Análise: Shovel Knight: King of Cards (Switch) encanta com saltos mirabolantes e jogos de cartas

Um dos últimos complementos de Shovel Knight mostra que ainda existe muito a se explorar nesse universo.

em 17/12/2019

Shovel Knight foi lançado em 2014 a partir de uma campanha de Kickstarter. Para aqueles que compraram a versão original ou participaram da campanha, uma série de DLCs foram prometidos e finalmente todos foram entregues agora em 2019, sendo Shovel Knight: King of Cards um dos últimos lançamentos. O jogo mantém o estilo clássico da série e talvez ótimas inovações, funcionando muito bem como um game solo, além de ser uma prequela do Shovel Knight original.

Pule, Gire, caia no lugar certo

A série Shovel Knight é, essencialmente, um metroidvania com muitos elementos de plataforma. Em todos os jogos anteriores existe uma mescla desses elementos. Mas em nenhum deles os esquemas de plataforma parecem ter tanta atenção quanto em Shovel Knight: King of Cards. No game, jogamos com King Knight, um dos vilões do primeiro título. Aqui, acabamos descobrindo mais sobre ele e sobre sua obsessão por ser rei — coisa que ele efetivamente não é, mas insiste em ser tratado como se fosse. King Knight possui como golpe uma ombrada, que pode tanto atacar inimigos como funcionar como elemento acrobático. Ao dar uma ombrada em uma parede, o personagem ganha um salto extra (como um wall jump) e começa a girar. Esse giro permite que ele possa cavar tesouros ou acessar determinados ambientes, bem como atacar inimigos.

Existe uma variação muito grande de sessões de plataforma. É realmente bem impressionante como os desenvolvedores da Yacht Club Games, mesmo depois de tantas incursões nesse universo, continuam criativos para criar ambientes e desafios. Muitas coisas nesses momentos de saltar e utilizar as habilidades do jogador lembram um jogo de puzzle, em que é preciso entender a mecânica da fase para planejar os movimentos. Apesar disso, e mesmo lembrando títulos reconhecidamente difíceis como os primeiros Mega Man, Shovel Knight: King of Cards não é tão impossível assim. As fases são relativamente curtas e os checkpoints, ainda que poucos, ajudam na sensação de avanço constante.

Essa é, sem dúvida, a melhor parte do jogo, já que o combate com os inimigos pelo caminho é apenas um obstáculo razoável e os chefes são relativamente fáceis, apesar de serem também muito criativos e únicos. Cada um dos chefes possui habilidades específicas e luta em um ambiente próprio, trazendo camadas novas de jogabilidade e desafio. No entanto, é possível conquistar um grande número de upgrades pelo caminho, e isso acaba deixando o desafio de enfrentá-los bem menor. Invariavelmente o jogador conseguirá ampliar o número de vidas, de vigor (utilizado para liberar magias e armas extras) e conquistará itens especiais, como a capacidade de recuperar todas as vidas durante o estágio. Nada disso é realmente um problema, mas mostra que a luta contra os chefes não é o ponto mais alto dessa aventura.


Customizações para rei nenhum botar defeito

Shovel Knight: King of Cards apresenta um número muito grande de customizações. É possível comprar roupas novas, e com isso ativar algumas capacidades extras, assim como destravar itens preciosos. Essas habilidades, como entrar em uma bolha e ganhar mais altura para alcançar locais mais difíceis, são opcionais e podem ser encontradas em fases secretas.

Aliás, essa é uma característica interessante do mapa do jogo. Durante os quatro mapas, e muitas fases, é possível pegar atalhos e avançar no game sem ter que passar por todos os estágios ou pegar todos os itens. O fato de não ser obrigado a coletar tudo, permite ao jogador criar sua própria estratégia para lidar com os desafios pelo caminho. Claro que é muito mais simples se você progredir lentamente, pegando todos os upgrades que puder, mas é extremamente válido que isso seja uma opção e não uma obrigação a seguir.

Durante a aventura muitos personagens que você conhece, e até mesmo os inimigos derrotados, vão se reunindo em um dirigível utilizado por King Knight para se locomover pelas áreas do jogo. Nesse dirigível, no contato com esses personagens, é possível fazer muitas das alterações permitidas durante o percurso. A mãe do nosso “herói”, por exemplo, está lá, e pode vender comidas para o filho ampliar o número de vidas e vigor. O rei de Brejorgulho, derrotado logo na primeira área, lhe vende novas roupas. Outros personagens, vendem armas, habilidades etc.

Cartas na mesa

Até aqui falei sobre a parte de plataforma e exploração, mas existe um mundo inteiramente novo a descobrir dentro dessa aventura: um jogo de cartas chamado Joustus. Tenho que admitir que demorei muito para pegar o jeito, apesar das regras serem simples e bem apresentadas. O problema não é entender como jogar, mas sim adquirir a habilidade de raciocínio necessária para pensar bem de acordo com as demandas propostas.



O Joustus funciona assim: existe uma mesa (que varia de tamanho durante as diferentes partidas) e um espaço livre no centro dela. Nesse espaço, vemos uma ou mais joias. O objetivo do jogo é terminar a partida com uma carta sua em cima do maior número possível de joias. Parece simples, mas não é possível simplesmente colocar uma carta no lugar da gema. É preciso posicioná-la em algum outro espaço vago e só depois movimentá-la. No entanto, a partida funciona em um modo de 1 x 1. Você faz uma jogada e o adversário faz uma logo depois, e só é possível empurrar as cartas em situações específicas. Por exemplo, algumas cartas possuem uma seta apontando para a esquerda. Isso significa que elas podem empurrar outras cartas para essa direção. No entanto, se a carta do adversário tiver uma seta para a direita, esse movimento não será possível, pois as forças contrárias das setas se anulam.

Junte a essa mecânica o fato de que existem dezenas (talvez mais de uma centena) de cartas diferentes, algumas com setas duplas, poderes de destruição e cheats, e você perceberá que estamos diante de um card game muito complexo e brilhantemente bem executado. Sério, o Joustus daria tranquilamente um título à parte, de tão interessante e desafiador que é. Sei que é complicado entender como são as partidas a partir da descrição que fiz acima, mas dentro do jogo tudo funciona muito bem. Fora isso, essa página tem um manual com mais detalhes.

Tirando a primeira casa de cartas que você encontra, os desafios posteriores são opcionais. É importante vencê-los para conquistar troféus e dinheiro que podem ser trocados por upgrades, mas realmente não é obrigatório. Isso é bom, porque o desafio pressupõe um engajamento realmente grande e muitas pessoas talvez estejam mais interessadas nas mecânicas de plataforma e exploração do que nos puzzles dificílimos impostos mas mesas de Joustus.

Reinando com brilho

A Yatch Club Games afirma que Shovel Knight: King of Cards é o maior e mais ambicioso jogo da série. E isso é verdade. O game é realmente longo, com muito conteúdo e desafios de sobra, funcionando muito bem como uma aventura solo e sendo praticamente um absurdo como DLC gratuito (para quem tem a versão completa do original). O trabalho é primoroso nos mínimos detalhes, com fases extremamente criativas e um humor peculiar (muitas vezes beirando o ridículo) que fazem você quase sentir pena do vilão com quem jogamos.



Shovel Knight: King of Cards encerra com brilhantismo a série de jogos de plataforma de Shovel Knight e mostra como é possível inovar dentro de uma estrutura básica, conseguindo sempre surpreender positivamente os jogadores.

Prós

  • Muita criatividade na construção das fases e desafios de plataforma;
  • Conteúdo longo e bem distribuído entre tarefas obrigatórias e opcionais;
  • Joustus, o jogo de cartas dentro do game, é extremamente desafiador e complexo.

Contras

  • Pouco desafio nas lutas contra os chefes, mas nada que tire os méritos do jogo.
Shovel Knight: King of Cards — Switch — Nota: 10
 Análise produzida com cópia digital cedida pela Yacht Club Games
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Pesquisador nas áreas de estética e cibercultura com Mestrado em Cultura e Sociedade (UFMA) e Doutorado em Comunicação (UnB). Além de escrever sobre jogos, produz o Podcast Ficções e tem um blog sobre literatura, filosofia e cotidiano.
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