Para quem não conhece a franquia, a dupla Sam & Max foi criada por Steve Purcell em 1987, quando foi publicada pela primeira vez em uma revista em quadrinhos. De lá para cá, eles apareceram em outros tipos de gibis, séries televisivas e, obviamente, jogos de videogame. Mesmo tendo se apresentado em tantos formatos, nunca mudaram seu estilo característico de humor afiado.
Os detetives, ou freelance police, como gostam de ser chamados, são dois animais humanoides peculiares. Sam é um cachorro bípede alto, que veste terno, gravata e chapéu. É calmo, tem um senso de justiça elevado e ama o seu trabalho. Já Max é um coelho antropomórfico muito agitado, que quase sempre está com um sorriso enorme no rosto. É excessivamente falante e quase hiperativo, além de contar com um humor mais ácido, o que faz Sam dizer para ele muitas vezes: “You crack me up, little buddy!” (“você me mata de rir, amiguinho”). Eles trabalham em um escritório em Nova Iorque, onde se aventuram em investigações bizarras.
Freelance Police em ação
Em Sam & Max Save the World, nós podemos trabalhar em seis casos, que são separados por episódios independentes. Ou seja, podemos escolher a ordem em que queremos jogar. É legal ter essa autonomia, mas a jornada faz muito mais sentido quando seguida sequencialmente do um ao seis. Assim, a dica é encará-los como se fossem episódios de sua série humorística preferida, que podem durar entre uma hora e meia e três horas cada.
De todos os episódios, dois estão entre os meus favoritos. Um deles é o primeiro, que se inicia com um telefonema do comissário da polícia relatando eventos suspeitos no bairro em que Sam e Max moram. Eles descobrem que os distúrbios estão sendo causados pelos Soda Poppers, ex-atores infantis famosos que foram hipnotizados por uma fita de autoajuda. Para curá-los, os policiais procuram por uma psiquiatra, que consegue tirá-los do transe. Na sequência, descobrimos que tudo é um plano vingativo de outra velha estrela mirim.
Outro episódio marcante e muito excêntrico é o quarto, em que Sam e Max são chamados a Washington, pois o presidente dos Estados Unidos anda agindo estranho. A tarefa dos nossos heróis é dar um jeito de entrar na Casa Branca, onde descobrem que o político estava hipnotizado. As cenas seguintes são hilárias, com direito a uma briga entre a dupla e o presidente, problemas diplomáticos, personagens disfarçados de russo e eleições com Max concorrendo à presidência.
Essência humorística e muitos puzzles
O gameplay se resume em resolver quebra-cabeças no estilo point and click em ambientes fechados, como nosso escritório, um mercado, um set televisivo e afins. Neles, podemos controlar Sam para manejar objetos com os quais desejamos interagir, buscando por combinações necessárias para solucionar os problemas dos casos policiais. Boa parte dos puzzles são resolvidos conforme coletamos utensílios, como uma luva de boxe, espuma de barbear e uma bola de boliche, mas também podem aparecer charadas em forma de diálogos, em que temos de fazer escolhas de frases a serem enunciadas.
Geralmente nos dão quatro citações para escolher, e se selecionarmos a certa, o problema será solucionado. Nós somos livres para tentar várias vezes, alternando entre as opções até acertar. Infelizmente isso acaba sendo frequentemente necessário, pois muitas das resoluções são nonsense, quase impossíveis de serem interpretadas normalmente. É engraçado, mas pode frustrar e trancar a jogatina, nos fazendo recorrer à tentativa e erro em excesso ou a buscar as respostas em guias e detonados.
Assim, Sam & Max Save the World pode ser encaixado no gênero de aventura, pois em cada episódio vivemos uma jornada fresca, mas ele está longe de ser um jogo cheio de ação e frenesi. Com muitos diálogos, quebra-cabeças e escolhas, ele naturalmente se torna um pouco vagaroso, o que pode espantar jogadores de alguns estilos. Logo, se você não gosta de títulos com um ritmo mais lento e com bastante texto, talvez essa não seja a melhor escolha.
Animais falantes
Com tantas falas, Sam & Max Save the World felizmente conta com uma dublagem excelente, e é perceptível a melhora feita no lip sync dos personagens em comparação à edição original. As vozes interpretam muito bem a emoção, principalmente a parte humorística das ocasiões.
Infelizmente o jogo não conta com tradução para o português – nem no áudio, nem na legenda. Isso é, para mim, o seu principal ponto negativo, pois pode ser penoso acompanhar as histórias em outro idioma, também acarretando em muitos bloqueios de piadas regionais ou algo do tipo. O jogo se aproveita do cenário da cultura pop americana, brincando muito com referências internas dos Estados Unidos, que podem passar batido para quem não é de lá.
Dessa forma, tanto pelos muitos diálogos e por possuir pequenos detalhes essenciais, Sam & Max Save the World requer bastante atenção. É preciso estar constantemente ligado em tudo para decifrar os quebra-cabeças. Com isso, achei um pouco difícil de se jogar no modo portátil; não pela tela ser menor, mas por ser mais fácil de se distrair e perder o compromisso. Porém, não considero esse detalhe como algo ruim, dado que uma das grandes alegrias desse port é justamente poder jogar no console híbrido da maneira que quisermos, também permitindo outros atrativos na nova versão.
Remasterização bem executada
No relançamento, o visual da dupla freelance police está muito amável, com melhorias nos personagens e ambientes. Agora em widescreen, o jogo ganhou uma iluminação melhor e cores mais vivas, fazendo-o parecer uma obra de 2020. Os protagonistas estão mais expressivos e a principal melhoria foi na sincronia da dublagem, conforme mencionado acima.
Os protagonistas e cenários ganharam um tratamento de qualidade em seus modelos, mas sem abrir mão da essência original. Então, não se preocupe, o jogo não perdeu sua fofura visual tridimensional, muito menos sua trilha sonora rica, com temas de jazz na temática anos 50. No geral, a estética se tornou quase impecável ao atualizar traços que estavam defasados.
Entre as adições, há também a inclusão do touchscreen no modo portátil. Como é um point and click originalmente pensado para o PC, o recurso funciona bem ao substituir o cursor do mouse de certa forma. Mas, mesmo no modo docked, não é difícil controlar Sam. Basicamente, os dois analógicos substituem o uso do mouse: enquanto um movimenta o personagem, o outro seleciona objetos próximos para interagir.
O formato de gameplay é simples, funciona bem e é interessante, mesmo não havendo nada de extraordinário; afinal, ele ainda é um jogo de 2006 e de mecânicas antiquadas. Todavia, Sam & Max Save the World acaba sendo uma jornada encantadora muito mais por seus episódios, diálogos e situações em si. Com um humor sarcástico e as piadas no ponto, sua essência segue atual, mesmo com 14 anos de diferença.
Let's get to work!
Acho justo dizer que Sam & Max Save the World tem um dos melhores humores que já presenciei em videogames. Os seus seis episódios apresentam histórias peculiares e divertidíssimas, assim como seus puzzles são interessantes e funcionam bem. Mesmo sendo de 2006, o point and click do cachorro de terno e do coelho hiperativo ainda é uma garantia de risos na tela do Switch – agora em uma remasterização oportuna.
Prós
- Sam e Max são protagonistas cômicos e cativantes;
- Histórias peculiares em seis episódios de boa duração;
- Puzzles bem pensados dentro de um universo carismático;
- Visual, trilha sonora e dublagem deslumbrantes.
Contras
- Sem tradução para português, tanto no áudio como na legenda;
- Alguns diálogos de quebra-cabeças são muito aleatórios e nonsense;
- O ritmo vagaroso e o excesso de conversação podem afastar jogadores de alguns estilos.
Sam & Max Save the World — Switch/PC — Nota: 9.0Versão utilizada para análise: Switch
Revisão: Davi Sousa
Análise produzida com cópia digital cedida pela Skunkape Games