Análise: Dandara: Trials of Fear Edition (Switch) — um metroidvania diferente com um tempero tupiniquim

Atualização gratuita traz várias novidades para o título do estúdio brasileiro Long Hat House.

em 21/03/2020

Em 2018, a dupla de desenvolvedores mineiros da Long Hat House, Lucas Mattos e João Brant, lançou Dandara para todas as principais plataformas, incluindo o Switch. O título recebeu certa notoriedade, graças ao seu esquema de controles nada convencional, e permaneceu no imaginário do gamer brasileiro como uma referência de trabalho de qualidade feito em terras tupiniquins. Agora, passados dois anos, e após um árduo trabalho por parte dos desenvolvedores, Dandara é atualizado quase como um novo jogo, chamado de Trials of Fear Edition.

Um Metroidvania diferente

Comecemos pela característica mais marcante de Dandara: os controles. O mapa e a progressão da aventura transcorrem da mesma forma que todo metroidvania. Mas em Dandara você não pode simplesmente caminhar livremente por aí — algo que, ao mesmo tempo, limita e enriquece a experiência. Por um lado, o desafio de poder pisar apenas em locais predeterminados é intrigante e cria algumas situações específicas. Por outro, às vezes o processo se torna um pouco cansativo e repetitivo. O esquema de controle, em sua essência, é o que faz o título ser o que é: definitivamente interessante, mas longe de não ter as suas falhas.

E como esse sistema funciona exatamente? Dandara, a protagonista que possui o mesmo nome do jogo, só pode pisar em locais onde tiver "sal": pequenas áreas brancas predeterminadas espalhadas pelo mapa. Essas áreas estão sempre a uma considerável distância uma da outra, por isso, é necessário pular diretamente entre elas, ignorando a gravidade por completo. Os locais onde é possível aterrissar ficam em qualquer um dos quatro cantos de uma sala — cima, baixo, pelos lados — e as áreas giram para cima ou para baixo de forma constante.


Como já deve ter ficado claro, o gameplay de Dandara consiste de uma "pulação" sem fim. Graças às limitações de movimento, cada sala é como se fosse um pequeno puzzle a ser resolvido. As grandes questões são como e onde pular na hora certa e como lidar com os inimigos da melhor forma. O combate é bastante simples e até um pouco lento, mas isso encaixa bem com a natureza de quebra-cabeças do gameplay. Inicialmente, você tem apenas um tiro que precisa ser carregado para lidar com as várias ameaças de cada área — e, acredite, todos os inimigos conseguem ser bastante chatos —, por isso, paciência é sempre de suma importância.

Além do enigma de cada quarto, as áreas como um todo funcionam como um grande puzzle geral, típico do gênero metroidvania. Aquela velha fórmula de andar até não conseguir ir mais adiante, e então voltar e procurar alguma resposta em todas as salas que ainda não foram exploradas. Entretanto, em Dandara há um risco adicional para exploração exacerbada: perder todo o seu sal, ou melhor, o "dinheiro" do jogo. 



Morrer significa começar de novo a partir do último acampamento (ou bandeira) e perder todo o sal que você tinha coletado até então. Sal serve para realizar todos os upgrades do jogo, então perder tudo que você tem pode ser bastante desagradável para o progresso da história. Os upgrades são: mais corações de vida, mais energia para ataques especiais ou mais efetividade da poção de cura de corações/energia.

O sal, porém, não precisa se perder para sempre. Se você chegar até o local onde morreu (antes de morrer mais uma vez) é possível pegar (ou atirar) no seu fantasma flutuante e receber 100% do sal de volta. Essa mecânica não é nada de novo e é vista em jogos como a série Dark Souls ou Nier: Automata, mas ela certamente faz com que Dandara seja um metroidvania mais ansioso do que os outros. A exploração sempre parece custar caro. É importante sempre seguir adiante com paciência e pensar bem nos próximos passos.

Dandara e os reinos de sal

Em relação à história, Dandara possui uma ideia interessante, mas a execução não é das melhores. Basicamente, a narrativa trata de como o "sal" — ou, o "natural", a magia das coisas — está sendo corrompido por Eldar e o seu exército dourado. Embora o tema claramente anticapitalista em favor da natureza seja válido (e tenha sua relação direta com o Brasil), a história nunca parece realmente importar alguma coisa. Os diálogos espalhados de alguns poucos personagens específicos costumam enrolar bastante a ideia principal, e a heroína Dandara só não tem muito a falar sobre o assunto.

A construção do universo de Dandara também afeta a exploração de certa forma. Ao contrário de muitos outros metroidvanias, você nunca adquire novas habilidades excitantes que realmente façam alguma diferença no progresso. Em vez disso, as portas (metafóricas) se abrem a partir de soluções mais fáceis: coisas como mísseis que destroem paredes, um lugar específico onde é possível saltar mais longe e áreas que são "reanimadas" e voltam a funcionar por causa de algum objeto especial. As soluções para o progresso parecem fáceis demais e Dandara continua basicamente fazendo as mesmas coisas do começo ao fim da aventura.


Não me entenda mal, Dandara consegue ser divertido e com certeza é uma obra bem feita. O estilo visual pixel-art é agradável, o level design de algumas salas é muito bom e, principalmente, a trilha sonora original e os efeitos sonoros de Thommaz Kauffmann são fenomenais. Cada área é embalada pela sua própria música, encaixando perfeitamente com o clima e/ou a tensão do momento — desde a pegada mais tribal da área da floresta até o piano nervoso da frenética e empolgante música da parte final.

Apesar do que o título faz certo, parece que algo nunca encaixa em definitivo para fazer Dandara ser um grande jogo. A dificuldade, por exemplo, é estranha. Em geral, se você está fazendo os upgrades e andando com calma, o desafio é bom e nunca chega a ser totalmente decepcionante na maior parte do jogo. Entretanto, algumas partes da área final e da nova área do Trials of Fears Edition são tão ridiculamente lotadas de inimigos que é mais fácil fechar os olhos e ir na sorte — algo que, na verdade, acontece em um grau menor durante todo o jogo. A paciência que Dandara pede ao jogador para enfrentar/desviar de certos inimigos, ou combinações de inimigos em algumas salas, muitas vezes só não vale a pena e acaba por ser frustrante.



Quanto às adições do novo update gratuito, o principal atrativo são as três novas áreas incluídas em toda uma segunda parte alternativa do mapa principal. Além disso, outras novidades que acompanham o novo local são algumas novas habilidades, um novo chefe, diferentes mecânicas nas salas, algumas músicas inéditas e um final secreto para a história principal. Se você pensava em jogar Dandara antes, agora com certeza é o momento ideal para isso. A quantidade de conteúdo jogável disponível definitivamente é vasta, além de melhorias gerais em aspectos técnicos e uma retocada grande em toda parte da história. No entanto, por mais que algumas coisas novas de fato apareçam no DLC gratuito, o sentimento geral é um pouco de "mais do mesmo".

No fim das contas, Dandara não pode ser encarado como um metroidvania tradicional. É bem claro que mecânica de pular entre os lugares foi feita pensando em uma touch screen, o que inclusive é uma possibilidade no Switch (embora eu tenha usado apenas o pro controller). Por causa disso, muitas vezes o game parece mais certo para um ambiente como o celular. Não tenho certeza se jogar Dandara na TV com um controle faz jus à experiência proposta, pelo menos até certo ponto. Se metroidvanias são o seu gênero favorito e, isso é importante, se você se apaixonar pela mecânica do título desde o começo, Dandara pode ser uma experiência incrível — principalmente agora com o mais novo update.


Prós

  • Mecânica inovadora;
  • Gráficos legais;
  • Level design na maioria das vezes interessante;
  • Trilha sonora excepcional.

Contras

  • A mecânica de movimentação pode cansar rápido;
  • Exploração e combate frustrantes de vez em quando;
  • Progressão um tanto arrastada e repetitiva.
Dandara: Trials of Fear Edition - Switch/PC/PS4/XBO/Mobile - Nota: 7.0
Versão utilizada para análise: Switch 
Revisão: Jorge Neto
Análise produzida com cópia digital cedida pela Raw Fury
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