Análise: Fairy Fencer F: Advent Dark Force (Switch) é uma boa introdução ao gênero JRPG

Encare uma aventura com Fang, Eryn e seus companheiros e decida se deseja reviver a Deusa ou o Deus Maligno.

em 11/02/2019

Um dia eu pedi a uma pessoa uma dica sobre por onde começar uma famosa série de RPG japonesa que já colecionava mais de dez títulos e que não possui uma ligação de narrativa sequencial. Os jogos em questão acompanharam a evolução da indústria de videogames, portanto, havia diferenças técnicas enormes entre os primeiros e últimos lançamentos. A resposta obtida foi: “apenas comece pelo que lhe chamar mais atenção”. Ainda não tive oportunidade de conhecer aqueles mundos de fantasia, mas o conselho me serviu. Quando assisti o trailer de Fairy Fencer F: Advent Dark Force, apesar de o gênero não ser do tipo que eu costumo jogar, o que vi no conteúdo me chamou a atenção, por isso aproveitei a oportunidade para jogá-lo e trazer minhas impressões.

Fairy Fencer F foi lançado originalmente para o Playstation 3 em 2013 e trata-se de um RPG de fantasia, com o enredo e diálogos contados em formato de visual novel e combates táticos em turnos, que ocorrem em arenas. Para quem conhece, é o mesmo sistema que fez da série Hyperdimension Neptunia um sucesso. Ambos são desenvolvidos pela Compile Heart e pela Idea Factory. A versão Advent Dark Force trouxe para a nova geração um jogo mais polido, com correções técnicas necessárias, como a ausência de telas de carregamento na passagem de áreas, melhorias de performance e opções de qualidade de vida. Além disso, todas as DLC’s foram inclusas e três rotas principais distintas foram criadas para a história, ao invés de apenas o final mudar de acordo com as escolhas do jogador.

A batalha dos deuses

A história começa muito tempo atrás, quando duas entidades divinas travaram uma longa batalha. Uma delas, conhecida como Goddess (Deusa), emergiu da luz e fortalecia-se através dos sonhos e esperanças das pessoas. Já o Vile God (Deus Maligno) surgiu das trevas e aumentava seu poder através da tristeza e sofrimento humano. Durante a guerra, os deuses criaram e se atacaram com armas chamadas furies, até acabarem selando um ao outro e caindo em um sono profundo. Essas armas eram imbuídas com o poder das fairies, seres criados pelos deuses para ajudar na batalha. Muitas caíram na terra e se espalharam pelo mundo.

Com o tempo, humanos dignos de cumprir o propósito desejado pelas fairies passaram a utilizar o poder das furies, em uma parceria benéfica a ambos. Esses guerreiros são conhecidos como Fencers. Basicamente, um Fencer ajuda a Fairy a cumprir seu desejo, enquanto ela empresta a ele um imenso poder. A escolha da pessoa capaz de realizar a tarefa é realizada pela própria Fury. Apesar dessas regrinhas descritas no início do game, o que acompanhamos ao longo da jornada são muitos casos de fairies submetendo-se às escolhas de vida de seus parceiros. Talvez por terem objetivos mais simples ou no caso de ele já ter se cumprido. Provavelmente nunca saberemos.


A Jornada do Herói

Fang é o típico herói que nunca desejou a aventura que lhe aguarda. Ele era apenas um jovem preguiçoso, glutão e desbocado, que só pensava em uma vida livre de preocupações. Um dia, enquanto passava por uma cidade, ficou sabendo de uma espada que ninguém conseguia retirar do chão, que estava ali mesmo antes da fundação do município. A lenda dizia que um desejo seria concedido àquele que conseguisse retirar a arma do solo. Interessado em pedir algo gostoso para comer, ele cumpriu a tarefa. Assim surgiu Eryn, uma Fairy que deseja reunir todas as furies que puder para remover o selo da Deusa e revivê-la — obviamente ele não conseguiu o que a princípio queria.

Se existe algo em que a trama de Fairy Fencer F se apoia, é em clichês, e como em qualquer “jornada do herói”, Fang inicialmente recusou o chamado. Após ser preso por não pagar por um alimento, ele foi salvo por Eryn, aceitando por fim a parceria entre eles. No caminho houve um encontro com um inimigo poderoso e assim ele entendeu melhor os poderes que ela poderia proporcionar, prometendo então ajudá-la a cumprir seu desejo. Ainda assim, ele manteve seu jeito teimoso e decidido a fazer as coisas a sua maneira. Por conta disso, caso o jogador deseje, é possível tomar até três caminhos diferentes na história, inclusive reviver o Vile God.


Muitos companheiros novos juntam-se a equipe durante a aventura, colaborando não só para fortalecê-la com suas habilidades, mas também para o crescimento pessoal uns dos outros. Fang passa por esse processo de aprendizado constante, tornando-se um bom líder e uma pessoa melhor — ao menos no caminho da Deusa —, mas ainda assim mostra-se falho e humano, além de manter algumas de suas péssimas características intactas. Heróis não precisam ser tratados como seres perfeitos, e nesse ponto o jogo agradou-me bastante. Tiara é uma jovem adorável, mas com seus segredos e desvios próprios de conduta, ainda que tenha boas intenções em seus objetivos. Pippin é o membro mais diferente do grupo, uma espécie de gato verde com uma espada incrustada na cabeça. O desfecho satisfaz como qualquer anime em que você já sabe que o herói sempre contará com o “poder do protagonismo”, e mesmo assim adora.

Não é para todos

Por outro lado, é preciso entender que o gênero JRPG é um nicho dentro de outro nicho. RPG’s já não são para todos, e um game que na parte da história apresenta-se como uma visual novel é ainda mais difícil de agradar ao público geral — não estou dizendo que todo JRPG utiliza elementos de visual novel, mas é o caso desse. Os personagens possuem características variadas e formam uma boa equipe nas batalhas, mas fora delas tudo é motivo para colocá-los em situações pervertidas, fazer piadinhas com comida, com personagens se comparando, sendo grosseiros uns com os outros e para sexualizar as garotas. Houve uma preocupação dos desenvolvedores em fazer os seios se moverem até mesmo nas animações mais simples que acompanham os textos. É como uma versão branda de animes do estilo ecchi — é safadinho, mas não explícito.


Porém, há também bons diálogos tratando de temas mais sérios relacionados aos problemas pessoais de cada integrante da equipe e como eles se ajudam a superá-los. Essa parte do jogo funciona através de menus, que representam alguns pontos principais da cidade de Zelwinds. Através dessas opções é possível entrar em longas conversas, obrigatórias ou opcionais, com os integrantes da equipe e cidadãos. Além disso, funções importantes como uma loja de itens, um pub onde conseguimos receber missões do dono com ótimas recompensas e os encontros com uma útil informante são acessados por ali.

Os textos das cenas são acompanhados de belas imagens em HD dos personagens, com pequenas animações que representam de forma capaz quando eles estão falando, comendo ou fazendo outros tipos de expressões. O trabalho de dublagem também é impecável e todas as vozes em inglês são excelentes. Porém, a dublagem só funciona nos diálogos obrigatórios. Mesmo assim, tantas conversas entre as batalhas podem ser bastante cansativas, e os cidadãos comuns quase sempre não possuem nada de útil a dizer. Para piorar, praticamente um terço do jogo é um grande tutorial, e mesmo após terminá-lo, ao iniciar um New Game +, é preciso passar por tudo novamente.


Onde a magia acontece

O grande destaque do jogo está nas batalhas. Após sair da cidade, temos acesso ao mapa do mundo, com diversas dungeons que podem ser exploradas livremente. Não há muita criatividade ou presença de grandes desafios nos calabouços, por tratarem-se apenas de salas e corredores interligados, com cenários 3D de baixa resolução e texturas nada realistas. Elas estão preenchidas com alguns inimigos em cada sala e um chefe no final, que concede uma Fury ao ser derrotado. Há ainda alguns cristais de itens para procurarmos. Apesar dos gráficos datados, os personagens ainda são muito bem modelados e detalhados e os inimigos, apesar de genéricos e esquecíveis, também possuem animações de qualidade.

A magia acontece quando encostamos em algum monstro. A partir daí o jogo muda para uma arena circular em que aparecem todos os personagens da nossa party e também um grupo de inimigos. Cada integrante possui suas características específicas que influenciam a distância que conseguem se mover e também a que conseguem acertar seus alvos. Além dos ataques normais, estão disponíveis técnicas especiais, habilidades únicas, magias, combos e o mais legal: o Fairize, um modo em que o personagem se acerta com sua Fury para unir seus poderes com o da Fairy, mudando seu visual com a adição de uma incrível armadura tecnológica e aumentando o dano causado para 1.5x. As animações de ataques especiais são super pirotécnicas, fazendo "um show à parte".


Cada ataque possui uma pontuação específica que define o quanto um Fencer precisa aguardar para ter uma nova vez de atacar. Portanto, combos menos poderosos às vezes podem significar que aquele guerreiro ficará disponível mais rapidamente, possibilitando a criação de estratégias diferentes para cada integrante do grupo. Uma barra presente na lateral esquerda da tela mostra a ordem dos turnos de cada personagem e também dos inimigos. Apesar da enorme lista de opções para customizar a experiência, tudo é bastante simplificado. Apenas selecionar os inimigos e atacá-los de qualquer jeito provavelmente funcionará na maior parte das vezes, mas também pode significar ter que “upar” mais ou gastar muito ouro com potes de cura. Além disso, sempre haverá batalhas mais desafiadoras que serão facilitadas por um bom domínio das técnicas disponíveis.

Os monstros possuem fraquezas específicas a certas armas e elementos e saber explorá-las faz toda a diferença. Ainda assim, o jogo é bastante abrangente: cada Fencer que encontramos costuma ter um elemento diferente e podem usar várias categorias de armamentos, formando equipes bem preparadas para lidar com as mais diversas situações. Como exemplo, Fang possui ataques especiais e magias do tipo fogo. Sua habilidade única é a Serious Face, que aumenta o dano dos seus ataques normais ao custo de SP — barra utilizada para magias e técnicas especiais. Sua arma primária é a espada, mas ele também pode utilizar machado e socos, além de outras duas opções. Tudo é bastante simples de aprender, além de ser introduzido gradualmente ao longo de toda a primeira parte do game.


Aumentando a coleção

Outro ponto que é bastante descomplicado é a hora de definir os equipamentos. Ao invés de um monte de peças, basta escolher um traje e uma joia para cada personagem, a fim de aumentar seus atributos de ataque ou defesa. Cada Fury obtida adiciona uma Fairy à coleção, que aparecem como se fossem cartas. Todo Fencer já tem sua Fairy parceira que participa da história, mas essas colecionáveis podem ser adicionadas como secundárias, aumentando atributos dos personagens. Existem em torno de 100 fairies diferentes, que possuem elementos específicos e conseguem subir de nível e de rank, então vale a pena procurar pelas mais poderosas e combinar com os personagens corretos para melhor aproveitamento.

Por fim, as fairies colecionadas podem ser utilizadas para remover furies que estão selando o Deus Maligno ou a Deusa. O processo é realizado através da pousada em que ficam os personagens e a escolha de quem reviver ou de quais espadas retirar fica por conta do jogador, mas saiba que tratam-se de escolhas que irão definir o rumo da história. No entanto, cada espada precisa de uma Fairy de um rank específico, e uma batalha ocorre ao retirar a arma. Obtendo sucesso, a Fairy recebe novas habilidades que valem quando ela é colocada como secundária e também passa a poder ser utilizada no mapa do mundo para liberar novos locais e conceder atributos a dungeons como, por exemplo, um maior drop de ouro em troca de menor dano físico ou mágico.


Por ser um processo longo, é possível terminar o jogo sem conseguir remover todas as furies de um dos deuses. O nível máximo dos personagens pode chegar a 999, e para comparação, eu consegui finalizá-lo com uma média de level 50 para a maioria deles. Existe uma infinidade de técnicas e melhorias para desbloquear, fazendo com que os personagens estejam sempre progredindo. Vê-los mais fortes e com mais opções é bastante animador. Infelizmente, o fato de precisar refazer os tutoriais mesmo levando o que conquistou no jogo passado para a nova partida desanima igualmente. Além disso, após conferir os três caminhos da história, lutar contra os mesmos inimigos genéricos de forma repetitiva deixará apenas quem gosta muito do estilo do game ainda interessado em continuá-lo. Nem mesmo as dungeons específicas indicadas para níveis acima de 100 contribuem muito para um bom fator replay.

Encerrando a jornada

É bom deixar claro que o jogo é muito bonito na parte de visual novel, mas possui gráficos datados nos momentos de exploração, além de pouquíssimas escolhas que fazem muita diferença na história. A movimentação do líder da party em 3D é um pouco desconfortável, mas não faz muita diferença, já que as batalhas são realizadas por turnos. O rumble é muito forte, e eu o desliguei porque se tornou incômodo. A trilha sonora possui uma qualidade extremamente desbalanceada. Enquanto algumas músicas são maravilhosas, outras são sofríveis — mas isso vai do gosto de cada um. No modo portátil o game sofre ocasionalmente com algumas quedas na taxa de quadros.


Conteúdo não falta. Isso inclui muitas técnicas, equipamentos e cosméticos — mesmo que existam vários itens simples e desinteressantes como óculos e tiras de pano amarradas ao braço, há também opções bem legais. A cutscene de apresentação do jogo em anime é incrível, mas o vídeo inicial que apresenta os deuses já perde um pouco em qualidade. Apesar de todos os problemas, Fairy Fencer F: Advent Dark Force é um bom port para o Switch. Um game divertido, que me fez rir em vários momentos. Também me parece uma boa oportunidade para introduzir os interessados em conhecer o gênero JRPG, por conta de suas dungeons fáceis de localizar o caminho, equipamentos simplificados, personagens carismáticos e sistema de batalha interessante, funcionando bem tanto para iniciantes quanto jogadores experientes.

Prós:

  • Belos visuais e animações na parte de visual novel;
  • Ótima modelagem de personagens e animações na parte de exploração;
  • Excelente dublagem, com vozes que combinam com os personagens;
  • Animações pirotécnicas incríveis ao executar ataques especiais;
  • Personagens principais carismáticos;
  • Boa progressão de habilidades;
  • Sistema de batalha excelente.

Contras:

  • Gráficos datados, controles duros e dungeons sem graça na parte de exploração;
  • Diálogos longos, arrastados e nem sempre interessantes;
  • Tutorial muito extenso, e obrigatório ao se jogar o New Game +;
  • Repetitivo, sem muito incentivo para replay além dos três caminhos possíveis para a história;
  • Inimigos genéricos e vilões nada carismáticos.
  • Problemas de desempenho podem ocorrer no modo portátil.
Fairy Fencer F: Advent Dark Force — PC/PS3/PS4/Switch — Nota: 7.0
Versão utilizada para análise: Switch
Análise produzida com cópia digital cedida pela Idea Factory
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