O primeiro Harvest Moon — série que hoje atende oficialmente pelo nome Story of Seasons — foi lançado para o SNES em 1996 no Japão, chegando ao mercado americano no ano seguinte. Nele, a premissa básica foi instituída e se mantém até hoje: o personagem principal acaba adquirindo, por qualquer que seja o motivo, uma fazenda em péssimas condições e recebe a tarefa de reconstruí-la, trazendo a prosperidade ao vilarejo onde ela se encontra.
Apesar de ser amplamente considerado pertencente a um gênero simulação rural, há um outro ponto de vista bastante incomum que o considera um jogo de estratégia, visto que o núcleo do gameplay envolve a administração de recursos no intuito de fazer com que a fazenda prospere. Também não é incomum vê-lo visto sendo considerado um RPG, o que chega a ser compreensível se juntarmos todos os fatores apresentados. Algo que também contribui com essa visão é o marcante world building, essencial para jogos do gênero.
Um vilarejo cheio de vida
Considerando que a história dos primeiros Harvest Moon era praticamente a mesma, o principal atrativo para cada um dos títulos era justamente o cenário onde cada um dos jogos se passava. Mineral Town, por sua vez, tem o grande mérito de combinar uma excelente construção de mundo com personagens realmente carismáticos. Juntos, esses dois fatores tornam a experiência de jogo verdadeiramente marcante.Lembra-se da questão da administração de recursos citada anteriormente? Pois bem, em Harvest Moon, o tempo é certamente um deles, visto que o tempo do jogo roda de forma contínua e é preciso gerenciá-lo no intuito de realizar todas as tarefas diárias antes que o dia acabe. O level design de Mineral Town tem um grande mérito por levar isso em conta e, ao contrário do que acontece com alguns dos títulos da série, todas as construções comerciais essenciais ficam situadas bem próximas ao sítio do personagem, evitando que uma simples viagem para comprar ração de galinha leve o dia todo por uma necessidade estúpida de ter que cruzar todo um mapa.
Outro ponto muito interessante que torna o Vilarejo Mineral único é a forma como todos os ambientes foram esquematizados. Nada parece fora de lugar e a progressão do mundo aberto se dá de uma maneira muito orgânica, ao contrário do Forget-me-Not Valley de Harvest Moon: a Wonderful Life (GC), por exemplo, em que os diversos pontos de interesse aparentam ter sido simplesmente encaixados no mapa sem qualquer organização ou planejamento.
Considerando que a tradução literal do título é “Amigos do Vilarejo Mineral”, os cidadãos também têm uma importância fundamental na imersão da vida rural. As pretendentes, tradicionais da franquia, são memoráveis. É um dos poucos jogos da franquia cuja escolha é realmente difícil. Popuri, Karen, Elli, Mary e Ann são dotadas de um carisma incrível, cada uma do seu próprio jeitinho. Como se não bastasse, os outros personagens presentes também demarcam presença com qualidade.
Por fim, um dos grandes destaques foi na forma como eles lidaram com alguns dos festivais. Apesar de não se aplicar a todos, alguns deles foram atrelados a minigames específicos que irão depender do progresso do jogador ao longo da própria campanha. Por exemplo, se a afeição do cavalo estiver bem alta, será muito mais fácil se tornar o vencedor das corridas durante o festival correspondente. Considerando que tais efemérides acontecem uma vez a cada ano de jogo, cada uma delas acaba se tornando um grande evento que dão fôlego ao jogador em meio às atividades cíclicas do cotidiano.
Das conquistas aos defeitos técnicos
Falando nelas, aliás, estão atrelada também ao aspecto auditivo, com melodias cativantes e pertinentes a cada uma das atmosferas referentes a tais passagens do ano. Elas acabam se tornando um exemplo notável de trilha sonora do Game Boy Advance, cuja fonte de som é conhecida por não ser lá grande coisa.
Ainda assim, naquele momento, era possível afirmar que aquele se tratava tranquilamente do Harvest Moon mais bem-produzido até a presente data. Apesar de contar com versões em consoles infinitamente mais potentes (como o PlayStation e o Nintendo 64), foi só aqui que um título da série chegou a alcançar a excelência técnica nesse aspecto. Essa ideia só se consolida se retomarmos a comparação entre o SNES e o GBA e colocarmos lado a lado as respectivas versões de cada título para cada uma dessas plataformas.
Por outro lado, enquanto a Marvelous fez um excelente trabalho a nível técnico, ressalta-se como a Natsume deixou a desejar no serviço de localização, visto que não é incomum encontrar erros de gramática e trechos completamente em japonês, não traduzidos, nos textos do game.
Conectividade e Versões Alternativas
Uma prática que foi se perdendo nas gerações atuais é a forma como a Nintendo promovia a integração entre o aparelho portátil vigente e seu console contemporâneo. Dessa forma, Friends of Mineral Town conseguia se conectar diretamente com A Wonderful Life, do GameCube. Essa integração entre os jogos liberava novos personagens que passariam a visitar o Vilarejo Mineral e permitia a construção de uma casa na praia.Uma relação de simbiose
Harvest Moon: Friends of Mineral Town é tranquilamente um dos títulos mais enxutos e quintessenciais da série em questão. Esse game do GBA tem muitos méritos por conseguir criar uma aconchegante atmosfera campestre que, através de um competentíssimo level design aliado a uma excelente direção artística, consegue transmitir a principal ideia da franquia, que é a compreensão da relação simbiótica entre o homem e a natureza.Assim, esse aparentemente simplório título do Game Boy acaba entrando no rol dos grandes clássicos para o console por sua proposta singular que conseguiu cativar os jogadores, que até hoje guardam boas lembranças das horas e mais horas investidas no título.
Revisão: Diego Franco Gonçales