Monster Tale: O clássico de Nintendo DS que chegou tarde demais

Conheça mais sobre a história do primeiro (e praticamente único) jogo da desenvolvedora DreamRift

em 19/05/2019


Fevereiro de 2011, milhares de fãs da Nintendo vão à loucura atrás do mais novo portátil que, além de possuir as já tradicionais duas telas do DS original, ainda conseguia reproduzir jogos em 3D sem a necessidade do uso de óculos especiais. O futuro parecia exatamente com aquele momento no começo de 2011. Todo mundo já amava o DS, aí você coloca um 3D no meio e pronto! Naturalmente, como acontece desde os primórdios dos videogames, não demorou muito até que o público geral esquecesse do DS e dos seus jogos, inclusive dos que nem haviam sido lançados ainda, como era o caso de Monster Tale, o primeiro jogo produzido pela desenvolvedora DreamRift.

Infelizmente, um dos melhores títulos do primeiro portátil de duas telas da Big-N foi lançado só em março de 2011, um mês após a geração 3D dos portáteis Nintendo chegar às lojas. Não é de se espantar que pouca gente tenha tido a chance de jogar Monster Tale na época de seu lançamento — que por sinal só compreendia a região das Américas e nunca chegou até o Japão ou a Europa. No entanto, vale lembrar que Monster Tale é um jogão que merece ser experienciado pelo maior quantidade de pessoas possível. Mesmo em 2019, em meio à essa verdadeira enxurrada de metroidvanias e plataformas indie, Monster Tale não desaponta de forma alguma, muito pelo contrário, ele impressiona.


Se você por acaso ainda tem um DS (ou um 3DS) e gostaria de jogar um metroidvania divertido e competente, com história e personagens totalmente originais, além de uma mecânica única e criativa que faz uso das duas telas do portátil simultaneamente, dê uma chance para o título de lançamento da DreamRift — ou, pelo menos, continue lendo e descubra um pouco mais sobre esse jogo que chegou sim um pouco tarde, mas também veio para ficar.

DreamRift e o conto do monstro

Formada em grande parte por uma equipe que trabalhou no aclamado Henry Hatsworth in the Puzzling Adventure (DS), a DreamRift iniciou suas operações com a esperança de criar um jogo novo e divertido para o DS que utilizasse as duas telas do portátil de forma inventiva e inteligente. O lead designer de Monster Tale, Peter Ong, acreditava no potencial criativo do uso das duas telas e, inspirado pelos velhos títulos da série Monster Hunter do PlayStation original, iniciou o Project Monster: um jogo em que a tela de cima iria focar no controle do personagem e a tela de baixo funcionaria meio que como um tamagotchi, ou uma "casa" para um monstro. Além disso, o monstro viajaria entre as duas telas, influenciando diretamente a ação da tela de cima quando necessário.


A desenvolvedora lutou para produzir Monster Tale de forma fiel à sua visão original de criar uma nova IP, com personagens, história e mecânicas inéditas, mas sofreu pressão por parte de diferentes publishers. Inclusive, é sabido que, durante o desenvolvimento do jogo, a protagonista Ellie, uma jovem garota com um design bem simples, quase mudou de gênero e ficou mais madura (ou "sexualizada) graças à opinião das publicadoras que um personagem desconhecido — e sem aquele apelo visual masculino e violento, ou feminino e "sexy" — não seria lucrativo, principalmente em frente à forte cena de pirataria no DS, outro dos grandes problemas no caminho da DreamRift. Em 2011, final da vida do DS, adquirir um flashcart e jogar ROMS ilegais diretamente no portátil era a coisa mais fácil do mundo de se fazer, o que com certeza afetaria drasticamente as vendas de um jogo de uma franquia nova e desconhecida.

Apesar de todos os percalços, Monster Tale foi lançado nas Américas, publicado pela Majesco Entertainment. Em geral, quem jogou, gostou (inclusive a crítica especializada da época), entretanto, como esperado, o jogo não vendeu muito e não conseguiu impactar muitos jogadores, principalmente pelo lançamento pouco após o do 3DS. No ano seguinte, a DreamRift lançou seu segundo e último jogo, Epic Mickey: Power of Illusion, título licenciado pela Disney, parte da (nova, na época) franquia Epic Mickey e sequência direta do clássico Castle of Illusion para o Mega Drive/Genesis. É importante frisar que, mesmo sendo um jogo licenciado e meio que uma parte "menor" e menos importante do universo Epic Mickey — exclusivo para o Wii que teve um marketing agressivo, mas acabou decepcionando maioria das pessoas — Power of Illusion foi lançado com críticas, em sua maioria, positivas. 



Em 2015, a desenvolvedora deu um último sinal de vida por meio de um anúncio empolgante para seus poucos fãs: Monster Tale Ultimate, um remake para o 3DS que "melhoraria a aventura em todos os aspectos". O título nunca foi oficialmente cancelado, mas cá estamos em 2019 e os dias de vida do 3DS estão contados. O jeito é esperar por algum anúncio repentino para o Switch, e, enquanto isso, quem sabe jogar o Monster Tale original algumas vezes...

As aventuras de Ellie e Chomp

Ellie acorda após ouvir um barulho bem alto do lado de fora, caminha até um bosque perto de sua casa e encontra um estranho bracelete. Ao pegar o bracelete, Ellie é imediatamente transportada para o mundo dos monstros e, em pouco tempo, não só adquire o primeiro power up para seu novo acessório (a habilidade de atirar "bolinhas" de energia, bem estilo Mega Man) como encontra um misterioso ovo onde seu mais novo melhor amigo dorme. Quando o ovo choca, o simpático monstro que sai de dentro é apelidado de "Chomp" e imediatamente prova ser uma ajuda inestimável durante a jornada que vem pela frente. 


Enquanto você controla Ellie na tela de cima e explora o vasto mundo dos monstros, Chomp "mora" na tela de baixo. Claro que ele não fica o tempo todo por lá, com o toque de um botão o monstrinho voa para cima e ajuda Ellie a enfrentar os inimigos, além de interagir com alguns elementos do cenário durante pequenos puzzles. A tela de baixo também é o lugar onde Chomp interage com os itens, brinquedos e comidas que você encontra após derrotar inimigos — que servem para aumentar o nível das formas do Chomp.

Chomp começa como criança e, enquanto adquire mais níveis, melhora seus atributos gerais (como força, inteligência, etc) e abre skills e traits para cada forma — e, sim, o Chomp vem em todos os tamanhos e modelos possíveis. Cada "estágio" de crescimento do monstrinho (criança, adolescente e adulto) possui 10 formas diferentes que pode ser destravadas, o que se dá por meio de uma "árvore" de evolução do personagem. As formas ainda estão divididas em 5 elementos (fogo, terra, água, luz e trevas) e todas possuem a capacidade de master, ou de "aperfeiçoar", as skills e traits que podem ser aprendidas em determinada forma. 



Pode ser um pouco complicado no começo, mas a estratégia básica é simples: o ideal é sempre estar treinando uma forma até, pelo menos, aprender sua skill (diferente ataque que Ellie pode mandar Chomp usar, e que sempre possui um elemento) e uma ou duas traits (habilidades passivas do monstro que geralmente aumentam atributos diretamente). Após o "aperfeiçoamento" da skill e da trait, você provavelmente já vai ter destravado uma nova forma para Chomp, aí é só trocar e começar de novo. Todas as skills e traits que foram aperfeiçoadas, podem ser usadas por qualquer forma a qualquer momento — assim que Chomp vira uma máquina imbatível de combate.

No entanto, Ellie também não fica pra trás e coleta, ao longo de toda a aventura, um número impressionantemente grande de power ups e novas habilidades — que funcionam tanto para o combate quanto para acessar novas áreas, claro. A protagonista começa apenas atacando um pouquinho de longe com o bracelete e pulando, e, em pouco tempo, o ataque de perto (melee) com sua humilde bolsa de pano dá as caras e ainda traz uma mecânica nova junto: atacar de perto recarrega a barra de energia que permite que você ataque de longe (com o bracelete). Esse elemento, ligado ao grande número de habilidades que aparecem depois (ataque especial, ataque forte, carregar o raio do bracelete, entre várias outras) traz uma dinâmica bem interessante para o combate de Monster Tale. 




E isso tudo só com a Ellie, porque apertando os botões L e R você também pode mandar Chomp usar suas skills a qualquer hora, o que, por sua vez, consome a barra de stamina do monstro. Mas não se preocupe, é só voltar para a tela de baixo que Chomp recupera stamina até que bem rápido. Lembrando que a mesma "barrinha" também funciona como um indicador de pontos de vida para ele, então, se Chomp for atacado o bastante na tela de cima, ele cai diretamente para a tela de baixo desacordado e permanece assim por algum tempo.

Parece muita coisa para lembrar (e talvez seja), mas tudo acontece de forma super orgânica e é tão divertido que você nem vê o tempo passar. O aprendizado realmente é bastante natural, o jogo meio que pega leve no começo e gradualmente vai ficando mais complicado de uma forma bem saudável — afinal, Ellie e Chomp também ficam consideravelmente fortes até que bem rápido.

Um pequeno (mas marcante) grupo de personagens

Quanto à trama, ela é simples e efetiva com uma pitada de crítica social (no estilo de Pokémon Black & White, para quem jogou). Basicamente, Ellie não é a primeira criança a viajar e se aventurar pelo mundo dos monstros, cinco outros jovens já estão vivendo ali há algum tempo, cada um comandando uma das diferentes áreas sob o título de Kid King: Meade, Deanu, Zoe, Ethan e, quem lidera todos eles, Priscilla. Como é de se esperar, cada rei governa uma área temática relacionada às personalidades individuais de cada um: Meade é o músico, Deanu curte uma praia, Zoe gosta de brinquedos, Ethan constrói máquinas e Priscilla é o antagonista principal/chefão final da história. 



A rainha do mal foi a primeira criança a viajar para o mundo dos monstros, escravizando-os e obrigando que eles façam tudo que ela mandar. Seu objetivo final é roubar o bracelete lendário de Ellie e eventualmente dominar o mundo real através de sua tirania, transportando seu exército e tomando controle de tudo. Em contraste, Ellie ensina para cada um dos "reis-criança" que nós podemos ser amigos dos monstros e trabalhar juntos. Aquela velha história.

O último personagem importante é o monstro que facilita a vida de Ellie vendendo upgrades gerais para suas habilidades, e itens para Chomp consumir na tela de baixo. O monstro chamado Jinx aparece tão frequentemente quanto o save room do mapa (uma sala com livros que permite que você salve o jogo e recupere toda sua vida) e é extremamente importante durante o progresso. Todo monstro derrotado deixa um dinheiro para trás e o único uso para essas moedas é a loja do Jinx. Os upgrades são bem mais úteis (e também mais caros, afinal, são permanentes) e fazem coisas como aumentar o dano geral dos ataques de Ellie ou até acrescentar um coração de vida, entre várias outras funções.

Lembre de Monster Tale (e jogue, se puder)


Por fim, acho importante dizer que eu tive a oportunidade de jogar Monster Tale há pouco tempo, e, após me apaixonar pelo jogo, me senti obrigado a falar mais sobre ele e espalhar a notícia. Monster Tale é simplesmente muito bom e divertido, seu maior pecado foi ter sido lançado em 2011 para o DS, o que parece injusto. É realmente uma pena que os genuínos esforços da DreamRift de criar um jogo tão inovador e original tenham sido esquecidos (ou nem ao menos reconhecidos) por grande parte da comunidade.

Metroidvanias viraram moda e não é difícil achar uma tonelada de jogos do gênero em consoles da Nintendo, principalmente hoje em dia no Switch, mas jogar Monster Tale no DS me levou diretamente para os meus 13 anos, quando eu jogava Metroid Fusion no Gameboy Advance sem parar um segundo, e poucos jogos conseguem fazer isso. Se você tiver alguma forma de jogar, aproveite. E, enquanto isso, vamos torcer para que a DreamRift reapareça das cinzas e, quem sabe, lance uma continuação (ou o remake perdido) em um futuro próximo.
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