Em ano de Jogos Olímpicos, duas coisas são certas: o mundo irá parar para testemunhar momentos esportivos únicos, que mostram toda a capacidade do ser humano, e um jogo temático do evento estrelando Mario e Sonic será lançado. A série desenvolvida e publicada pela SEGA já virou uma tradição em si e marca presença nos consoles Nintendo a cada dois anos, nos Jogos de Verão e de Inverno, desde 2007.
O produto final, porém, é uma coletânea de minijogos esportivos que, embora tenha alguns aspectos de apresentação e jogabilidade bem-vindos, não se esforça para sair de sua zona de conforto. A consequência é um título raso, que diverte ocasionalmente, mas que não se dispõe a expandir mais suas mecânicas.
Crossover poliesportivo
A primeira coisa que se busca em um jogo baseado nas Olimpíadas são justamente os esportes representados. Nesse quesito, o game não deixa a desejar. O catálogo conta com 34 provas, a maior quantidade na história da série em consoles de mesa e um salto enorme em relação às somente 17 modalidades presentes na edição das Olimpíadas do Rio de Janeiro, para Wii U.O lineup de Tóquio 2020 |
O lineup de Tóquio 1964 |
Tanto a lista de modalidades antigas quanto a de provas contemporâneas possuem uma certa diversidade. O foco maior é, sem dúvidas, em eventos de atletismo: corrida de 100 metros rasos, lançamento de disco e salto em distância são alguns dos exemplos. Porém, outros esportes individuais – como natação, hipismo e ginástica – retornam de edições anteriores da série, assim como disputas em equipe, representadas aqui pelo futebol, rúgbi de sete, voleibol e por partidas de badminton, tênis de mesa e canoagem em dupla.
Surfe é uma das novas modalidades de Tokyo 2020 |
O lado bom de Tokyo 2020
Apesar de todos esses esportes, quantidade não significa, necessariamente, qualidade. Experimentando os minijogos, percebe-se os pontos em que o game se sobressai e, principalmente, naqueles em que ele peca.Vale ressaltar que, em uma boa sacada, os jogos 2D são controlados somente com botões, tentando emular ao máximo a experiência dos games originais dos anos 80, em que controles de movimento eram inimagináveis.
Independentemente do estilo de controle escolhido, é inegável que este é um título com bons gráficos. Mesmo não tendo uma direção de arte inovadora e reutilizando assets de jogos passados, os modelos dos personagens em 3D são muito bem feitos. Soma-se a isso alguns detalhes de apresentação, como sombras em tempo real e algumas animações carismáticas, e o resultado é algo agradável de se olhar. Aliás, essa atenção aos detalhes está presente também na vestimenta que os personagens usam em cada modalidade. Pela primeira vez, as roupas condizem com o esporte praticado. É algo pequeno e que não influencia em nada na jogabilidade, mas que cria um ambiente propício para cada prova. É simpático ver o Sonic com um terninho de hipismo ou a Daisy com um uniforme de esgrima, por exemplo.
A apresentação do game torna-se ainda mais especial quando descobre-se que há localização em português brasileiro, algo inédito na franquia. A adaptação dos textos para a nossa língua é boa, com uso de alguns termos característicos do idioma e quase nenhum erro gramatical. O mesmo pode ser dito sobre a dublagem, que se limita às locuções das provas e não se estende às vozes dos personagens. O título conta com dubladores profissionais que fazem um ótimo trabalho em passar a empolgação das partidas de maneira natural. A única ressalva é que, em alguns jogos, usa-se tanto os clipes de voz que essa repetição pode incomodar.
Qualidade variável
Assim como acontece com a maioria das coleções de minigames, as atividades de Tokyo 2020 variam em sua qualidade. O primeiro aspecto que influencia nesse quesito é a duração de cada prova. Há modalidades, principalmente as de atletismo, que duram menos de um minuto. Essa rapidez pode até facilitar que se jogue uma nova disputa quase que instantaneamente, mas a sensação principal que fica é que não há tempo hábil para se divertir nesses casos. Enquanto isso, outros esportes, como futebol e tênis de mesa, permitem que se altere a quantidade de pontos de um set ou o período da partida, tornando-os mais robustos, como um título esportivo arcade.Essa sensação pode ser traduzida para os controles de movimento. Enquanto há provas que os utilizam de modo orgânico, também há aquelas que obrigam o jogador a chacoalhar os Joy-Con sem um feedback claro. Além do mais, é possível notar um leve atraso na resposta dos controles de movimento em alguns minigames, fazendo com que a experiência não seja tão precisa assim.
Falta de substância
O grande problema do game, no entanto, é a falta de criatividade ao trabalhar em cima das modalidades. Outros party games, como Mario Party ou Mario Kart, já mostraram que diversidade e liberdade de opções são importantes para manter os jogadores engajados. Quanto mais atividades se cria ao redor da mecânica principal do jogo, como desafios com regras diferentes, mais as pessoas se sentem impelidas a continuar jogando. Esta edição de Mario & Sonic fraqueja nesse ponto.Mesmo ao se esforçar para obter os melhores resultados, o jogador não ganha recompensa alguma em troca. A única coisa que pode acontecer é ele destravar algumas conquistas à la troféus de PlayStation 4. O que impede isso de se tornar divertido é que todas elas são misteriosas. Ou seja, o game propõe desafios aos usuários, mas esquece de dizer a eles que desafios são esses. Desbloqueá-los, então, acaba sendo como atirar no escuro.
Essa superficialidade acaba afetando também o modo online. Sem torneios ou eventos in-game, as contendas via internet se limitam a partidas amistosas ou competições de ranking, nas quais ganha-se pontos com as vitórias e sobe-se de nível. Quem não é ávido por estar na lista dos melhores do mundo, vai encontrar uma diversão bem pontual ao conectar à web. Vale ressaltar também que, em nossa experiência jogando online com usuários japoneses, houve significativo lag, o que impediu que certas ações nas disputas fossem executadas no momento certo, provocando derrotas.
Senta que lá vem o Modo História
Todos esses pontos positivos e negativos definem também o principal modo do jogo. O Modo História, assim como o restante do game, tem uma boa apresentação, mas não se aventura a fazer mais do que o mínimo necessário.Durante os mais de 15 capítulos, o jogador alterna entre a Tóquio de 2020 e a de 1964, visitando complexos olímpicos e conhecendo pontos turísticos importantes da cidade. Há aqui uma certa proposta educacional, pois, conforme se avança na aventura, curiosidades sobre os dois Jogos Olímpicos de Tóquio, sobre os esportes e sobre os principais locais do município são destravados. Inicialmente, colecionar essas curiosidades funciona como um teste de conhecimentos bacana, mas ao final, torna-se uma obrigação repetitiva para quem quer completar o modo 100%. Porém, hei de admitir que foi por causa delas que passei a reconhecer atrações turísticas em outros jogos, como no mapa de Tóquio de Mario Kart Tour.
Novamente, os gráficos 3D ganham destaque. As reproduções dos principais ginásios e complexos, além de lugares como o cruzamento de Shibuya, a Tokyo Tower e a Tokyo Station, são bastante agradáveis e permitem ao jogador ter a dimensão desses ambientes. A vontade que fica é a de explorar todos os cantos desses espaços dentro do game, mas, infelizmente, os personagens se restringem a uma área muito limitada.
Quanto ao grosso do Modo História, a falta de ambição do título é novamente sentida. Basicamente, o objetivo desse modo é fazer com que as pessoas passem por todas as modalidades disponíveis em uma única aventura. Com mais de 30 provas, as chances de a amarração entre a narrativa e os eventos esportivos ficar um pouco frouxa é grande. E é justamente isso que acontece. Não são raros os momentos em que as ações da história não fazem bem sentido ou servem só como enrolação até a próxima disputa. Quando isso ocorre, o game também não faz questão de introduzir muitas novas mecânicas para tornar a história mais dinâmica. A regra acaba sendo vencer uma disputa, ir para o próximo cenário no mapa, vencer outra disputa e assim sucessivamente.
O último ponto confuso do Modo História é o desbloqueio de novos personagens. À medida em que se avança, novos personagens aparecem com desafios em provas específicas. Ao serem derrotados, eles são liberados para serem utilizados no modo Partida Rápida. No entanto, cada um deles só pode ser usado nessas provas específicas. Ou seja, se a Rosalina foi desbloqueada após ser vencida no desafio de surfe, ela estará disponível de forma jogável somente nos eventos de surfe. É uma decisão que não faz sentido e diminui a importância dos personagens desbloqueáveis no jogo, já que eles não podem ser usados em qualquer esporte.
Show do esporte?
Mesmo com um hiato de quatro anos, Mario & Sonic nos Jogos Olímpicos Tokyo 2020 não consegue se destacar entre os demais jogos da série. O game possui uma apresentação de qualidade, bastante atenta aos detalhes, e a localização em português brasileiro evidencia que a SEGA está olhando com carinho para os fãs do Brasil. Porém, por trás de toda essa beleza, está um título oco, que não ambiciona ser mais do que regular.Prós
- Maior quantidade de provas esportivas da história da série, com modalidades em 2D e 3D;
- Grande variedade de opções de controles, que incluem botões e controles de movimento;
- Bela apresentação, com bons gráficos em 3D tanto para os personagens quanto para os cenários;
- Localização em português brasileiro.
Contras
- Qualidade de minigames variável, com alguns jogos sendo muito curtos, muito simples ou muito confusos, com controles que não passam bom feedback ao jogador ou são imprecisos;
- Falta de variedade e profundidade no uso das modalidades esportivas;
- Ausência de um sistema de progressão que recompense o jogador;
- Modo História não passa de um mostruário linear dos esportes disponíveis;
- Minijogos não esportivos são, na maioria, medianos;
- Personagens desbloqueáveis disponíveis somente em algumas modalidades.
Mario e Sonic nos Jogos Olímpicos Tokyo 2020 - Switch - Nota: 6.5
Revisão: Vinícius Fernandes
Análise produzida com cópia digital cedida pela SEGA