Todo mundo já “sofreu” com o vazio que fica após terminarmos aquele jogo sensacional e vir a carência de algo que sequer chegue perto do que acabamos de vivenciar. Uma das alternativas mais comuns é justamente procurar substitutos que até podem nos entreter, mas que sabemos que não são a mesma coisa.
Essa foi a exata sensação que eu tive com Knight vs Giant: The Broken Excalibur, desenvolvido pelo Gambir Studio e publicado pela PQube. Esta reimaginação da lenda do rei Arthur e os Cavaleiros da Távola Redonda é bem-humorada e competente em evocar a satisfação típica dos roguelites, o que, infelizmente, não compensa tanto seus tropeços.
É nisso que dá passar um briefing incompleto
Quem já se deparou com qualquer obra originária ou inspirada na literatura arturiana está familiarizado com a história do lendário monarca, seu reino Camelot e seus fiéis cavaleiros, além, é claro, do competentíssimo mago Merlin. Acontece que, na trama de Knight vs Giant, ele não é tão competente assim.
Ao mandar Arthur e os Cavaleiros da Távola Redonda na manjada busca pelo Santo Graal, o feiticeiro se esqueceu de avisar sobre os perigos de manusear o artefato indevidamente, o que ocasionou “apenas” no despertar de uma criatura conhecida como o Gigante do Vazio (Void Giant), que rapidamente elimina o rei e seus comandados e vira sua atenção para Camelot.
Sem saída, Merlin manda o Graal, fonte de poder do Gigante do Vazio, para a Dimensão Astral, uma dimensão paralela à nossa situada no meio do nada. O problema é que Camelot acaba indo junto e seus habitantes são mandados para diferentes áreas infestadas de criaturas malignas.
Com o poder que lhe resta (e sem revelar que foi tudo culpa dele), nosso senhor barbudo e trapalhão decide reviver seu líder para que ele possa derrotar o Gigante do Vazio e levar todos de volta à nossa dimensão.
Uma saga tão épica deveria durar um pouco mais
Knight vs Giant: The Broken Excalibur acerta ao seguir muitos dos passos tradicionais de um bom roguelite. Tudo começa com um tutorial rápido e simples, incluindo um tour pelo hub do jogo, que aqui é Camelot, naturalmente. Para a surpresa de ninguém, controlamos Arthur em sua jornada para acabar com o Gigante do Vazio. Como desgraça pouca é bobagem, a lendária espada Excalibur também foi vítima do massacre e agora está destruída.
A solução está em nossos leais súditos, cujos espíritos nos emprestarão suas lâminas e habilidades, localizados em suas respectivas estátuas na praça central de Camelot. Um detalhe bacana é que podemos combinar a arma de um guerreiro com o poder de outro, expandindo bastante o leque de possibilidades criativas, com diferentes estilos de combate.
A trajetória até o Gigante do Vazio não é lá muito longa, consistindo em apenas três ambientes: a Floresta Brochalant, o Deserto Sarrache e o Vulcão Suidhe. Cada cenário tem duas fases, concluídas após previsíveis batalhas contra chefões, e todo o processo de uma run completa, incluindo o confronto final, não leva mais do que uma hora em média.
É claro que eliminar a misteriosa criatura colossal não é a única tarefa em nossas mãos. Os cidadãos que agora se encontram perdidos na Dimensão Astral também são de nossa responsabilidade. Podemos encontrá-los aleatoriamente em salas criadas unicamente com esse fim e mandá-los para a segurança do reino.
E por falar em Camelot, não adianta mandá-lo de volta se ele estiver completamente destruído. Portanto, cabe a nós restaurar as áreas do reino para devolvê-lo à sua antiga glória. Para isso, nos deparamos também com criaturinhas enigmáticas que farão as vezes de construtores, aprimorando instalações que nos serão úteis.
Muitos desses cidadãos são peças valiosas no combate às criaturas da Dimensão Astral. Figuras como o ferreiro, que aprimoram as armas que pegamos emprestadas, facilitarão muito o nosso trabalho; alguns personagens, no entanto, permanecem nas zonas de perigo para prestar serviço a Arthur durante a peleja. É o caso do Mercador, que vende itens de efeito prático, como aumentar nosso HP máximo, ou Morgana, que oferece um benefício aleatório junto de uma maldição também aleatória.
A estranha combinação de simplicidade e complexidade
Após o primeiro triunfo, vem a notícia de que não retornaremos à nossa dimensão. Sem entrar em detalhes sobre o enredo, descobrimos que será necessário superar o Gigante do Vazio mais de uma vez para alcançar um final feliz — pelo menos é nisso que Merlin acredita.
Eu entendo que a parte de ação da gameplay de Knight vs Giant tenha sido planejada nesse formato para incentivar a rejogabilidade por meio de sucessivas tentativas rápidas, mas o resultado, na prática, acabou ficando simples demais, tornando a jogatina repetitiva após pouco tempo.
O loop de passar pelas mesmas seis fases e derrotar os mesmos gigantes, com o mesmo chefão final, não prende o interesse por tempo suficiente para que realizemos tudo que o jogo espera, como restaurar Camelot por completo ou até mesmo derrotar o Gigante do Vazio múltiplas vezes. A gameplay fica cansativa muito antes disso.
A trilha sonora é outro peso que nos afunda em direção à exaustão, com uma única faixa para cada ambiente. A consequência não poderia ser outra que não um aborrecimento com a mesma sequência de melodias, que não chegam a ser ruins, mas que obviamente não se beneficiam nem um pouco deste repertório minúsculo.
É até interessante observar esse paradoxo de termos ao mesmo tempo um roteiro extremamente simples, mas que impõe umas boas horas de esforço para concluirmos todos os desafios e tarefas existentes. A combinação não deu tão certo, e uma forte prova disso é o próprio desbloqueio das estátuas dos Cavaleiros da Távola Redonda, cujo kit de arma e habilidade é primordial para dar frescor à gameplay.
Não vou me alongar muito na explicação, mas o processo para pelo menos começarmos a reconstrução da primeira estátua além das duas disponíveis inicialmente é desnecessariamente complicado, envolvendo passos como resgatar a funcionária do reino apropriada; restaurar e aprimorar seu local de trabalho; e encontrar um objeto do cavaleiro correspondente para despertar seu espírito. É uma atividade ridiculamente prolongada, fazendo com que não seja nada estranho se você decidir abandonar o jogo antes mesmo de reformar uma única estátua.
Todo reino tem sua salvaguarda
Enquanto não chega a hora de nos cansarmos, quero deixar bem claro que The Broken Excalibur não deixa de ter seus méritos. A dupla de estátuas disponíveis desde o começo já rende um entretenimento razoável, e caso você tenha resiliência para superar a robusta barreira inicial que é o desbloqueio de novos Cavaleiros da Távola Redonda, as possibilidades se expandem ainda mais.
Além da arma e da habilidade própria de cada personagem, encontramos ao longo das fases estátuas dos cavaleiros cujos espíritos foram selecionados para nos acompanhar. Dentro delas, podemos escolher uma bênção, que nada mais é do que um benefício para o equipamento correspondente. Esses buffs também podem ser encontrados aleatoriamente em Távolas Redondas espalhadas por aí.
Nesse sentido, o fato de as runs serem curtinhas joga a nosso favor, pois não demora para evoluirmos o suficiente para trucidar os inimigos e limpar áreas em poucos segundos com a combinação de equipamentos de nossa escolha. Essa é, sem dúvida, a parte mais satisfatória do jogo — até porque não resta muito para fazer além de bater nos monstros e reconstruir Camelot.
Quando os sentimentos errados são evocados
Knight vs Giant: The Broken Excalibur não chega a ser um jogo completamente dispensável. Ele entrega bons momentos de roguelite em uma interessante reimaginação da saga do Rei Arthur e os Cavaleiros da Távola Redonda, mas depois de poucas horas de jogatina, não pude deixar de sentir saudades da excelência de Hades e desejar que eu já tivesse sua sequência em mãos. Não é exatamente a reação que esperamos ter ao adquirir um jogo novo.
Prós:
- Adota muitos dos elementos tradicionais que fazem um bom roguelite, como o tutorial rápido e simples;
- Não demora para chegarmos ao ponto em que o combate se torna divertidamente satisfatório;
- A possibilidade de combinar armas e habilidades de diferentes cavaleiros acrescenta um excelente aspecto de criatividade ao expandir o leque de possibilidades de equipamentos.
Contras:
- Conta com apenas seis curtos estágios divididos em três ambientes, que rapidamente se tornam repetitivos;
- O loop de passar pelas mesmas seis fases e derrotar os mesmos gigantes, com o mesmo chefão final, não prende o interesse por tempo suficiente para que realizemos tudo que o jogo oferece;
- A trilha sonora é outra vítima da repetitividade, com apenas uma faixa por ambiente;
- A combinação de termos ao mesmo tempo um roteiro extremamente simples, mas que impõe várias horas de esforço para concluirmos todos os desafios e tarefas existentes, não funciona;
- O processo para desbloquear mais estátuas além das duas disponíveis inicialmente é desnecessariamente complicado.
Knight vs Giant: The Broken Excalibur — Switch/PC/Mobile/PS5/XSX — Nota: 6.5Versão utilizada para análise: Switch
Revisão: Juliana Paiva Zapparoli
Análise produzida com cópia digital cedida pela PQube Games