Análise: Golden Force (Switch): um plataforma que une tradição aos tempos modernos

Esse plataforma da No Gravity Games tem dificuldade old school, mas não impossível.

em 12/04/2021
Atualmente, há discussões sobre a dificuldade frustrante de alguns jogos, como Super Meat Boy, Cuphead ou Dark Souls. Todos os três estão presentes no Switch e são excelentes, mas não são para todos. Apesar desses exemplos recentes, games "impossíveis" são pedras no sapato dos jogadores há tempos. Contra e Battletoads são títulos clássicos do NES sempre lembrados quando o assunto é dificuldade acentuada. 


Golden Force foi lançado em janeiro de 2021 com o visual pixelado dos áureos anos 80/90 e a proposta de trazer essa dificuldade old school, mas de uma forma que fosse acessível. Acompanhe nossa análise para ver se o lançamento da No Gravity Games atinge seu objetivo ou se, assim como os títulos citados na introdução fazem os jogadores se sentir, falha miseravelmente.

Hasteando as velas

O arquipélago das Muscle Islands é um lugar paradisíaco, onde a vida era perfeita. Porém, tudo muda com a chegada do Demon King, uma figura que só quem chegar ao final do game vai conhecer. Seu exército domina a ilha em busca de ouro.

Aos moradores, só resta uma opção: contratar os serviços da Golden Force, um grupo de mercenários que estava de férias. A equipe curtia os prazeres numa taberna quando recebeu a missão. De olho no ouro que podem ganhar pelo caminho, aceitam lutar contra a horda de demônios que atualmente infesta o lugar.

Com essa motivação, o jogo estabelece a ambientação para a pancadaria livre contra os estranhos seres que aparecem na tela e para o clima de pirataria contido na música. Contudo, talvez um jogador menos paciente não tenha contato com essas informações.

Isso porque a história é contada através de um texto que aparece numa tela estática e com uma qualidade gráfica inferior à que o jogo apresenta. Muitos podem passar por essa tela menos atraente e partir logo para a jogatina, o que provavelmente não prejudicará a experiência. Não que seja um roteiro digno de Oscar, mas poderia ter sido tratado com um pouco mais de carinho.

A tripulação do navio

É possível jogar com os quatro membros da Golden Force: Gutz é um hábil espadachim, enquanto Spina usa duas espadas; Drago, como o nome indica, é um dragão humanoide que usa um machado; e por fim, temos Elder, um forte idoso com braços mecânicos.

Cada um tem o seu carisma, e ainda é possível trocar as cores das roupas e dos cabelos na tela de seleção. Alternar entre eles é um jeito simples de trazer um respiro ao gameplay após empacar em alguma fase. Na prática, porém, não há diferença de jogabilidade entre os personagens. A diversidade cosmética é interessante, mas o jogo ganharia mais variedade se houvesse especificidades na jogabilidade de cada mercenário.

Terra à vista

Golden Force conta com quatro mundos, representados no mapa por quatro ilhas. Cada uma possui quatro fases e um chefe, além de um estágio extra. Por algum motivo, cada ilha possui o nome de uma comida mexicana, como nacho ou tortilla. É um detalhe engraçadinho, adicionando um pouco de humor à jornada deste grupo de piratas.

Há uma boa variedade temática entre as 20 fases, o que evita a repetição, mas nada que não seja comum em games side scrolling, como neve, montanha e as fases na água. Pelo menos os trechos aquáticos são bem-feitos, sem causar a clássica irritação de outras eras.

Os cenários, por sua vez, são simples, sem muito destaque. Essa decisão acaba por enaltecer o design de personagens: todos os inimigos foram bem trabalhados e possuem movimentação bem agradável.

O modo cooperativo local para duas pessoas funciona, mas com uma ressalva: a câmera acompanha o primeiro player, deixando o segundo jogador em maus lençóis. Para um jogo em que a morte é uma constante inevitável, essa é uma situação desagradável.

O que vale é a jornada

O jogo começa com uma fase tutorial, a bordo do navio da trupe. Ali, em alto-mar, aprende-se duas coisas importantes para a jornada.

Primeiro, os controles. O pulo é ativado pelo botão B, e o Y é o botão de ataque. Segurá-lo aciona um ataque mais forte, capaz de derrubar os escudos de alguns zumbis, por exemplo. Por sua vez, o botão A dá um ataque enquanto seu personagem desliza, o que é útil para passar por alguns inimigos.

Já o X é o botão do dash, o movimento que terá que ser melhor dominado para ter sucesso. Seja para sobreviver quando houver muitos inimigos na tela, seja para alcançar plataformas inatingíveis com o pulo padrão, ou ainda para passar por determinados trechos que exigem precisão e velocidade.

A princípio, a movimentação dos personagens pode parecer lenta ou meio presa, principalmente em comparação aos games de plataforma side scrolling mais atuais, mas aqui isso funciona bem, além de combinar com a proposta old school do título.

Por falar na proposta de Golden Force, o segundo ponto que esse trecho inicial nos ensina tem relação à dificuldade. O marketing do game aposta em propagandear sobre como o desafio se assemelha ao do século passado, porém de uma forma mais acessível. E o tutorial deixa claro como funciona essa proposta na prática.

Do seu navio pirata, é preciso enfrentar um polvo gigante, usando os tentáculos do molusco como plataformas para não cair no mar. Essa batalha possui algumas etapas e o normal será morrer diversas tentando, até aprender o esquema de movimentação e as brechas para atacar a criatura.

É um tutorial, portanto, que não se furta em matar o jogador diversas vezes. A cada nova tentativa, você volta exatamente ao ponto inicial, tendo que refazer todo o processo para tentar morrer num trecho mais distante até, enfim, derrotar o polvo.

Se Golden Force tivesse sido lançado na década de 1980, fatalmente você gastaria suas três ou cinco vidas iniciais, alguns continues, e finalmente encararia uma tela de game over. E isso aconteceria com tanta frequência que chegar ao final do jogo seria um desafio para poucos.

Como aquele período é apenas uma referência, aqui não há vidas ou continues. É possível tentar quantas vezes for preciso, o que estimula o jogador a não desistir. E recomeçar tantas vezes no tutorial também valoriza os checkpoints, bem distantes um do outro. Depois de algumas mortes, alcançar a caveira amarrada no tronco causa um sentimento de vitória e alívio, recompensando por insistir na fase e estimulando a continuar.

O baú do tesouro

Para quem gosta de um desafio a mais, Golden Force conta com colecionáveis secretos. Cada fase esconde três moedas e uma concha, e encontrá-las não é difícil no começo. Conforme se avança na jornada, porém, é comum terminar um estágio sem ter ideia da localização das peças, aumentando assim o fator replay do game.

A recompensa para quem coleta as muitas moedas espalhadas ao longo do caminho e encontra um bom número de itens escondidos é trocá-los por melhorias no barco-loja do mapa. É possível, por exemplo, adquirir permanentemente um coração extra, estendendo assim sua vida, ou aumentar a potência do seu golpe, essencial para diminuir mais rápido a barra de energia dos chefes.

A cereja do bolo de Golden Force são as batalhas contra os chefes, que são o que o jogo apresenta de mais desafiador e divertido, e onde se passa mais tempo. E os desenvolvedores têm consciência disso, pois são quatro mundos e seis bosses (contando o polvo gigante do tutorial e o Demon King do final).

Arrisco dizer que o jogo existe em função dessas batalhas. A sensação que ele passa é de que as fases poderiam ser mais curtas, para que pudéssemos chegar logo nos chefes. Cada um possui uma dinâmica e uma variação que entretém bem mais do que o caminho para chegar até eles.

Em nenhum momento a luta parece impossível ou injusta. Quando você falha, o sentimento sempre é de que o erro foi seu, o que te incentiva a levantar e tentar novamente. O design dos chefes é sempre interessante: são seres monstruosos ocupando a tela inteira, alguns com mudanças de forma na parte final da batalha.

Destaco um exemplo singelo de como os personagens têm carisma e de como o jogo te impulsiona a continuar: um determinado chefe ri ao vê-lo se apresentar para a batalha. Meu filho de 4 anos, que me via jogar, reagiu a isso furioso, torcendo para eu quebrar a cara daquele folgado.

A pilhagem valeu a pena?

No fim das contas, Golden Force abraça a estética e o espírito da época do NES e SNES, mas sem os empecilhos que estragavam a diversão. Não ter um contador de vidas ou de tempo nos permite curtir o jogo e os seus desafios sem a preocupação de encarar uma tela de game over que jogaria horas de jogatina no ralo.

O título é competente no que se propõe e é um bom entretenimento por toda a sua duração. Porém, alguma dedicação e atenção a detalhes como variação no gameplay e tela de apresentação trariam mais elementos para Golden Force ir além do "bem-feitinho" e se destacar no meio do oceano.

Prós

  • Dificuldade desafiadora e bem-equilibrada;
  • Animação e design de personagens cativantes;
  • Excelentes batalhas contra os chefes.

Contras

  • Não há diferença de jogabilidade entre os personagens;
  • Apresentação pouco caprichada;
  • Modo cooperativo injusto com o segundo jogador.
Golden Force - Switch/PS4/XBO - Nota: 6.0
Versão utilizada para análise: Switch
Revisão: Davi Sousa
Análise produzida com cópia digital cedida pela No Gravity Games


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Nascido no mesmo dia que Manoel Bandeira (mas com alguns anos de distância), perdido em Angra dos Reis (dos pobres e dos bobos da corte também), sob a influência da MPB, do rock e de coisas esquisitas como a Björk. Professor de história, acostumado a estar à margem de tudo e de todos por ser fora de moda. Gamer velho de guerra, comecei no Atari e até hoje não largo os mascotes - antes rivais - Mario e Sonic.
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