Em um dos raros casos de jogo extremamente voltado ao público japonês que consegue ser lançado no ocidente, Elite Beat Agents (DS), um clássico do portátil de duas telas, completa 15 anos de seu lançamento e se mantém absoluto como um jogo único, marcante e que faz jus à máxima de Hunter S. Thompson: muito estranho para viver, muito raro para morrer.
Uma batida secreta
Lançado em novembro de 2006 exclusivamente para o Nintendo DS e desenvolvido pelo iNiS, Elite Beat Agents é um jogo de ritmo maluco que gira em torno de um elenco extremamente peculiar de personagens, os quais precisam de ajuda. O game usa a tela sensível ao toque para comandar as etapas de um intenso jogo de ritmo: você toca, desliza e rodopia sua stylus em sincronia com bizarrices visuais e faixas de música.
Como uma pérola do início ao fim, Elite Beat Agents se passa em um mundo em ruínas, em que as relações interpessoais estão todas em farrapos e os sonhos e vontades das pessoas estão sendo esmagados pela realidade — semelhanças?.
É nesse contexto que um grupo de agentes especiais bem vestidos, composto por três homens chamados Spin, Chieftain e J e liderados pelo Comandante Kahn, surge. Estes, claramente inspirados em MIB, podem ser despachados instantaneamente para qualquer pessoa do mundo após ouvir um grande grito de "Socorro!”.
Não se trata de agentes da CIA ou do MI6, eles não representam nenhum país, forças especiais ou federação oculta, são simplesmente movidos pela força maior da música e, portanto, oferecem seus serviços na forma de dança para todas essas pessoas. — sim, isso mesmo, nada de luta ou tiros — Dessa forma, caso dançarem suficientemente bem, eles tem o poder de de alguma forma alterar o tecido da realidade e inspirar as pessoas para que elas virem a chave e resolvam suas necessidades
A premissa é simples, mas o que torna o game tão único e especial é como ele torna essas pequenas e simples tarefas tão convincentes. As histórias variam do mais estranho ao mais bizarramente concebido possível, e muito do humor vem da apresentação da situação de cada nível que ocorre na tela de cima do DS, enquanto a execução dos passos de dança fica na tela de toque.
Com música boa, dançar fica fácil
Enquanto se joga e se espanta com tamanha bizarrice dos acontecimentos, é de se admirar a diversão que parece que os desenvolvedores estão tendo ao abordar vários assuntos da cultura pop e críticas a comportamentos sociais de maneira muito bem humorada. Os capítulos mostram lutas individuais, depois as amplificam em um grau absurdo, mostrando como a música ajuda as pessoas a dar sentido a elas.
Os problemas nos quais eles intervêm são bastante simples no início, apresentando situações como a de uma babá que está sobrecarregada com o seu trabalho ou um taxista que precisa levar uma gestante ao hospital, tudo sendo resolvido de maneiras peculiares, para dizer o mínimo.
Mas o jogo torna-se cada vez mais absurdo e aumenta sua bizarrice exponencialmente: um glóbulo branco, personificado como uma enfermeira sexy, deve derrotar um vírus de aparência de demônio azul enquanto os agentes adentram os corpos doentes. Sem nexo ou sentido, mas muito legal ainda assim.
Ainda, não se espante ao se deparar com super ricos que têm que lutar para serem abandonados em uma ilha tropical ou um herdeiro preguiçoso que perderá sua herança se não se vestir como um ninja e roubar de volta os segredos corporativos que foram roubados de sua empresa. Ou até mesmo uma mãe que também é meteorologista e decide desafiar a própria natureza porque prometeu a seu filho que eles poderiam ir a um piquenique. Esse tipo de coisa é corriqueira no universo de EBA.
Em uma missão muito incomum, os agentes são até mesmo encarregados de ajudar uma garotinha a enfrentar a morte de seu pai no Natal. A forma como os agentes ajudam é expressa de maneira em grande parte emocional, em vez de física. É uma direção rara para um jogo e que é indiscutivelmente surpreendente em um jogo que não se propõe a nada sério.
Todo o absurdo é potencializado pelas excelentes faixas disponíveis. Os direitos adquiridos para canções como "YMCA" ou "Sk8er Boi" surpreendem, contando até mesmo com nomes como Madonna, Queen e David Bowie dentre as faixas. São músicas tão populares que leva a risos e surpresas até mesmo do gamer mais casual. É tudo realmente estranhamente apropriado.
Até mesmo nas canções não tão reconhecidas, os desenvolvedores conseguiram trazer um bom casamento de ritmo e jogabilidade. Trata-se mesmo de uma pérola perdida.
Toque, arraste e dance!
Os controles são rápidos e responsivos; você não se sente como se o ritmo estivesse fora de sincronia ou suas ações estivessem desconectadas do que os Agentes executam na tela. Cada estalo, aplauso e giro tem algum peso sobre a dança ou o contexto na tela superior.
A jogabilidade é simples e bem concebida, mas a diversão está tão ligada à história e ao humor que você quase não consegue separar os dois.
Apesar de tudo, o game talvez seja “japonês demais” para a audiência ocidental. Essa bizarrice e loucura generalizada, comum aos programas de TV de terras nipônicas, certamente não é tão bem recebida na região onde as grandes séries e produções hollywoodianas são sua marca registrada.
Referências à bebida, à drogas ou mesmo mais veladas à masturbação e nudismo dão a impressão de um jogo que se destinava a um público mais velho e mais inteligente. A Nintendo até parecia ter percebido isso, comercializando-o em sua marca "Touch Generation" que deveria alcançar um público mais velho que nunca havia jogado um videogame antes. No final, no entanto, Elite Beat Agents era bizarro demais para ter sucesso, não vendendo nem mesmo 250.000 cópias antes de sair de circulação — mas sendo um grande sucesso nos flash cards.
Ainda assim, o game é extremamente popular dentre os fãs do portátil de duas telas e é constantemente colocado como um dos melhores jogos de ritmo de todos os tempos. Em uma entrevista à Polygon em 2016, os desenvolvedores da iNiS se colocaram à disposição da Nintendo para desenvolver uma sequência para o Switch, à época conhecido apenas como NX.
Dado o tempo na vida útil do híbrido nintendista e a falta de qualquer menção ao título, faz parecer que trata-se de mais uma proposta engavetada, mesmo com a aparição mais recente dos agentes como Spirits em Super Smash Bros Ultimate (Switch).
Dentre tantos risos e surpresas que o game nos proporcionou, podemos colocá-lo sem problemas na seleta lista de games que merecem mais um carinho e torcer para que a Nintendo e a iNiS consigam se alinhar para uma sequência, ainda que improvável, num futuro próximo.
E você? Guarda alguma memória ou carinho com o Elite Beat Agents? Estaria disposto a investir em uma eventual sequência? Conte-nos nos comentários abaixo!
Fontes: Kotaku, Polygon
Revisão: Icaro Sousa