Desbravando a península com os Braves
Logo ao iniciarmos Brave's Rage, uma breve cena cinematográfica é exibida com o seguinte enredo: nas terras mágicas da Taoist Peninsula, o temido dragão Suva'cillathon causou caos e destruição ao sequestrar a princesa local. Diante de tal calamidade, o grande monarca ofereceu uma recompensa para quem fosse capaz de resgatar a sua filha, em uma sedutora proposta que chamou a atenção de guerreiros de toda a península.
Em nossa jogatina, portanto, assumimos o papel de um desses heróis — chamados de Braves pelo jogo — que investigam o paradeiro da princesa. Há de se reconhecer que, desde os primeiros instantes de gameplay, temos uma narrativa que não é lá muito original, pois se caracteriza pela presença de diversos lugares-comum, como dragões vilanescos, raptos de altezas e heróis em ação.
Para além da evidente trivialidade, a trama de Brave's Rage também deixa a desejar diante da ausência de grandes acontecimentos, cenas cinematográficas e diálogos no decorrer da campanha, não desenvolvendo o seu enredo como poderia. Afinal, do início ao fim da jogatina, pouco ficamos sabendo sobre as terras mágicas da obra e demais características do enredo, elementos que permanecem em segundo plano durante a jornada.
Isso aparentemente ocorre porque o título concentra os seus esforços em desenvolver os aspectos de sua jogabilidade, encontrando dificuldades narrativas sobretudo diante de sua progressão roguelite e dos múltiplos protagonistas possíveis. De qualquer forma, há de se apontar que, por mais que o gameplay seja envolvente, é notável que o jogo sofre com fragilidades na exibição de seu enredo como um todo.
Uma combinação de estilos em ação
Logo ao iniciarmos a jogatina, assumimos o papel de um destes Braves e ingressamos em mapas segmentados por pequenos quadrados, nos quais podemos nos locomover com liberdade. Nestes fragmentos, encontramos diversos elementos iconográficos que indicam a presença de estabelecimentos, fontes para recuperar vida, cavernas, lojas e, claro, diversos inimigos que devem ser derrotados em engenhosas batalhas.
Diante de um sistema deckbuilder, cada personagem dispõe de um repertório de movimentos baseado em cartas que seguem o estilo de seus armamentos. Estes elementos poderão ser acionados, durante os embates, por meio de recursos active time battle, nos quais cada participante deve esperar um determinado período para escolher uma carta e assim fazer um movimento por vez.
Isso faz com que seja necessário atenção para as cartas de golpes momentaneamente disponíveis, que são sacadas de forma aleatória e podem ser utilizadas de acordo com o funcionamento da barra de ação dos personagens. Com isso, conforme progredimos na campanha, podemos adicionar ou substituir os movimentos de nosso baralho, justificando a interface deckbuilder que o título promete entregar.
As batalhas são divertidas e intensas pois incorporam elementos de ação, tornando as conjunturas ainda mais complexas conforme temos a capacidade de realizar movimentos especiais, como combos e bloqueios, e também de duelar ao lado de Braves ajudantes, que podem ser resgatados nos mapas. Como cada personagem tem singularidades que devem ser levadas em conta, temos uma boa variedade de duplas, que podem ser formadas com os nove protagonistas desbloqueáveis, entre eles arqueiros, magos, espadachins e afins.
Além da intensidade dos embates, outro fator que torna Brave's Rage um jogo difícil é a sua progressão roguelite. Em outras palavras, isso significa que os estágios da campanha devem ser completados de uma só vez, sem que o nosso Brave principal morra nos embates. Para facilitar essa interface, o jogo oferece um sistema de nivelamento que concede alguns upgrades permanentes, como melhorias nos atributos dos personagens e cartas de movimentos mais poderosas.
Desse modo, sinto-me seguro em dizer que este RPG traz uma boa diversidade de recursos de gameplay, que são funcionais e proporcionam uma jornada envolvente mediante a oferta de desafios que combinam elementos de estratégia com movimentos ágeis. Ou seja, se por um lado Brave's Rage sofre com uma narrativa superficial, por outro ele desfruta de um sistema de batalhas profundo que rouba a cena com seu brilho durante a performance.
Algumas pedras no caminho dos heróis
Quando se trata de gráficos, a aventura dos Braves estampa um estilo cartunesco e fantasioso que é, de fato, bastante bonito, apresentando cenários vibrantes e personagens cuidadosamente detalhados. Entretanto, há um ponto que pode incomodar, que é o fato de que o título não se destaca com singularidades. Isso ocorre na medida em que ele incorpora um estilo excessivamente clássico e, às vezes, até um tanto genérico, sendo similar a muitos outros RPGs fantasiosos que encontramos por aí.
Outro detalhe complicador que eu encontrei em minha jornada passa pelas caixas de texto da interface do jogo. Algumas delas são pequenas demais e comprometem a leitura no modo portátil do console da Nintendo, o que é um problema dado que essa é uma demanda constante no título, sobretudo quando temos que ler as funcionalidades das cartas de nosso deck.
Além do mais, há outro problema que precisa ser apontado: a dificuldade exagerada nas primeiras horas de gameplay. Acontece que Brave's Rage não é exatamente um jogo muito convidativo no começo, proporcionando diversas mortes com desafios demasiadamente severos, especialmente para jogadores que não estão acostumados ao funcionamento de seus gêneros.
Junto a isso, senti uma falta de maiores incentivos para seguir na tentativa de completar a campanha, pelo menos nos primeiros instantes de jogatina. De certa forma, acredito que isso ocorra pois as melhorias que podemos empregar nos personagens não são tão atraentes de imediato, levando um tempo até conseguirmos recursos eficientes. Ainda por cima, a ausência de grandes acontecimentos na trama deixa a jogatina repetitiva e sem intrigar os jogadores, que podem se desmotivar diante disso.
São esses detalhes, portanto, que impedem Brave's Rage de se destacar com maior brilho na biblioteca do Switch. É curioso notar essa conjuntura pois o essencial do gameplay, que são efetivamente as batalhas, não dispõe de grandes defeitos ou de uma falta de personalidade, muito pelo contrário. O problema, porém, é que o título deixa a desejar em outros pilares de seus alicerces, o que é um fator que compromete parte de seu potencial.
Decks, decisões e diversão
Diante de boas propostas de jogabilidade com mecânicas deckbuilder e active time battle, Brave's Rage se apresenta enquanto um agradável RPG que se soma à biblioteca de indies do Switch. Ainda que tenha problemas em sua personalidade, os seus desafios são robustos o bastante para nos manter envolvidos por um bom tempo. Assim, a aventura se mostra capaz de render momentos valiosos, tão ricos quanto a recompensa prometida pelo rei para o Brave que conseguir derrotar o dragão da trama.
Prós
- A mistura de gêneros é bem implementada e gera uma fórmula envolvente;
- Grande variedade de personagens e cartas, permitindo estratégias plurais;
- O conceito de ATB traz emoção para as batalhas;
- Visuais agradáveis em um estilo cartunesco.
Contras
- Diante de poucos acontecimentos e diálogos, a trama é pouco desenvolvida;
- Às vezes o jogo passa ares genéricos em termos de enredo e estética;
- Algumas caixas de diálogo são pequenas demais para o modo portátil do Switch;
- Dificuldade elevada e poucos incentivos nas primeiras horas de jogatina.
Brave's Rage — Switch/PS5/PC — Nota: 7.5Versão utilizada para análise: Switch
Revisão: Vitor Tibério
Análise produzida com cópia digital cedida pela Astrolabe Games