Análise: Front Mission 2 Remake (Switch) traz um clássico RPG estratégico de mechas pela primeira vez ao Ocidente

O segundo jogo dos remakes de Front Mission da Forever Entertainment mantém os problemas de seu antecessor.

em 23/10/2023
Originalmente lançado no PS em 1997, Front Mission 2 é um RPG estratégico que não chegou a ter um lançamento oficial em inglês. O título foi bem recebido no Japão, tendo vendido mais de 500.000 unidades na época, mas apenas o seu sucessor chegou ao Ocidente.

Mais de 26 anos se passaram desde então, e a Forever Entertainment continua a linha de relançamentos da série com Front Mission 2 Remake. Apesar de ser uma oportunidade de ouro para os fãs da franquia, temos aqui uma tentativa de ser tão fiel ao original que o resultado final é mais cru do que o ideal.

No fronte de um novo conflito

Vários anos após o Segundo Conflito de Huffman, Front Mission 2 mostra como uma nova disputa no país asiático de Alordesh (uma versão alternativa de Bangladesh) escala para uma guerra com múltiplos interesses em jogo. Começamos a história na visão de Ash, um ex-soldado de Alordesh que se tornou membro das tropas da O.C.U. após seu desligamento.

Porém, um dia, forças militares da República Popular de Alordesh decidem declarar a sua independência da O.C.U., atacando as bases instaladas em seu território. Sob as ordens de Ven Mackarge, alguns dos aliados presentes nessas áreas foram utilizados como reféns para exigir que suas demandas fossem atendidas.

Para apresentar mais a fundo o conflito, o jogo alterna perspectivas entre Ash e a capitã Lisa do Serviço Secreto da O.C.U. e seu grupo de inteligência, que têm como missão resgatar os prisioneiros de guerra. Aos poucos, mais detalhes secretos sobre o conflito vêm à tona e conseguimos entender como a situação é muito mais complexa do que pode parecer.

Assim como no caso de Front Mission 1st Remake, temos a opção de jogá-lo em português de Portugal, espanhol, inglês, italiano, francês, alemão, polonês, japonês e chinês. Não há nenhum tipo de dublagem, embora os personagens tenham animação de movimento labial. A qualidade dos textos traduzidos é geralmente aceitável, mas há algumas inconsistências e escolhas questionáveis de vocábulos.

Em inglês, um erro frequente era a inconsistência do nome de Ven.
Como tenho dificuldade em avaliar a qualidade de escrita em português de Portugal, fiquei alternando entre ela e o inglês durante meu tempo com o jogo. Em alguns momentos, a tradução em inglês chegou a ter erros que a versão em português evitou. Porém, especialmente nos menus, algumas escolhas de termos na edição lusitana dificultavam a compreensão como um todo.

Em termos de exploração da lore, gostaria de destacar a presença de uma espécie de internet arcaica. A Rede é uma forma de conseguir mais informações sobre os personagens e eventos da trama sem que a história precise gastar muito tempo com exposição. Vale a pena mergulhar nesse sistema para entender mais a fundo a trama.

Estratégia e uma boa dose de sorte

Assim como o primeiro jogo, Front Mission 2 é um RPG estratégico no formato tático, ou seja, cabe ao jogador controlar várias unidades e movimentá-las em mapas com grids retangulares. Cada personagem sob nosso comando pilota um robô humanoide gigante chamado “wanzer”, e as suas configurações farão diferença significativa no combate.

O primeiro aspecto que vale a pena destacar é a grande variedade de opções para customização. Cada robô é dividido em partes para perna, braços e corpo, sendo possível também equipar uma mochila para carregar itens e fazer modificações no computador que gerencia as suas habilidades. Com muitas peças disponíveis, armas e acessórios como escudos e lançadores de mísseis, cabe ao jogador equilibrar bem o peso do robô e do seu arsenal.

O combate é inteiramente baseado na quebra das partes dos adversários, sendo possível atingir as partes para efeitos distintos. Qualquer unidade aliada ou inimiga será eliminada se a peça do seu “corpo” for destruída, mas a perda dos braços leva à incapacitação dos equipamentos associados àquele lado e as pernas fazem uma diferença significativa para a evasão. O jogador não define quais partes irá atacar e até mesmo a ativação de suas habilidades passivas é aleatória, dando ao combate um pouco de imprevisibilidade, sendo possível que o fator sorte impacte muito significativamente as batalhas.

Em comparação com o jogo anterior, a principal adição de Front Mission 2 é o sistema de pontos de ação (PA ou AP). Cada unidade começa o seu turno com uma determinada quantidade de pontos que variam de acordo com vários fatores, como o nível de força da unidade e a proximidade de aliados. Cada quadrado de movimento custa um ponto de ação e os ataques e contra-ataques consomem valores diferentes.

Estar com o valor máximo de PA implica em mais precisão e capacidade de evasão, algo que também é afetado pelo posicionamento em áreas de vantagem por geoposicionamento (indicado como Geo pela interface do jogo). Dominando esses aspectos por meio de bons posicionamentos e ações comedidas para evitar esgotar a quantidade de PA disponível, o jogador pode aumentar significativamente as suas chances em combate.

Uma barreira informacional

O problema mais grave de Front Mission 2 Remake é o fato de que o jogo não evolui significativamente a apresentação de informações importantes para um formato moderno. No esforço por se manter fiel ao original, o jogo conta com abreviações pouco explicativas e menus que escondem informações importantes para o usuário.

Antes de atacar, podemos ver que armas e armaduras são associadas às siglas “P” (perfurante), “S” (choque) e “F” (fogo), que são os três tipos com os quais se alinham. Essa subdivisão é até explicada no tutorial no menu inicial do jogo e em batalhas opcionais pouco após as primeiras missões da campanha, mas o fato de que armas específicas podem combinar dois atributos dificulta o entendimento por conta própria e faz falta um menu de ajuda explicando os elementos de forma mais detalhada durante o próprio combate.

Nenhum dos elementos que compõem o estado dos pilotos e suas máquinas é detalhado e isso faz uma falta enorme em um jogo de cunho estratégico. Pior ainda é que não temos indicação de quantos pontos de AP consumimos a cada ataque e contra-ataque nem sobre a sobrevida esperada das nossas peças nesses menus. Se o jogador fizer uma defesa ou contra-ataque com o equipamento de um braço que está prestes a ser destruído, há uma grande chance de perder um armamento precioso por um erro bobo e evitável.

Até temos aqui um tutorial bem compreensivo, explicando todos os elementos fundamentais do jogo, porém não há nenhum material de apoio rápido e isso torna a experiência muito mais fechada para novatos do que ela deveria ser. Especialmente em se tratando de um remake, o ideal seria que o título fizesse um esforço significativo para garantir que os jogadores tenham todas as informações necessárias dentro do próprio combate.

Esse erro também se propaga para elementos como a evolução dos personagens, o desbloqueio de novas habilidades e o gerenciamento dos equipamentos. Como se trata de um relançamento de um jogo antigo sem modificações significativas nos seus sistemas, obviamente é possível encontrar guias e outros textos auxiliares que explicam todas as possibilidades de habilidades das unidades aliadas, mas o jogo em si deveria contar com esse tipo de informação mais claramente apresentada no jogo.

Outros detalhes

De forma geral, Front Mission 2 Remake apresenta uma ambientação sólida de drama militar e é uma renovação honesta do clássico de PS. Uma das poucas coisas que me incomodou no jogo foi a forma como as ilustrações exageradamente expressivas dos personagens fazem caras e bocas que nem sempre são apropriadas para os diálogos. O traço excessivamente detalhado era para dar um tom mais realista ao jogo, mas acaba tendo o efeito oposto e parecendo caricato por conta dessa incongruência.

Outro ponto menor, mas que considero que merece destaque, é a Arena. Em determinadas cidades do jogo, é possível participar de duelos opcionais para ganhar dinheiro. No primeiro Front Mission, mesmo que fosse um ganho mínimo, ainda era possível melhorar um pouco os atributos das armas dos aliados, mas, neste segundo, ganhamos apenas dinheiro.

Porém, a principal mudança é que agora podemos escolher entre batalhas solo ou em grupo e os combates solitários implicam em escolher cinco ataques a priori em vez de controlar diretamente a estratégia turno a turno. O resultado é um sistema que depende ainda mais de sorte, já que o robô pode ter o braço referente aos ataques selecionados decepado em um turno, levando a múltiplos momentos sem ação. Já ao escolher a opção grupal, o combate é mais similar a uma missão comum.

Como sempre costumo comentar em títulos que possuem boa carga textual, vale destacar que Front Mission 2 Remake não possui um log para registrar diálogos já vistos, o que piora um pouco a experiência de leitura. Há opções para pular algumas conversas (mas não todas) e cutscenes apertando B. No menu, também podemos ativar configurações para acelerar a movimentação dos robôs até o dobro, remover as animações de combate e utilizar a trilha sonora original em vez da versão nova do remake.

Por fim, a performance no Switch não tem grandes problemas. Há várias telas de loading, sendo elas especialmente comuns ao entrar em uma nova área ou na área de configuração dos wanzers, mas elas não chegam a ser um grande incômodo.

Uma roupagem aceitável, mas não ideal

Uma das ilustrações das telas de loading.
Front Mission 2 Remake é uma boa oportunidade para conhecer o segundo título da franquia de RPGs estratégicos da Square Enix que nunca havia sido lançado no Ocidente. Infelizmente, assim como seu antecessor, a gameplay conta com vários problemas de qualidade de vida que precisavam urgentemente ser ajustados para tornar a experiência mais acessível e agradável.

O que temos novamente é um relançamento que se apega demasiadamente à fidelidade ao original sem notar problemas claros e sérios que precisavam ser corrigidos para tornar a experiência mais moderna sem perder a essência do jogo. Trata-se de um título clássico e interessante que está de volta, mas em uma roupagem que dá a sensação de que dava para fazer muito mais.

Prós

  • Rica customização de mechas;
  • As habilidades especiais desbloqueadas com a melhoria dos atributos podem fazer uma grande diferença no combate;
  • História séria de guerra que mostra aspectos éticos e políticos dos grupos envolvidos no conflito;
  • Sistema de AP e geoposicionamento valorizam o posicionamento estratégico e o uso comedido de ações das unidades;
  • A Rede fornece um interessante banco de dados para entender mais a fundo o contexto de personagens e eventos;
  • Tutorial bastante compreensivo para explicar as regras básicas.

Contras

  • O combate e o gerenciamento das unidades são desnecessariamente inconvenientes graças à interface repleta de abreviações e a ausência de informações relevantes e explicações em vários menus;
  • As batalhas acabam tendo uma forte dependência do fator sorte, seja no aspecto de partes atingidas ou de ativação de habilidades;
  • Mesmo em inglês, a qualidade da tradução deixa a desejar em alguns momentos;
  • As ilustrações dos personagens são exageradamente expressivas, de forma a destoar dos diálogos;
  • Ausência de log para os diálogos e textos.

Front Mission 2 Remake — Switch — Nota: 7.0

Revisão: Juliana Paiva Zapparoli
Análise produzida com cópia digital cedida pela Forever Entertainment


é formado em Comunicação Social pela UFMG e costumava trabalhar numa equipe de desenvolvimento de jogos. Obcecado por jogos japoneses, é raro que ele não tenha em mãos um videogame portátil, sua principal paixão desde a infância.
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