O Nintendo 64 teve alguns jogos interessantes de corrida e o primeiro deles foi Wave Race 64. Foi o quarto título lançado para o console no Japão, em 23 de setembro de 1996, e o terceiro na América do Norte, no começo de novembro do mesmo ano, mas foi mais um produto que exibiu o diferencial de gameplay em mundos tridimensionais que o aparelho da Nintendo prometia.
O resultado pode ser conferido no aplicativo de N64 do Nintendo Switch Online + pacote adicional, pois Wave Race 64 foi recentemente lançado no serviço, no dia 19 deste agosto, e os assinantes não deveriam deixá-lo passar em branco. A jogabilidade aquática é boa e desafiante até hoje, sendo motivo suficiente para valer a pena conhecer o que ela tem a oferecer.
Antes, vamos considerar isto: o Nintendo 64, lançado em junho de 1996, ficou 3 meses com apenas 3 jogos no Japão! Super Mario 64 e Pilotwings 64 cumpriam até então a tarefa de mostrar o nível do console e seus ambientes poligonais, mas o terceiro lançamento foi de shogi, um jogo de tabuleiro que não retratava o passo geracional.
Assim, Wave Race 64 foi um representante nintendista importante na magra janela de lançamento de 1996. Uma mostra do potencial depositado nele foi a participação de Shigeru Miyamoto como produtor ao lado de Katsuya Eguchi na direção, uma dupla que já havia trabalhado antes em jogos de Mario e também no primeiro marco 3D da Nintendo, Star Fox (SNES).
Ambicioso na forma...
Naturalmente, o principal destaque de Wave Race 64 é a água. Transparente e brilhante, a reprodução líquida impressionou por seu movimento dinâmico e física realista como em nenhum jogo antes dele. O jetski é o veículo ideal para demonstrar o efeito porque, sendo pequeno, ele corta a água ao mesmo tempo em que é levado e sacudido pelas ondas. O jogador logo aprende que um de seus objetivos é manter seu competidor de pé durante a corrida.
Os personagens são os meros polígonos rudimentares que vemos nas imagens, mas a animação os mostra sempre tentando preservar o equilíbrio enquanto o jetski balança seguindo cada movimento da água. A própria câmera ondula levemente, aumentando a sensação de movimento. Tudo isso constrói um cenário coerente que não é puramente visual, como se não passasse de pistas de corrida com tema aquático. Wave Race 64 vai além e concentra na água seu principal elemento estético, técnico e de gameplay, resultando em uma harmonia notável e imersiva. É por isso que envelheceu bem.
Guiar o veículo em meio ao sobe e desce das ondas é prazeroso. Deslizar em velocidade e ser lançado ao ar exige que o jogador se aprimore no domínio da moto aquática. Faça uma curva fechada demais e seu competidor vai escorregar do jetski, ainda agarrando-se pelas mãos, mas com grande impacto negativo na velocidade. Esbarre em obstáculos e ele cairá totalmente na água, perdendo tempo precioso até conseguir retomar o rumo, o que é praticamente uma confirmação de que não será mais possível terminar a corrida em primeiro lugar. A fragilidade do equilíbrio à mercê da água leva à necessidade de saber dosar entre cuidado e risco – e a muitas vitórias perdidas por um deslize.
Um ponto importante que diferencia Wave Race 64 são as boias de balizamento na forma de setas, como na foto abaixo. O competidor precisa passar à esquerda das amarelas e à direita das vermelhas. Passar corretamente por 5 setas forma um combo que aumenta a velocidade máxima. Perder uma delas quebra o combo e, ao perder 5 bóias, o jogador é desclassificado daquela pista e não recebe pontos.
Essa mecânica incrementa a sensação de corrida arcade e modifica a simplicidade das pistas ao criar trajetos mais tortuosos de acordo com a dificuldade escolhida.
...mas humilde no conteúdo
Ainda que, em sua época, Wave Race 64 tenha se destacado no quesito técnico, não deixa de ser um jogo curto. Há parcos 4 personagens jogáveis, cada um com duas paletas de cores (na tela de seleção de personagem, segure ↑ para alternar) e diferentes atributos que não são mostrados. Mesmo assim, podemos alterá-los através de medidores que variam entre curvas mais leves ou mais pesadas, mais aceleração ou mais velocidade máxima.
Honestamente, nunca mexi muito nisso, apenas um pouco na velocidade, e dá para aproveitar tudo com as configurações básicas dos personagens, mas está aí para quem quiser experimentar.
O conteúdo principal em jogos do gênero são as pistas e, neste caso, temos apenas 8 trajetos de corrida e um estágio extra para manobras, sempre com extensões que ficam na média dos 30 segundos por volta. Dessa forma, o principal modo, o de campeonato, mal chega aos 15-20 minutos. Como comparação, Mario Kart 64, bem mais simples tecnologicamente, foi lançado poucos meses depois com 16 pistas.
Wave Race 64 tem 6 pistas no modo Normal, guardando mais um para o Hard e outra para o Expert. A primeira é Sunny Beach, uma oval básica para aprendermos a guiar o veículo por entre as boias e sentir como é passar por uma onda. Em seguida vem Sunset Bay, que acrescenta rampas, mas ainda é bem simples.
A próxima é Drake Lake, um lago de águas calmas que demanda mais precisão também com alguns zigue-zagues. Começa com uma neblina que se dissipa ao longo da corrida, reforçando a atmosfera natural e pacífica do lugar, mas a visibilidade reduzida não afeta a dificuldade porque o jogador já está acostumado com os elementos que só surgem quando nos aproximamos deles (pop-in), algo que acontece muito com as bóias e que, na verdade, afligia o catálogo do N64.
Em Marine Fortress a água é agitada e tem ondas que lançam o jetski ao ar e dão a opção de saltar sobre um quebra-mar. Isso é uma aposta: se funcionar, dá um pouco de vantagem, mas se você tentar na hora errada, perderá bastante tempo. Port Blue aumenta a dificuldade com algumas paredes a serem evitadas e uma curva fechadíssima após uma rampa, que demora para ser dominada.
Por fim, acho Southern Island a fase mais interessante porque a maré fica mais baixa a cada volta, revelando a areia da praia e obstáculos que antes estavam submersos, o que altera significativamente alguns trechos e exige mais presteza na condução para seguirmos no melhor caminho.
Aqui o jogo começa de verdade
Ao finalizarmos o jogo na dificuldade Normal, Wave Race 64 ainda tem algumas cartas na manga. Os modos Hard e Expert trazem água mais agitada, mais boias e alguns obstáculos extras. Além disso, são adicionadas algumas mudanças às fases, como portas que se abrem em Marine Fortress e Port Blue, revelando caminhos mais sinuosos e estreitos que certamente exigem que o jogador desenvolva sua habilidade para cruzá-los sem acidentes.
O importante é que o Hard traz a fase Twilight City, que tem mais saltos em rampas que as anteriores e, quando você acha que já pegou o jeito, o Expert adiciona Glacier Coast, com trechos em que o jetski passa por gelo e desliza sem qualquer freio, exigindo reaprender o ângulo e o momento certo para entrar nessas curvas.
Com isso, a dificuldade Normal parece apenas um modo de treino e não é surpresa se o jogador conseguir vencer o campeonato no primeiro dia. O Hard mostra outro nível de competição e o Expert requer bastante prática. Para variar as coisas, há o modo Reverse, que é apenas o Expert com circuitos invertidos.
Esse último acréscimo não anula o fato de haver pouco conteúdo, mas é bem-vindo ao saldo final por levar o desafio adiante e dar mais um passo em desafiar o jogador a continuar desenvolvendo habilidade.
Em outras águas
Ainda não falei das manobras em Wave Race 64. Elas são possíveis durante as corridas, mas só servem para se exibir ou para cair do jetski e estragar a vitória. O lugar delas é o Stunt Mode, no qual o jogador acumula pontos ao passar por uma sequência de aros e realizar manobras ao saltar das rampas e ondas. Cada pista sem seu recorde de pontuação a ser batido e há uma pista extra exclusiva para esse modo, Dolphin Park, onde um golfinho acompanha o percurso; aliás, há um truque para desbloquear o golfinho como “jetski” secreto.
Poucas e simples, as manobras envolvem apenas direções na alavanca, mas também fazem parte do prazer de dominar o controle dos jetskis na água e no ar, especialmente naquela época em que se movimentar por ambientes tridimensionais era uma novidade e um deleite por si só.
O título oferece ainda um modo Time Trial, útil para treinar as pistas individualmente, e um modo de dois jogadores, o que parece um desperdício diante da novidade do Nintendo 64 em permitir até quatro controles de forma nativa, sem precisar de adaptador – provavelmente o sistema não aguentaria tudo isso.
Não é só nostalgia
Wave Race 64 é uma experiência que mantém boa consistência ainda hoje e vale a visita e até a permanência por algum tempo, enquanto você sente o seu progresso no controle dos jetskis.
Tive o cartucho e foi um dos meus favoritos enquanto durou; após alguns meses, troquei por outro. As músicas ficaram na memória ao longo dos anos, mesmo sem ter jogado os relançamentos para o Virtual Console do Wii em 2007 e do Wii U em 2016. Foi um prazer rejogá-lo no NSO.
Vale mencionar que a entrada para o Nintendo 64 é o segundo jogo da série. Antes, veio o Wave Race (Game Boy) em 1992 e depois tivemos o Blue Storm (Game Cube) em 2001, mas não cheguei a jogá-los. Só posso atestar que Wave Race 64 basta para entrar na lista de “franquia-esquecida-há-20-anos-que-precisa-de-continuação!”.
Revisão: Davi Souza