Blast from the Past

Metroid Prime Hunters: First Hunt (DS): relembre a demo mais ousada da história da Nintendo

Este cartucho especial incluído junto com o primeiro modelo do Nintendo DS carrega uma história curiosa.



Não é novidade para ninguém que a tela de toque era o grande ponto de venda do Nintendo DS e, ao contrário do que muitos acreditam, é correto afirmar que certos tipos de gênero se encaixam com mais facilidade nesse esquema de controle. Acreditava-se que esse era o caso dos jogos de tiro em primeira pessoa (First-Person Shooters), que carregavam um potencial nunca antes visto em um videogame, quiçá de qualquer plataforma que não tivesse acesso a um mouse.

Graças à tela de toque e à fiel canetinha Stylus, a tarefa de controlar a mira com precisão e agilidade ficava muito mais simples e acessível. A Nintendo mais do que ninguém sabia desse potencial a ser explorado, tanto que resolveu simplesmente lançar o primeiro modelo do portátil em conjunto com um cartucho de demonstração do FPS de exploração Metroid Prime Hunters, sob o título especial de “First Hunt”.

Apesar de ter sido escolhido para carregar o enorme peso de apresentar ao mundo inteiro o Nintendo DS em seus primeiros anos de vida, a falta de reconhecimento hoje em dia nos leva a crer que First Hunt não conseguiu cumprir essa missão. 

Mas será que isso é verdade? Os jogadores ficaram satisfeitos com apenas uma demo depois de comprar um videogame novo? Ou melhor ainda, será que a demonstração gratuita realmente ajudou a criar interesse para o lançamento do jogo completo? As respostas podem te surpreender.

Um treinamento arriscado



Após o sucesso de Metroid Prime 1 e 2 no GameCube, a franquia de jogos da heroína Samus Aran passava pelo seu maior pico de popularidade até então. Com o lançamento do Nintendo DS se aproximando, teve início a produção de um spin-off da série com foco primário no modo multiplayer com a intenção de ser o primeiro grande lançamento do portátil. A Retro Studios estava ocupada desenvolvendo o terceiro jogo da trilogia Prime, então Hunters acabou caindo no colo da Nintendo Software Technology (NST), uma pequena subsidiária norte-americana da Big N.

O terreno nunca explorado do novíssimo hardware do Nintendo DS e a falta de experiência da equipe da NST acabaram se provando um enorme problema durante o desenvolvimento de Hunters. Percebendo que a produção iria demorar mais do que foi estipulado, o então presidente da Nintendo of America, Reggie Fils-Aimé, propôs que a equipe desenvolvesse uma demo do jogo para ser incluída junto ao primeiro modelo do DS.

O plano de Reggie era que a equipe utilizasse a demo como uma espécie de treinamento para pegar o feedback do público e solucionar os problemas do jogo. A NST não gostou da ideia e alegou que a produção de uma demo faria com que o desenvolvimento de Hunters precisasse atrasar por mais cinco meses, além de a equipe não se sentir bem em lançar o conteúdo do jogo “de graça”. O que fez eles mudarem de ideia foi a pressão dos líderes e figurões da Nintendo do Japão, como Satoru Iwata e Shigeru Miyamoto, que apoiaram a ideia de Reggie.

Olhando de fora, é fácil entender que essa foi uma ideia bastante arriscada. Com o passar dos anos, o Nintendo DS acabaria se adaptando como uma plataforma mais focada no público casual, como resultado direto da influência do Wii. Dito isso, não teria sido melhor lançar o portátil junto com a demo de um jogo mais amigável, como Super Mario 64 DS? Não dá para saber se seria realmente “mais efetivo”, porém eu, pessoalmente, fico feliz pela existência de First Hunt.

Simulando o futuro


Ao contrário do que se espera de uma demo, First Hunt praticamente não tem nada a ver com o jogo que ele tenta apresentar. Os gráficos, os cenários, os modos de jogo, a interface visual, a premissa e o funcionamento do multiplayer... Tudo aqui é substancialmente diferente do que os jogadores encontraram no lançamento oficial de Prime Hunters. O próprio “feeling” de jogar já é algo bem distante da versão completa.

A premissa de First Hunt é ser uma espécie de simulação holográfica que está sendo utilizado por Samus para treinar e se preparar até a sua próxima missão. Estão disponíveis três campanhas single-player com uma pegada “arcade”, sendo cada uma focada em treinar algum tipo de fundamento essencial que a protagonista precisa dominar em suas aventuras.

A primeira simulação se chama Regulator e pode ser resumida a uma pequena fase linear na qual devemos navegar por sessões de plataforma e derrotar todos os inimigos para avançar até o final. Na última sala, uma espécie de clone parecido com a Dark Samus surge como um chefe que deve ser derrotado. Em média, é possível terminar esse modo em cerca de 5 a 8 minutos.

Como o seu próprio nome diz, a segunda simulação é um modo Survivor no qual Samus deve eliminar o maior número possível de inimigos dentro de uma área com diferentes andares por tempo indeterminado até morrer. Para conseguir combar e obter pontuações maiores, o jogador deve atirar em sequência sem errar os inimigos.

A terceira missão é focada no controle da Morph Ball, que deve ser conduzida com precisão para coletar todos os hologramas de uma área com vários corredores. Esse é o modo de jogo com a menor duração e conteúdo, podendo ser concluído em cerca de 30 segundos se você não perder nenhum holograma pelo caminho.

Todos os modos giram em torno de um sistema de pontuação que leva em conta o tempo de conclusão e a pontuação de combos realizados. Depois de conseguir o primeiro lugar no ranking de qualquer modo, o jogador pode acessar um trailer da versão final de Metroid Prime Hunters. Não tem nada muito especial ou profundo aqui, mas essas pequenas aventuras contam com um fator replay que pessoalmente me fez ficar horas explorando cada possibilidade do cenário quando jogava na infância.

Vazio do espaço

De fato, é preciso admitir que o single-player de First Hunt é extremamente raso. Sem contar o clone maligno da Samus, só existem três tipos de inimigos diferentes e apenas um deles, os Talon Metroids, são de fato agressivos contra o jogador. O único power-up acessível são os tradicionais mísseis e um coletável que duplica o dano do seu disparo por 1 minuto.

Mesmo com a clara ausência de conteúdo, First Hunt ainda é lembrado com muito carinho por todos que o experimentaram na época. Os gráficos da aventura continuam impressionantes, especialmente para algo que foi lançado literalmente no primeiro dia de vida do portátil. Por sinal, são poucos os jogos em 3D do Nintendo DS que chegam perto de superar a performance gráfica desta demo.

Os controles de mira com a tela de toque são surpreendentemente eficientes. Alguns jogadores até reclamam de dor no pulso após jogar por muito tempo, mas a natureza arcade de First Hunt praticamente anula esse problema. Por ser uma demo, é normal perceber alguns pontos da jogabilidade que foram melhor polidos para o jogo completo.


O fator replay também não é algo que dá para subestimar aqui. As missões Regulator e Survivor são eficientes na hora de fazer o jogador ficar com vontade de aperfeiçoar os combos e ser mais rápido da próxima vez. Hoje em dia não é nada especial, mas na época era uma distração perfeita para quem só tinha esse cartucho e nada mais.

Por outro lado, o Multiplayer é uma verdadeira pérola escondida. Apesar de não contar com a praticidade do Download Play, o modo ainda conseguia ser bem acessível pelo fato de que literalmente todos os donos do primeiro modelo do portátil também tinham seus próprios cartuchos.

Em comparação direta com a versão completa de Prime Hunters, a jogatina com amigos aqui é super-simplificada. Não temos modo online, personagens com armas diferentes ou maior diversidade de mapas, mas quer saber? Tudo isso nem foi necessário para garantir a diversão.

A primeira grande experiência multiplayer realmente acessível em um videogame portátil foi proporcionada por First Hunt, marcando tanto que diversos donos do primeiro modelo gorducho do DS ainda lembram com muito carinho das jogatinas no modo Deathmatch. Afinal de contas, até hoje em dia elas continuam divertidas e competitivas se você de alguma forma conseguir reunir três amigos para jogar localmente.

Aprendizados positivos

No final das contas, ainda é difícil justificar Metroid Prime Hunters: First Hunt como uma experiência relevante nos dias de hoje. Tudo que essa tech-demo fazia de especial na época perdeu o brilho com o passar do tempo. A própria versão completa do jogo que lançaria em um ano já oferece um conteúdo que ofusca completamente a demo.

No entanto, também não dá para dizer que essa demonstração fracassou em seus objetivos. Seja como um pioneiro em mostrar o potencial gráfico do recém-nascido Nintendo DS, seja apresentando a franquia para uma nova leva de jogadores, ou demonstrando as possibilidades da tela de toque e as maravilhas do modo multiplayer wireless

First Hunt mostra se como um excelente produto no contexto de sua época. Talvez não pareça atrativo, mas acredito que todos os fãs da série Prime deveriam pelo menos conhecer esse pedaço tão interessante e ousado da carreira de Samus Aran.

Revisão: Davi Sousa

Estudante de jornalismo que não vê a hora de achar um estágio. Apaixonado por videogames e esperando o fim de Hunter x Hunter e Berserk desde que me entendo por gente.
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