Análise: Bastion (Switch) é uma obra de arte filosófica

A calamidade arruinou tudo, e você deve resolver o problema

em 21/09/2018

“Mas então? Tudo o que ele fez foi seguir as ordens de um velho que sequer perguntou o nome. E sim, eu posso ser aquele com quem sonhou com a Bastion construída, mas foi a criança que a construiu de verdade, não eu. Eu gostaria de dizer que nunca vou esquecê-lo. O que ele fez, certamente eu faria”. Bastion não se trata de um simples jogo, Bastion nos mostra como é difícil lidar com a perda ou como podemos superá-la, e é por isso que vim analisar esta belíssima, porém não muito conhecida, obra de arte.

O jogo foi lançado originalmente em 16 de agosto de 2011. Ele foi desenvolvido pela Supergiant Games e distribuído pela Warner Bros. Interactive Entertainment. Na época, devo admitir que ele fez um certo sucesso, mas com o tempo foi esquecido, como lágrimas na chuva.

Graças a sua volta ao Nintendo Switch, as pessoas agora poderão conhecer ou re-vivenciar a experiência de se jogar Bastion. No game começamos controlando um personagem chamado “A Criança”, e basicamente temos que passar por diversos caminhos — estes que vão surgindo em nossa frente conforme nos aproximamos das bordas — e matar variadas criaturas maléficas.

Os mapas consistem em um único plano, com visão isométrica, e é um jogo de aventura com elementos de hack and slash. Mas, seu principal aspecto é o narrador nomeado de “Stranger”, que narra todos os movimentos, ações e acontecimentos que “A Criança” está presenciando.

Antes de começar a análise, já adianto que Bastion trata-se mais de uma obra filosófica, do que um genérico jogo de ação e aventura.



Mate tudo que lhe atacar, Criança

Apesar da jogabilidade de Bastion ser simples, ela é também divertida e dinâmica. Com o nosso personagem, podemos correr, rolar — para desviar de ataques —, defender com escudo, usar 2 armas — sendo uma de curto alcance e outra de longo alcance — e usar uma habilidade especial, que consumirá a sua “mana”.

Tendo isto em vista, podemos investir diversos combos especiais, combinando todos os elementos presentes, tornando o combate atraente e cativante a cada fase.



Os equipamentos e armas são encontrados conforme exploramos os mapas. As armas podem ser modificadas para aumentar seus atributos, para isto o jogador deve coletar recursos. A vida e a mana do personagem são regeneradas através de poções que encontramos pelo cenário. Vale lembrar que temos os “spirits”, que são passivas desbloqueáveis conforme subimos de level.

O quartel-general do jogo é a própria Bastion — nome dado à ilha flutuante onde começamos a jornada — e é lá que podemos fazer todos esses upgrades. 



Na ilha ainda temos acesso a uma loja para comprar recursos, “spirits” e mementos — os mementos contam mais sobre a história do mundo que nos rodeia. Além da loja, temos o arsenal para troca de equipamentos, a forja para melhoria dos mesmos, a destilaria para escolher as passivas (spirits), a “shrine” — onde podemos fazer oferendas a antigos Deuses, que em troca recebemos aumento de XP e dinheiro, mas também desvantagens —, e por último o memorial, onde coletamos recompensas dos feitos durante a campanha.

O Tema da Zia - Build That Wall



É sério, ouçam o tema do subtítulo acima no YouTube enquanto leem esta parte da análise. Todas as músicas e melodias do jogo foram feitas pelo compositor norte-americano Darren Korb — que inclusive compôs a trilha de um outro jogo indie, trata-se de Transistor. Caso você esteja ouvindo o tema da personagem Zia, já deve ter percebido o nível do trabalho de Korb. Agora, caso não esteja, saiba que a canção é belíssima.

Um dos atributos mais importantes para um videojogo é a combinação das músicas e sonoplastias com o ambiente. Temos vários exemplos de games que fracassaram miseravelmente nisso, mas Bastion passa longe dessa lista. Cada fase, cada ação, cada cinemática ou até em conjunto com o narrador, a trilha se encaixa perfeitamente nos ambientes, fazendo de Bastion dependente de sua trilha sonora.



Houve partes do jogo onde cheguei até a arrepiar, devido ao que estava acontecendo na minha frente, em união com a melodia que tocava ao fundo. Com canções graciosas, melodias desérticas, composições para ambientes sinistros e as baladas de combates, Bastion traz uma soundtrack que vale a pena ser ouvida sozinha também.

É tudo pintado à mão

Sim, isso mesmo, toda a arte do jogo foi pintada à mão e ela é simplesmente maravilhosa. Todos os detalhes como caixas, pedras, arbustos, folhas caindo das árvores ou até o vento desértico passando são extremamente detalhados, coloridos e belos. O jogo possui mais de 40 mapas e cada um com suas peculiaridades. Existem cenários desérticos, florestas devastadas, ambientes gélidos e até lugares inóspitos.



Em Bastion, eu vivenciei um verdadeiro apocalipse, uma calamidade que ocorreu sem ninguém perceber. Tudo que era belo e formoso agora está em pedaços, mas ainda assim conta com sua expressividade artística. A arte vale também aos personagens e inimigos, que — apesar de não serem tão diferenciados — foram bem apresentados ao jogo.



Vou citar o que eu já mencionei, todo jogo precisa também de seu atributo artístico. Bastion me conquistou nesse quesito, graças a sua criatividade.

Ei Criança, a Bastion pode consertar tudo

Tudo começa quando um garoto — este que passa o jogo inteiro sem falar nada — acorda em seu quarto. Ao olhar em volta, percebe que o mundo está caindo aos pedaços, uma calamidade aconteceu sem que ninguém percebesse. O garoto então decide se levantar e buscar por um refúgio, por um lugar que seja ao menos habitável. No início já começamos com a ponderosa narração de Logan Cunningham, que descreve todas as ações do garoto até que o mesmo o encontre na ilha de Bastion.



Com a união do velho "stranger" e da criança, o narrador explica que o mundo foi afetado por uma calamidade, e que reativar a ilha de Bastion é o único meio de fazer tudo voltar a ser como era. E como esperado, essa missão cai sobre nossas costas, ou seja, nosso objetivo é coletar núcleos que vão reconstruindo Bastion.

Durante a jornada nos encontramos com outras figuras cativantes, cada uma com sua história, personalidade e papel naquele ambiente. Conforme vamos jogando também, o narrador vai explicando um pouco mais sobre os ambientes, o que havia naqueles lugares devastados e sobre as vidas tiradas pela calamidade.



Eu presenciei diversas reviravoltas e revelações durante toda a jornada, finalizando o jogo com a cabeça ainda presa naquele universo, naquele mundo onde eu pude fazer minhas escolhas. Admito que em uma delas — escolhas — fiquei parado por uns 10 minutos olhando para a tela do Switch, pensando na reação que ela traria para a ilha de Bastion, ou aos personagens que lá residiam.

Com os comentários ardilosos e a ressonância emocional da narração de Cunningham, entramos de cabeça naquele universo, tendo que tomar caminhos que vão interferir diretamente com o emocionante e incrível final do jogo.



Admito que todo o game me lembrou um pouco de Zelda: Breath of the wild (Switch), mas enfim, eu não posso ir mais a fundo na história de Bastion, pois esta é uma obra que deve ser desfrutado do começo ao fim, sem que ninguém o interfira. 

Lembrando também que ao completarmos o game — que leva de 7 a 8 horas —, é liberado um Novo Jogo +, onde podemos re-jogar a história com todos os itens e equipamentos já melhorados.



A Filosofia de Bastion

Dentro do universo de Bastion é explorado o genocídio, o preconceito e principalmente o luto. Temos personagens que perderam tudo e querem consertar os seus erros. Eles negam a sua perda, ficam com raiva de quem tenta ajudá-los e então agem, por impulso, para tentar arrumar o que já está morto, ou destruído.

Assim como estes que passam pelas fases do luto, temos também os que veem a calamidade como um novo caminho, aceitando a nova realidade, prontos para enfrentar a nova jornada que o destino os proporcionou.



Resumindo, a escolha final — e a jornada em si — mostra ao jogador se ele está pronto para seguir em frente ou continuar sofrendo com os erros ou perdas do passado. Pois bem, Bastion me mostrou que eu ainda não estou pronto para seguir em frente e que minhas escolhas deveriam ser repensadas.

Levante-se Criança, ainda há tempo


Bastion é um jogo extremamente divertido e repleto de conteúdo em questão de jogabilidade, fazendo com que o jogador experimente diversas armas, poderes e combos diferentes. Além disso temos o conjunto maravilhoso da trilha sonora (que pode ser ouvida à parte) com a arte feita à mão dos cenários catastróficos, porém belos.

Mas o que mais cativa o jogador e o insere dentro daquele mundo, é a voz do narrador que nos segue por toda jornada, contando a história de cada lugar e detalhando aquele universo. Tendo isto em vista, e lembrando da filosofia que Bastion nos entrega, eu só posso resumir este jogo em duas palavras: uma obra de arte. Opa, foram 4.

Prós:

  • Jogabilidade simples, divertida e repleta de conteúdo;
  • A trilha sonora é uma obra que funciona sozinha, mas somada a Bastion é melhor ainda;
  • Arte cativante, cheia de detalhes e pintadas à mão;
  • Uma narrativa totalmente diferenciada e envolvente, graças ao narrador;
  • A filosofia de Bastion.

Contras:

  • O jogo é curto, infelizmente.
Bastion - Switch/PC/PS4/PS3/XBO/iOS - Nota: 10
Versão utilizada para análise: Nintendo Switch 
Revisão: Júlio César
Análise produzida com cópia digital cedida pela Supergiant Games

Passou por vários cursos até aceitar seu destino em Publicidade e Jornalismo. Hoje escreve para a Nintendo Blast durante a manhã e combate Goombas com o seu amigo Luigi durante a noite. Quando não está em suas aventuras midiáticas ou acadêmicas, está presente no Facebook e Instagram (@mirandacom2a)
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