da aventura; o contraste com o silêncio constante de Mario é excelente, e Bowser se torna o membro mais memorável dos heróis da trama.
Corrijam-me se eu estiver errado, mas o Bowser de Jack Black não existiria se Super Mario RPG não tivesse desenvolvido a fundação do comportamento do personagem. É muito satisfatório e hilário acompanhar o brutamontes e sua personalidade gigante ao longo da aventura; o contraste com o silêncio constante de Mario é excelente, e Bowser se torna o membro mais memorável dos heróis da trama.
A campanha, por sinal, é simples e bem direta ao ponto — como era típico em RPGs mais antigos —, porém o desenvolvimento da narrativa é cheio de nuances. A construção do mundo, os diálogos e a personalidade dos personagens compensa qualquer carência de complexidade por parte da narrativa. A história é perfeita para a proposta dessa obra curta e em geral pouco desafiadora.
Com muito esforço, consegui somar pouco mais de 20h fazendo absolutamente tudo no jogo, só que Super Mario RPG é claramente sobre a jornada, não o destino. A vontade de continuar existindo nesse mundo é grande, mas, como em qualquer conto de fadas, uma hora o encanto acaba — e existe valor em uma experiência enxuta e que vai direto ao ponto.
O título não deixa de acrescentar o seu próprio tempero a um sistema de batalha de turnos já bastante conhecido dos veteranos do gênero. Aqui entra outra peça chave da criação da identidade de todos os RPGs estrelando o bigodudo: os action commands.
Mario em turnos
Mecanicamente, Super Mario RPG também não se complica muito. A personalidade de Mario permanece intacta, completa com seus famosos pulos e alguns trechos de plataforma para você utilizá-los da melhor forma. O desafio não se compara aos títulos tradicionais do personagem, mas esses momentos oferecem uma quebra de expectativa interessante em um RPG focado em combate.O título não deixa de acrescentar o seu próprio tempero a um sistema de batalha de turnos já bastante conhecido dos veteranos do gênero. Aqui entra outra peça chave da criação da identidade de todos os RPGs estrelando o bigodudo: os action commands.
Depois de experienciar os tradicionais turnos do gênero com a presença desse artifício, que consiste na maioria das vezes em pressionar o botão de ação de forma precisa para atacar e defender, é difícil voltar ao jeito mais tradicional de batalhar em RPGs. Ainda por cima, o remake consegue aumentar ainda mais a importância de um dedo rápido no gatilho, recompensando formidavelmente uma boa utilização da mecânica — tanto para o ataque quanto para a defesa.
O problema é que os action commands são tão eficientes que diminuem consideravelmente a dificuldade de um jogo que já não é muito complicado. No remake, acertar o pressionar do botão perfeitamente durante o ataque faz com que o ataque básico ganhe uma área de efeito e acerte todos os inimigos; já durante a defesa, alcançar a sincronia perfeita simplesmente cancela 100% do dano que você poderia receber.
A eficiência da mecânica também simplifica a gama de possibilidades dos combates, de certa forma. O ataque básico se torna tão eficiente que, na maior parte do tempo, não faz sentido gastar Flower Points (basicamente o MP, os pontos mágicos) para usar as habilidades especiais dos personagens. Com um leque de possibilidades interessantes de magias elementais, buffs e debuffs, é uma pena que a opção de combate mais simples seja a melhor durante 90% da experiência.
Outra nova adição que facilita ainda mais as batalhas é a possibilidade de trocar os membros ativos do seu grupo na batalha a qualquer momento sem perder um turno inteiro no processo. Não me leve a mal: a mudança é extremamente bem-vinda e adiciona um grande nível de fluidez e dinamismo aos combates, mas também aumenta consideravelmente a sua sensação de segurança. Quando você não perde uma ação trocando de personagem, é muito fácil curar seus amigos, reviver alguém ou até acertar o ataque final em algum inimigo sem nenhum tipo de consequência.
Por fim, há ainda mais uma mecânica que, embora acrescente complexidade ao combate, também facilita muito a progressão geral: os ataques superpoderosos entre trios de personagens que acontecem em uma linda cutscene e podem ser ativados após você carregar uma barra de energia com o tempo. Dependendo da combinação de personagens, esses ataques possuem efeitos diferentes, como curar, proteger e atacar um ou mais alvos com dano físico ou mágico.
O papel de um remake
É difícil definir qual é o dever de um remake. Certamente algumas pessoas dirão que a versão de Switch de Super Mario RPG poderia ter ousado mais, criado mais conteúdos inéditos e alterado a jogabilidade-base de alguma forma especialmente inovadora. O resultado, no entanto, é uma experiência praticamente idêntica à do título original de Super Nintendo — e isso não é necessariamente um problema.O jogo inegavelmente cumpre o papel de ser visualmente fiel às memórias do que ele parecia ser em 1996; ou seja, revisitar o original hoje em dia é essencialmente muito diferente das memórias de uma criança impressionada com os gráficos da época. A nova versão, porém, se assemelha mais a essas lembranças do que o seu próprio predecessor.
Eu não conseguiria imaginar outro visual ou jogabilidade para este remake. Mario ainda se mexe de uma forma um tanto antiquada e o número de detalhes dos cenários, objetos e personagens ao seu redor não é muito grande, mas o sentimento permaneceu totalmente intacto. O prazer de abrir a caixa de brinquedos e se divertir com esses “bonecos” tão familiares continua — e a experiência é honestamente um deleite visual a quase todos os instantes.
É inegável que o título foi modernizado. As mudanças mecânicas citadas acima já são o bastante para concretizar o remake como uma experiência única que pode ser aproveitada separadamente da original. Infelizmente, algumas dessas adições tratam de deixar ainda mais fácil um jogo que é curto e direto em sua execução, mas eu diria que o balanço geral aponta que vale a pena dar uma bela chance à nova versão desse clássico RPG.
Embora não seja muito, o remake possui um conteúdo pós-jogo totalmente inédito e que aumenta de forma significativa a dificuldade. Não espere por uma trama intrincada e extensa após os créditos rolarem, mas é possível enfrentar alguns inimigos importantes novamente em versões poderosas e bastante criativas. Essas batalhas não têm medo de brincar com as mecânicas do título e é uma pena que elas apareçam tão tarde na trama. Seria interessante um maior número de alterações nas batalhas de chefão durante a narrativa principal, por exemplo.
Embora não seja muito, o remake possui um conteúdo pós-jogo totalmente inédito e que aumenta de forma significativa a dificuldade. Não espere por uma trama intrincada e extensa após os créditos rolarem, mas é possível enfrentar alguns inimigos importantes novamente em versões poderosas e bastante criativas. Essas batalhas não têm medo de brincar com as mecânicas do título e é uma pena que elas apareçam tão tarde na trama. Seria interessante um maior número de alterações nas batalhas de chefão durante a narrativa principal, por exemplo.
A nova gravação da trilha sonora também não decepciona. A compositora original Yoko Shimomura voltou para trabalhar em novos arranjos para as clássicas faixas originais e também há uma opção de alternar entre as canções de SNES e os novos arranjos a qualquer momento no menu. Eu teria gostado de uma forma de trocar entre as duas versões que não estivesse escondida em algumas pressionadas de botão dentro do menu, mas o problema não é assim tão grave. Eu aconselho apreciar e comparar os temas clássicos com os novos arranjos sempre que você lembrar.
No campo das más notícias, como é típico do nosso console híbrido, alguns slowdowns bem desagradáveis ocorrem em certas horas, principalmente dentro das cidades; no entanto, isso afeta muito pouco a experiência final. Em geral, a performance se mantém em 60 quadros por segundo durante quase todo o jogo.
A versão definitiva de um clássico
Super Mario RPG resgata de forma efetiva as sensações produzidas pelo título original e traz de volta um clássico imortal do Super Nintendo em grande estilo. Embora a aventura não seja muito longa ou desafiadora, ela mostra o seu valor por meio de um mundo leve e bem-humorado, ótimos personagens, mecânicas interessantes, uma série de pequenas melhorias e até alguns conteúdos totalmente inéditos após o encerramento da trama principal. As novas gerações agora têm uma chance melhor de não deixar este clássico passar — e se você lembra dele com carinho, com certeza vale a pena revisitá-lo.Prós
- Visualmente muito agradável;
- Novos conteúdos, cutscenes e mudanças gerais interessantes;
- Novos arranjos para a trilha sonora;
- Um grande clássico da indústria pode ser facilmente acessado novamente.
Contras
- Sistema de avaliação poderia ser melhor e mais dinâmico;
- Nível de desafio baixo em geral;
- Poucas mudanças significativas e novos conteúdos;
- Algumas quedas de quadros por segundo em certos momentos.
Super Mario RPG - Nintendo Switch - Nota: 8.5
Revisão: Davi Sousa
Análise produzida com cópia digital cedida pela Nintendo
Análise produzida com cópia digital cedida pela Nintendo