Análise: Dragon Quest II: Luminaries of the Legendary Line (Switch) expande os horizontes de Alefgard

Será que vale a pena conferir o remake do elo mais fraco da Trilogia Erdrick?

em 08/10/2019

Dando sequência às nossas análises das novíssimas versões da trilogia original de Dragon Quest que aportou quase de surpresa no Switch juntamente a Dragon Quest XI S: Echoes of an Elusive Age, essa semana contemplamos o remake de Dragon Quest II (NES), cuja remasterização recebeu o título Dragon Quest II: Luminaries of the Legendary Line.

Apesar de fazer parte das origens da saga e introduzir diversos elementos que se tornaram parte do DNA da série, o segundo capítulo costumeiramente é tido como o elo mais fraco da Trilogia de Erdrick. Será que a fama é merecida? E a remasterização. vale a pena? Confira conosco!

Linhagem lendária

Dragon Quest (NES) teve total sucesso em sua principal missão, que era a de adaptar os sistemas do gênero RPG, até então restrito aos computadores, a uma linguagem e interface mais simples e direta nos consoles, Dragon Quest II marcou o momento de expandir o entorno dessa estrutura bem construída, trazendo várias inovações que não encontraram espaço no predecessor. Essa mudança permanece a mesma nas edições remasterizadas, que prezam pela total fidelidade em relação aos lançamentos originais, ao contrário do que ocorreu com alguns dos remakes anteriores da série.

Assim, esse segundo game é uma operação de multiplicação sobre a experiência mais básica do primeiro. Assumimos o controle não apenas de um, mas de três descendentes do lendário Erdrick (e, por tabela, do herói do primeiro jogo) encarregados de trazer a paz de volta a uma Alefgard já um pouco reconstruída, porém ameaçada pelas trevas do clérigo corrupto Hargon. Qual seria a força por detrás de seu avanço? Qual a maneira de detê-lo? Apenas reunindo a linhagem lendária será possível descobrir!



Ao invés do herói solitário vindo de Tantegel, temos os herdeiros dos novos reinos fundados a partir da viagem do primeiro herói 100 anos atrás, logo após a derrota do Dragonlord: Midenhall, Moonbrooke e Cannock. Para igualar as chances do lado maléfico, os inimigos agora se apresentam também em grupos – os quais frequentemente superam em números nosso trio de bravos heróis. A multiplicação se redobra em todas as frentes: mais castelos, mais cidades, mais locais para se visitar e itens-chave para se coletar.

Iniciando-se com uma cutscene simples, porém clássica e charmosa ao seu próprio modo, retratando a destruição de Moonbroke, a produlção tenta elevar um pouco a narrativa em relação ao game anterior, embora o resultado final não chegue muito mais longe em termos de complexidade.



Aqueles em busca por uma jornada com subtramas, elenco de apoio, número razoável de sidequests ou algo do tipo não terão muito o que encontrar aqui. Trata-se, na maior parte de tempo, da boa e velha caça aos macguffins lendários. As motivações para cada passo da jornada dizem mais respeito a barreiras naturais do mapa do que a desenvolvimentos da história, sua estrutura lembrando demais a do game anterior.

Em comparação com sua versão 8-bits, o remake tem, no mínimo, a grande vantagem de não precisar sacrificar os fundos de batalha por conta da implementação dos combates em grupo. O estilo gráfico segue a mesma linha do remake anterior: cenários e mapas 16-bits, monstros e sprites de personagens em HD. No entanto, não se trata de uma padronização, já que o estilo visual mudou levemente entre um e outro — este segundo ganhando detalhes mais caprichados e um aspecto no geral mais harmonizado em comparação ao primeiro. Por sorte, a interface de usuário e as fontes corrigem o acabamento ruim da versão mobile, sobre a qual esta foi baseaada.


Assim como foi o caso no anterior, a superioridade ou não do novo estilo gráfico dependerá unicamente do gosto. Redimensionados para tamanhos menores e encaixados em uma tela de combate mais elegante, o aspecto dos monstrinhos me pareceu ainda melhor do que no remake do primeiro jogo — algo muito importante, já que as criaturas são um dos elementos centrais da experiência de DQ.

A coloração viva é fiel ao que foi visto no remake 16-bits, e a produção fica devendo apenas por não implementar quaisquer animações nos monstrinhos. Bem representados, os designs de Akira Toriyama emprestam carisma e personalidade aos nossos heróis e vilões, reafirmando e intensificando a identidade visual introduzida no primeiro jogo.

A trilha sonora traz as versões orquestradas de mais uma belíssima trilha de Koichi Sugiyama — o tema de batalha é totalmente grudento e a primeira música do mapa do mundo (antes de reunir os três descendentes) é uma das minhas favoritas de toda a série, muito bem renderizada aqui. Os efeitos sonoros icônicos também se mantém com total precisão. Faz falta, no entanto, uma opção de escolha entre estilos audivisuais. aspecto que seria muito bacana de se ver em uma edição definitiva do jogo.



Espírito de equipe

Se é verdade que Dragon Quest (Switch) representa uma (re)visita às raízes mais longínquas do gênero JRPG, será apenas aqui, na sequência direta do título, que o jogador encontrará alguns dos pilares básicos do estilo — o principal deles sendo, sem dúvida, o sistema de party. Saindo do toma-lá-dá-cá frenético das batalhas do primeiro, o segundo jogo se desenvolve mais notadamente nessa área, dinamizando completamente a ação do jogo. A equipe é composta por três classes não customizáveis: o Príncipe de Midenhall é um Warrior, a Princesa de Moonbroke uma Sage e o Príncipe de Cannock um Armamentalist.

Com isso, temos pela primeira vez classes diferntes de personagem compondo uma equipe, de forma que o aspecto estratégico do game ganha bastante em diversidade. Um dos efeitos é a varidade de magias, que aumenta bastante em relação ao sistema minimalista do anterior.



Dentre uma gama razoável de opções, estreiam aqui as técnicas de buff e debuff, que daqui em diante ganham papel central nos sistemas de combate ao longo de toda a série. Somando todos esses fatores, a exploração e o aspecto estratégico das batalhas vistos no game anterior ganham nova profundidade – embora sua implementação não seja livre de falhas.

Assim, é inegável que nesse quesito o jogo empolga de cara e diverte bem mais do que a estreia da franquia. Logo na primeira hora de jogo já é possível sentir mais variedade do que o que foi visto ao longo da jornada anterior inteira! No entanto, há uma limitação presente no lançamento original que é carregada nessa versão, ainda que de forma atenuada: a estrutura da progressão do jogo.



De um lado, a busca pelos Crests consiste em uma versão mais embaralhada da missão central do game anterior, que ao menos se restringia a um espaço limitado o suficiente para ser descoberta pelo jogador em relativo pouco tempo. O remake segue o modelo do primeiro ao indicar mais explicitamente os objetivos ocultos entre portais e torres labirínticos ao longo da versão expandida de Alefgard. No entanto, isso não resolve o segundo probleminha de progressão, intimamente ligado a esse primeiro. Por mais que as batalhas estejam mais animadas, explorar o mapa do mundo não é exatamente uma tarefa tranquila para nossos heróis...



Uma luz no fim do grinding

Sim, o grind.  Um dos mais implacáveis dos RPGs 8-bits de que tenho memória, movido a degraus de poder abruptos e mapas longos, cheios de encontros aleatórios e sem ter de onde tirar mais MP. O funcionamento em equipe também significa duas coisas: nossos heróis morrem, desfalcando nossa equipe em pleno meio de uma dungeon imensa e necessitam ser ressucitados um a um (diversão arrastando caixõezinhos pelo mundo afora!); além, é claro, de as batalhas se tornarem mais longas e exigir mais atenção do que o mata-mata frenético do jogo anterior.

Com isso, o aspecto dos encontros aleatórios pode pesar negativamente para um jogador que não se dê muito com o modelo. Em não sendo o caso, o título se garante nessa frente: me diverti bastante memorizando estratégias para lidar com os diferentes tipos de monstros, e tive a impressão de que houve um renivelamento positivo da progressão dos levels, que me pareceu bem menos árdua do que na contraparte 8-bits do título. Um prato cheio para os fissurados nesse estilo antigo de jogo, um potencial pesadelo para quem tem flashbacks pós-traumáticos do Zubat toda vez que entra em uma caverna.



Isso tudo fica mais marcado na segunda metade do jogo, onde após receber o navio nossos heróis se vêem totalmente à mercê de um mundo inóspito e sem muito propósito exceto procurar pelo pequeno brilho que os desenvolvedores do remake tiveram a piedade de incluir para sinalizar os pontos de interesse da aventura.

Por sorte, temos outras implementações do remake que ajudam a atenuar o degrau de dificuldade da sequência final da aventura: a presença de uma sempre bem-vinda opção de quicksave (que, pelo que testei, pode ser carregado indefinidamente) e um portão de aviso que impede o jogador de se enveredar pela implacável rota final do jogo sem possuir os itens necessários. Com bastante tentativa e erro e muito amor aos combates por turnos, trata-se de uma experiência bastante recompensadora, ainda que não tão equilibrada quanto poderia ser.



Ambicioso em seu projeto e menos preciso do que o antecessor em sua execução, Dragon Quest II permanece sendo um ótimo JRPG que diverte com seu cenário bem ambientado, entretendo principalmente o jogador que se prepara para um desafio moderado com um belo guia em mãos.

Analisada no contexto da Trilogia de Erdrick, a jornada dos três príncipes acaba se revelando o elo mais fraco entre um clássico seminal e uma obra-prima. Ainda que a concorrência seja acirrada, é certo que o game se beneficiaria de uma reimaginação mais profunda, que incrementasse a experiência em mais direções do que apenas o revamp audiovisual e as correções de "qualidade de vida" vistas aqui.



Conteúdos extra também seriam um fator atrativo, em especial no que diz respeito aos dois primeiros jogos da série, que raramente foram agraciados com incrementos do tipo. Por mais que seja bacana a ideia de fidelidade próxima à versão original, um agradinho para os fãs certamente tornaria a experiência mais facilmente recomendável.

Seus escorregões dificilmente anulam seus acertos, mas no final das contas, Dragon Quest II: Luminaries of the Legendary Line (Switch) acaba sendo um lançamento que apela mais para os "historiadores de plantão" do gênero e/ou da franquia do que ao jogador simplesmente em busca de um JRPG clássico.

Prós

  • Implementação do sistema de party é uma masterclass em game design;
  • Apresentação audiovisual primorosa do remake, aproveita os melhores aspectos da remasterização Mobile e corrige algumas de suas falhas;
  • Extrema fidelidade ao jogo original, com ajustes mínimos de qualidade de vida, garante uma experiência autêntica do título, adaptada para os dias de hoje;
  • Trata-se da versão mais completa do jogo, ainda que não possa ser considerada uma "edição definitiva".

Contras

  • Progressão da história é uma masterclass (sobre o que não se deve fazer) em game design;
  • Mesmo com ajustes, o grinding violento continua a quebrar o ritmo da aventura;
  • Ausência de conteúdos extra como personalização dos visuais e da trilha sonora deixa escapar a oportunidade de uma "edição definitiva" do clássico.
Dragon Quest II: Luminaries of the Legendary Line — Switch — Nota: 7.0
Análise produzida com cópia digital cedida pela Square Enix
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é gamer pra todo jogo, mas tem predileção por títulos retrô e um bom e velho JRPG. Sonic, Donkey Kong Country, Ratchet & Clank, Final Fantasy e Disgaea são algumas das séries que formaram a paixão pelos games, desde que ganhou seu Mega Drive, muitos (nem tantos!) anos atrás. Além de escrever para o Nintendo Blast e Game Blast, pode ser encontrado tagarelando no Plano Crítico.
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