Análise: Scott Pilgrim vs. The World: The Game — Complete Edition (Switch) é um beat’em up retrô clássico até demais

O jogo aposta na simplicidade e no carisma, mas algumas escolhas duvidosas em suas mecânicas atrapalham a experiência.

em 19/01/2021

Scott Pilgrim, personagem que surgiu nos quadrinhos de Bryan Lee O'Malley, alcançou visibilidade com a adaptação cinematográfica exagerada e divertida. Para acompanhar o longa, a Ubisoft produziu um jogo que, infelizmente, foi retirado das lojas online depois de alguns anos. Isso foi mudado com o Scott Pilgrim vs. The World: The Game – Complete Edition, relançamento do beat ‘em up para as plataformas modernas, incluindo Switch.

O jogo oferece pancadaria descomplicada por um vibrante universo colorido, e a nova versão inclui os DLCs em um único pacote. No entanto, é importante ficar atento ao fato de que a Complete Edition não oferece novidades em relação ao original além de compilar todo o conteúdo. Não tive a oportunidade de testar o título em seu lançamento original e aproveitei o relançamento para conferi-lo, afinal ele é bastante elogiado. Ele diverte, principalmente no multiplayer, mas certas mecânicas e decisões comprometem bastante a experiência.

Enfrentando uma liga maligna de ex-namorados

Scott Pilgrim é um rapaz que tinha uma vida tranquila em Toronto, dividida entre momentos de preguiça, diversão com os amigos e ensaios com sua banda. Tudo muda quando ele se apaixona por Ramona Flowers, uma garota misteriosa que acabou de se mudar para a cidade. Para poderem ficar juntos, Scott precisará derrotar os sete ex-namorados de Ramona em confrontos surreais. A série de quadrinhos e o longa cativam com seu humor, cenas absurdas e inúmeras referências ao mundo dos games e à cultura pop.


O jogo transforma esse universo em um beat ‘em up claramente inspirado em clássicos da era 8 e 16-bits, como River City Ramson. Em cada um dos estágios, Scott e seus amigos precisam descer o sarrafo em todos os capangas que aparecem pelo caminho para conseguir chegar até o chefe, sempre um dos ex-namorados de Ramona. Além de Scott, é possível controlar Ramona Flowers, Stephen Stills, Kim Pine, Knives Chau e Wallace Wells (sendo estes dois últimos DLCs pagos na versão original). Os personagens são bem similares entre si, com uma ou outra particularidade própria.

O sistema de luta é simples e conta com ataques fracos que podem ser combinados em combos, um golpe forte e lento, defesa e um movimento especial. Knives Chau, uma das namoradas de Scott, pode ser chamada para executar ações de suporte. Um detalhe curioso é a presença de elementos de RPG: conforme derrotam inimigos, os personagens recebem experiência e aprendem novas habilidades ao subir de nível, como contra-ataque, recuperação aérea ou golpes especiais. Lojas espalhadas pelos estágios vendem itens que aumentam permanentemente atributos, como defesa e força.


O mundo maluco de Scott Pilgrim é retratado com visual em pixel art que remete aos clássicos da era 16-bits. Tudo é muito colorido e detalhado, com várias referências sutis e divertidas, como o mapa de Toronto que lembra Super Mario World. A variedade dos cenários também cativa, como ruas repletas de neve, um estúdio cinematográfico e  uma estranha festa de Halloween. A trilha sonora da banda rock chiptune Anamanaguchi é repleta de energia e complementa a ambientação retrô.
 


Simplicidade que diverte

Em sua essência, Scott Pilgrim vs. The World: The Game é um beat ‘em up bem básico. A estratégia principal consiste em atacar repetidamente com combos, mas há espaço para experimentação com golpes que permitem lançar inimigos no ar ou dispersar grandes grupos. As possibilidades aumentam conforme o arsenal de movimentos dos personagens se expande e é divertido tentar criar sequências mais complexas.

A simplicidade das mecânicas torna o jogo bem acessível, sendo fácil descer a porrada nos capangas, seja sozinho ou com amigos. A estratégia, no geral, se concentra em lidar corretamente com os obstáculos e com inimigos: às vezes é melhor enfrentar inimigos individualmente; grupos são perigosos e exigem cautela; já estágios com perigos o desafio é evitar dano. Os chefes são o ponto alto com lutas criativas e visualmente interessantes. É fato que não há muita variedade de oponentes e situações pelos sete estágios, além de algumas áreas se arrastarem demais, mas não deixa de ser uma diversão pura e descomplicada.


No meu tempo no mundo de Scott Pilgrim, senti constantemente que esta é uma aventura direcionada para grupos — ao lutar sozinho, foram vários os momentos em que foi extremamente complicado enfrentar muitos inimigos simultaneamente. E, de fato, no multiplayer o jogo fica mais divertido, afinal é possível coordenar ações para fazer combos impressionantes e há até mesmo um ataque especial combinado entre os heróis. Sendo assim, a minha recomendação é jogar com outras pessoas.

Fora a aventura principal, há vários modos extras, como Boss Rush, sobrevivência contra hordas de zumbis e combates versus entre jogadores. Essas modalidades são simples, mas dão uma sobrevida ao jogo. Fora isso, o título conta com multiplayer online, mas, infelizmente, ele não funcionou em nenhuma das minhas tentativas. Além disso, as opções de criação e busca de sala são bastante limitadas. Logo, recomendo somente o multiplayer local, pois seu funcionamento é garantido.
 


Atrapalhado por uma série de decisões duvidosas

Scott Pilgrim vs. The World: The Game esbanja carisma e diverte, mas um conjunto de problemas impacta a experiência e impede que o jogo alcance seu real potencial. Para começar, ele conta com características de RPG que parecem bem interessantes na teoria: os personagens aprendem novos movimentos ao subir de nível e seus atributos são melhorados por meio de itens. Esses sistemas, na verdade, são bastante desbalanceados e uma maneira tediosa de tentar estender a jornada.

No começo da aventura, os personagens têm um conjunto limitado de ataques, fazendo com que as primeiras fases sejam desinteressantes mecanicamente: você basicamente repete o combo básico repetidamente. Para piorar, habilidades importantes, como recuperação aérea ou esquiva, só são liberadas nos últimos níveis. Sem elas, é muito comum ser alvo de malabarismo aéreo pelos inimigos sem poder reagir, às vezes resultando até em morte.


Isso melhora com o avançar da aventura, porém ainda há problemas com a precisão dos controles: certas técnicas são difíceis de executar (mesmo com comandos simples), e a movimentação alterna entre um andar lento ou corrida rápida e quase descontrolada. A simplicidade das mecânicas faz com que qualquer um consiga jogar, mas senti falta de maior fluidez ou mais possibilidades. Isso é até justificável, afinal Scott Pilgrim foi lançado inicialmente em 2010, mas beat ‘em ups modernos, como Streets of Rage 4 e Fight’n Rage fazem um trabalho melhor nesse aspecto.


Mas o pior aspecto do jogo é o desbalanceamento. Pela aventura aparecem picos de dificuldade irritantes, e para superá-los é necessário revisitar estágios para juntar dinheiro e melhorar as características dos heróis. Não só isso, cada personagem precisa ser treinado individualmente, inclusive no multiplayer. E técnica não adianta, pois os inimigos ficam extremamente resistentes e poderosos, ou seja, o infame grind é praticamente inevitável

Por causa disso, o progresso se arrasta e somos forçados a repetir trechos, em uma clara forma artificial de estender a aventura, que dura por volta de três horas. No fim das contas, as características de RPG comprometem a pancadaria, afinal é mais importante fortalecer o personagem do que dominar seus movimentos. Tudo isso já estava presente no lançamento original e a versão completa era uma boa oportunidade de resolver esses problemas, mas eles estão intocados.
 


Um beat ‘em up básico para momentos de descontração

Scott Pilgrim vs. The World: The Game – Complete Edition esbanja carisma e diverte com sua pancadaria bem humorada. As mecânicas simples deixam a experiência bem acessível, sem deixar de lado alguns aspectos de profundidade. Este é mais um daqueles jogos perfeitos para curtir com os amigos no multiplayer: é um deleite coordenar ataques para acabar com os inimigos ou então aproveitar os modos extras. No entanto, o título tem algumas escolhas de design duvidosas, como os aspectos de RPG mal implementados e dificuldade desbalanceada, o que pode afastar os mais exigentes. No mais, Scott Pilgrim vs. The World: The Game é uma opção descomplicada para curtir com os amigos.

Prós

  • Sistema de combate simples e intuitivo, com algumas boas opções após os personagens aprenderem todos os movimentos;
  • Ambientação repleta de energia e referências com visual 2D pixel art e contagiante trilha sonora com composições chiptune;
  • Presença de modos extras e multiplayer ajudam a estender a vida útil do jogo.

Contras

  • Os controles e a movimentação carecem de fluidez em alguns momentos;
  • Elementos de RPG forçam grind tedioso e diminuem a relevância dos sistemas de luta;
  • Alguns problemas de desbalanceamento, especialmente ao jogar sozinho.
Scott Pilgrim vs. The World: The Game – Complete Edition — Switch/PS4/PC/Xbox One — Nota: 7.0
Versão utilizada para análise: Switch
Revisão: Icaro Sousa
Análise produzida com cópia digital cedida pela Ubisoft
Siga o Blast nas Redes Sociais

é brasiliense e gosta de explorar games indie e títulos obscuros. Fã de Yoko Shimomura, Yuzo Koshiro e Masashi Hamauzu, é apreciador de roguelikes, game music, fotografia e livros. Pode ser encontrado no seu blog pessoal e nas redes sociais por meio do nick FaruSantos.
Este texto não representa a opinião do Nintendo Blast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Você pode compartilhar este conteúdo creditando o autor e veículo original (BY-SA 3.0).