Análise: 80 Days (Switch) — Uma viagem literária

Jogo inspirado na obra de Júlio Verne finalmente chega ao Switch.

em 02/10/2019

Lançado originalmente em 2014, 80 Days agora está disponível no Switch, apresentando uma aventura inspirada na obra “A volta ao mundo em 80 dias”, de Júlio Verne. Neste jogo, acompanhamos dois personagens que, saindo de Londres, precisam viajar ao redor do mundo em menos de três meses. O que nos espera em uma jornada como essa?

Steampunk

80 Days apresenta um visual totalmente inspirado no steampunk. E isso não é por acaso, já que muitos pesquisadores atribuem a Júlio Verne o título de pai dessa estética de ficção científica que utiliza elementos da cultura vitoriana com tecnologias avançadas inspiradas na Revolução Industrial. Isso se reflete, por exemplo, nos diferentes tipos de transporte, que vão de locomotivas e carroças a caravelas voadoras. O jogo como um todo tem um anacronismo próximo ao da série De Volta Para o Futuro, o que é realmente empolgante.


Mas a coisa que mais impressiona em 80 Days é o cuidado com os detalhes e referências à obra de Júlio Verne. Assim como no livro, a aventura começa em 1872, a partir de uma aposta. Nós jogamos como Jean Passepartout, o assistente francês de Phileas Fogg, um excêntrico cidadão londrino que, desafiado por amigos, decide provar que é viável dar a volta ao mundo em apenas 80 dias. Claro que existe muito dinheiro em jogo. E o nosso papel, como assistentes de Fogg, é gerenciar seus recursos, escolher seus itinerários de viagem, vender e comprar itens, cuidar de sua saúde. Enfim, pode parecer simples, mas, diferentemente do livro, aqui é possível escolher muitos caminhos únicos e cada decisão importa, tanto para a condição financeira quanto para o bem-estar físico de Fogg. Um trajeto exaustivo pode lhe custar muitos pontos de vida, enquanto comprar itens banais com pouco valor de revenda pode colocar em risco a chance de chegarmos até o final do projeto no tempo correto.

Um exemplo da importância das decisões é o fato de que, durante a estada em alguma cidade, é possível explorar o ambiente para conhecer outras pessoas, e assim abrir novos caminhos de percurso. Outra coisa que pode ocorrer, é você comprar itens demais durante as viagens e acabar perdendo a saída de um destino a outro. Isso acontece pelo fato de que podemos estar com muitas malas e é necessário se livrar delas (vendendo seu conteúdo) antes da saída do transporte, o que nem sempre é possível. Tudo isso tem impacto na saúde de Fogg, mostrando que todo o gerenciamento precisa ser realizado com esmero.

O gameplay funciona a partir dessas escolhas alternando entre as decisões que interferem na jornada e a leitura de textos interativos. Aqui vale uma informação importante: o jogo exige muito tempo de leitura e está completamente em inglês. É uma pena que não exista localização para o português (na verdade, não há para nenhuma outra língua), mesmo depois de tanto tempo que foi originalmente lançado. Ainda assim, é de se imaginar que os desenvolvedores tentaram manter o espírito da prosa de Verne e as traduções poderiam limitar ou até menos alterar o sentido e contexto de parte da obra.


Para os amantes da literatura 

80 Days é um game mais próximo de um visual novel do que de qualquer outra coisa. Assim, não estamos diante de um título em que a emoção deriva da presença evidente do perigo ou da tensão, mas sim da possibilidade de lidarmos com situações imprevisíveis que podem ocorrer durante a viagem. Cheio de referências à literatura e repleto de informações sobre Geografia, História e conhecimentos gerais, 80 Days é uma experiência única e que combina perfeitamente com a portabilidade do Switch. Um jogo para se jogar lentamente, aproveitando os textos e refletindo sobre cada caminho e decisão. Afinal, ainda que o objetivo seja bem delimitado, o caminho é realmente único, e cada jogador terá sua própria narrativa, desafios e vitórias. A única certeza aqui, é que iremos retornar a Londres — para recomeçar tudo de novo.

Prós

  • Estética steampunk bem conectada com a história;
  • Experiência envolvente com elementos de literatura;
  • Grande fator de replay, já que cada viagem é realmente única a partir de suas escolhas.

Contras

  • Ausência de localização para o português;
  • Ritmo lento que pode desagradar a alguns jogadores.
80 Days — Switch — Nota: 9.0
Análise produzida com cópia digital cedida pela inkle


Pesquisador nas áreas de estética e cibercultura com Mestrado em Cultura e Sociedade (UFMA) e Doutorado em Comunicação (UnB). Além de escrever sobre jogos, produz o Podcast Ficções e tem um blog sobre literatura, filosofia e cotidiano.
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