Confesso que o título desta análise é um tanto quanto sensacionalista, mas fazer alarde não é minha praia. Descobri que tinha miopia aos nove anos, na quarta série (atualmente quinto ano), e hoje, aos quase 29, tenho praticamente seis graus em ambos os olhos, embora isso não me impeça de jogar videogames. Digo, não me impedia, até eu decidir experimentar Wildfire.
Não que o jogo seja ruim ou injogável, muito pelo contrário: tem comandos responsivos, boas mecânicas, bonitos gráficos em pixel art e garante uma boa diversão. Mas, se jogar no modo TV já é complicado, depender da tela de sete polegadas do híbrido da Nintendo é judiar de quem não tem boa acuidade visual. Wildfire até oferece a opção handheld mode zoom, porém os elementos gráficos continuam pequenos demais — e as screenshots e os vídeos para esta análise estão com essa opção habilitada.
Se é que posso chamar de zoom, né |
Fogo, água, terra e criatividade
O jogo consiste em conduzir um personagem bem pequenininho até a saída de um mapa em forma de plataforma, tentando não chamar a atenção de guardas também muito pequenininhos. O herói requer alguma habilidade para saltar buracos, pousar em plataformas e escalar cipós, mas o principal é saber usar seus poderes elementais e se esgueirar, esperando o momento certo para agir e não chamar a atenção dos pixels — digo, guardas.
Na maioria das fases, não basta apenas ir do ponto A ao ponto B, é necessário também superar alguns desafios, como objetos bloqueando a passagem ou reféns que precisam ser resgatados. Para isso, o personagem conta com seus poderes mágicos e pode controlar os elementos fogo, água e terra.
A física do uso de cada um desses elementos é bastante interessante e o jogador pode ser criativo para superar os obstáculos. Dentro do cabível, essa mecânica lembra a de The Legend of Zelda: Breath of the Wild, pois também é possível usar as características de cada elemento, ou até mesmo combinações entre eles, para produzir o efeito desejado.
Por exemplo, para escalar uma parede mais alta, os poderes de água podem ser usados para flutuar em uma bolha ou criar uma plataforma de gelo; as magias de terra criam uma trepadeira que permitirá uma escalada mais fácil; já as de fogo permitem que o herói use um salto duplo ou voe na fumaça. Os elementos também servem para distrair ou derrotar os guardas, sufocando-os com fumaça, espantando-os ao atear fogo à grama, entre outras possibilidades — criatividade é a palavra-chave aqui.
Pena que ainda não dá para invocar o Capitão Planeta... |
Esses recursos, contudo, costumam ficar em locais de difícil acesso e requerem bastante planejamento por parte do jogador para serem obtidos. Até é possível completar uma fase sem pegar os pedaços de meteoro e ativar as estátuas, mas é extremamente recomendado procurar por eles, pois as novas habilidades são extremamente úteis; além disso, a busca por esses itens acrescenta uma camada extra de diversão e desafio ao jogo.
A liberdade criativa transforma Wildfire em um incrível puzzle de plataforma com ampla abertura à experimentação por parte do jogador, além de conferir um grande fator de rejogabilidade. É difícil não ficar com vontade de revisitar as fases já concluídas e tentar superar os desafios de uma maneira diferente, ou até mesmo pegar itens que ficaram esquecidos na primeira tentativa.
Amigo é coisa para se jogar
Em algumas missões, é preciso roubar certos objetos ou resgatar pessoas. Esses NPCs, em Wildfire, são tratados como objetos — no sentido literal —, pois podem ser lançados como uma bola. Em uma das fases, por exemplo, o herói deve salvar um amigo que se feriu, e uma das formas de fazê-lo é arremessá-lo através de um penhasco. Porque, afinal de contas, jogar uma pessoa com o tornozelo quebrado para o outro lado de um precipício é algo que só os verdadeiros amigos podem fazer.
Também é possível jogar com um amigo, e não se trata de arremessá-lo por aí: Wildfire possui um modo multiplayer cooperativo local muito interessante no qual ambos os jogadores controlam os personagens na mesma tela e podem usar os poderes elementais combinados entre si, gerando soluções curiosas para os desafios. Mesmo que não esteja disponível online, o multiplayer pode ser jogado em qualquer ponto já desbloqueado da campanha atual e não possui separação de progresso entre os modos.
Para (quase) todas as necessidades
Um ponto para se elogiar em Wildfire é a preocupação dos desenvolvedores com as opções de acessibilidade. Existem opções que adaptam a jogabilidade a diversos gostos e necessidades, como configurar o controle para ser jogado com uma mão só, permitir que o personagem execute saltos automáticos enquanto corre e ajustar as cores para daltônicos, entre outras possibilidades.
Os controles funcionam bem no modo portátil, seja com os Joy-Con destacados ou com um controle compatível com o Switch. Os Joy-Con, mesmo separados no modo co-op, são bons o suficiente nos comandos; a desenvolvedora fez um ótimo trabalho com o feedback destes controles e é possível “sentir” o efeito de cada elemento ao usar os poderes do personagem.
Só faltou mesmo a lente de aumento nas opções de acessibilidade |
A maior dificuldade em se jogar no modo portátil, porém, não está nos controles, e sim em enxergar os elementos gráficos muito pequenos na tela de sete polegadas do Switch. Embora jogar dessa maneira seja possível, Wildfire requer uma TV para ser aproveitado totalmente. Pessoas que preferirem jogar em qualquer lugar ou sofrerem de algum problema visual — como miopia, no meu caso — devem se preparar para ficar com o rosto colado na tela, e o handheld mode zoom é praticamente obrigatório.
Existem também opções que afetam a dificuldade do jogo, como desabilitar contornos dos personagens quando estão se escondendo, ocultar o estado de alerta dos guardas ou a indicação de temperatura do personagem. Se por um lado isso torna a aventura bem mais complexa, por outro deixa-a muito mais emocionante.
Quanto aos idiomas, há oito opções disponíveis, mas nenhuma delas é português. Contudo, o enredo é simples e, apesar de acrescentar um quê a mais à história, não é essencial para curtir o jogo em si. Wildfire apenas requer que o jogador tenha fluência básica em um dos idiomas para entender os objetivos de cada missão e as descrições das habilidades.
Um ponto negativo do jogo é que ele costuma apresentar queda de quadros por segundo quando há muitos elementos ativos na tela, mesmo jogando com o Switch no modo TV. Essa queda pode chegar a atrapalhar a jogabilidade, já que algumas partes do jogo necessitam de comandos de ação por parte do jogador.
Para não perder de vista
Wildfire é um interessantíssimo título de stealth e puzzle de plataforma. O jogo requer agilidade, planejamento e astúcia na dose exata, e sua mecânica rica no uso dos elementos incentiva o jogador a ser criativo e experimentar novas soluções, o que acrescenta um grande fator de rejogabilidade. Existem, sim, alguns problemas, como os elementos gráficos muito pequenos e algumas quedas de FPS; no entanto, considerando também o divertido multiplayer local e as amplas opções de acessibilidade, é uma experiência mais do que recomendada — mas talvez seja necessário o uso de óculos durante a jogatina.
Prós
- Comandos bastante responsivos;
- Alto fator de rejogabilidade;
- Diversas alternativas para a solução das fases;
- Co-op local divertido e instigante;
- Várias opções de acessibilidade e dificuldade.
Contras
- Fontes e elementos gráficos muito pequenos, ruins para jogadores com pouca acuidade visual;
- Jogabilidade afetada pelas eventuais quedas de FPS.
Wildfire — Switch/XBO/PS4/PC — Nota 8.0
Versão utilizada para análise: Switch
Revisão: Davi Sousa
Análise produzida com cópia digital cedida pela Humble Games