Stardew Valley: Dia dos Pais na fazenda em co-op com a família toda

Como em um videogame cultivamos plantas, amores, brigas e, acima de tudo, união familiar.

em 13/08/2023

Há um ano, meu texto de estreia no Nintendo Blast foi justamente uma crônica de Dia dos Pais, na qual falei de clássicos da Disney no SNES. Como continuo me divertindo em jogos cooperativos com meus filhos, aquele foi o ponto de partida para uma série de artigos chamada “Jogando com Crianças”, da qual este também faz parte (confira todos os links no final).

Entre os vários títulos que fizeram nossas tardes em família, um se destaca grandemente: Stardew Valley. Esse gerenciador de fazenda é conhecido por ter se tornado a referência pela qual os demais jogos do gênero são medidos. Uma fama merecida que o configura como um clássico da cena indie e uma obra exemplar na indústria de games como um todo.

Toda essa qualidade nos rendeu uma soma de centenas de horas investidas naquele mundo bucólico. Jogamos em quatro, e chamarei meus parceiros cooperativos de Esposa, filho Mais Velho e Caçula (à época, 7 anos e meio e 3 anos e meio, respectivamente). Eu sou o avatar de gorro cinza. Agora, tenho o prazer de contar como foi a experiência de jogar em família.



O filho Mais Velho

Eu joguei Stardew ainda em 2017. Na época, cheguei à avaliação do avô ao fim dos dois primeiros anos de fazenda e continuei mais um pouco para finalizar as missões que reformam o centro comunitário. Dei-me por satisfeito e pronto, parei.

Anos mais tarde, em 2022, o Mais Velho viu o jogo instalado no console e, no auge de sua recém adquirida capacidade de leitura, decidiu que queria jogá-lo. Sabendo como o jogo é repleto de sistemas e detalhes que requerem atenção e envolvimento, comecei a dissuadi-lo, mas vi algo no menu que mudou tudo: opção de co-op!

Sendo um recurso implementado na enorme atualização 1.5, de 2021, aquilo era novidade para mim e apagou todas as minhas dúvidas. De imediato, pegamos na enxada e começamos a trabalhar na nossa fazenda Dois Irmãos, à beira do rio.

Não demorou muito para eu perceber que a divisão do trabalho era um tanto desequilibrada. O Mais Velho focava em suas atividades preferidas, especialmente a pesca, e eu fazia o trabalho braçal que trazia dinheiro para conduzir os negócios. De repente, ele queria ir à mina para enfrentar monstros ou procurar minérios para confeccionar equipamentos. Construiu uma casa de criação de gosmas, reproduziu vários tipos e depois a abandonou, achando mais interessante se dedicar a diferentes viveiros de peixes.




O ápice foram as horas gastas no museu pessoal, onde ele queria colocar um exemplar de cada recurso mineral. Começou no porão de casa e, quando o hobby mostrou-se duradouro, mudou tudo para um grande armazém. Na sala de jantar, criou sobre a mesa uma espécie de santuário cercado de tochas acesas para guardar o Fragmento Prismático, um dos itens mais raros do jogo.

Quando descobriu que poderia casar com alguém, escolheu Penny, a doce professora ruiva que mora em um trailer com a mãe alcoólatra. Foi exatamente minha escolha quando joguei pela primeira vez! Pode ter sido mera coincidência, uma vez que só há seis opções femininas para namorar, ou pode ter puxado ao pai. Talvez um pouco dos dois.

O Caçula

Quando o Caçula decidiu se juntar a nós, eu não achei que ele conseguiria fazer muita coisa, apenas deixei que assumisse um controle, criasse seu personagem e tivesse uma casa extra na fazenda, agora apelidada de “Três Irmãos”.

O pequeno me surpreendeu com seu rápido aprendizado. Ele captou as mecânicas das ferramentas agrícolas e o funcionamento do inventário, aprendeu o mapa da região e trabalhou muito para o bem maior se aproveitou da condição de ser “café com leite” para fazer apenas o que quisesse, sem assumir compromissos.



É claro que precisamos de muita paciência com ele. Sempre com a mochila cheia, o Caçula gostava de vagar e relaxar na piscina de água quente, mesmo quando não havia gasto energia. De vez em quando, ele me ajudava regando, colhendo ou cortando árvores. Do nada, decidia reorganizar as cercas e usar a enxada nas plantações em crescimento para abrir novos canteiros.

Foi engraçado quando ele incorporou o roleplay familiar e ficou de babá da filhinha do Mais Velho e Penny (a criança foi nomeada em homenagem à amiga preferida da escola), seguindo-a pela casa para evitar que se machucasse (o que não é possível no jogo) e até se colocou entre ela e o fogão, repetindo o que nós dizíamos a ele na vida real: “não toque, o forno está quente!”.

Não raro, o Caçula era pego, digamos assim, se apropriando indevidamente do conteúdo dos baús da casa do Mais Velho ou, pior, do museu pessoal, levando a muitas brigas que tive que intermediar! Quem tem irmão sabe como é. Brigaram para usar o cavalo e, quando resolvi comprar outro para acabar com o problema, os irmãos passaram a apostar corrida pelas alamedas do Vale do Orvalho.



Houve um período em que ele foi perdendo o interesse, sem saber muito bem o que fazer, então arrumei uma nova atividade para ele: decorar a casa. Dediquei-me a expandir a morada dele ao máximo e entreguei os catálogos de papéis de parede e de mobília, que dão acesso ilimitado a esses materiais.

Sabem como é, caçulas na vida real herdam as coisas que os mais velhos não usam mais. No jogo não foi diferente, ele só tinha o que sobrava nas outras casas, então o catálogo deu-lhe a liberdade de escolher por si só as coisas de que gostava. Depois, ele descobriu a máquina de costura e focou em procurar tecidos em baús para criar roupas customizadas, misturando com todo tipo de coisa, até as valiosas.

A Esposa

Vendo nós três jogando juntos, a Esposa não resistiu e disse que queria entrar conosco. Por sorte, há varejistas online que entregam as compras no mesmo dia, então, poucas horas depois, tínhamos um novo controle em mãos para fechar o quarteto gamer e nossa fazenda recebeu a nova moradora, uma prima dos três irmãos.




Quando ela chegou, já estávamos cerca de 60 horas de jogo adentro e havia muito a aprender, sem a inserção gradual de quando vamos desde o começo. Logo, ela preferiu começar com uma coisa de cada vez e elegeu seu ponto de partida: suprir a nossa falta de relações sociais com o pessoal da vila Pelicano.

Foi a Esposa quem descobriu os presentes favoritos dos moradores. Foi ela quem insistiu em fazer amizade com o ranzinza Shane até descobrir seu histórico de depressão e ansiedade (escrevi um texto sobre saúde mental a partir da experiência dele). Foi ela que quis conhecer os rapazes locais… e depois se afastou, achando todos pirralhos demais. Exceto por um. É hora de falar dos amores.




Como o Mais Velho gamou em Penny, tive que escolher outra paixão e optei por Abigail, a nerd meio dark que toca bateria e diz que minerais são deliciosos (!). Com o tempo, ela foi conversando sobre o dever de casa e reclamando que “meus pais não me entendem”, confirmando minhas temíveis suspeitas: estava namorando uma adolescente!

Arrependido da escolha, vi na artista Leah uma mulher adulta que combina muito mais comigo, mas não tive tempo para pensar direito sobre isso porque as coisas mudaram: a Esposa começou a dar em cima de Harvey, o médico da vila Pelicano! Ela dizia “vou levar um presente ao meu namorado (ele só não sabe disso ainda)” e, em meu misto de sentimentos, comecei a ver quem era mais importante para mim no jogo.

Tomei uma decisão. Comecei a investir pesado nas escavações na Caverna da Caveira, na esperança de encontrar um valioso Fragmento Prismático. Passei meus dias lá até desmaiar, correndo de monstros para chegar mais fundo e aumentar as chances de me deparar com a joia rara. Era o item que faltava para executar meu plano antes que fosse tarde demais.




Quando a Esposa estava beirando o nível de intimidade com o qual poderia oficialmente pedir Harvey em namoro, eu achei o fragmento, confeccionei o anel que propõe casamento entre jogadores e corri para encontrar minha amada. Parei diante dela e disse: “pegue este item que tenho aqui”.

Ao aceitar o anel, um texto de escolha surgiu na tela: “Vitório pediu sua mão em casamento”. Houve um momento de expectativa suspensa no ar enquanto ela absorvia a surpresa e pensava no que fazer. Eu prendi a respiração até que ela disse “sim”!

Casamos no jogo, assim como na vida real. Nosso roleplay mudou de novo e Mais Velho e Caçula passaram a ser nossos filhos in-game também. Tivemos mais crianças, refletindo o fato de que in real life queremos adotar uma menina e já estamos registrados no Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento (SNA). Isso já dá outro texto.




Com beijinhos e presentes cotidianos, a Esposa e eu vimos a família e a fazenda crescerem com os anos.

Dia da família no Vale do Orvalho

Na contagem de horas ao longo de alguns meses, o Mais Velho teve 172, eu acumulei 165, a Esposa aproveitou 85 e o Caçula se divertiu conosco por 56. Foi uma experiência familiar lúdica, imaginativa e afetiva, na qual nos relacionamos em um mundo imaginário de diversão, cooperação e descobertas. Mesmo quando na fazenda estávamos longe uns dos outros, na vida real estávamos bem juntinhos, conversando, interagindo, brigando, rindo e dizendo milhares de vezes “ei, você está na frente da tv, sente-se!”.

Escolhemos nomes para as galinhas, adentramos juntos as profundezas da Caverna da Caveira, ganhamos os Festivais da Colheita com nossos melhores produtos e aumentamos as porcentagens de completude conjunta. Eu estou perto de maximizar os relacionamentos com todo mundo da vila. O Mais Velho precisa pescar uma última espécie de peixe e confeccionar alguns artesanatos restantes. A Esposa já aprendeu a maioria das receitas e as deixa prontas, na geladeira. O Caçula nos deu orgulho sendo ele mesmo.

Com 73% de completude em Stardew Valley, ainda falta um bom caminho para alcançar o status de Perfeição — isto é, 100% das metas estendidas —, mas o Mais Velho, que começou essa longa aventura com a família, insiste que quer chegar lá. E nós vamos com ele.

Um feliz dia dos pais a todas as pessoas que são uma figura de cuidado e amor familiar e também às que guardam alguém assim no coração.


Jogando com crianças

Nintendo Blast

GameBlast

Revisão: Thais Santos
Siga o Blast nas Redes Sociais

Admiro videogame como uma mídia de vasto potencial criativo, artístico e humano. Jogo com os filhos pequenos e a esposa; também adoro metroidvanias, souls e jogos que me surpreendam e cativem, uma satisfação que costumo encontrar nos indies. Veja minhas análises no OpenCritic.
Este texto não representa a opinião do Nintendo Blast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Você pode compartilhar este conteúdo creditando o autor e veículo original (BY-SA 3.0).