NieR: Automata (Switch): Entrevistamos YOKO TARO, Yosuke Saito e Keiichi Okabe

Os desenvolvedores falam sobre influências e referências em Automata, a parceria com a PlatinumGames e o estilo musical da série NieR.

em 19/10/2022

Square Enix e Nintendo nunca estiveram tão próximas desde a era 16-bits. Ainda assim, uma das maiores surpresas deste ano no Switch foi NieR:Automata The End of YoRHa Edition, um excelente port de um dos JRPGs mais aclamados da última década. Graças ao intermédio da Square Enix Latam (@SquareEnixLatam), tivemos a oportunidade de entrevistar três dos principais nomes por trás desse relançamento.


Conversamos sobre a parceria com a Platinum, o estilo musical de Automata em relação à série NieR e as referências de YOKO em sua direção e escrita. A entrevista foi feita originalmente em inglês remotamente com os desenvolvedores durante a semana de lançamento de NieR:Automata The End of YoRHa Edition, contando com o auxílio da Square Enix para a tradução do japonês para o inglês. O texto que você pode conferir abaixo é uma tradução integral das perguntas e das respostas.



Escritor e diretor das séries Drakengard/NieR e Voice of CardsYOKO TARO (@yokotaro) é famoso por sua personalidade irônica, espontânea e imprevisível. Sua direção em RPGs é marcada por perspectivas de câmera alternadas e por uma mistura de mecânicas de outros gêneros. Como escritor, é conhecido por tramas melancólicas, ramificadas, filosóficas, com referências à cultura otaku, e que criticam convenções de game design. Caso queira saber mais, escrevi um artigo sobre seu estilo no decorrer de sua carreira: Game Masters: Yoko Taro (inglês). 
Nintendo Blast: YOKO-san, seus trabalhos tendem a ter uma abordagem única em relação à linguagem dos videogames. Mesmo coisas consideradas "comuns", como gênero de jogo, finais, save points ou até mesmo a ideia de matar criaturas não humanas ou vilões são refletidas em seus títulos. O que motiva seu design de jogo subversivo e imprevisível em jogos como NieR: Automata? Há algum diretor de cinema ou videogame que você admira? Algum escritor que o inspire?

YOKO TARO: No que diz respeito às influências, sou influenciado por praticamente todos os filmes a que assisto, sejam eles bons ou chatos. O mesmo vale para jogos e livros.

Pensando bem, também sou influenciado por programas de variedades (variety shows) e notícias.

Eu tento não assistir a muitos filmes e [outras] coisas porque sou muito influenciado por eles. Há tanto conteúdo interessante neste mundo que eu poderia morrer.

NB: Jean-Paul Sartre, em Existentialism is a Humanism (1946), define “angústia” como a emoção que as pessoas sentem quando percebem que são responsáveis não apenas por si mesmas, mas por toda a humanidade. NieR: Automata tem várias referências ao existencialismo humanista de Sartre, o que me faz pensar: você acredita que há algo especial na linguagem dos videogames que pode evocar esse tipo de emoção? Se sim, o que você destacaria no design do jogo que foi implementado para esse fim?

YOKO: A resposta a esta pergunta é algo que os jogadores devem descobrir por si mesmos. No entanto, lembre-se de que YOKO não mencionou o nome de Sartre sem uma ponderação cuidadosa. Isso mesmo, eu não o joguei aleatoriamente no meio [da história] porque pensei: "pode ser legal se eu mencionar o nome de um filósofo", enquanto bebia um pouco de cerveja. Absolutamente não.

Por favor, certifique-se de informar a todos no Brasil. Cerveja é muito bom.



Em Nier: Automata, seu produtor também teve um papel fundamental. Membro do Dragon Quest Team desde a antiga Enix, Yosuke Saito (@SaitoYosuke_Z) também tem produzido todos os trabalhos dirigidos por YOKO TARO, exceto Drakengard 3 e SINoALICE. Para o desenvolvimento de NieR: Automata (PS4), Saito foi um dos intermediadores da parceria da Square Enix com a PlatinumGames. Recentemente, também foi produtor de outro jogo com essa empresa, Babylon's Fall, lançado em março deste ano (2022).
NB: Saito-san, sabemos que você também foi o produtor de NieR (2010), que foi desenvolvido pela Cavia como os dois primeiros jogos Drakengard. Para as pessoas que já eram fãs da série Drakengard/NieR, foi inesperado que a Square Enix se unisse à Platinum para desenvolver um novo jogo nesta série, NieR: Automata. Como aconteceu essa parceria? E você acha que essa parceria foi decisiva para tornar NieR: Automata mais popular em comparação com os jogos Drakengard/NieR anteriores?

Yosuke Saito: Queríamos encontrar o melhor desenvolvedor para criar um RPG de ação, então abordamos a PlatinumGames.

Na equipe, Taura* destacou-se por ser especialmente talentoso, o que consideramos um dos principais fatores que contribuíram para o sucesso deste título.

* Nesta resposta, Saito refere-se a Takahisa Taura, game designer de jogos como The Wonderful 101 e Metal Gear Rising: Revengeance. Tornou-se game designer senior para NieR Automata (PS4), e mais recentemente foi diretor de Astral Chain (Switch). A proximidade de Taura com o time de NieR é notória. Na Tokyo Game Show 2022, por exemplo, Astral Chain foi exposto e comentado por Taro e sua equipe na apresentação da Square Enix, mesmo sem ter nenhuma relação com desenvolvimento ou publicação do jogo. A divulgação foi autorizada pela Nintendo (detentora dos direitos dessa IP).



O jogo também não seria o que é sem suas músicas, o que nos leva a Keiichi Okabe (@MONACA_okabe), um compositor, arranjador e diretor musical que tem sido um dos nomes-chave para os projetos de YOKO TARO desde NieR (PS3/X360). Em 2004, fundou um estúdio musical chamado MONACA. Em parceria com outros músicos — como a cantora Emi Evans — e outros compositores do estúdio, Saito deu uma forte identidade musical à série NieR, um estilo também sentido em NieR: Automata. Seus trabalhos destacam-se por uma grande sensibilidade com vocais e harmonias melancólicas.
Nintendo Blast: Okabe-san, tenho algumas questões sobre a música do jogo. Acho que um dos destaques da trilha sonora da série NieR está em seus vocais. Não é comum usar vocalistas solo em música de fundo em videogames e também não é comum que as músicas tenham vários idiomas (como francês, alemão, chinês e outros). Essas escolhas foram feitas para dar ao jogador um “sentimento mais humano” e uma sensação de intimidade? Qual é o papel dessas escolhas em NieR: Automata?

Keiichi Okabe: YOKO-san pediu desde o início para incluir algum tipo de "voz" na música da série NieR.

Seja um refrão, um vocal solo ou um sussurro, quase como uma respiração, há uma enorme variação de vozes que foi incorporada dependendo do que a música envolve.

[Essa escolha] não é tanto para dar apenas uma impressão específica de humanidade ou familiaridade, mas uma impressão única, própria de NieR e seu mundo.

Nintendo Blast: Percebo que a harmonia das músicas da série NieR quase invariavelmente tem um "som menor clássico" (como em A Beautiful Song, que lembra Carmina Burana de Carl Orff) ou um "som menor suave" (como em Voice of no Return). Quais compositores e músicos inspiram seu trabalho nesses dois estilos de música?

Okabe: Como forma de se alinhar com o enredo de NieR e as emoções dos personagens, as músicas são compostas em um tom menor para infundir uma sensação de melancolia, em graus variados, em toda a música.

YOKO-san também me envia músicas de referência junto com seus pedidos, então eu as tomo como referência, mas minha intenção nunca é criar especificamente uma música assemelhada ao trabalho de um determinado compositor. No entanto, sou influenciado pelos compositores cujas músicas escutei, então acho que a música [de NieR] reflete a essência de muitas pessoas diferentes misturadas.



O que achou do papo? Você sabia da importância de Sartre (e talvez da cerveja?) para a escrita de NieR: Automata? E o que acha da música desse game? Se por alguma razão você ainda não as ouviu, pode conferi-las ao final de minha análise de Automata. Falando em análise… você já jogou Astral Chain (dirigido por Taura-san)? Em termos de design de combate, essa é uma recomendação fácil para caso tenha gostado de quebrar robôs com a 2B e 9S. Confira nossas análises desses jogos e deixe seus comentários abaixo.
Revisão: Juliana Paiva Zapparoli

Doutorando em Filosofia que passa seu tempo livre com piano, livros, PC e portáteis. No Twitter, também é conhecido como Vivi. Interessa-se especialmente por narrativas de ficção científica, realismo mágico e alta fantasia política, e aprecia mecânicas de puzzle, stealth, estratégia e RPG. Seu histórico de análises pode ser conferido no OpenCritic e suas reflexões sobre RPG e game design encontram-se na SUPERJUMP (textos em inglês), bem como no Podcast do Vivi e em seu canal no YouTube.
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