Análise: Katana ZERO (Switch) mescla gameplay viciante e intrigante desenvolvimento de enredo

Assuma o papel de um samurai assassino e prepare-se para ser surpreendido todo momento.

em 23/04/2019


Sabe aquelas noites em que estamos na companhia de um bom livro e usamos a famosa desculpa “só mais um capítulo” para afastar o sono e continuar a leitura? Geralmente, isso acontece com narrativas que nos envolvem e estimulam a curiosidade, aquelas que têm o dom de nos deixar loucos se não soubermos rapidamente o que acontece na página ao lado. E assim, quando percebemos, o “só mais um capítulo” acaba virando um terço ou metade da história.


Foi exatamente esse sentimento que tive ao experimentar Katana ZERO, projeto do estúdio Askiisoft e distribuído pela Devolver Digital. Tanto as principais mecânicas do game quanto o desenvolvimento do enredo instigam a imaginação do jogador, criando nele o desejo de tentar mais uma vez ou só dar uma olhadinha na próxima fase para ver o caminho que a aventura vai tomar. Tudo parece ter sido minuciosamente planejado para capturar nossa atenção, fazê-la de refém e somente liberá-la quando as perguntas certas forem respondidas.

No jogo, assumimos o papel do Dragão, um samurai com poderes de controlar o tempo e que trabalha como assassino. Cada missão traz um alvo que precisa ser eliminado, sendo que uma série de outros inimigos tem que ser decapitados antes de se chegar ao objetivo principal. As fases são divididas em pequenas seções e o protagonista deve primeiro limpar a área antes de seguir para o próximo mapa. Para isso, ele conta com sua espada, além de elementos que podem ser coletados pelo cenário e arremessados, como garrafas, bustos de mármore e elementos explosivos.
Katana x arma de fogo, que duelo injusto para quem só pode atirar

O samurai ainda conta com estranhas habilidades para deixar o tempo passando de maneira mais lenta, facilitando assim movimentos para rebater balas ou que visam execuções mais precisas. O grande ponto de dificuldade é que o personagem não pode ser atingido, caso sofra qualquer dano, volta para o começo da área e tem que refazer tudo de novo. Essa repetição acaba sendo um tanto quanto enjoativa em fases mais desafiadoras, porém, em nenhum momento o jogo é injusto e ao falhar, a sensação é que você errou e poderia ter feito melhor.

Essa vontade de querer provar que você é capaz de passar daquele desafio e prosseguir para a próxima missão é constante durante toda a jornada. Eu realmente percebi que estava evoluindo conforme ia errando e recomeçando, tanto que ao revisitar os níveis iniciais um pouco mais tarde, pude finalizá-los de maneira extremamente fácil e precisa. Com isso, mesmo aborrecido algumas vezes por ter que fazer os mesmos movimentos por cinco ou 10 vezes seguidas, nunca a vontade foi de desistir.
É recomendável sempre analisar a situação antes de começar a agir

Fora de ordem

Tão interessante quanto as mecânicas de jogo, é a maneira como a história de Katana ZERO é contada. Depois de cada missão, o Dragão visita seu psicólogo para tratar de sonhos e visões estranhas que atrapalham sua vida. Nessas consultas, o jogador e o protagonista vão juntos descobrindo importantes detalhes do passado e montando um quebra-cabeça que só se completa após a batalha final. Com isso, a narrativa acaba se tornando completamente imprevisível e nada linear.

O jogador se sente ainda mais na pele do samurai ao ter opções diferentes de respostas para diversos diálogos. As escolhas importam, pois, a partir delas conhecemos níveis maiores ou menores de detalhes da história. Ponto positivo e que torna o game ainda mais acessível para o público brasileiro é que ele está totalmente em português e com uma tradução extremamente bem feita.

Mas, o que torna mesmo o enredo um dos principais pontos altos de Katana ZERO são as inúmeras reviravoltas. Existem surpresas tão grandes que fazem o jogador mudar completamente a maneira como ele observa o game. Claro que não vou soltar spoilers por aqui, mas posso dizer que estava encarando as mecânicas e possibilidades do título de uma forma e quando me deparei com algumas novas informações, percebi que era algo completamente diferente da minha interpretação inicial.
Nem tudo é aquilo que parece

VHS e fitas k7

Dizem que um bom livro não se julga pela capa, mas Katana ZERO mostra que é possível ter ótimo conteúdo e também uma arte digna de elogios. O mundo futurístico criado a partir de pixel art é cheio de detalhes e capaz de criar uma atmosfera distópica. O uso das cores também foi muito bem feito, enquanto as missões externas são mais escuras e densas, o consultório do psiquiatra é totalmente voltado para o vermelho, tonalidade associada à energia e violência — questões constantemente tratadas naquele escritório.

O aspecto visual é complementado pelo excelente sistema de iluminação com cores de neon que criam um lindo jogo de sombra e luz. O efeito de alguns cenários, como Chinatown, é absolutamente incrível. Confesso que permaneci parado por alguns minutos para ficar admirando as sombras projetadas na tela pelas roupas penduradas nos varais. Katana ZERO é a prova definitiva que títulos em pixel art não são sinônimos de baixa qualidade visual.
As sombras criadas pelas roupas no varal: detalhes que fazem diferença

O bom desempenho gráfico é acompanhado pela trilha sonora e, mais uma vez, os produtores usam artifícios para o jogador se sentir o próprio Dragão. Antes de iniciar a missão, o protagonista coloca fones de ouvido e somente depois disso a música da fase começa a ser executada. É como se aquele pequeno aparelho que reproduz fitas k7 estivesse diretamente ligado aos alto falantes do Switch. E nosso samurai tem um bom gosto musical, afinal, todas as trilhas são excelentes e combinam muito bem com a temática da missão.

Já os efeitos sonoros são um tanto quanto simples, além dos barulhos de tiros e objetos sendo quebrados, o jogador vai cansar de ouvir o grito de morte do Dragão. É verdade que não há como inovar muito para reproduzir os sons de uma arma ou de garrafas se estilhaçando, porém, com a alta qualidade da trilha sonora, os efeitos acabam destoando um pouco.
Na balada, mas curtindo meu próprio som

Sede de sangue

O game é relativamente curto e mesmo repetindo diferentes fases por dezenas de vezes, é possível concluí-lo em cerca de quatro ou cinco horas. Porém, mesmo depois de finalizado, vale a pena uma segunda experiência para buscar detalhes da história que possam ter ficado para trás graças às escolhas dos diálogos. Há até mesmo um “final alternativo” que pode ser encontrado no meio do game.

Além de complementar a jogatina, o replay serve para buscar chaves que estão muito bem escondidas e liberam novos tipos de espadas. É pouco provável que logo na primeira experiência o jogador consiga coletar todas elas, é até mesmo bem difícil que isso aconteça na segunda ou terceira vez. O mais razoável é ter que optar por um guia para conseguir as armas especiais.

Guerreiro atemporal

Traz um sentimento incomum ter de decepar cabeças ao som de um velho toca-fitas enquanto nos aventuramos em uma cidade futurista. Katana ZERO é brutal, mas não usa a violência explicita somente para se promover. É uma experiência diferente e com ingredientes únicos que fazem do game um dos indies que mais merecem atenção dentro da eShop. Depois de segurar essa espada pela primeira vez, será difícil largá-la até que a última missão seja cumprida com louvor.

Prós

  • Mecânicas e enredo que prendem a atenção do jogador;
  • Trabalho de iluminação torna os cenários ainda mais belos;
  • Trilha sonora dita o ritmo da matança;
  • Possibilidades de respostas diferentes que realmente impactam na experiência.

Contras

  • Jogador pode se aborrecer ao repetir a mesma fase inúmeras vezes;
  • Efeitos sonoros um pouco aquém da qualidade da trilha.
Katana ZERO — PC/Switch — Nota: 9.0
Versão utilizada para análise: Switch
Análise produzida com cópia digital cedida pela Devolver Digital
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É jornalista e obcecado por games (não necessariamente nessa ordem). Seu vício começou com uma primeira dose de Super Mario World e, desde então, não consegue mais ficar muito tempo sem se aventurar em um bom jogo. Diretor de Redação do Nintendo Blast.
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