A franquia Fire Emblem segue firme e forte desde 1990, com jogos sendo lançados em praticamente todos os consoles da Nintendo, do NES ao Switch, passando também pelo GBA, DS e 3DS. Em 2023, ano em que a franquia completa 33, eis que surge a 17ª entrada principal: Fire Emblem Engage.
Anunciado em setembro do ano passado, a espera pelo dia 20 de janeiro pareceu uma eternidade. Foram meses de especulação e anúncios pensados para fomentar o hype em torno de Engage, mas, finalmente, você pode conferir a seguir o que esperar deste novo Fire Emblem.
Uma guerra de luz e sombra (e o fim de especulações)
Alear, ao lado de poderosos heróis de outros mundos, derrotou o Dragão Caído, Sombron, e salvou o continente de Elyos de sua ruína. A consequência de usar seus poderes ao máximo, porém, foi um sono de um milênio, do qual Alear acordou sem memórias.
Ao lado de Vander, Clanne e Framme, o protagonista amnésico conhece a rainha de Lythos, Lumera, sua mãe, mas de quem, infelizmente, Alear não se lembra. Para piorar a situação, correm boatos de que o reino de Elusia está tentando ressuscitar Sombron e o herói precisa, mais uma vez, enfrentar essa terrível ameaça — e, para isso, será necessário reunir os 12 Emblem Rings, espalhados pelos quatro reinos de Elyos, e despertar esses heróis icônicos para pôr fim ao Dragão Caído.
Recapitulando a prévia de Engage que escrevi para a edição 156 da Revista Nintendo Blast, eu havia especulado que a trama deste novo Fire Emblem teria como pano de fundo o incessável combate entre Naga, a guardiã dos Dragões Divinos, e Grima, o Dragão Caído, explorado em diversas entradas da franquia (em especial, as da saga de Archanea e de Ylisse). Agora, com o jogo em mãos, pude suspirar aliviada ao ver que minha "teoria de fã" caiu por terra.
A história de Engage conseguiu me prender por trazer diversos elementos de entradas passadas em sua narrativa. É difícil não achar pontos em comum com as demais sagas — Elibe (The Binding Blade e The Blazing Blade), Magvel (The Sacred Stones) e até mesmo Jugdral (Genealogy of the Holy War e Thracia 776), para nomear algumas — nos quase 30 capítulos que compõem a aventura de Alear e os Emblems.
Vendo sob esse aspecto, a Intelligent Systems acertou em cheio por conseguir resumir em um só jogo os pontos altos de sua franquia, tanto no desenrolar da trama quanto nos personagens. Por outro lado, também entendo a crítica de outros portais à parte narrativa de Engage; ela, de fato, não é o ponto forte do jogo e quem esperava mais profundidade nos conflitos e seus envolvidos, algo que Three Houses e o spin-off Three Hopes conseguiram trazer com excelência, pode ficar um gosto amargo de decepção na boca.
No mais, para os padrões de Fire Emblem como um todo, a trama é satisfatória. Como fã da franquia, considero ter sido uma grande sacada da Intelligent Systems incluir os diversos elementos dos 16 jogos e eu não podia ter ficado mais feliz com essa homenagem.
Um combate memorável que une o antigo e o atual
Se, por um lado, a história de Engage peca pela falta de conteúdo, por outro, a 17ª entrada está mais Fire Emblem que nunca. Elementos clássicos, como o triângulo de armas (weapon triangle advantage em inglês ou simplesmente WTA) e várias possibilidades de classes, estão novamente presentes, bem como os diversos tipos de terrenos — sim, desertos e nevoeiros estão de volta (e mais chatos do que nunca).
Porém, o que já era bom ficou melhor. Mais uma vez, o time responsável por Engage conseguiu adaptar o cerne da franquia, o combate tático, para que ele ficasse mais interessante dentro do cenário atual dos videogames. Para isso, a primeira grande mudança foi a inclusão do sistema de weapon break, que desarma o oponente ao ser atingido por uma arma superior à sua no WTA.
Ou seja, se uma unidade equipada de espada ataca outra em posse de machado, acertar o golpe acarreta break, que impede o alvo de contra-atacar durante o próximo embate. Isso significa que um personagem com lança pode seguramente atacar esse inimigo sem medo de uma retaliação, já que machados são superiores às lanças; artistas marciais, por outro lado, levam vantagem contra arqueiros e magos, que, por sua vez, são fortes contra voadores e inimigos de armadura pesada (armored), respectivamente.
Agora, se o sistema de break já parece uma revolução, saiba que há ainda a introdução de smash. Essa condição é causada por meio de armas específicas e, se o ataque acertar o alvo, este é empurrado um espaço (tile) para trás; em contrapartida, unidades munidas desses equipamentos nunca atacam primeiro, mesmo quando iniciam o combate, e também não podem realizar follow-ups.
As novidades no sistema de combate não acabam por aí. Em Engage, foi incluída a divisão de personagens por seus papéis desempenhados em combate, algo que vai muito além de suas classes, explicados brevemente a seguir:
- Qi Adept: pode bloquear ataques direcionados a aliados adjacentes com o comando Chain Guard;
- Mystical: ignora efeitos de terreno do alvo na hora de calcular o dano mágico com tomos;
- Covert: recebe o dobro de bônus em Avo e outros parâmetros (stats) de acordo com o terreno; e
- Backup: realiza ataques em cadeia (chain attacks) quando um aliado próximo inicia um ataque.
Apesar de serem muitas informações novas em cima de conceitos já consolidados na franquia, podendo deixar até mesmo veteranos um pouco perdidos de início, Engage consegue deixar tudo muito bem explicado nos tutoriais, que são desbloqueados à medida que as mecânicas são introduzidas na campanha. São detalhes assim, na minha opinião, que enriquecem a jogatina como um todo.
Contudo, ainda a respeito de classes e armas, senti falta de alguns aspectos já presentes na franquia (embora em não todos os jogos), mas que geram algumas controvérsias na comunidade. O primeiro deles é a durabilidade de armas, que, assim como em Fates e Shadows of Valentia, foi removido em Engage.
O sistema de Rescue, que permite que um personagem possa carregar outro para os mais variados fins, não está presente, ainda mais quando o parâmetro Constitution (chamado de Build em Engage) está de volta. O comando Dismount, que dá a opção de unidades de montaria combaterem a pé, também me fez falta em diversas situações.
Entendo que a remoção desses sistemas tenha sido uma decisão muito provavelmente relacionada à mecânica de Engage, que será explicada no tópico a seguir, mas acredito que sua permanência teria deixado os combates ainda mais emocionantes.
Fusão ou digievolução por DNA? Que nada, é Engage mesmo!
Dando nome ao 17º Fire Emblem, a mecânica de Engage é, sem sombra de dúvidas, o ponto alto do jogo. Os Emblem Rings não são apenas acessórios cosméticos que garantem bônus nos stats dos personagens: cada um dos heróis lendários pode se fundir com os personagens e ampliar ainda mais o leque de oportunidades estratégicas.
Os Emblems trazem consigo não apenas armas exclusivas, mas também habilidades ativas (Emblem Skills) e passivas (Synchro Skills) que mudam dependendo de quem os equipa. Lembra quando eu falei dos papéis desempenhados pelos personagens? Pois bem, compare as duas imagens a seguir.
Perceba que Corrin, se utilizada por Diamant, uma unidade Backup, garante efeito que aumenta Def/Res ao usar Dragon Vein; quando usada por Yunaka, que é do tipo Covert, essa habilidade garante bônus em Avo para todos que estiverem na área afetada.
Claro que os efeitos também mudam de acordo com a classe ou arma da unidade; por exemplo, personagens da classe Cavalry causarão 50% de dano extra com o ataque de Ephraim durante o Twin Strike, Emblem Skill da Eirika. Esses detalhes, por mínimos que possam parecer, enriquecem e muito a estratégia de combate, fazendo com que Engage seja, na minha opinião, o melhor jogo para quem quer aproveitar a parte tática da franquia.
Porém, dada a natureza dos inúmeros bônus concedidos pelos Emblems, de início, o modo Engage só fica ativo por três turnos. Além disso, a Emblem Skill só pode ser utilizada uma vez por ativação, isto é, para utilizar Lodestar Rush, de Marth, duas vezes na mesma missão, é necessário ativar Engage uma segunda vez.
Não é complicado encher novamente a barra do Emblem e, dependendo da estratégia adotada e da dificuldade do jogo, essa é uma tarefa bem rápida. Existem duas maneiras: colocar um personagem em cima de Spirit Ground ou entrar em combate; nesta segunda, independe causar ou não dano ao oponente.
No entanto, apesar de ser possível que qualquer personagem equipe os Emblem Rings sem quaisquer restrições, uma vez iniciada a missão, não podemos trocar os anéis entre nossas unidades. Dito isso, saber quem fará par com qual Emblem é parte crucial da estratégia, uma vez que nem sempre as vantagens concedidas são realmente aproveitadas em sua totalidade.
Claro, é muito bom Alear poder criar clones a mais para comprar tempo em combate quando pareado com Lyn, porém seu dano com Astra Storm chega a ser irrisório. Por outro lado, Ike prefere personagens que não se importem com a perda de Avo para causar um dano significativo com Great Aether — ou seja, o líder dos mercenários de Greil não é uma boa opção para unidades de função Covert.
Eu poderia continuar a listagem de exemplos ad aeternum, mas, como ainda temos muita lenha para queimar nesta análise, sigamos para o próximo tópico. No entanto, firmo aqui um compromisso com você: voltarei a abordar todas as funcionalidades dos Emblem Rings em matérias futuras.
Fazendo a social, mas não muito
Somniel é um hub que serve como ponto central para as diversas atividades não relacionadas aos combates. É nesta base de operações que podemos comprar itens e equipamentos, participar de minijogos e, acima de tudo, interagir com os aliados.
Contudo, quem esperava momentos mais significativos com os companheiros de batalha, tal qual acontece em Three Houses, pode se decepcionar com a limitação de atividades. Mais uma vez, a interação social não é um aspecto significativo em Engage, cujos esforços foram direcionados para os combates. Ou seja, para aumentar o nível de suporte entre eles com mais eficiência, é melhor fazer isso em campo de batalha.
Isso não quer dizer que não seja importante passar um tempinho por lá e explorar tudo o que Somniel tem a oferecer — com cada vez mais conteúdo sendo desbloqueado à medida que avançamos na campanha — e destaco três locais interessantes (e, de certa forma, importantes): Arena, Ring Chamber e Tower of Trials.
A Arena, como o nome sugere, é onde podemos evoluir nossos personagens com certa agilidade; aqui, ganhar ou perder os duelos acarreta ganho de EXP e, dependendo do oponente (escolhido aleatoriamente, vale ressaltar), aumentar o suporte entre eles. Também podemos evoluir o bond level entre aliados e Emblems em troca de Bond Fragments, agilizando a obtenção de habilidades.
Na Tower of Trials, temos a oportunidade de lidar com diversos desafios em sequência em troca de itens que servem como melhorias para as armas dos Emblems. Por mais que nossas unidades não ganhem EXP durante esses combates especiais, eles são uma ótima oportunidade para testarmos diferentes estratégias e combinações.
É na Ring Chamber que podemos acessar os benefícios proporcionados pelos Emblems, como o sistema de Inherit Skills e a criação de Bond Rings. Estes são adquiridos por meio de um sistema gachapon e conferem pequenos bônus aos parâmetros dos personagens quando equipados.
Talvez a parte mais interessante da câmara seja, de fato, a possibilidade de aprender as habilidades dos Emblems em troca de skill points (SP) que os personagens ganham em combate. Se equipar um Emblem Ring já faz diferença, imagine só combinar diferentes skills simultaneamente!
Para todos os gostos
Abordadas as mecânicas principais de Engage, vamos à customização do jogo. Esta nova entrada da franquia dispõe de três dificuldades, Normal, Hard e Maddening, que afetam significativamente a experiência em batalhas.
Para os veteranos em Fire Emblem, eu realmente aconselho as duas últimas, que captam a verdadeira essência da série; no entanto, caso você queira se familiarizar com a história e os personagens primeiro, escolha Normal sem medo de ser feliz. Também não se preocupe se precisar diminuir a dificuldade ao longo da campanha, mas tenha em mente que esse é um processo irreversível.
Em conjunto às dificuldades, estão os modos Casual e Classic: no primeiro, unidades derrotadas em combate continuam disponíveis até o fim da campanha, enquanto o segundo traz o sistema de morte permanente (permadeath) da franquia. Pense bem antes de escolher entre um e outro, pois não é possível alterar o modo de jogo uma vez iniciada a campanha.
Performance excelente dentro dos limites do Switch
Engage não apenas traz cenários e personagens vibrantes e coloridos, como também uma interface limpa e organizada, seja durante as missões, seja em Somniel. O melhor de tudo isso é que, por mais que existam uns serrilhados e borrões aqui e ali, o jogo roda muito bem no Switch.
Tanto no modo TV quanto no portátil, achei a realização de ações e atividades muito fluidas e rápidas, e os momentos de exploração são um vislumbre à parte. Mesmo não sendo especialista nessa parte mais técnica, acredito que esse desempenho esteja ligado ao fato de ter sido feito em Unity, a mesma engine utilizada em Pokémon Brilliant Diamond/Shining Pearl.
Claro, em alguns poucos momentos, em especial após as telas de carregamento, senti algumas travadas e "engasgos" pontuais, às vezes uma ligeira demora para carregar um elemento ou outro do cenário, mas nada que, de fato, tenha comprometido a jogatina como um todo; embora existam, esses pequenos pontos fora da curva não afetaram (ou afetaram muito pouco) a taxa de quadros por segundo. De todo modo, perceptíveis ou não, Engage continua sendo uma experiência bastante satisfatória.
Também gostei bastante dos dubladores selecionados. Embora eu tenha jogado majoritariamente em inglês, pois é um idioma que consigo entender, a dublagem em japonês apresenta ótima qualidade; é como se os atores tivessem sido escolhidos a dedo para interpretar seus papéis.
Por fim, a trilha sonora é envolvente e carismática. Senti que poderia ter tido uma variedade maior de músicas, mas as presentes no jogo não são enjoativas e não é raro eu cantarolá-las enquanto jogo.
Um verdadeiro presente de aniversário para a franquia
Fire Emblem Engage é, com toda certeza, a entrada perfeita para jogadores que querem conhecer todo o potencial estratégico que a franquia tem a oferecer. Os conceitos já consagrados da série ficaram ainda melhores com os sistemas exclusivos da 17ª entrada, fazendo com que até veteranos precisem tirar um tempinho para estudar o que as novas mecânicas acrescentam à experiência.
É verdade que, nos âmbitos narrativo e de interações sociais, Engage pode deixar a desejar para alguns, ainda mais depois da experiência proporcionada por Three Houses. De modo geral, este novo Fire Emblem consegue ser um jogo inovador, mas que não abre mão de suas raízes em momento algum.
Prós
- Combates dinâmicos que priorizam o pensamento estratégico acima de tudo;
- As mecânicas exclusivas complementam com excelência as já consagradas na franquia;
- Dificuldade de jogo adaptável, podendo ser diminuída se necessário;
- Diversas referências aos jogos passados da série;
- Ótima apresentação audiovisual;
- Interface limpa e bem organizada;
- Excelente performance no Switch, tanto no modo TV quanto no portátil.
Contras
- História e personagens pouco desenvolvidos se comparados aos de Three Houses, podendo desagradar a alguns jogadores;
- Poucos momentos de interação com aliados em Somniel;
- Telas de carregamento longas em alguns momentos.
Fire Emblem Engage — Switch — Nota: 9.0
Revisão: Vitor Tibério
Análise produzida com cópia digital cedida pela Nintendo