Análise: AI: The Somnium Files (Switch): um envolvente mistério em um mundo futurista

Novo jogo do diretor e escritor Kotaro Uchikoshi (Zero Escape) apresenta um instigante mistério com a possibilidade de investigar o subconsciente dos envolvidos no caso.

em 30/09/2019
Desenvolvido pela Spike Chunsoft e com direção e escrita de Kotaro Uchikoshi (da série Zero Escape), AI: The Somnium Files é um jogo de mistério. Na pele do detetive Kaname Date, o jogador precisa investigar um assassinato. Ambientado em um mundo futurista, o personagem pode acessar os sonhos das pessoas envolvidas com o caso.


O caso do Cyclops Killer


Tóquio, num futuro não tão distante. O corpo de Shoko Nadami é encontrado no carrossel de um parque abandonado. Além de muitos ferimentos em seu torso, a mulher também teve seu olho esquerdo removido enquanto ainda estava viva.

A partir desse caso, múltiplos eventos ocorrem e Kaname Date tem que realizar a sua investigação. Com uma narrativa cheia de ramificações, mas com um único final verdadeiro que conclui a resolução do mistério, AI oferece ao jogador mais do que a capacidade usual desse tipo de jogo.


Jogos de investigação muitas vezes permitem interrogar pessoas variadas e explorar ambientes para obter pistas, mas a confiabilidade da informação obtida em conversas é algo potencialmente frágil, então AI oferece uma alternativa de ficção científica: o Psync.

Através de uma máquina, o detetive consegue mergulhar em uma espécie de sonho (Somnium) de uma pessoa-chave para obter informações que ela pessoa pode estar omitindo por vários motivos (culpa, medo ou trauma, por exemplo). Obviamente, em se tratando de um mundo processado pelo cérebro como um sonho, esses locais são altamente instáveis e possuem elementos abstratos que não correspondem à realidade. Ainda assim, são capazes de oferecer insights bastante úteis na resolução do caso.


Eles funcionam da seguinte forma: na pele de Aiba, uma inteligência artificial que atua como parceira de Date, o jogador tem 6 minutos para vasculhar um espaço 3D em busca de objetos com os quais possa interagir. Para avançar, é necessário encontrar a ação que quebra um “Mental Lock” que impede o jogador de prosseguir. Por exemplo, se há um grande bloco de gelo no caminho, talvez chutá-lo ou interagir com outro objeto seja capaz de quebrá-lo. No entanto, por se tratar de uma espécie de sonho, há ações estranhas e consequências que podem ser inesperadas.

De certa forma, esse sistema se assemelha um pouco ao de Punch Line (PC/PS Vita), outra obra escrita por Kotaro Uchikoshi, onde era necessário descobrir as interações corretas com o cenário. No entanto, aqui tudo funciona de forma mais direta, sem a necessidade de pensar em combinações complexas de ações.


Apesar de ser mais simples, o limite de tempo acaba se tornando um fator importante de dificuldade. Enquanto o jogador está parado, o tempo corre de forma muito devagar, mas a movimentação pelo cenário e cada ação executada custam um pouco de tempo.

Conforme os Somniums vão se tornando mais complexos, o tempo de 360 segundos também se mostra bastante restritivo. Nesses casos, o jogador precisa calcular bem as oportunidades de cada escolha, em especial a possibilidade de usar Timies, itens obtidos ao realizar determinadas ações e que podem ser usados para alterar o custo de tempo de uma ação. Há alguns Somniums que não podem ser resolvidos sem utilizá-los.


Além de ser um elemento de gameplay interessante, os Somniums também são responsáveis pelas ramificações do enredo. Em alguns deles, existem opções corretas que levam a situações diferentes, como “acreditar no testemunho de um personagem” ou “negar que ele esteja falando a verdade”.  O jogo indica claramente quando isso pode ocorrer e há no menu um fluxograma que pode ser usado para pular entre os diversos pontos da história.

Esse sistema já estava presente na série Zero Escape e é muito bem-vindo em jogos baseados em escolhas com ramificações. Afinal, com isso, mudar para qualquer ponto da história se torna uma simples questão de escolhê-lo no menu.

Além da trama envolvente


A narrativa tem um excelente mistério, que é bem desenvolvido ao longo do jogo. A cada nova rota concluída, o jogador compreende melhor o que está acontecendo com algumas revelações bombásticas, o que vai tornando a história cada vez mais envolvente até o clímax.

É importante destacar também que, em contraste com o tom sério dos eventos do enredo principal, há muitos diálogos com piadas e trocadilhos. Em alguns momentos eles funcionam bem e ajudam na relação com os personagens, mas há casos em que se tornam excessivos. Em particular, a primeira rota que fiz tinha muitas interações que terminavam em piadas de cunho sexual e o excesso chegou a me incomodar. Isso é mais moderado nas outras partes da história.


Além do mistério, os personagens são um ponto forte da história. Quanto mais o jogador tem contato com eles, mais descobre sobre suas situações de vida. Saber disso extrapola a questão de obter informações para a investigação: são formas de criar um vínculo de empatia com os personagens.

Por outro lado, a performance do jogo tem alguns problemas no Switch. Há uma perceptível queda de frames em alguns momentos, em particular na demora para abrir as cenas de flashbacks, a ponto de dar a impressão de que o jogo travou.

É perceptível o serrilhado e a redução da qualidade dos modelos em comparação com as versões de PC e PS4 também. O curioso é que jogar com ele no modo portátil acaba sendo melhor justamente porque no dock o jogo acaba ficando mais borrado e fácil de se perceber as imperfeições.

Porém, a questão visual (e em especial o tempo de loading dos flashbacks) é o único grande problema do jogo. Tirando esse aspecto, todos os elementos do jogo são bem executados. Além do que já foi descrito na análise, em particular por se tratar de um jogo narrativo, é importante destacar que a qualidade da tradução em inglês é muito boa.

O roteiro é bem escrito e não dá a impressão de que havia algo em japonês que foi perdido na tradução. Além disso, a dublagem faz um trabalho muito bom de interpretar os personagens, com vozes que se adequam a eles tão bem quanto as japonesas.


Com um mistério envolvente, personagens cativantes e um interessante sistema de explorar as memórias das pessoas através de sonhos distorcidos, AI: The Somnium Files é diversão garantida para fãs de histórias de investigação repletas de suspense e reviravoltas chocantes.

Prós

  • Mistério bem construído em uma narrativa ramificada;
  • Vasculhar os Somniums é uma forma interessante de conseguir pistas;
  • Personagens carismáticos cujas situações pessoais geram empatia;
  • Excelente tradução e dublagem em inglês.

Contras

  • Problemas de performance, em especial no loading dos flashbacks;
  • Piadas de cunho sexual em uma das rotas chegam a ser um elemento excessivo.
 AI: The Somnium Files - Switch/PC/PS4 - Nota: 9.0
Versão utilizada para análise: Switch

Revisão: Davi Sousa
Análise produzida com cópia digital cedida pela Numskull Games

é formado em Comunicação Social pela UFMG e costumava trabalhar numa equipe de desenvolvimento de jogos. Obcecado por jogos japoneses, é raro que ele não tenha em mãos um videogame portátil, sua principal paixão desde a infância.
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