Além de sua biodiversidade ser essencial para a vida no planeta Terra, a Floresta Amazônica também é um ótimo local para experienciar aventuras lendárias. Pelo menos é isso que Tunche nos mostra. Combinando jogabilidade beat ‘em up, progressão roguelike e uma temática baseada em mitos dos povos da maior selva do mundo, este indie chega ao Switch como um jogo de luta extremamente divertido, cativando com um sistema de combates profundo e uma exuberante apresentação do rico folclore da região.
Cinco personagens diante das lendas da floresta
Em sua tela inicial, Tunche nos introduz a um acampamento indígena situado na selva amazônica, onde podemos selecionar um herói entre cinco personagens: a feiticeira Rumi, o menino-ave Qaru, o músico Pancho, a guerreira Nayra e a garota Hat Kid, protagonista de A Hat in Time (Multi). Independentemente de nossa escolha, logo ficamos sabendo que os jovens estão naquela área da floresta por um grande desejo em comum, embora movidos por motivos particulares: eles estão atrás de um espírito maligno conhecido como Tunche.
No acampamento, os personagens encontram uma senhora xamã com o nome Kawri, que os alerta sobre os perigos da região. De acordo com ela, o perímetro anda sofrendo com a presença de aberrações mágicas, as quais podem ter relação com os poderes de Tunche. Sem receber muitas explicações sobre o que está motivando a aventura dos jovens, Kawri nota que eles estão muito determinados em suas missões. Diante disso, ela decide ajudá-los, criando uma barreira mágica entre o acampamento e as zonas consideradas perigosas.
Essa capacidade faz com que os jogadores possam entrar na selva para realizar incursões em busca de Tunche. Até então, o jogo não contextualiza sua trama, deixando em aberto questões sobre os próprios protagonistas e o vilão, que é uma criatura baseada em uma lenda indígena peruana. Entretanto, maiores explicações serão dadas mediante o progresso nas zonas da floresta, segmentadas em quatro mundos de temáticas distintas. Inicia-se assim uma aventura com propostas de gameplay interessantíssimas.
Lutando nas diversas áreas de uma selva imensa
Apesar de estarmos falando de um título com uma trama situada na Amazônia e repleto de raízes latinas, desenvolvido pelo estúdio peruano LEAP Game, dois termos da língua inglesa se fazem necessários para se entender a jogabilidade da aventura. Afinal, Tunche é, essencialmente, um beat ‘em up com progressão no estilo roguelike. Vamos por partes:
Após selecionar um dos heróis no acampamento, os jogadores viajam até as profundezas da floresta para encarar cenários laterais onde inúmeros inimigos surgem aleatoriamente. Diante disso, deve-se combater essas criaturas tropicais com diferentes golpes físicos, como socos, chutes, cruzados e um ataque mágico que consome pontos de mana. Quando combinados em sequência, estes movimentos podem formar combos poderosos, potencializando os danos e consequentemente permitindo um melhor desempenho.
Seguindo as características tradicionais dos beat ‘em ups, Tunche oferece batalhas intensas em que um herói deve combater diversos inimigos de uma só vez. Entretanto, embora a tarefa de lidar com múltiplos oponentes seja de fato complexa, isso é possibilitado através de uma jogabilidade ágil e precisa, que se torna profunda na medida em que novos novos combos e golpes são liberados. Entre as possibilidades, definitivamente minha sensação preferida é a de lançar os oponentes para o ar, seguido de uma sequência de socos aéreos.
Conforme todos os inimigos de cada sala são exterminados, novos espaços são abertos e podemos avançar, seguindo uma trilha que nos leva até um chefe final. Quando derrotado, ele libera um novo mundo, que seguirá a mesma fórmula. Apesar de parecer simples, essa situação se torna difícil ao considerarmos a interface roguelike do jogo, em que todos os quatro mundos, com desafios que são gerados aleatoriamente, devem ser completados de uma só vez.
Ou seja, caso o jogador morra, ele retornará ao acampamento e deverá começar do zero, o que dá toques de crueldade para a aventura. Todavia, Tunche fornece alguns benefícios para os personagens, como a possibilidade de se conseguir melhorias permanentes a partir de coletáveis encontrados no itinerário amazônico.
Fragmentos da trama em busca de Tunche
Apesar das salas de Tunche oferecerem um mesmo modo operacional, elas se diferenciam graças às suas possíveis recompensas, liberadas após acabarmos com todos os oponentes. Entre os exemplos, temos a capacidade de conquistar novas habilidades passivas, como a Sanguessuga, que permite restaurar pontos de HP conforme usamos ataques mágicos. Também na categoria de buffs poderosos, temos o chamado Estilo Deslumbrante, que libera raios de energia de nossos socos quando realizamos combos mais elaborados.
Sob os aspectos da vertente roguelike, infelizmente esses poderes são perdidos quando somos derrotados, o que faz com que as jornadas sejam ainda mais imprevisíveis. Entretanto, existem outros fatores que podem nos beneficiar de maneira permanente, como melhorias vendidas no acampamento através de essências e moedas coletáveis. Esses upgrades definitivos podem ser específicos de cada personagem, como novos movimentos e combos individuais, ou compartilhados por todos, relacionando-se com os possíveis níveis dos diferentes buffs.
Voltando aos fatores relacionados às salas da campanha, é importante ressaltar que os ambientes podem abrigar outras aleatoriedades, como NPCs que vendem itens, zonas de desafios e locais que disponibilizam partes de livros. Ao interagirmos com esses objetos, eles nos apresentam fragmentos, como flashbacks e diálogos, da história do personagem que estamos controlando. Desse modo, enfim ficamos sabendo o que motiva cada herói na procura por Tunche, mostrando-se como uma forma muito criativa de se narrar a trama.
Portanto, evidencia-se a necessidade de se aventurar diversas vezes por dois motivos: primeiro, para conseguirmos melhorias definitivas, capazes de nos ajudar na busca implacável pelo vilão do título; segundo, para conhecermos o enredo por trás de cada personagem, na medida em que isso é revelado gradualmente.
Dessa forma, temos um jogo com propostas divertidas e engenhosas, que nos mantém instigados a retomar os desafios justamente para conhecer mais dos personagens, vilões e outros elementos de seu adorável universo — o qual, diga-se de passagem, é disponibilizado através de uma estética exuberante, com traços desenhados à mão, e uma rica trilha sonora que faz uso de instrumentos tradicionais da região amazônica.
Inimigos que somem e outros problemas
Infelizmente, há de se dizer que existem alguns pequenos problemas que podem incomodar em Tunche. Um deles aconteceu algumas vezes comigo especialmente no segundo mundo, quando eu jogava um inimigo para fora do campo de visão. Com isso, ele passava para outra área e me impedia de avançar, pois teoricamente eu ainda não havia derrotado todos os adversários do perímetro.
Para consertar esse bug, era necessário disparar ataques mágicos para todos os lados, buscando atingir o inimigo desaparecido, que me mantia trancado em tal sala. Felizmente, eu consegui avançar em todas as ocasiões, pois sempre tinha pontos de MP para gastar. Contudo, consigo imaginar o quão frustrante seria sofrer um softlock graças a esse problema, principalmente levando em conta que estamos falando de um roguelike.
Curiosamente, as outras imperfeições técnicas que presenciei em Tunche ligavam-se à tradução do jogo e aos diálogos. Além de ser comum a aparição de palavras em outros idiomas e indicações equivocadas de botões, alguns caracteres recorrentes na língua portuguesa, como a cedilha, apareciam com erros de formatação nos discursos, causando pequenas quebras na leitura.
Da mesma forma, fiquei um pouco incomodado com o fato de que as minhas preferências de gameplay, como a escolha do idioma e a ativação do modo rumble, acabavam sendo desconfiguradas quando eu fechava o jogo. Ou seja, sempre que eu o abria novamente, tinha de acessar as configurações para iniciar a jogatina de acordo com minhas preferências. Nota-se assim que Tunche apresenta algumas imperfeições que merecem ser corrigidas em atualizações futuras, justamente para incrementar uma jogatina que é sublime em muitos outros aspectos.
Divertindo-se no coração da maior floresta do mundo
Seja através de um sólido e divertido modo cooperativo ou em expedições solitárias repletas de desafios interessantes, a aventura de Tunche se configura como um dos grandes indies que pude experimentar neste ano de 2021.
Entre combates ricos com profundidade e cenários exuberantes, este beat ‘em up acerta em cheio ao misturar características de seu gênero com a progressão dos roguelikes. O resultado é uma aventura que encanta com suas histórias baseadas nas fascinantes lendas da Floresta Amazônica, região que agora ganha novos enquadramentos e vivências a partir das jornadas de Rumi, Quaro, Pancho, Nayra e Hat Kid.
Prós
- Aventura épica que nos apresenta lendas da Amazônia;
- Jogabilidade beat ‘em up intensa e prazerosa;
- O jogo ganha profundidade com melhorias e novos combos;
- Estética encantadora, com lindos visuais desenhados à mão e uma rica trilha sonora;
- Cinco personagens em um mesmo ambiente, mas com cinco histórias diferentes.
Contras
- Presença de um bug que pode comprometer o progresso ao empurrarmos inimigos para áreas inalcançáveis;
- Alguns erros técnicos de apresentação e disposição de texto.
Tunche — Switch/PC/XBO — Nota: 9.0Versão utilizada para análise: Switch
Revisão: Davi Sousa
Análise produzida com cópia digital cedida pela HypeTrain Digital