Análise: Arise: A Simple Story - Definitive Edition (Switch) é gracioso, singelo e honesto

O título possui boas ideias de conexão da direção de arte com o level design, mas possui alguns probleminhas e muitas limitações.

em 04/05/2022



Desenvolvido pelo estúdio indie Piccolo Studio e publicado pela Untold Tales, Arise: A Simples Story - Definitive Edition é um modesto art game com mecânicas simples de puzzle em plataforma e influência de design por subtração. Sem qualquer implementação de diálogo ou narração, apenas mecânicas simples e grande foco no audiovisual, o título tem a proposta de explorar a conexão entre entes queridos (especialmente do núcleo familiar) ao mesmo tempo em que desenvolve mecânicas de manipulação de objetos no tempo.

Simples e mal-polido, mas artisticamente exuberante

Antes de tudo, é preciso levar em conta, como o título sugere, que Arise é um jogo modesto, sobretudo em termos de enredo. Ele não traz e nem pretende trazer uma experiência narrativa com uma profundidade densa — um conceito que abordei recentemente em um texto para a SUPERJUMP —, mas se contenta em dizer pouco com pouco, mas o faz de uma forma minimalisticamente graciosa e perspicaz, ao ponto de não parecer fajuto e nem demasiadamente clichê ou vazio.

Sempre com interface limpa e conexão direta com um protagonista, o jogador controla um homem mais velho no topo de uma montanha gélida e mágica com portais que o levam para mundos oníricos e bastante distintos, cada qual relacionado a um sentimento diferente que podemos desenvolver com nossos entes queridos, ou em sua presença ou em sua ausência. Entre eles, sentimentos negativos ou positivos, como de solidão e esperança.

Esses temas foram alinhados, na direção criativa e de arte de José Luis Vaello, a escolhas artísticas e de level design dentro de cada mundo. A solidão, por exemplo, é relacionada ao frio, à lentidão e a tensão para achar a saída de um desfiladeiro de montes rochosos altos e instáveis que abraçam um abismo intimidador. Nesses mundos, a variedade da direção de arte é bem notável, mas pouco criativa com os temas do enredo. Também não é exatamente coesa em worldbuilding e pouco coerente e elucidativa em termos de lore, sendo altamente vaga e interpretativa (mas não exatamente de uma forma positiva).

Com uma paleta de cores colorida e vívida, modelos simples em cel shading e efeitos cintilantes de iluminação, Arise possui uma cenografia bem embelezada, e normalmente com uma ambientação de design formal harmônico, que é a categoria usada por Chris Solarski em Interactive Stories and Video Game Art (2016) para designar cenários com formas compatíveis com o design de personagem. No caso de Arise, formas arredondadas tanto para os personagens quanto para os cenários, gerando sensações mais positivas/confortáveis ao jogador. Uma estratégia semelhante a de outros indies de art game, como Omno (Switch).




Alguns biomas têm traços mais realistas, como o já mencionado cenário montanhoso, além de outros, ambientados em floresta ou jardim. Entre esses ambientes, há alguns que misturam seu realismo com uma sensação de gigantismo de flores e criaturas pacíficas, como abelhas e lesmas que podem ser usadas mecanicamente pelo jogador. Por outro lado, há uma variedade de cenários fantásticos, geralmente com um tom onírico, aconchegante e leve. Alguns poucos estão relacionados a momentos mais sombrios e tensos, mas são menos numerosos, e não costumam ser opressores ou pesados. 

Apesar de a parte artística-visual ser o ponto forte do jogo — razão para ter um modo foto incluso —, também é aí que residem alguns de seus defeitos mais notáveis. Mesmo considerando que se trata de um título de baixo orçamento, os modelos de algumas coisas são excessivamente simplistas e, além disso, pouco interativos, como o gramado, algo muito presente no jogo. A textura de algumas coisas também é ruim: a da água é especialmente defeituosa, muito mais aparentada a uma tinta com tons de azul, e infelizmente bem presente no jogo. A animação de algumas coisas também deixa a desejar, especialmente das chamas, que são muito estáticas, intensas e uniformes.



A OST de Arise também é um ingrediente importante para a experiência. As escolhas de composição de David García são comuns de art games com inspiração audiovisual nos jogos da Thatgamecompany, como Journey (Multi). A escolha tímbrica orquestral segue tendências românticas, com ênfase em cordas e, ocasionalmente, um suave canto lírico.

No mais, há uma harmonia simples e bem regular, ritmo lento e melodias espaçadas e pouco marcantes, geralmente em tom maior. Constantemente utilizadas como música de fundo, as peças cobrem a cenografia com uma delicada atmosfera mágica, por vezes alternada com micro tensões, refletindo situações de perigo in-game. As composições não são exatamente excepcionais ou muito menos inovadoras, mas cumprem bem sua função, embora os efeitos sonoros e o silêncio poderiam ter sido melhor aproveitados.



Mecânicas simples e level design limitado, mas com personalidade e boas ideias

Como jogo de plataforma, Arise é bastante simples, com pulo, escalada, caminhada e câmera fixa guiada, mas possui um ovo de colombo: uma mecânica que controla tudo no mundo, à exceção do protagonista, ao retroceder ou avançar no tempo em alguns segundos. Tal recurso parece ser uma variação da ideia central de Braid (Multi), de Jonathan Blow, mas, como o foco não está em puzzles, o jogo da Piccolo Studio explora esse recurso de forma bem limitada em um level design altamente simples, direto e fácil.

Contudo, isso não significa que não haja boas ideias no level design. A mecânica de retroceder-avançar no tempo com fenômenos contextuais funciona com o direcional direito do Pro Controler ou analógico do Joy-Con direito. A habilidade é desenvolvida de forma bem limitada, infelizmente, mas não deixa de ser interessante – e vez ou outra é implementada com boas ideias de interação com o cenário. Um exemplo é como se pode manipular o tempo para lidar com objetos que iluminam o cenário.



Além disso, há boas execuções de manipulação do tempo para utilizar plataformas incomuns, como uma bola de pedra rolante ou girassóis que se curvam na direção do Sol (cuja localização se altera com o passar do tempo). Entre as influências que se pode notar no level design, está a aparição de estátuas humanas e de sombras humanóides que perseguem o jogador e são vulneráveis à luz, lembrando outros art games, como RiMe (Multi), e, mais ao final, efeito de gravidade, lembrando um pouco de Mario Galaxy (Wii/Switch). Tudo isso, porém, explorado de uma forma bastante básica.

Vale ainda mencionar que o jogo apresenta alguns pequenos bugs e glitches que passaram despercebidos durante os testes. Os problemas técnicos não são tão graves, mas podem incomodar um pouquinho, envolvendo casos de glitches visuais, cacofonia em direção de som, e, em situações mais extremas, pode-se ficar preso em algum local. Felizmente é possível, pelo menu, voltar ao último ponto de save. Talvez esses problemas sejam corrigidos em atualizações futuras. Outro incômodo notável é o de não poder controlar de câmera. Como não é possível controlá-la, em alguns momentos isso prejudica significativamente a precisão em alguns saltos. Levando em conta essa limitação de câmera, o design de experiência e interface de usuário (design de UX/UI) deveria ter sido mais cuidadoso em momentos em que a noção de profundidade é relevante no gameplay.




Uma obra graciosa, singela e honesta

Embora seja um jogo sem muitas pretensões, Arise: A Simple Story - Definitive Edition (Switch) poderia ter tido maior refinamento na construção narrativa, bem como maior polimento e desenvolvimento tanto do ponto de vista artístico quanto de gameplay. Todavia, o título da Piccolo Studio tem boas ideias em seu level design, possui algumas belas cenas e passa uma mensagem bonita e singela de seus desenvolvedores, e merece ser apreciada por fãs de art games de plataforma, embora devam experimentá-lo sem grande expectativa.

Prós

  • Uma premissa narrativa singela, mas com uma mensagem espirituosa;
  • Direção de arte variada, com alguns bons efeitos visuais e com algumas boas ideias de sintonia com o level design;
  • Trilha sonora agradável e funcional com a proposta;
  • Mecânica de manipulação temporal simples, mas com personalidade e ocasionalmente usada com criatividade e coerência.

Contras

  • Design narrativo simplório e pouco desenvolvido criativamente no gameplay;
  • Falta de polimento em alguns aspectos artísticos, como no design da grama, da água e das chamas;
  • Lore pouco instigante e construção de mundo pouco coesa;
  • Level design muito simples e mecânicas subutilizadas;
  • Design de UX/UI descuidado em alguns momentos em relação à falta de controle de câmera;
  • Alguns bugs e glitches envolvendo visual, direção de som e gameplay.
Arise: A Simples Story - Definitive Edition - PS4/XBO/Switch/PC - Nota: 7.0
Versão utilizada para análise: Switch

Revisão: Janderson Silva
Análise produzida com cópia digital cedida pela Untold Tales

Doutorando em Filosofia que passa seu tempo livre com piano, livros, PC e portáteis. No Twitter, também é conhecido como Vivi. Interessa-se especialmente por narrativas de ficção científica, realismo mágico e alta fantasia política, e aprecia mecânicas de puzzle, stealth, estratégia e RPG. Seu histórico de análises pode ser conferido no OpenCritic e suas reflexões sobre RPG e game design encontram-se na SUPERJUMP (textos em inglês), bem como no Podcast do Vivi e em seu canal no YouTube.
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