Em 26 de março de 2021, um reencontro que, à primeira vista, deixaria qualquer fã de jogos dos anos 1990 e 2000 animado acontecerá no Nintendo Switch. Neste dia, Yuji Naka e Naoto Ohshima, respectivamente o programador e o designer de personagens de Sonic the Hedgehog (Mega Drive) e responsáveis pelo desenvolvimento de uma série de clássicos da SEGA, como NiGHTS into Dreams (SEGA Saturn) e Sonic Adventure (Dreamcast), apresentarão ao mundo o resultado de seu primeiro trabalho juntos em 20 anos: Balan Wonderworld.
Publicado pela Square Enix e desenvolvido pelos estúdios Balan Company e Arzest, esse jogo de ação e plataforma chamou a atenção da mídia e do público por reunir dois desenvolvedores icônicos em uma aventura cheia de elementos que remetem às suas produções passadas. Porém, a demonstração disponibilizada pelas empresas no último dia 28 de janeiro jogou parte das expectativas para baixo devido a seu gameplay arrastado, design de níveis, puzzles e batalhas muito simples e sistema de power-ups incômodo.
O teatro das emoções
A demo começa de maneira promissora. Após a escolha do avatar do protagonista, uma cutscene em computação gráfica bastante misteriosa, psicodélica, dinâmica e muito bem produzida dita o tom do título. Quem cair de paraquedas no game pode achá-la meio confusa, já que em nenhum momento explica-se literalmente o que o jogador está assistindo. Porém, algumas informações divulgadas previamente pela Square Enix dão contexto à cena. No universo do título, pessoas que passam por momentos de dificuldade e tristeza acabam se deparando com o Teatro Balan, um lugar onde os sentimentos daqueles que sofrem são reequilibrados, trazendo de volta a alegria e a esperança. Os personagens principais Leo Craig (avatar masculino) e Emma Cole (avatar feminina) descobrem esse local após passar por situações de desalento próprias. Dentro do Teatro, conhecem seu comandante: o Maestro Balan. A criatura enigmática então leva os jovens ao Mundo das Maravilhas, onde deverão ajudar outras pessoas com suas emoções ao mesmo tempo em que tentam restaurar seus equilíbrios internos.
Nestes primeiros minutos, elementos de design de personagens e de apresentação fazem referências claras aos trabalhos antigos da Sonic Team. Os protagonistas possuem traços que lembram a turma de Sonic misturada com personagens de Billy Hatcher and the Giant Egg (GC). Já o Maestro Balan é muito inspirado em Nights de NiGHTS into Dreams. Aliás, toda a premissa que envolve sentimentos e sonhos parece uma homenagem ao título de SEGA Saturn.
Soma-se a isso a bela trilha sonora — não só nesta introdução, mas em todo o jogo — e as animações em CG das cutscenes dignas de curtas cinematográficos e o resultado é uma produção que teria tudo para agradar jogadores antigos e novos. Porém, a prévia deixa um gosto amargo na boca quando o assunto é gameplay.
A Ilha de Tims
O primeiro ambiente explorável pelos jogadores é a Ilha de Tims, um cenário que funciona tanto como um hub de acesso aos diferentes mundos quanto um local para cuidar dos chamados Tims, criaturas similares a pintinhos rechonchudos que acompanham o personagem principal durante toda a aventura.
Após a introdução pré-renderizada, é notável a queda em qualidade gráfica quando os assetsin-game entram em ação. Texturas, modelos e iluminação tornam-se bem mais simples, perdendo-se um pouco do deslumbramento visual e do design artístico apresentado até então. No entanto, mesmo em hardwares mais potentes que o Switch, essa discrepância nos gráficos em relação a uma cutscene que roda fora da engine do game é esperada.
Um Tim esfomeado na ilha de qualidade gráfica reduzida
Dentro da Ilha de Tims, é possível experimentar os controles de Leo e Emma e a sensação não é das melhores. Apesar de suas animações os mostrarem correndo freneticamente, a velocidade do deslocamento ao movê-los é lenta, fazendo com que o ato de explorar seja pesado e moroso. Além disso, a aceleração dos protagonistas parece não se refletir 100% quando eles saltam. A impressão é que, no meio do pulo, o impulso do movimento é diminuído, o que resulta em saltos mais curtos do que deveriam ser.
Essa experiência com os controles acontece enquanto os usuários são introduzidos às dinâmicas do hub e às mecânicas de cuidado dos Tims. Infelizmente, a demo não explica quem são esses seres, por que eles são importantes para a narrativa, ou como alimentá-los com itens encontrados nas fases ou construir estruturas com as quais eles podem interagir, como torres, os ajuda a evoluir.
A ilha possui este contador que, quando chega a certo número, constrói estruturas para os Tims brincarem, mas a demo não esclarece como isso os ajuda a evoluir
Durante o modo história, alguns deles seguem os protagonistas nos níveis e ajudam a coletar itens como gotas de flores, que são consumidas por eles na ilha flutuante. Porém, a performance deles não tem alterações visíveis após serem cuidados no overworld, deixando mais dúvidas do que esclarecimentos. Espera-se que, na versão final, seja possível entender melhor como tomar conta desses pintinhos rechonchudos faz parte da jornada do Teatro Balan.
Boa premissa, má execução
A atração principal de Balan Wonderworld são suas fases, que misturam elementos de plataforma 3D com momentos de ação e combate. Comparações com Sonic Adventure são inevitáveis. No entanto, pela movimentação lenta dos personagens, os níveis são muito mais compactos, com estrutura linear e cheios de colecionáveis e segredos espalhados.
A premissa das fases é interessante. Por se tratar de um universo onde as pessoas precisam ter o equilíbrio das suas emoções restaurado, cada um dos 12 mundos do título final representa os sentimentos de uma pessoa em uma situação desoladora. A demo possui três dessas narrativas: "O homem que afronta tempestades", que mostra um fazendeiro tentando manter as esperanças após um tornado devastar suas plantações; "O garoto que queria ser o vento", que introduz um jovem apaixonado pelo céu aberto; e "A menina e o gato", que conta sobre uma garota que encontra um gato em uma cidade movimentada.
Somente o primeiro desses mundos está presente na íntegra, com dois níveis e uma luta contra um chefão. Os demais têm somente seus primeiros níveis disponíveis. Apesar dessa limitação, dá para se ter uma boa ideia da abordagem para as fases em geral. Cada uma delas está permeada por decorações que remetem aos personagens de suas respectivas histórias. O mundo do fazendeiro é repleto de espigas de milho, feno e ferramentas de fazenda, por exemplo. Já o do garoto que adora o vento encontra-se acima das nuvens e possui vários ventiladores que soltam rajadas de ar. Os níveis se destacam no lado artístico ao incorporar características de seus personagens de maneira abstrata.
É possível encontrar representações dos personagens das histórias espalhadas pelos níveis
Porém, em seu design, as fases não impressionam tanto. Ao invés de passar uma impressão coesa, os cenários parecem uma mistura dos mesmos assets combinados de diferentes maneiras em seções divididas por checkpoints. Dessa forma, os espaços não têm novidades visuais à medida que se progride. Os mundos mais avançados até acrescentam mais elementos que trazem variedade, mas a sensação que fica é a de um level design mecânico, não de fluidez.
Muitos milhos e plantações semelhantes pelo nível
Além disso, as primeiras horas com a demo possuem puzzles extremamente simples, que se limitam a apertar botões ou derrotar todos os inimigos na tela para desbloquear o caminho a seguir. Quick time events também podem ser encontrados ocasionalmente, transformando o jogador no Maestro Balan e obrigando-o a apertar botões repetidamente ou em momentos exatos em troca de itens que ajudam a desbloquear novos mundos, em um desafio que torna-se previsível e repetitivo com o tempo.
Nos Desafios de Balan, é necessário apertar o botão quando a silhueta se alinhar com o personagem
A exploração desses universos também não é fluida. A versão de Switch sofre com quedas na taxa de quadros por segundo e com gráficos serrilhados, especialmente no modo portátil. Além disso, todos os problemas de controle apresentados acima são sentidos na hora de se aventurar pela campanha. A vagarosidade do personagem faz com que percorrer cada canto dos mapas seja maçante, principalmente para quem se dedicar a encontrar todos os colecionáveis. O movimento da câmera, em certas situações, atrapalha a visualização do cenário. Os saltos curtos tornam difícil calcular a distância para alcançar uma plataforma do outro lado de um abismo. Para um game feito por desenvolvedores que criaram um dos personagens mais rápidos dos games, a jogabilidade é bastante vagarosa.
Com que roupa eu vou?
Para tentar solucionar esse problema, um dos grandes destaques do gameplay de Balan Wonderworld é seu sistema de roupas. Durante o jogo, será possível encontrar mais de 80 fantasias que oferecem poderes diferentes aos jogadores. Cerca de dez desses acessórios estão presentes na demonstração e são cruciais para derrotar adversários e resolver quebra-cabeças.
Essas roupas trazem um certo frescor à jogabilidade, pois introduzem uma série de mecânicas diferentes ao moveset de Leo e Emma. A fantasia de lobo, por exemplo, adiciona um ataque giratório ao arsenal dos personagens. Já a de canguru permite que eles façam um flutter jump similar ao do Yoshi. Socos longos podem ser realizados com a roupa de abóbora e fogo pode ser disparado da vestimenta de dragão. Também há situações em que a indumentária inicia um minigame, como no caso do uniforme de futebolista, que desafia os jogadores a acertar painéis com uma bola. Há uma sensação de novidade a cada roupa conquistada.
Isso também traz uma longevidade saudável às fases. Durante a exploração, é possível encontrar itens e áreas inacessíveis que exigem os poderes de roupas presentes em outros níveis para ser alcançados. É preciso ficar atento aos elementos das fases e associá-los às habilidades adquiridas mais à frente na demonstração, adicionando um senso de curiosidade, descoberta e recompensa agradável e interconectando os diferentes mundos.
No entanto, a administração e utilização dessas roupas são bastante confusas. Curiosamente, praticamente todos os botões dos controles do Switch — A, B, X, Y, ZR e ZL — executam a mesma ação. Quando estão sem fantasias, esses inputs fazem os personagens saltar. Mas, quando fantasiados, os botões acionam o poder de cada vestimenta. São poucas as indumentárias que realizam ambos. Ou seja, há roupas que simplesmente fazem os protagonistas atacar ou solucionar puzzles, enquanto outras só incrementam seus pulos. Assim, situações em que é necessário trocar de fantasia não são raras.
A troca de roupas no meio do jogo é lenta
O problema está na limitação da quantidade de roupas que podem ser carregadas pelo jogador ao mesmo tempo. É possível ter até três vestes no inventário e, para trocá-las, é necessário assistir à mesma animação várias e várias vezes. Esse processo quebra o ritmo do game, pois não é tão instantâneo, sendo fastidioso.
Caso o usuário não tenha as melhores fantasias para os desafios, é possível preencher o inventário manualmente com roupas obtidas durante o game em uma espécie de guarda-roupa. Porém, ele só está disponível nos checkpoints das fases. Pode acontecer de obstáculos ou segredos que necessitam de uma veste específica serem encontrados longe desses pontos, obrigando que se retorne a eles em ritmo devagar, ficando em um vai e volta constante.
A opção de mudar as roupas presentes no inventário só surge nos checkpoints
Além disso, o combate realizado com essas vestimentas não é muito inspirado. Os inimigos são bastante simples de derrotar, até mesmo o chefão, demandando apenas que se aperte os botões repetidamente para ter sucesso.
Torcendo pelo melhor
Tudo na proposta de Balan Wonderworld é atrativo. Sua equipe de desenvolvedores possui nomes aclamados da indústria, sua premissa é bastante original e remete a jogos clássicos da SEGA, e suas músicas e cutscenes em CG são ótimas.
No entanto, a demonstração do título não corresponde às expectativas criadas. Seu gameplay é lento, seu sistema de power-ups não é confortável de usar, seu design de níveis é relativamente genérico e sua mecânica de combate é muito simples. Cabe esperar até o lançamento do jogo para ver se a Square Enix está guardando algumas cartas na manga para o produto final.
Revisão: Davi Sousa
Daniel Morbi
Jornalista, analista de mídias, PcD e entusiasta de games desde que jogou Pokémon Azul no Game Boy Color nos anos 90. De lá para cá, tenta aproveitar ao máximo todos os consoles no pouco tempo que a vida adulta permite. Se não está escrevendo para o Blast ou demorando anos para zerar um jogo, está no Twitter (@DanielMorbi) e no Instagram (@danielmorbi_)
Este texto não representa a opinião do Nintendo Blast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Escrevemos sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0 - você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.