Os lançamentos da Nintendo estão atendendo ao público na era Switch? O que está faltando?

Apesar das IPs atuais estarem indo bem, ainda há gêneros pouco explorados e há franquias importantes da Nintendo que não deram as caras no Switch.

em 27/05/2022

Passados cinco anos desde seu lançamento, não resta a menor dúvida de que o Nintendo Switch é um grande sucesso. O console vendeu já mais de 107 milhões peças de hardware, fazendo-o o quinto console mais vendido de todos os tempos. A expectativa é de que venda em torno de 20 milhões de unidades neste ano de 2022, tornando-se o quarto mais vendido no ranking. O sucesso desse console é ainda mais flagrante no Japão, onde já é o terceiro mais vendido da história do país do Sol nascente, atrás somente do Game Boy e do Nintendo DS.


A venda de jogos no Switch também impressiona. O console já vendeu mais de 820 milhões de softwares, mais de duas vezes o número do 3DS, que vendeu “apenas” 76 milhões de unidades de hardware e está com loja digital ainda aberta para vendas de jogos há mais de 10 anos. A venda de jogos no Japão é particularmente impressionante. Semana após semana por lá, nos últimos anos o relatório semanal da Famitsu aponta que 20 ou mais títulos do top 30 jogos mais vendidos no país são do Switch.


Em termos globais e históricos, o console híbrido da Nintendo ainda está atrás do Wii em vendas de softwares (+921 milhões de unidades) e muito atrás do PS4, que se tornou em 2021 o console com maior número venda de softwares da história: mais de 1.56 bilhões de unidades, destronando o PS2. Contudo, como já afirmado pelo presidente da Nintendo, o Switch ainda está na metade do seu ciclo de vida. Supondo que realmente tenha mais meia década pela frente, mesmo com outro console sendo comercializado em simultâneo, é possível que haja ainda um crescimento bem significativo de vendas totais tanto de hardware quanto de software.

Dado esse contexto, discutiremos se os lançamentos da Nintendo no Switch estão atendendo bem ao seu público e o que, em termos de softwares, ainda está falando nesse console. Note que estaremos nos limitando aos lançamentos da Nintendo em particular, e não softwares em geral (incluindo de terceiros). Essa delimitação visa tornar este artigo mais conciso e, além disso, priorizar a publicadora que possui maior sucesso crítico e popular na plataforma.



A boa recepção crítica e popular dos jogos da Nintendo e o perfil de seu público

Não há dúvidas de que a recepção crítica dos títulos para Switch em geral é muito boa. O console já possui 25 jogos considerados must-play pelo Meta Critic, ou seja, jogos com nota superior a 90/100 avaliados por mais de 15 críticos independentes. Considerando consoles concorrentes de 8ª e 9ª geração, um número que só fica atrás do PS4, com 29 títulos must-play.

A aclamação crítica dos jogos de Switch é, tal como ocorre com a Sony em relação ao PS4 e PS5, especialmente marcante nos títulos da própria Big N, responsável por cinco desses jogos must-play. Isso sem contar outros lançamentos must-play em que seu papel foi decisivo, como na parceria com a Square Enix para a versão definitiva de Dragon Quest XI.

Mas é na diferença de sucesso popular dos jogos da Nintendo que realmente fica abissal a comparação com outros títulos disponíveis na plataforma. 27 dos 30 jogos mais vendidos para Switch são publicados pela Nintendo, seus jogos sempre dominaram o top 10 de vendas na plataforma e Mario Kart 8 Deluxe (Switch) sozinho já vendeu mais do que a soma de vendas de todos os jogos de terceiros best-sellers (ou seja, jogos com vendas superiores a 1 milhão de unidades).




O “público alvo” da Nintendo pode ser subdividido em cinco tipos de “grande público” de consumidores que a empresa tem cultivado ao longo de sua história
  • Fãs de plataforma;
  • Pokemaníacos;
  • Casuais;
  • RPGistas;
  • Zeldeiros.
O primeiro grupo (fãs de plataforma) é um grande alvo da empresa desde seu primeiro console, na década de 1980, e é pensando nele que surgiram as principais contribuições da empresa para a história dos videogames, tais como as franquias Super Mario, Kirby, Donkey Kong, Metroid, Kid Icarus e muito mais. E também é pensando nesse público do Switch que muitas empresas terceiras lançam seus jogos no Switch e obtém ótimo resultado imediato, como, por exemplo, os jogos de Sonic, da antiga concorrente Sega.

O segundo grupo (pokemaníacos) é um público bem importante da empresa desde o Game Boy e tem sido também uma das razões para a popularidade de seus consoles portáteis, já que seus jogos costumam aproveitar ao máximo as potencialidades desses hardwares. Assim, a série Pokémon possui milhares de fãs fiéis pelo mundo, além de novos adeptos geração após geração, tanto pelos jogos quanto pela série animada, razão pela qual quase todos os títulos principais da franquia possuem vendas superiores a 10 milhões de unidades.




O terceiro grupo (casuais) sempre existiu nos videogames em geral, mas a Nintendo ampliou imensamente esse público em seus consoles a partir da 7ª geração. Isso foi feito por uma estratégia do então presidente Iwata, como conta em seu livro Iwata Asks, para atingir “não-gamers” através de escolhas de design mais intuitivas, indo desde a redução de dificuldade no level design e a simplificação de interface até o uso de controle de movimento no Wii e da caneta stylus no DS.

E o quarto grupo (RPGistas) é um público que, embora tenha se formado no NES e SNES, principalmente por JRPGs de outras empresas, ele tem sido cultivado pela Big N nas gerações seguintes, sobretudo em duas frentes. Por um lado, a frente de seus consoles portáteis que, desde o GBA, tornaram-se as principais plataformas na indústria para RPGs de turno e RPGs táticos, tanto de publicação própria — desenvolvidos pela Intelligent Systems — quanto de publicação de terceiros, como Final Fantasy Tactics Advance e A2, desenvolvidos pela Square Enix e Radiant Historia e vários títulos de Shin Megami Tensei feitos pela Atlus. Por outro lado, nos seus consoles de mesa, a frente de Xenoblade e outros RPGs da Monolith Soft — estúdio adquirido pela Nintendo no final dos anos 2000.




Por fim, os zeldeiros. Embora a série The Legend of Zelda seja uma das mais aclamadas da história dos videogames, e também profundamente influente, principalmente no gênero action-adventure, a verdade é que nunca antes chegou ao nível de popularidade atual, pós Breath of the Wild. Mas com o número expressivo de vendas desse título (+26 milhões de unidades), e também pela forma como tem conseguido alavancar as vendas de remakes e remasters da série, já é possível falarmos de mais um “grande público” da Big N.

Apesar de esses cinco “grandes públicos” serem os principais alvos da Nintendo, é claro que há outros perfis que são significativos. Como, por exemplo, os leitores de VNs e outros adventures, como Famicom Detective Club. Afinal, é muito confortável ler VN em modo portátil, e esse diferencial é particularmente valorizado no Japão. E há alguns jogos indie que não são RPGs e nem de plataforma que também são sucessos no Switch, como, por exemplo, Minecraft. Portanto, essa listagem não é exaustiva, mas seletiva em relação aos jogos de maior impacto mediante crítica e vendas.



A Nintendo tem conseguido agradar todos seus principais públicos, mas ainda tem o que melhorar

O Nintendo Switch, enquanto console híbrido, surgiu com a difícil tarefa de substituir tanto o Wii U quanto o 3DS. Em termos de hardware, já é algo desafiador, pois o hibridismo (e mesmo a versão Lite) não permitiu que fosse tão portátil quanto um GBA ou um DS e ao mesmo tempo poderoso como um PS4. Porém o meio-termo, feito de forma versátil em controles e transição de modos de jogo foi algo que agradou, e os números de vendas do tópico anterior o demonstram.

Por outro lado, com esse desafio de hardware também veio a difícil tarefa de redirecionar e agradar os públicos de seus antigos consoles de mesa e de portáteis. Isso definitivamente não foi algo fácil de se fazer, mas ela tem conseguido fazê-lo.

Os fãs de plataforma foram imediatamente chamados para o Switch com Super Mario Odyssey, e hoje já podem jogar também a coletânea de clássicos 3D de Super Mario, Super Mario 3D World, Super Mario Maker 2 e Super Mario Bros. U Deluxe. Além disso, também há dois títulos novos de Kirby (2D e 3D), Donkey Kong Country: Tropical Freeze, Metroid Dread e, em breve, Metroid Prime 4. Lembrando ainda que há vários ótimos platformers disponíveis no serviço Nintendo Switch Online.


Todos esses títulos até agora foram bem recebidos pelo público e pela crítica. Embora haja reclamações quanto ao preço e à forma de comercialização, estamos nos detendo aqui nesta matéria aos lançamentos em si. Comparando com consoles anteriores, esses fãs são os mais bem atendidos no Switch. A maior ausência é de Donkey Kong Country, que não conta ainda com título próprio do Switch, apenas uma versão expandida do jogo de Wii U.

Por sua vez, os pokemaníacos já contam com vários spin-offs menores, uma nova entrada na série para o console, um remake de Diamond/Pearl, seguindo também a tradição geracional, e de bônus receberam Pokémon Legends: Arceus, que reformou a série em pontos que eram pedidos há muito tempo. É verdade que todos esses títulos (principalmente os dois primeiros) receberam críticas mais severas por não aproveitarem bem as capacidades do hardware do Switch como faziam com os portáteis. Por outro lado, Pokémon vende hoje mais do que nunca, e talvez a nova entrada, Pokémon: Scarlet/Violet, aproveitando as melhores de Arceus, compense os problemas com os lançamentos anteriores.

A situação dos casuais também é boa. Animal Crossing: New Horizons, Super Smash Bros. Ultimate, o novo Brain Age, WarioWareMario Kart 8 Deluxe, Ring Fit Adventure, Mario Golf: Super Rush e Nintendo Switch Sports capturaram facilmente o público casual do Wii, Wii U, DS e 3DS, mesmo que todos esses lançamentos, com exceção de New Horizons e o novo Smash, não tenham sido grandes saltos em relação aos antecessores, ou mesmo apenas versão deluxe. Mas ainda há séries de destaque sem representação no Switch, como Pushmo, F-Zero e Punch-Out!!.


Os RPGistas são talvez o grupo menos contemplado entre os principais. O destaque vai para Xenoblade, que tem trazido action-RPGs de qualidade para o Switch. Porém, diferente do 3DS, no Switch ainda há apenas um Fire Emblem de RPG tático, embora de alta qualidade. A série Paper Mario tem se afastado do gênero RPG, e não há nenhum anúncio de Mario & Luigi pela frente. Earthbound também faz falta mais uma vez nesta geração. Felizmente parcerias com outras empresas, como a Atlus e a Square Enix, têm suprido um pouco esse déficit, com lançamentos de Dragon Quest, TWEWY, Shin Megami Tensei, jogos do Team Asano, entre outros.

Quanto aos zeldeiros, estes contam com excelentes títulos da série já no Switch, e a sequência de Breath of the Wild será o exclusivo da franquia que faltava para a plataforma. Por outro lado, ainda fazem falta as versões de Wii U de Twilight Princess e Wind Waker, além de que poderia ter um Zelda 2D novo, seguindo a tradição dos portáteis, cujo último título foi A Link Between Worlds, de 3DS. E falando em 3DS, também faz falta a duologia Oracle, de GBA, disponível no 3DS, mas ainda não no Switch.

Para além desses “públicos maiores”, também podemos dizer que um novo público competitivo tem emergido no Switch e crescido principalmente com Super Smash Bros. Ultimate, Splatoon 2 e, em breve, Splatoon 3. Esse público é promissor, e pode ser mais explorado com novas IPs. Assim como é promissor o público de HnS, alimentado por alguns lançamentos em parceria com a Platinum, podendo também ser explorado com outras IPs. Ademais, seria interessante para a Nintendo que seu antigo público de estratégia fosse recuperado, com Advance Wars e Pikmin, que até o momento se limitaram a aparecer apenas com remaster e remake.

Revisão: Cristiane Amarante
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Doutorando em Filosofia que passa seu tempo livre com piano, livros, PC e portáteis. No Twitter, também é conhecido como Vivi. Interessa-se especialmente por narrativas de ficção científica, realismo mágico e alta fantasia política, e aprecia mecânicas de puzzle, stealth, estratégia e RPG. Seu histórico de análises pode ser conferido no OpenCritic e suas reflexões sobre RPG e game design encontram-se na SUPERJUMP (textos em inglês), bem como no Podcast do Vivi e em seu canal no YouTube.
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