Análise: Redemption Reapers (Switch) combina simplicidade com desafio em RPG tático

Este TRPG aposta em uma trama simples de fantasia sombria e em um level design lento e punitivo para táticas com poucas unidades.

em 04/03/2023

Desenvolvido pela Adglobe e publicado pela Binary Haze Interactive, sob a direção criativa de Hironori Takeshige, Redemption Reapers é um RPG tático de fantasia sombria (dark fantasy) com ambientação medieval que aborda a luta por sobrevivência da humanidade frente a uma brutal invasão de um exército de criaturas das trevas. Para tal proposta, o jogo foi projetado para tática com um pequeno grupo fixo de unidades, cada qual com habilidades específicas, de modo a cada personagem complementar um ao outro no campo de batalha.

Uma fantasia sombria genérica com um argumento interessante

Com conceito de Hiroyuki Kobayashi (produtor de ENDER LILIES: Quietus of the Knights) e roteiro de Tomokazu Fukushima (coescritor de Metal Gear Solid 2: Sons of Liberty), a história começa em um contexto apocalíptico no qual a humanidade é perseguida e trucidada por um exército macabro de Morts, seres que não mostram nenhuma emoção e possuem traços que se assemelham a ogros, criaturas mutantes ou assombrações, a depender do tipo. Esse exército surgiu repentinamente no mundo e passou a dizimar cidade após cidade. A cada povoado exterminado é deixado um rastro de sangue, ruína e chamas, e com sorte resta algum sobrevivente.

O jogador segue Sarah (na voz de Yuhko Kaida; ou Alejandra Reynoso, na versão em inglês), uma ágil mercenária que empunha duas adagas e faz parte de um grupo de guerreiros independentes chamados de Brigada do Falcão Cinza. A narrativa é contada basicamente com alguns poucos diálogos no começo de cada combate e em uma curta cutscene após o final das missões; para cada capítulo da história há uma partida com combate de RPG tático. A jornada possui algumas pequenas variações de rotas, mas em geral é uma aventura linear.


Na prática, Sarah é o único personagem jogável com potencial na trama. Ela possui arrependimentos sobre algumas batalhas que travou no passado e que fizeram muitos desconfiarem de seu caráter, mas seu passado também a fez destemida para enfrentar os Morts. Ao mesmo tempo, Sarah ganhou um forte senso de responsabilidade e se preocupa em cuidar de seus amigos e de refugiados da guerra, como de Naki, um menino que sobreviveu a uma invasão de Morts à vila de Inissa, na região de Bishu.

Nos capítulos iniciais, Sarah encontra-se um a um com os demais membros da Brigada. Esses são Lugh (lanceiro), Glenn (cavaleiro), Urs (um gigantesco bárbaro com um machado), Karren (arqueira), Socius (outro arqueiro) e Rowen (guerreiro com espada de duas mãos). Infelizmente esses personagens são escritos de modo bastante simplista e típico, e o texto não os explora para muito além disso.


Lugh é o clássico lanceiro habilidoso que apenas quer se divertir matando Morts. Glenn é um típico guerreiro leal; no passado, era um comandante cavaleiro antes de se juntar ao time de Sarah. Urs é um personagem bruto, mas sério e de poucas palavras; seu papel é basicamente de protetor do grupo. E Karren, uma personagem próxima de Urs e com um texto bastante sucinto; seu papel é basicamente o de dar cobertura para o grupo.

Por fim, temos Socious e Rowen, os quais são pouco presentes nos campos de batalha, mas importantes para a história, são respectivamente o vice-comandante e o comandante da Brigada, ambos mostrando-se confiáveis e inteligentes. Rowen é “o homem por trás do tabuleiro”, enquanto que Socious é seu braço direito, este está sempre sério e circunspecto e costuma ser um daqueles personagens que servem para se contrapor ao espírito libertino de Lugh.


Após introduzidos todos os personagens principais da história, estes permanecerão de forma mais ou menos fixa até o final do jogo, mas há alguns poucos personagens sobreviventes que você encontrará pelo caminho e que poderão ser aliados temporários durante o conflito apocalíptico, como por exemplo Lorthos, que tentou em vão proteger os habitantes de um dos vilarejos invadidos no início do game. Outro exemplo é Levante, um general do reino de Caledaecia que segue lutando em uma das torres da cidade, embora o reino tenha sido devastado por um exército de Morts. 

Quando não estão em combate, os personagens estão no acampamento da brigada, também chamado de Ninho, o qual serve também de abrigo para os sobreviventes desse contínuo massacre e é palco de boa parte dos diálogos entre os personagens durante os capítulos intermediários da campanha. O ponto alto da narrativa está na sensação de que você não é um herói vitorioso, mas sim alguém encurralado, incapaz de salvar quem está ao seu redor e a duras penas conseguindo sobreviver, fugindo de uma área após a outra, sem perspectiva de esperança.

Apesar de ter um argumento ousado, infelizmente não se pode dizer que a trama seja satisfatória. Eu diria que possui um bom final, mas demora para se mostrar minimamente interessante e infelizmente não possui bons personagens. O grupo é formado por caricaturas superficiais com pouco desenvolvimento de suas motivações e pensamentos, além de com pouco carisma e originalidade. E não ajuda o fato de os inimigos serem simplesmente inimigos cruéis, nada mais.

Batalhas lentas e simplistas, mas desafiadoras

Com game design de Masayuki Horikawa (diretor de Fire Emblem: Path of Radiance e level designer de outros títulos da série nos portáteis), Redemption Reapers traz uma proposta bastante simples e econômica, mas também desafiadora e com um ritmo lento e único para RPG estratégico. A ideia é fazer cenários mais limitados com inimigos que avançam lentamente, de modo que você possa combatê-los aos poucos com seu pequeno grupo de personagens.

Quando eu falo que o cenário é limitado, refiro-me à limitação em três sentidos. Em primeiro lugar, no sentido do tamanho do tabuleiro. Em geral não são cenários muito grandes, e quando o são as batalhas se tornam entediantes, embora também sejam desafiadoras e justas (embora punitivas), pois você possui apenas cinco unidades e elas morrem com facilidade, se não estiverem em modo de defesa, com exceção de Urs.


Mas a limitação espacial se estende para outros dois aspectos que não são muito justificáveis para a proposta de gameplay. Primeiramente, a ausência de topologia. Diferente de jogos como Tactics Ogre e Triangle Strategy, não é levada em conta a altura em que seus personagens estão; um arqueiro, por exemplo, não pode se beneficiar de estar em cima de um morro ou no topo de uma escadaria.

Essa limitação não é necessariamente um problema quando é possível aumentar a complexidade do level design de outras formas. A série Fire Emblem, por exemplo, geralmente compensa isso com cenários maiores e uma série de obstáculos e itens interativos, como balistas, vilarejos e armadilhas, e às vezes variáveis de ambiente, como ventania.


Mas infelizmente o design de Horikawa não compensou isso de nenhuma forma. Salvo alguns baús e itens para pegar, a interação cenográfica é nula, o combate se resume a você e seus inimigos, e sua missão repetitivamente é simplesmente derrotá-los todos ou ao general. O único destaque fica por conta de pontos específicos em que você pode recarregar a vida e a poção de vida consumível por uma unidade. Cada personagem só pode carregar uma poção, isso é algo que torna suas estratégias bem desafiadoras.

A ideia de centralizar o level design em um líder a ser derrotado é um clássico que remonta à experiência do xadrez e pode ser usado de forma bem interessante, a exemplo da proposta de Tactics Ogre Reborn. O problema é que Redemption Reapers simplesmente coloca a maior parte das unidades inimigas imóveis em algum local, inclusive o chefe. Com raras exceções, as unidades inimigas só se movem se você chegar perto delas.


Embora essa escolha seja parcialmente compreensível, para que seu pequeno grupo não seja massacrado, do ponto de vista do level design temos uma experiência muito pobre, entediante e pouco verossímil, enquanto simulação. O único ponto forte da gameplay parece estar no sistema de combate, pois ele força o jogador a usar com prudência o potencial de cada personagem. Se algum deles morrer, você só o verá na próxima partida. Aliás, provavelmente terá de reiniciá-la, pois cada membro é fundamental ao seu modo.

Urs é uma unidade crucial para estar na linha frente, na defesa, enquanto que o lanceiro, como é a única unidade que ataca a duas células de distância, é útil deixá-lo na diagonal em relação aos inimigos, enquanto a arqueira pode atacar de longe e o cavaleiro causa um bom dano de perto. Sarah, por sua vez, é a personagem ideal para iniciar um ataque, pois ela possui uma evasão alta em algumas de suas habilidades. Uma vez que um ataque é iniciado, você pode fazer combos com seus outros personagens que estão por perto, exceto com a arqueira.


Os inimigos são outro ponto fraco do jogo. Eles possuem uma IA muito simples e a variedade não é tão significativa. Há, sim, algumas criaturas que trazem contribuições táticas interessantes, como seres que se sacrificam para matar instantaneamente sua unidade, caso cheguem perto dela. Mas de modo geral os Morts são marcados mais por variação de força e defesa, além de equipamentos, com uma variação semelhante à de seus personagens.

Por fim, temos algumas customizações. Quando não está em combate, você tem acesso a um mapa-múndi e pode grindar nos cenários anteriores, algo que é desbloqueado por volta de um terço do jogo. Também é possível ter acesso a um comerciante, a partir do qual você pode comercializar equipamentos, além de refinar ou consertar os seus atuais. Vale destacar que, como em Fire Emblem, você pode carregar vários tipos de armas de um mesmo tipo e alternar entre elas em batalha. Ademais, cada personagem possui uma pequena árvore de habilidades. A customização é razoável, mas não espere muita complexidade ou versatilidade.

Uma boa trilha sonora com um visual mediano

A cenografia possui alguma variedade. Há campos de batalha na neve, outros em interiores, como dentro de um castelo ou caverna, e outras vezes ao ar livre. Porém é uma pena que nada disso interfira na gameplay e esses locais não são artisticamente marcantes. Os inimigos também não contribuem, costumam seguir caricaturas típicas de dark fantasy com uma pitada de O Senhor dos Anéis.

O maior destaque audiovisual do game está na arte de suas cutscenes, sob os cuidados de Edson Issao Yorioka. Os personagens em si, de Yoko Tsukamoto, também não contribuem, pois são típicos demais ou simplesmente genéricos, mas há uma boa modelagem 3D dos personagens e algumas cenas com uma boa produção, sempre com um tom sombrio, porém a expressão facial nem sempre é convincente. Confira um pouco do estilo cinemático no trecho de vídeo abaixo.


Fora das batalhas, o acesso ao comerciante e a outras coisas é totalmente via menus. O design de interface, liderado por Kumiko Ito, não sai muito fora do padrão no gênero. Durante as batalhas lembra um pouco o estilo de Fire Emblem: Three Houses. Provavelmente agregaria mais em imersão e arte se o jogo oferecesse interações e controle de unidades fora dos combates.

No fim, o ponto mais alto do audiovisual está na trilha sonora, composta por Rei Kondoh (compositor da série Bayonetta e da geração pós-Awakening de Fire Emblem), mesmo que não sejam tão sombrias quanto se poderia esperar para a proposta do mundo. Suas peças certamente lembram o estilo dos últimos Fire Emblem, com melodias simples, ao mesmo tempo bonitas e suaves, e com uma harmonia que passa energia e tensão, enfatizando percussão e cordas. Há também uma bela canção ao final, na voz de Patricia Kaye Lumahang. Confira um pouco da dinâmica audiovisual em combate no trecho de vídeo abaixo.

Um TRPG simplório com um ritmo de desafio único

Apesar de ter uma história bem simples com personagens muito fracos e um level design bastante limitado e repetitivo, Redemption Reapers não chega a ser um fracasso completo, seu ritmo lento e desafiador explora de forma única a complementaridade entre os pontos fortes e fracos de suas unidades, a história tem alguns poucos pontos mais altos e a trilha sonora é sempre uma boa companhia para sua experiência tática. O título é recomendado apenas para fãs de RPG tático que queiram algo desafiador com um ritmo lento e não tenham coisas melhores no radar.

Prós

  • Boa trilha sonora;
  • A história possui alguns pontos fortes, como a protagonista e o desfecho da trama;
  • Cinemáticas com uma boa produção;
  • Alguns elementos únicos de combate que tornam o level design desafiador e equilibrado com um foco no gerenciamento de um pequeno grupo fixo de personagens.

Contras

  • Level design simplista, limitado, cansativo e repetitivo;
  • Inimigos extremamente genéricos e com uma IA simplória;
  • História que demora a ficar minimamente interessante e com personagens quase inteiramente superficiais e mal desenvolvidos;
  • Cenários pouco marcantes e técnica de expressão facial nem sempre muito convincente.
Redemption Reapers — Switch/PS4/PC — Nota: 6.5
Plataforma utilizada para análise: Switch

Revisão: Vitor Tibério
Análise produzida com cópia digital cedida pela Binary Haze Interactive
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Doutorando em Filosofia que passa seu tempo livre com piano, livros, PC e portáteis. No Twitter, também é conhecido como Vivi. Interessa-se especialmente por narrativas de ficção científica, realismo mágico e alta fantasia política, e aprecia mecânicas de puzzle, stealth, estratégia e RPG. Seu histórico de análises pode ser conferido no OpenCritic e suas reflexões sobre RPG e game design encontram-se na SUPERJUMP (textos em inglês), bem como no Podcast do Vivi e em seu canal no YouTube.
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