O tempo é uma das forças mais poderosas com a qual o ser humano precisa lidar. Experiências boas e ruins estão, naturalmente, ligadas ao passar do tempo, e cabe a cada um aproveitar as 24 horas de um dia da melhor maneira possível para que, no futuro, não seja esmagado pela força das consequências de seus atos.
Dito isso, LOOPERS é uma visual novel de Ryukishi07, conhecido por escrever outras obras de sucesso do nicho, como Higurashi no Naku Koro ni, que busca levar o jogador-leitor a diversas reflexões acerca dessa grande potência da vida, já que, para os protagonistas do título, as mesmas 24 horas estão em um loop sem previsão para acabar.
Alguns podem não gostar do conceito de novels cinéticas no geral, que são aquelas lineares em que o jogador não possui nenhum impacto na história: iniciar o jogo e deixá-lo rodando automaticamente o levará ao fim da história, como um livro. No entanto, LOOPERS se apropria dessa característica do gênero para entregar uma história curta e fechada, mas com excelente qualidade no geral.
Tudo começa com uma caça ao tesouro
Para o garoto Tyler, nada é mais interessante do que uma espécie de Pokémon GO de seu universo: um jogo chamado Geohunting, que consiste em encontrar “tesouros” escondidos por outros jogadores no mundo real. O garoto é tão investido em tal atividade que, ao jogar durante a noite, acaba encontrando com suas ex-amigas de escola, Hilda e Leona, em frente a uma loja local. Após um divertido reencontro de colegas recheado de piadocas, o jovem as convence a participar de uma caçada consigo para mostrar a elas o quanto o negócio é mais divertido do que parece.
Após uma madrugada de Geocaçadas e depois de se despedirem de Tyler, Hilda e Leona voltam para a frente da loja onde estavam anteriormente. No entanto, após dar uma habitual cabeçada (!) em sua amiga, Hilda nota que esta não recebe seu gesto tão naturalmente como sempre e uma série de eventos misteriosos começam a acontecer.
Diante de tais acontecimentos, Hilda e Tyler percebem, após muitos momentos de desespero, que esse mesmo dia primeiro de agosto se repete, não importa quantos dias se passem. Apesar de tudo, a dupla vê que não está sozinha nesse pesadelo: outros jovens presos no loop temporal fundaram um grupo chamado Loopers, no qual ingressam e colaboram para que o mistério dessa repetição seja resolvido.
A premissa é simples e lembra muito o clássico filme Feitiço do Tempo, estrelado por Bill Murray, no qual o mesmo dia se repete e os protagonistas de ambas as obras se veem diante das vantagens e desvantagens de repetir o período de 24 horas diversas vezes, o que os leva a reflexões sobre aproveitar cada momento. Na novel, tais questões perpassam por assuntos delicados que dizem respeito ao passado de personagens e o que os leva a serem as pessoas que são no momento presente, culminando no quanto isso os afeta dentro do loop, pois não há progresso em nenhuma atividade rotineira.
Mas o que é um tesouro, afinal?
Dessa forma, Ryukishi07 trabalha com conceitos talvez já usados à exaustão em outras obras, mas de uma maneira única e cativante. Durante a leitura, existem momentos de riso e pranto, além de toda tensão causada pela inevitável loucura de se ver preso em um mesmo dia, sem perspectivas de fim.
Tantos assuntos são muito bem amarrados um ao outro em uma narrativa curta, que dura cerca de seis horas. Para quem está mais familiarizado com o universo das visual novels, sabe que é bom separar um lencinho para secar as lágrimas proporcionadas pela leitura de jogos da Key, empresa responsável por outros títulos dramáticos, como Clannad e Kanon.
No entanto, talvez a curta duração da novel seja um ponto passível de críticas, pois é visível que muitas questões interessantes que dizem respeito ao desenvolvimento de personagens e interação entre eles poderiam ter sido mais trabalhadas. Afinal, os Loopers possuem muito potencial para que suas subtramas fossem muito mais impactantes do que apresentaram ao final da obra como um todo.
Além disso, o desenvolvimento da trama, em alguns momentos, pode ser considerado por muitos como previsível e clichê, mas nada que afete de fato a montanha-russa de emoções proporcionada pela experiência.
Para além da qualidade da escrita demonstrada por r07, a novel entrega um audiovisual ímpar: tudo aqui salta aos olhos, da excelente caracterização dos personagens de Kei Mochizuki aos cenários muito bem detalhados e agradavelmente coloridos por Cre-p e Torino. Ademais, as músicas de fundo casam muito bem com o encadeamento das cenas, e o mesmo pode ser afirmado da falta dela.
Em alguns momentos específicos, é difícil não sentir a carga emocional causada por efeitos sonoros ecoando no silêncio. Nas músicas com vocais, sana entrega um excelente trabalho, que pode ser conferido nas duas aberturas do jogo e em uma emocionante insert song responsável por apoiar um dos momentos mais emocionantes da trama.
Por fim, na área da dublagem, temos inúmeros talentos responsáveis por causar impacto positivo aos ouvidos durante todo o desenrolar da história. Uma pena que alguns personagens que, ao final da história, se mostram relativamente importantes não tenham sprite algum, enquanto outros, inclusive protagonistas importantes, não sejam contemplados com belas CGs como os demais.
Quanto à parte técnica, além da HUD visualmente agradável e vívida, é possível listar como pontos positivos as inúmeras opções de qualidade de vida. Pode-se alterar a velocidade de aparecimento do texto, além de outros aspectos como o formato da fonte no geral e a cor dos trechos já lidos.
O menu principal também conta com um manual no qual é possível ver os botões atrelados a comandos específicos, mas, no geral, todos eles são simples o suficiente para o gênero. No Switch, inclusive, temos a opção de controlar o jogo por meio de toques e gestos na tela sensível —só sugiro cuidado para jogadores mais desengonçados, como eu, já que os botões L e R avançam e retrocedem o texto com uma sensibilidade impressionante, o que gera momentos em que é necessário tentativa e erro para retornar a leitura de onde estava.
O verdadeiro tesouro são os amigos que fazemos pelo caminho
Apesar da presença de clichês e de algumas contradições na parte narrativa, LOOPERS é uma ótima leitura para quem procura algo impactante, mas não possui muito tempo para investir em obras de longa duração ou simplesmente gosta de histórias curtas e concisas. Suas aproximadas seis horas acabam não desenvolvendo tanto assim muitos dos personagens presentes, mas, apenas com o que está disponível, é possível garantir momentos emocionantes para aqueles que se permitirem conhecer essa história jovial de autoconhecimento, ganhos e perdas.
Prós
- Visual agradável e músicas envolventes;
- Excelentes personagens com personalidades variadas e ótima dublagem;
- Customização da interface e elementos de qualidade de vida para a leitura;
- Ótimo uso da tela de toque do Switch;
- História simples, mas bem-escrita de modo geral.
Contras
- Pouco desenvolvimento dos personagens e de suas subtramas;
- Alguns momentos clichês e contradições;
- Falta de imagens e CGs para ilustrar alguns personagens importantes.
LOOPERS — Switch — Nota: 9.0Versão utilizada para análise: Switch
Revisão: Juliana Paiva Zapparoli
Análise produzida com cópia digital adquirida pela redatora